
sábado, 23 de julho de 2016
sexta-feira, 22 de julho de 2016
O xadrez político das eleições municipais de 2016, no Recife: Precisamente às 09h03, conforme recomendava os astros, João dá a largada.
José Luiz Gomes
Em convenção realizada na noite desta quinta-feira, dia 21, na Câmara Municipal do Recife, o PT homologou a candidatura de João Paulo às eleições municipais de 2016. Conforme recomendação do seu astrólogo, ele ocupou o microfone exatamente às 19h03 minutos, claro, depois de acertos com os possíveis oradores, que até abdicaram de suas falas em nome da estrela principal do evento. Em seu discurso, João Paulo teceu alguns comentários sobre a conjuntura política que atravessamos no momento, sobretudo a este estágio de intolerância a que chegamos. O Plenário da Câmara Municipal ficou completamente lotado, com a presença de figuras de proa da agremiação no Estado, como o ex-prefeito João da Costa, Oscar Barreto, Humberto Costa e o líder dos Sem-Terra, Jaime Amorim.
Assim, de início, três aspectos positivos devem ser elencados nesta etapa inicial da campanha. A certeza de que essas eleições serão difíceis, em razão de inúmeros aspectos, realizadas numa conjuntura de instabilidade política e de dificuldades de financiamento. É preciso ser criativo, ter bons argumentos e os pés no chão; pela primeira vez, o time demonstra uma capacidade de união que podem trazer bons dividendos eleitorais. As divergências de João Paulo com João da Costa e Oscar Barreto parecem que foram, enfim, superadas; A expertise administrativa dos Joões, capazes de abrir um flanco de críticas contundentes à gestão do socialista Geraldo Júlio(PSB). Num momento, João Paulo lembrou que o legado petista na gestão da cidade foi tão importante que nem Geraldo Júlio não conseguiu desmontar. O senador Humberto Costa também bateu forte, apontando que o atual gestor faz uma administração para os mais ricos, que, a rigor, não são assim tão dependentes do poder público; outro aspecto que já é possível sentir pelas redes sociais é um flerte do candidato com os movimentos anti-golpe não necessariamente ligados ao PT, conforme já discutimos aqui pelo blog.
Há quem acredite que essa conflagração nacional tenha seus reflexos efetivos nas próximas eleições municipais. Talvez nunca tenhamos realizado uma eleição municipal com um quadro político nacional tão conflagrado como este. Como mesmo observou o candidato, os ânimos estão bastante acirrados. Por outro lado, volta-se à velha tese de que, nas eleições municipais, o eleitor está muito mais preocupado com o seu cotidiano, com aquilo que mexe diretamente com a sua qualidade de vida, como os problemas de mobilidade, limpeza pública, manutenções de serviços essenciais etc. Em qualquer circunstância, o PT apresenta um bom quadro para o debate nacional e para o cotejo de gestões. O eleitor recifense deve ganhar com isso, uma vez que a pirotecnia deverá ceder espaço à saliva.
Surpreende nessa composição ausência dos comunistas do PCdoB, que, segundo João Paulo, seriam muito bem recebidos, dado o alinhamento e convergência no plano nacional. Diversos caciques que se posicionaram em favor das urdiduras que solaparam o mandato da presidente Dilma Rousseff(PT) fizeram questão de demonstrar o seu "desconforto" em caminhar com o Luciano Siqueira(PCdoB) na condição de vice de Geraldo Júlio (PSB) no seu projeto de reeleição. Mesmo assim, ele permanece. Vão longe aqueles tempos em que os comunistas sofriam com os "encargos de natureza ideológica". Hoje eles se orientam por outros fatores. Em Jaboatão, por exemplo, nenhum constrangimento em caminharem ao lado de tucanos e "socialistas". O PCdoB deve apoiar o nome de Heraldo Selva(PSB).
Editorial: João Santana e esposa entram no programa de delação premiada.
