O XADREZ POLÍTICO DAS ELEIÇÕES MUNICIPAIS DO RECIFE EM 2012 –
João da Costa vence as prévias. O PT vive o seu Waterloo na capital
pernambucana.
José Luiz Gomes
escreve:
Um
dos assuntos mais comentados na crônica política brasileira são as últimas
prévias realizadas pelo Partido dos Trabalhadores no Recife. Mantendo uma
hegemonia de 12 anos na gestão da cidade, o PT esboça alguns sinais de desgaste
bastante preocupantes. No que concerne à administração da cidade, a avaliação
do prefeito João da Costa não vai muito bem - de acordo com alguns críticos -
rompendo o círculo virtuoso do “jeito petista de governar”, introduzido pelo
seu padrinho político, o Deputado Federal João Paulo. Do ponto de vista político,
então, a hemorragia é generalizada, sem previsão de estancar a sangria.
Não
fosse suficiente uma disputa fratricida pelo poder, que está transformando as tendências
em “bandos”, ocasionando, não raro, disputas internas marcadas por conflitos de
fato, o PT parece ter se perdido na perspectiva de “cuidar da cidade”. Tivesse
o partido mantido os princípios que nortearam sua fundação, certamente não
chegaríamos a esse ponto. A vitória de João da Costa está sendo manchada pelas
denúncias de irregularidades. A derrota de Rands não foi assimilada e isso
significa que teremos manobras da Executiva Nacional no sentido de intervir no
Diretório Municipal.
Todas
as declarações do grupo de Rands são no sentido de não aceitar o resultado das
prévias. Ainda não se sabe como o partido sairá desse imbróglio, mas convém
João da Costa colocar as barbas de molho. A aristocracia petista não o aceita como
candidato. Fernando Ferro, que em momento recente mediou conflitos internos da
agremiação no Maranhão, certamente, terá novas missões pela frente. O paradoxo
é que as prévias, que no passado contribuíam para dirimir conflitos internos,
no momento estão servindo para aguçá-los ainda mais.
Usando
uma figura de linguagem, João Paulo foi o responsável pelo primeiro golpe
acusado pelo PT no Recife – ou corte, para ser mais preciso. À época da
indicação de João da Costa, João Paulo preteriu companheiros antigos da
agremiação, com um perfil de organicidade e de articulação bem mais
expressivos. Nos seus cálculos políticos, João da Costa era um ator mais
confiável aos seus projetos. Logo o matuto assumiria uma postura de
independência que provocaria o estremecimento das relações entre ambos,
culminando com um rompimento irreversível. No calor das batalhas internas,
antes da realização das prévias, João Paulo deu declarações à imprensa
afirmando que não apoiaria João da Costa de “jeito nenhum”.
Acossado
pela caciquia petista, João da Costa promoveu um verdadeiro malabarismo
político com o objetivo de aglutinar em torno de si forças políticas da
agremiação e da Frente Popular. Houve, inclusive, um momento do “Costa é
Costa”, ou seja, o prefeito esteve alinhavado com um dos nomes mais importantes
do PT no Estado, o senador Humberto Costa. Se é impossível apontar os
verdadeiros motivos do rompimento entre João da Costa e João Paulo, por outro
lado, fica em aberto, igualmente, as razões que levaram Humberto a afastar-se
do prefeito.
O
próprio Governo do Estado, através de alguns projetos comuns, tentou
estabelecer uma parceria que poderia ser traduzida numa espécie de
transferência de “tecnologia de gestão”, mas que também não trouxeram grandes
resultados. A “má vontade” é um inimigo corrosivo. Num determinado estágio,
forças políticas do próprio PT e da Frente Popular decidiram isolar o matuto
que tomou água de barreira. Nesse estágio, a situação se complicou de vez. Se é
verdade que João tornara-se “carrancudo”, por outro lado, muitos atores
importantes ficaram torcendo pelo seu “desgaste”, não se predispondo a cruzar a
ponte Buarque de Macedo para socorrê-lo.
A
partir desse momento João da Costa não teve mais sossego e passou a administrar
as “crises” geradas por esse clima de animosidades, inviabilizando todas as
possibilidades de diálogo. Houve um momento – possivelmente quando do
lançamento do nome de Maurício Rands – que chegamos a perguntar, através de um
artigo, se seria interessante João da Costa procurar os seus algozes para
tentar dirimir alguns desses conflitos. João deixou de contar com o apoio de
setores importantes da aristocracia partidária do PT, de setores estratégicos
da Frente Popular – inclusive o próprio governador -, e, por fim, da Direção Nacional
do PT. Rui Falcão, por exemplo, em mais de uma ocasião, não conseguiu esconder
a sua torcida pela “solução Rands”. Estabeleceu-se, portanto, uma urdidura tríplice,
inclusive com o sinal verde de Lula, responsável pela candidatura do Secretário
de Estado, Maurício Rands.
