Da Redação
Na edição da revista CartaCapital que está nas bancas o repórter André Barrocal descreve o roteiro de um acordão que pode, se não enterrar, pelo menos limitar o alcance da Operação Lava Jato, preservando personagens importantes da política brasileira — Michel Temer, José Serra, Aécio Neves, Renan Calheiros, José Sarney e muitos outros.
O roteiro se encaixa na conversa gravada clandestinamente pelo ex-presidente da Transpetro, Sergio Machado, com o hoje presidente do PMDB, Romero Jucá.
Aqui, é importante relembrar:
MACHADO – Acontece o seguinte, objetivamente falando, com o negócio que o Supremo fez [autorizou prisões logo após decisões de segunda instância], vai todo mundo delatar.JUCÁ – Exatamente, e vai sobrar muito. O Marcelo e a Odebrecht vão fazer.MACHADO – Odebrecht vai fazer.JUCÁ – Seletiva, mas vai fazer.MACHADO – Queiroz [Galvão] não sei se vai fazer ou não. A Camargo [Corrêa] vai fazer ou não. Eu estou muito preocupado porque eu acho que… O Janot [procurador-geral da República] está a fim de pegar vocês. E acha que eu sou o caminho.[…]JUCÁ – Você tem que ver com seu advogado como é que a gente pode ajudar. […] Tem que ser política, advogado não encontra [inaudível]. Se é político, como é a política? Tem que resolver essa porra… Tem que mudar o governo pra poder estancar essa sangria.[…]MACHADO – Rapaz, a solução mais fácil era botar o Michel [Temer].JUCÁ – Só o Renan [Calheiros] que está contra essa porra. ‘Porque não gosta do Michel, porque o Michel é Eduardo Cunha’. Gente, esquece o Eduardo Cunha, o Eduardo Cunha está morto, porra.MACHADO – É um acordo, botar o Michel, num grande acordo nacional.JUCÁ – Com o Supremo, com tudo.MACHADO – Com tudo, aí parava tudo.JUCÁ – É. Delimitava onde está, pronto.[…]MACHADO – O Renan [Calheiros] é totalmente ‘voador’. Ele ainda não compreendeu que a saída dele é o Michel e o Eduardo. Na hora que cassar o Eduardo, que ele tem ódio, o próximo alvo, principal, é ele. Então quanto mais vida, sobrevida, tiver o Eduardo, melhor pra ele. Ele não compreendeu isso não.JUCÁ – Tem que ser um boi de piranha, pegar um cara, e a gente passar e resolver, chegar do outro lado da margem.
O boi de piranha para “chegar do outro lado da margem” pode ter sido Eduardo Cunha. O ex-presidente da Câmara, depois de cassado, não voltou a falar em fazer delação premiada.
Estaria à espera dos desdobramentos das ações contra ele, a mulher e a filha? Ou, quem sabe, do “acordão” mencionado por Romero Jucá na gravação?
De acordo com Barrocal, o acerto se daria em duas frentes: na Câmara, o deputado Hildo Rocha (PMDB-MA), aliado de José Sarney, costura uma anistia para os casos de recebimento de contribuições no caixa 2; no BNDES, haveria alívio financeiro às empreiteiras, de forma a modularas delações de seus executivos.
Um dos maiores beneficiários do acerto seria o atual ministro das Relações Exteriores, José Serra, que na delação premiada de Marcelo Odebrecht pode ser acusado de receber R$ 23 milhões em contribuições na campanha de 2010 — parte no Brasil, parte em contas no Exterior.
Também tem interesse em “chegar à outra margem” o senador Aécio Neves, sob investigação por causa do esquema de propinas em Furnas e suspeito de interferir nas investigações do mensalão petista com o objetivo de poupar aliados.
Aécio pode ser delatado por executivos da OAS por receber, através de Oswaldo Borges da Costa Filho, propina de 3% na parte da Cidade Administrativa que coube à empreiteira construir.
Curiosamente, a delação de Léo Pinheiro, da OAS, está travada. Ele faria denúncias contra o ex-presidente Lula, Aécio Neves e José Serra.
O acordão em Brasília beneficiaria especialmente o PMDB: executivos da Odebrechet podem delatar repasse de R$ 10 milhões a pedido de Michel Temer na campanha de 2014. Uma acusação formal contra ele pode por abaixo todo o governo golpista.
Ao menos uma denúncia de acordão já foi feita por um ex-integrante do governo Temer, Fábio Medina Osório, defenestrado da Advocacia Geral da União (AGU).
Quando ainda estava sendo fritado por boatos sobre sua demissão, ele resumiu: “É uma série de ataques que estamos sofrendo. Coincidentemente, logo agora, após havermos ajuizado ações bilionárias contra uma série de empreiteiras, no montante de R$ 12 bilhões para recuperar ativos dos cofres públicos. E no momento em que estamos reforçando a equipe da AGU para combater a corrupção, na Operação Lava Jato”.
Não é de estranhar, neste contexto, o discurso feito pelo ministro do STF Dias Toffoli — que é muito próximo de Gilmar Mendes, devedor do grão tucanato — num evento em Belo Horizonte.
Depois da denúncia do MPF contra Lula, Toffoli disparou em direção à Lava Jato:
“Megaoperações levam ao totalitarismo do Poder Judiciário”, diz Dias Toffoli
16 de setembro de 2016, 21h27
Reprodução parcial
O Judiciário exerce hoje o poder moderador das crises brasileiras que, antigamente, cabia às Forças Armadas, afirmou o ministro do Supremo Tribunal Federal Dias Toffoli nesta sexta-feira (16/9). No entanto, ele advertiu que os magistrados não podem extrapolar suas funções, sob risco de acabarem no ostracismo, como aconteceu com os militares após a ditadura.
“O Judiciário não pode exagerar no seu ativismo, senão vai ter o mesmo desgaste dos militares. Se criminalizarem a política, passarem a achar que o sistema judicial vai moralizar a sociedade brasileira, batendo palmas para doidos dançarem, vamos cometer o mesmo erro que os militares cometeram em 1964 ao assumir o poder”, alertou o ministro no último dia do XX Congresso Internacional de Direito Tributário, ocorrido em Belo Horizonte. O evento foi organizado pela Associação Brasileira de Direito Tributário (Abradt).
Além disso, Dias Toffoli criticou a espetacularização das megaoperações investigativas, como a “lava jato”. “Se quisermos ser os protagonistas da sociedade, temos que refletir se desejamos fazer operações que têm 150 mandados de busca e apreensão em único dia, que têm sentenças aditivas. Isso leva a um totalitarismo do Judiciário. Isso é democracia? Isso é Estado Democrático de Direito?”, questionou.
(Publicado originalmente no site Viomundo)
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