O marqueteiro João Santana e a esposa Mônica Moura entram no programa de delação premiada da PGR. Ambos são publicitários e estiveram diretamente ligados às últimas campanhas políticas do Partido dos Trabalhadores, logo que o conterrâneo Duda Mendonça foi deletado do posto, já como resultado dos famosas caixa dois. O assunto ocupa um bom espaço no trend do microblog Twitter. Fica ali pelo meio e, se a gurizada deixasse, poderia atingir o top, uma vez que os "coxinhas" estão loucos para verem o Lula preso e eles acreditam que as declarações de João Santana podem contribuir para isso. Até o momento, João Santana só falou o estritamente necessário, comprometendo, se é este o caso, apenas as empreiteiras, que já estão mais sujas do que pau de galinheiro.
Ninguém pode negar aqui a identidade entre o marqueteiro João Santana e o PT. Como estamos vivendo numa época de muitas ilações, mentiras, boatos e calúnias, chegou a circular pelas redes sociais a informação de que o senador Cássio Cunha Lima(PSDB-PB) - logo ele - teria a informação de que a carta de despedida da presidente afastada, Dilma Rousseff, teria sido escrita por João Santana, que se encontra preso. Na época de Lula, o ghost writer do Planalto era Gilberto Carvalho. Não seria nenhuma surpresa que, como uma espécie de assessor direto para os assuntos envolvendo a imagem do governo, Santana pudesse ser ouvido ou requisitado. Não acredito, porém, que a presidente Dilma Rousseff tenha requisitado seus serviços nessas circunstâncias. Isso está nos parecendo mai uma coisa plantada.
Uma das primeiras coisas que os "coxinhas" precisam entender é que, como publicitário, João Santana participou de diversas campanhas políticas, de vários candidatos, de inúmeros partidos, aqui e fora do país. Não nos consta que ele tivesse qualquer identidade ideológica com o Partido dos Trabalhadores. Não se aceita um acordo de delação premiada apenas com o propósito de atenuar as consequências dos ilícitos cometidos pelos acusados. Pelo que informou o ex-presidente da Transpetro, Sérgio Machado, as cláusulas são bem exigentes. Creio que o marqueteiro João Santana deve abri o jogo sobre a dinâmica e a estrutura dos mecanismos irregulares de financiamento de campanhas políticas. Neste aspecto, ele pode dar uma contribuição muito importante para que sejam aperfeiçoados os instrumentos de fiscalização e controle dos órgãos públicos. Ganha a res publica com esse tipo de delação.
O resto é torcida e nós não vamos entrar aqui neste mérito. Há problemas com os financiamentos das campanhas do PT? creio que sim e, se a delação premiada de João Santana for, de fato, homologada, ele poderá revelar essas possíveis irregularidades, pelas quais, inclusive, ele já se encontra preso. João está na cadeia em razão de campanhas recentes, realizadas para o Partido dos Trabalhadores, onde suspeita-se que parte dos seus ganhos, depositados no exterior, tenha origem na malversação de recursos públicos envolvendo a estatal Petrobrás, fulcro da Operação Lava Jato. Se isso seria suficiente para prender Lula no dia seguinte - embora seja este o propósito desta engrenagem - aí já estamos diante de uma outra questão.
Havia a informação de que João Santana e Mônica Moura não estavam bem, o que não seria surpreendente. Esses são momentos difíceis na vida de qualquer cidadão. Segundo dizem, apesar da pressão dos familiares, ele só não entrou antes no programa em razão dos possíveis problemas profissionais que poderia vir a enfrentar. Não há inocentes aqui. Se há irregularidades - como se prevê - os agentes envolvidos conhecem bem a engrenagem. João Santana passaria a ser um ator não confiável para futuro negócios dessa natureza. Com o avanço da legislação sobre o financiamento de campanhas, entretanto, o que se presume é que o expediente do caixa dois seja definitivamente encerrado. Este fato, inclusive, está afastando muita gente boa das próximas eleições municipais previstas para 2016.
quarta-feira, 20 de julho de 2016
terça-feira, 19 de julho de 2016
Como na ditadura, República de Curitiba usa os jornais para destruir os inimigos
É preciso acabar com Lula, fazer sua caveira, antes que ele tenha chance de voltar pelo voto. E antes que sua defesa desmoralize a Lava Jato.
