pub-5238575981085443 CONTEXTO POLÍTICO. : Michel Zaidan Filho: Algumas teses sobre a violência urbana no Brasil
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segunda-feira, 27 de novembro de 2017

Michel Zaidan Filho: Algumas teses sobre a violência urbana no Brasil

 

 
  
Tive a oportunidade de travar uma excelente debate sobre a segurança pública, com o deputado Marcelo Freixo (PSOL-RJ), o dr. Marcelo Barros (delegado da Polícia Civil-PE) e o diretor do SINPOL-PE, na sede do Sindicato dos Policiais Civis, de Pernambuco. Primeira tese levantada é que o Brasil é uma sociedade carcerária (tem 600.000 apenas e é a população carcerária que mais cresce no planeta), sem ser uma sociedade disciplinarizada - como dizia Michel Foulcault. Há no nosso país uma cultura de encarceramento, sem ressocialização. Não se apela para a mediação ou qualquer arremedo de justiça restaurativa. Aqui se parte imediatamente para a criminalização das condutas, abarrotando as varas do crime e aumentando a população carcerária. Nem as audiências de custódia ajudaram a resolver o grave problema da superlotação carcerária no Brasil.

A violência, ao contrário do que pensam alguns policiais, é um fenomeno muitidimensional e não se reduz a uma única causa ou explicação, como por exemplo quesitos relacionados à cor, orientação sexual, condição social etc. Há muitos crimes urbanos praticados por indivíduos da classe média branca, cristã e escolarizada, em fins de semana, que não têm nada a ver com aqueles requisitos. Na verdade, a fronteira entre o crime e a legalidade é tênue. Qualquer um pode cometer uma violência, dependendo das circunstâncias.

Outro questão séria é a falência relativa das tradicionais agências de controle social: a família, a escola, a igreja e o trabalho. Instâncias de socialização ou ressocialização, que canalizam a violência para atividades produtivas, socialmente úteis e permitidas. Essas agencias vêm deixando muito a desejar no que diz respeito ao controle de condutas tidas e havidas como anti-sociais. Há uma crise generalizada de legitimidade e aceitação desses controles. Alguns acham que é uma crise civilizatória. É necessário mudar o modelo de civilização.
Este ponto se relaciona diretamente à tese do caráter criminógeno da sociedade em que vivemos.
 
A inversão de valores, amplamente divulgada pelos meios de comunicação de massa que diz: o crime compensa (o crime de colarinho branco, frise-se). A expressão foi empregada por uma delegado da polícia civil, num debate radiofônico. Dizia o agente da lei, o modelo de sociedade que nós temos produz o criminoso e incita ao cometimento de práticas criminosas. Daí a famosa frase da escritora Marilene Filinto: "O crime é uma metáfora social". Não pode ser analisado apenas sob a ótica do Direito Penal. Isso nos leva diretamente para a busca desenfreada da nossa sociedade pela multiplicação dos tipos penais, como se isso fosse acabar com a violência. O medo e o ódio fazem as pessoas pedirem mais cadeia, mais processos, mais tipos penais, mais castigos etc. É o fenômeno do chamado "terrorismo penal" que vai na contracorrente de todo o movimento garantista, herdeiro dos reformadores iluministas do Direito e da Criminologia. É como se a política criminal de Cesare Lombroso tivesse voltado à cena, com toda força.

Outra tese muito controvertida é a da militarização da polícia, da necessidade da unificação das milícias, e o ciclo completo da operação policial. Aqui, nadamos na corrente contrária a desmilitarização da polícia, com o Exército sendo chamado a patrulhar os bairros e as ruas. Não bastassem os excessos e o desgaste da imagem dos soldados, durante a Ditadura Militar, a força federal é convidada à militarização da segurança, como numa operação de guerra. Isto só pode desacreditar ainda mais a imagem dos militares no Brasil. Mas há quem tire proveitos eleitorais dessa perigosa operação. Sobretudo quem quer ser candidato a alguma coisa no Rio de janeiro.

Não se pode esquecer naturalmente a imensa concentração de rendas e a desigualdade social no Brasil, aprofundada pelo fim das políticas sociais e o aumento dos privilégios das classes e categorias abastadas. Quando se diz que a clientela preferencial do Direito Penal são os pobres, pretos, homossexuais e outras minorias, não se diz outra coisa, senão que o braço pesado do juiz e do promotor cai sobre os excluídos da sociedade de consumo: não compram, não vendem, não se empregam ou solicitam cartas de crédito. É o chamado "rebotalho social", os que não têm mais lugar na sociedade, são elimináveis, como diz o Professor Luciano Oliveira. Neo-miséria, neo-fascismo.

Poderia ainda acrescentar algumas observações do malfadado "Pacto pela propaganda", do governo socialista de Pernambuco. Mas o diagnóstico fica para outra oportunidade. O nosso Estado tornou-se o campeão nas estatísticas de homicídio e mortes violentas nos fins de semana. E alguns coronéis da PM citados em operações duvidosas. E ainda vem se dizer que tudo vai bem, maravilhoso. Só se for na casa de noca.
 
 
Michel Zaidan Filho é filósofo, historiador, cientista político, professor titular da Universidade Federal de Pernambuco e coordenador do Núcleo de Estudos Eleitorais, Partidários e da Democracia - NEEPD-UFPE

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