pub-5238575981085443 CONTEXTO POLÍTICO. : Michel Zaidan Filho:Especial Reforma Política: Da ontologia política negativa à agenda das reformas
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quinta-feira, 23 de abril de 2015

Michel Zaidan Filho:Especial Reforma Política: Da ontologia política negativa à agenda das reformas




Michel Zaidan Filho é filósofo, historiador, cientista político, professor da UFPE e coordenador do Núcleo de Estudos Eleitorais, Partidários e da Democracia - NEEPD-UFPE.


                              
A palavra de ordem do momento é a reforma política. Tema sobre o qual todo mundo parece estar de acordo, mas sobre o que não há o menor consenso em como fazê-la. Cada um tem uma proposta diferente sobre o conteúdo dessas reformas. E há quem também discorde da maneira como deve ser encaminhada: Constituinte exclusiva ou uma reforma congressual? – Seria possível uma Assembleia especificamente eleita para cuidar do assunto, ou toda Constituinte é plenipotenciária para mudar a Constituição? – Não é tarefa fácil fazer esta reforma. Pois se trata da sobrevivência dos próprios atores políticos brasileiros, dos partidos, dos candidatos, do Poder Executivo, os parlamentares etc. E cortar na própria carne não é exatamente o que costumam fazer os nobres deputados. Não se deve fazer uma reforma política “à la carte”, pensando nos próprios interesses ou nos interesses de sua legenda. O Ideal é que os ilustres parlamentares pensassem apenas no interesse público, no que seria melhor para República brasileira, não para si e seu partido.

0 Brasil não tem uma tradição de ”engenheiros institucionais”. Estadistas e pensadores preocupados com a forma das instituições políticas. Tem de operadores políticos. 0 menosprezo pela qualidade das instituições vem de um certo ressentimento da política republicana, associada ora ao mercado ora ao exército. A matriz formadora do Estado brasileiro é a família patriarcal, a Casa Grande e sua hierarquia de poderes. A nossa experiência política é o Estado patrimonialista ou neo-patrimonialista, onde se confunde o público com o privado. Tivemos, segundo os sociólogos, 300 anos de Casa Grande. Só no século XIX, começa a formação do espaço público no Brasil. Assim mesmo com o corpo burocrático, oriundo da elite latifundiária da ex-colônia.

A origem do pensamento político brasileiro está ligada às ontologias políticas negativas, à ideia da miséria política brasileira, da inadequação das doutrinas políticas importadas dos outros países (o liberalismo, o socialismo, a democracia, o federalismo, o presidencialismo etc.). As reflexões de Tavares Bastos, Paulo Prado, Sérgio Buarque de Holanda, Oliveira Vianna, sobre “o idealismo da Constituição” e a necessidade de “um autoritarismo instrumental" mostram a pobreza da nossa reflexão sobre a Política e o Modelo Político Brasileiro. A isso viria se somar a maldição da herança (burocrática e patrimonialista) ibérica, entendida como fonte inevitável de corrupção na administração pública do país.

Foi preciso esperar pela década dos 90 e a agenda das reformas institucionais – anunciadas por Collor, mas realizadas por FHC – para introduzirmos de maneira canhestra a discussão sobre a engenharia política brasileira. A inadequação do modelo institucional às características históricas, sociais e culturais do Brasil. Começou , entre nós um debate (de inspiração anglo-saxã) que modelo eleitoral, partidário, federativo seria o mais adequado para o país. Iniciou-se então o debate sobre o estado atual das instituições, sua patologia, sua inadequação. Regime eleitoral (proporcional) que não ajudava o controle e o acesso do eleitor ao seu representante. Regime partidário libérrimo que estimulava a fragmentação congressual e a corrupção política. Regime de financiamento privado, que permitia o abuso escancarado do poder econômico. Hipertrofia do Poder Executivo, judicialização da política. Federalismo anômalo. E uma obrigatoriedade do voto, responsável pela apatia política e a venda dos eleitores. De eleição a eleição, acentuavam-se os defeitos e os problemas da representação política no país; no funcionamento dos partidos e no financiamento das campanhas eleitorais.

O ponto alto dessa crise se deu com as “jornadas de junho” de 2013, que obrigou à Presidenta a promover uma reforma política, com uma Constituinte Exclusiva, apoiada numa mobilização popular. Naturalmente que tal proposta suscitou reações em vários campos: no Judiciário, no Legislativo, na OAB etc.

Após o aprofundamento das investigações da Operação “Lava-Jato”, onde os contratos bilionários da Petrobras com empreiteiras brasileira para a construção de grandes obras públicas serviu de fonte para o financiamento das campanhas eleitorais, indiscriminadamente, a agenda das reformas tornou-se imperiosa. Há, no Congresso Nacional, 3 propostas de mudança nas regras do jogo político no país: uma da OAB/CNBB, uma do Partido dos Trabalhadores e uma outra, do PMDB. As duas primeiras têm pontos em comum, sobretudo, no que diz respeito ao financiamento exclusivamente público das campanhas eleitorais. A do PMDB mantém o financiamento privado, embora as empresas só possam fazer doação a um único partido ou candidato. As propostas mais republicanas são as duas primeiras, pois o financiamento privado das campanhas eleitorais tem sido a principal fonte de abuso e corrupção, pelo Poder Econômico, das eleições proporcionais e majoritárias, no Brasil. A manutenção do atual modelo de financiamento das candidaturas aproxima as eleições de um negócio escuso, clandestino, de troca de favores para a realização de obras e falcatruas, que enchem a crônica policial dos noticiários da TV e do jornalismo impresso. Segundo estimativa do ex-presidente do TSE, Ministro Dias Toffeli, 50% dos candidatos são eleitos por empresas e grandes grupos econômicos no Brasil. Estimativa conservadora, por certo.A proposta da OAB ainda defende outros pontos, como:  voto na lista fechado, e não em candidatos; a proibição de coligação nas eleições proporcionais; o fim de suplentes de senadores etc.

Nenhuma proposta de reengenharia institucional no país dará certo, sem uma profunda mudança da cultura política brasileira, da adoção de uma verdadeira cultura cívica, da exposição de bons exemplos, da punição exemplar de corruptos e corruptores e , acima de tudo, da generalização de oportunidades sociais para os mais pobres e desamparados. Não se pode ter ilusão sobre os milagres que o “messianismo jurídico” operará no Brasil, a despeito das desigualdades econômicas, educativas, regionais. Enquanto não se olhar para esse quadro profundo de iniquidades sobre o qual se pretende erguer o edifício das reformas institucionais, estamos fadados ao círculo vicioso da miséria e da corrupção. E na transformação das vítimas em réus, destinados às masmorras e matadouros públicos, chamados presídios e cadeias. E não escolas de ressocialização e convivência democrática.

                               

                                

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