Nos últimos dez dias, Globo, Folha e Estadão republicaram antigos vazamentos da Lava Jato contra o ex-presidente Lula. Notícias velhas foram requentadas e servidas como carne fresca a quem perdeu a memória dos desmentidos: uma sede do Instituto Lula que nunca existiu, uma rodovia na África e o acervo que Lula tem de guardar por força da lei. Isso se chama publicidade opressiva, violência inerente ao estado de exceção e essencial aos “julgamentos pela mídia”.
Não pode ser coincidência. A ofensiva dos vazadores e seus repórteres amestrados segue-se à ação da defesa de Lula, que levantou a suspeição de Sérgio Moro para julgá-lo, por perda da imparcialidade. Essa é a notícia nova do caso, que a imprensa brasileira escondeu. Deu no New York Times, mas não saiu no Jornal Nacional.
A ação aponta 12 afirmações de Moro antecipando a decisão prévia de condenar Lula. Registra os abusos que ele cometeu – da condução coercitiva sem base legal à divulgação criminosa de grampos telefônicos. No estado de direito, Moro deveria declinar do caso para outro juiz, isento, imparcial, condição que ele perdeu em relação a Lula.
O Datafolha também ajuda a entender a ofensiva. Só Lula cresceu. Tem um terço dos votos válidos no primeiro turno e mais de 40% no segundo, contra os três tucanos e a insustentável Marina. Só perde, hoje, para o antipetismo; e debaixo de uma campanha de difamação sem precedentes.

É preciso acabar com Lula, fazer sua caveira, antes que ele tenha chance de voltar pelo voto. E antes que sua defesa desmoralize a Lava Jato. Tem de bater na cabeça da jararaca. Mas como, se não há crime para acusá-lo? Se há só pedalinhos, obras de alvenaria, propriedades imaginárias, palestras profissionais, presentes de governos estrangeiros.
Desde a reeleição de Dilma (aliás, por isso mesmo), Lula, seus filhos, sua empresa de palestras e o Instituto Lula tornaram-se alvos de 9 inquéritos do Ministério Público e da Polícia Federal, 3 proposições de ação de penal, 2 fiscalizações da Receita e 38 mandados de busca. Quebraram e vazaram seus sigilos bancário, fiscal e telefônico.
Numa afronta à Constituição e a princípios universais do Direito, adotados pelo Brasil em tratados internacionais, Lula é investigado pelos mesmos fatos em inquéritos simultâneos: da Procuradoria-Geral da República, de procuradores regionais do Paraná e Brasília e de promotores do Estado de São Paulo. É tiro-ao-alvo.
Essa verdadeira devassa – insisto: sem precedentes no Brasil – não encontrou nenhum depósito suspeito, conta no exterior, empresa de fachada ou contrato de gaveta; nenhum centavo sonegado, nenhuma conversa de bandido. Nada que associe Lula direta ou indiretamente aos desvios na Petrobras investigados na Lava Jato ou qualquer ilegalidade.
Nem mesmo os réus delatores, que negociam acusações sem provas em troca de liberdade e (muito) dinheiro, apontaram fatos concretos contra Lula. No máximo, ilações, do tipo “ele devia saber”, conduzindo à esfarrapada tese do domínio do fato. No estado de exceção midiática, apela-se à tese da obstrução da justiça (o maldito direito de defesa), a partir do pré-julgamento de grampos ilegais.
