pub-5238575981085443 CONTEXTO POLÍTICO. : Resenha: Romance Chaminés Dormentes.
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sexta-feira, 13 de junho de 2025

Resenha: Romance Chaminés Dormentes.




O romance reconstitui, histórica e socialmente, a decadência da indústria têxtil no país, a partir de uma experiência observada na cidade-fábrica de Paulista, localizada na Região Metropolitana do Recife, em Pernambuco. Durante o seu apogeu, o município ostentou a condição de maior polo têxtil da América Latina, situação que o coloca como um indicador seguro para entendermos como este ciclo de industrialização se deu em todo o Brasil, pois as indústrias do Grupo Lundgren, em Paulista, se constituíam numa espécie de termômetro ou parâmetro seguro para avaliarmos o que ocorria neste setor da economia no país. Tudo, absolutamente tudo que ocorria no país em relação a essa indústria se refletia nas fábricas do município, seja as crises do setor, as novas tecnologias, os grandes movimentos grevistas. Daí se concluir, em princípio, porque o caso de Paulista torna-se emblemático para entendermos a origem, o apogeu e a decadência deste setor da economia em todo o país. 

Além de abordar o processo de decadência da indústria têxtil no município, o romance envereda pelas consequências daí decorrentes, uma vez que tudo, absolutamente tudo no município girava em torno dessa indústria, a Companhia de Tecidos Paulista. Como ficaria a cidade com o encerramento de suas atividades? O que fazer com o espólio de construções históricas do período? Qual a memória a ser preservada? a da oligarquia industrial – representada pelo clã da família Lundgren - ou a memória da luta dos trabalhadores e trabalhadoras por sua emancipação, principalmente mobilizados pela Sindicato dos Tecelões de Paulista? A indústria fechou suas portas na década de 80 do século passado, mas, já na década de 60, refletia a crise no setor têxtil que se observava no plano nacional, de onde não haveria mais retorno, exceto pelo interregno da fase do Milagre Econômico Brasileiro, decorrente da fase inicial desenvolvimentista da Ditadura Militar implantada no país com o Golpe Civil-Militar de 1964. Milagre que durou muito pouco, pois o santo era de barro. 

O que perdurou por longos 21 anos foram os danos políticos e institucionais daí decorrentes, como a supressão de direitos, liberdades civis e a perseguição aos adversários, com seus reflexos no município, elementos que são, igualmente, tratados no romance, como os torturados e desaparecidos locais, assim como o Massacre da Granja São Bento, onde guerrilheiros da VPR foram mortos pelos homens do delegado Sérgio Paranhos Fleury, depois da delação do agente infiltrado cabo Anselmo. Este foi considerado um dos maiores massacres da ditadura militar. Resultaram seis mortos, com evidências periciais de tortura. Esses fatos estão relatados no romance, trazendo, inclusive aquele que foi o último poema de Soledad Barret, dirigido a sua mãe. 

Este romance é o terceiro da trilogia sobre a industrialização têxtil no município, abarcando a origem, Menino de Vila Operária, o apogeu, Cidade das Chaminés e, finalmente, Chaminés DormentesNa primeira parte abordamos os problemas enfrentados pela indústria têxtil naquele período histórico específico, envolvendo, inclusive as sucessivas greves ali verificadas, aguçando, até o limite do possível, o conflito entre capital e trabalho. A greve de 1962 é a mais emblemática entre elas, pois ocorre num ambiente político extremamente favorável à classe trabalhadora, significando conquistas importantes, embora não duradouras, pois, logo em seguida, dois anos depois, ocorreu o Golpe Civil-Militar de 1964. 

Em 1962  estávamos no Governo João Goulart e o Dr. Miguel Arraes - como assim se referia a ele o professor João Francisco - governava o estado de Pernambuco. Papai tinha uma grande admiração pelo ex-governador Miguel Arraes. Arraes foi muito bem votado no município, elegendo-se governador do estado, a despeito das recomendações expressas da oligarquia industrial e dos clérigos católicos locais para que os trabalhadores não sufragassem o nome de Arraes. Naqueles idos, os comunistas eram bem ativos na cidade, a despeito das dificuldades inerentes. Eles conseguiram montar um aparelho que agia dentro da indústria têxtil, tomando todos os cuidados para não comprometerem os operários. Institucionalmente, através da ALEPE, moveram ações para investigar a atuação da milícia armada que atuava no município. 
 
A segunda parte do romance aborda as consequências da queda das atividades da indústria têxtil no município, pois existia um padrão de interdependência bastante acentuado entre essa indústria e os moradores locais, uma relação que extrapolava o caráter estritamente produtivo, atingido outras esferas, como a moradia - existia uma vila operária – os roçados da companhia, que produziam alimentos para a população local. Registre-se, igualmente, que a oferta de bens culturais na cidade também estava condicionados à indústria têxtil da família Lundgren. Na realidade, a cidade tornou-se absurdamente dependente dos ditames da oligarquia industrial. Quando se discutia, por exemplo, sua transformação em cidade, um dos grandes questionamentos dizia respeito à necessidade de uma mini reforma fundiária. 

Na terceira e última parte do romance, abordamos o quadro de ebulição política que exista no país naquele momento, no início da década de 60, de muita agitação política, sindical e estudantil, em torno das reformas de base que país reclamava, que envolvia questões relativas à reforma agraria, educação de adultos, entre outras, e como tal momento se refletia no município. Historicamente, como se sabe, tais reformas foram abortadas pelo golpe de classe articulado pelas forças conservadoras consorciadas com os militares, produzindo longos dias de trevas para o país. Como é dado a quem escreve a liberdade de criação e de invenção, abrimos espaço, durante a narrativa, para uma oficina literária, com o intuito de estimular a leitura entre os moradores, e até mesmo para a organização de um curso de alfabetização de adultos ofertado na Vila, cuja primeira aula foi ministrada pelo educador Paulo Freire. 

Como existia a paranoia entre os militares de que os cubanos estavam insuflando os agricultores no estado, criamos o personagem fictício de um professor cubano, que foi quem conseguiu articular a presença de Paulo Freire no município. Por muito pouco o filósofo francês Jean-Paul Sartre, que estava em  Pernambuco à época, também não esteve presente. Se ele foi tomar o famoso licor de pitangas, porque não atenderia a um pedido de Arraes para prestigiar o lançamento de um projeto de alfabetização de adultos da Vila Operária? Estamos procedendo algumas revisões no texto, mas a primeira versão já se encontra disponível em nosso perfil da Amazon.  

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