João
da Costa pode se preparar que eles vão até às últimas consequências. Rands, que
chegou a se queixar das manobras judiciais do prefeito, afirmam que teria
manobrado nos bastidores para que o julgamento das contas do então secretário
de João Paulo saísse antes das prévias, inviabilizando sua candidatura. Nós não
seríamos tão enfáticos – como fez o presidente estadual do partido, deputado
Pedro Eugênio – em falar de um processo de judicialização da decisão, ferindo a
autonomia interna da agremiação. O que houve foi uma decisão judicial
permitindo o voto a filiados, que, no entender do partido, não poderiam votar
consoantes as regras estabelecidas quanto aos prazos de quitação, entre outros
fatores.
Trata-se
de uma querela que ainda não teria sido devidamente equacionada. Tanto é assim,
que o nome do vencedor das prévias, João da Costa, ainda não teria sido
anunciado pelo partido. O mais grave é que não há disposição nenhuma em
anunciar o nome do prefeito como candidato da legenda. Elói Pietá,
representante da Direção Nacional, que acompanhou todo o processo, tem uma
responsabilidade muito grande pela frente. Respeitar uma escolha legitimada
pelas urnas, honrando o que resta das tradições petistas, ou articular a
imposição de um nome, com os remendos do tapetão.
Conforme
já afirmamos antes, em qualquer cenário, o PT sai fragilizado desse processo. A
agudeza do conflito interno permite afirmar que o partido marcha cindido para
as eleições de 2012, expondo suas fraturas internas para a oposição, seja lá
quem for o escolhido. Os dois maiores eleitores do Recife, João Paulo e o
governador Eduardo Campos, se o escolhido for Rands, emprestariam seu apoio à
sua candidatura, o que vem sendo apresentado como um trunfo. Não contariam,
entretanto, com o apoio da máquina municipal. Caso se confirmem os resultados
das prévias, João da Costa consegue a proeza de mudar substantivamente a
correlação de forças internas na agremiação, mas permanece fragilizado na
disputa, isolado, sem o apoio de lideranças expressivas do PT e da Frente Popular.
Nesta
última hipótese, se desenhas alguns cenários interessantes que podem
salvaguardar o PT, mas parecem feitos sob medida para a Eduardo Campos. O
primeiro deles seria uma aliança branca com o candidato Raul Henry, cuja
candidatura está em ascendência. Outra possibilidade, como já foi aventada pela
imprensa do sul, seria retirar o Coelho da cartola, ou seja, retomar o projeto
de relançar a candidatura do Ministro da Integração Nacional, de Fernando
Bezerra Coelho. Ou seja, Eduardo Campos emprestaria formalmente o seu apoio a
um candidato do PT, preferencialmente Rands, e, nos bastidores, poderia contar
com não uma, mas duas alianças brancas: Raul Henry e Daniel Coelho. Revés para
Eduardo somente na possibilidade de Mendonça Filho ganhar o pleito. Ainda
assim, Jarbas faria a ponte entre ambos, convidando-o para uma feijoada no Campo
das Princesas.
Como
já afirmamos em outro artigo, Eduardo Campos sempre manteve uma distância
regulamentar dessas querelas do PT, não se atrevendo a colocar a mão nessa
cumbuca. Por outro lado, tratou de estabelecer uma estratégia que permitisse seus
“movimentos’” no tabuleiro político, independentemente das manobras do
“aliado”. Intuitivamente, o “Moleque” dos jardins da Fundação Joaquim Nabuco
sabe que não contará com essa parceria para o seu projeto de tornar-se
presidente da República.
PT
transformou-se, um conjunto de agrupamentos políticos movidos unicamente pela
sede do poder, perfeitamente adaptados ao mais radical fisiologismo herdado das
velhas tradições patrimonialistas da sociedade brasileira. Um partido que
chegou ao poder prometendo mudar esse “jeito de fazer política” no Brasil,
apenas aprofundou-o. Como sugere o companheiro Edilson Silva, talvez tenha
chegado o momento de ressignificar a esquerda no Recife.
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