O fato é que a Lava Jato e a Procuradoria-Geral da República não têm como entregar – na só-base da prova, da lei e do direito – a mercadoria esperada desde sempre por seus patrocinadores: Lula na cadeia. Não em julgamento justo, com policias e procuradores apartidários, juiz natural e imparcial, tribunais fiscalizadores da primeira instância. Não no estado de direito democrático.
Para tirar Lula do jogo, precisam desesperadamente da cumplicidade dos meios de comunicação; a Rede Globo à frente e o rebotalho dos impressos na retaguarda. Precisam promover um julgamento pela mídia, com base na publicidade opressiva. Precisam espalhar que Lula estaria metido “nessa coisa toda”; silenciar e até intimidar quem duvide disso, para sancionar uma condenação sem prova.
Quem foi jornalista na ditadura tem amarga lembrança de colegas que serviam à repressão (alguns em dupla jornada, como na Folha da Tarde, da família Frias). Noticiavam assassinatos de presos como “atropelamentos”, tratavam torturas como “rigorosas investigações”. Faziam a caveira dos “subversivos”. Eram chamados jornalistas de “tiragem” – a serviço dos “tiras”, é claro, não da verdade.
Recordo sem intenção de ofender os jornalistas “investigativos” de hoje que comem na mão dos “investigadores” anônimos. Podem acreditar sinceramente que contribuem para “combater a corrupção”. Ganham as manchetes, mas abrem mão do jornalismo, que é a busca da verdade. Quando a meganha pauta e o repórter obedece, cegamente, quem perde é a notícia. E perde a democracia.
Não pode ser coincidência. A ofensiva dos vazadores e seus repórteres amestrados segue-se à ação da defesa de Lula, que levantou a suspeição de Sérgio Moro para julgá-lo, por perda da imparcialidade. Essa é a notícia nova do caso, que a imprensa brasileira escondeu. Deu no New York Times, mas não saiu no Jornal Nacional.
A ação aponta 12 afirmações de Moro antecipando a decisão prévia de condenar Lula. Registra os abusos que ele cometeu – da condução coercitiva sem base legal à divulgação criminosa de grampos telefônicos. No estado de direito, Moro deveria declinar do caso para outro juiz, isento, imparcial, condição que ele perdeu em relação a Lula.
O Datafolha também ajuda a entender a ofensiva. Só Lula cresceu. Tem um terço dos votos válidos no primeiro turno e mais de 40% no segundo, contra os três tucanos e a insustentável Marina. Só perde, hoje, para o antipetismo; e debaixo de uma campanha de difamação sem precedentes.
É preciso acabar com Lula, fazer sua caveira, antes que ele tenha chance de voltar pelo voto. E antes que sua defesa desmoralize a Lava Jato. Tem de bater na cabeça da jararaca. Mas como, se não há crime para acusá-lo? Se há só pedalinhos, obras de alvenaria, propriedades imaginárias, palestras profissionais, presentes de governos estrangeiros.
Desde a reeleição de Dilma (aliás, por isso mesmo), Lula, seus filhos, sua empresa de palestras e o Instituto Lula tornaram-se alvos de 9 inquéritos do Ministério Público e da Polícia Federal, 3 proposições de ação de penal, 2 fiscalizações da Receita e 38 mandados de busca. Quebraram e vazaram seus sigilos bancário, fiscal e telefônico.
Numa afronta à Constituição e a princípios universais do Direito, adotados pelo Brasil em tratados internacionais, Lula é investigado pelos mesmos fatos em inquéritos simultâneos: da Procuradoria-Geral da República, de procuradores regionais do Paraná e Brasília e de promotores do Estado de São Paulo. É tiro-ao-alvo.
Essa verdadeira devassa – insisto: sem precedentes no Brasil – não encontrou nenhum depósito suspeito, conta no exterior, empresa de fachada ou contrato de gaveta; nenhum centavo sonegado, nenhuma conversa de bandido. Nada que associe Lula direta ou indiretamente aos desvios na Petrobras investigados na Lava Jato ou qualquer ilegalidade.
Nem mesmo os réus delatores, que negociam acusações sem provas em troca de liberdade e (muito) dinheiro, apontaram fatos concretos contra Lula. No máximo, ilações, do tipo “ele devia saber”, conduzindo à esfarrapada tese do domínio do fato. No estado de exceção midiática, apela-se à tese da obstrução da justiça (o maldito direito de defesa), a partir do pré-julgamento de grampos ilegais.
O fato é que a Lava Jato e a Procuradoria-Geral da República não têm como entregar – na só-base da prova, da lei e do direito – a mercadoria esperada desde sempre por seus patrocinadores: Lula na cadeia. Não em julgamento justo, com policias e procuradores apartidários, juiz natural e imparcial, tribunais fiscalizadores da primeira instância. Não no estado de direito democrático.
Para tirar Lula do jogo, precisam desesperadamente da cumplicidade dos meios de comunicação; a Rede Globo à frente e o rebotalho dos impressos na retaguarda. Precisam promover um julgamento pela mídia, com base na publicidade opressiva. Precisam espalhar que Lula estaria metido “nessa coisa toda”; silenciar e até intimidar quem duvide disso, para sancionar uma condenação sem prova.
Quem foi jornalista na ditadura tem amarga lembrança de colegas que serviam à repressão (alguns em dupla jornada, como na Folha da Tarde, da família Frias). Noticiavam assassinatos de presos como “atropelamentos”, tratavam torturas como “rigorosas investigações”. Faziam a caveira dos “subversivos”. Eram chamados jornalistas de “tiragem” – a serviço dos “tiras”, é claro, não da verdade.
Recordo sem intenção de ofender os jornalistas “investigativos” de hoje que comem na mão dos “investigadores” anônimos. Podem acreditar sinceramente que contribuem para “combater a corrupção”. Ganham as manchetes, mas abrem mão do jornalismo, que é a busca da verdade. Quando a meganha pauta e o repórter obedece, cegamente, quem perde é a notícia. E perde a democracia.
(Publicado originalmente no portal Carta Maior)
Créditos da foto: reprodução
segunda-feira, 18 de julho de 2016
Le Monde Diplomatique: O desequilíbrio da Democracia Brasileira
No Brasil, a democracia não está balanceada. A combinação de direitos, maiorias e republicanismo se desorganizou demonstrando que nosso sistema político é mais frágil do que se supõe
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por Fábio Kerche |
Muro levantado para votação do impeachment na Câmara dos Deputados, em Brasília Democracia talvez seja o conceito da política mais popular e de uso mais corrente em nosso dia a dia. Quem nunca ouviu a frase “você não está sendo democrático” nas suas relações cotidianas? Isso não significa, entretanto, que seja o conceito mais entendido. Geralmente, democracia é usada tão somente como um sinônimo de desejo da maioria. No atual debate político brasileiro, por exemplo, muitos justificaram e defenderam o impeachment da presidente Dilma Rousseff como democrático por ser a vontade da maior parte da população segundo pesquisas. Há indícios que a maioria dos brasileiros aprova a atuação dos procuradores do Ministério Público e dos juízes envolvidos na operação Lava Jato, assim como apoiaram a decisão do Supremo Tribunal Federal em condenar os réus na época do Mensalão. Mas isso é suficiente para concluir que o processo foi ou é realmente democrático? Em outras palavras, sempre que uma ação for sustentada pela maioria, ela é democrática? A resposta é não necessariamente. Se uma maioria resolver linchar alguém, para ficarmos em um exemplo extremo, isso não é democrático. Como não é democrático condenar alguém sem provas ou prender alguém sem um julgamento, mesmo que uma maioria eventual defenda isso ardorosamente. As primeiras experiências democráticas que ocorreram entre diversos povos no passado se basearam exclusivamente no princípio intuitivo da maioria, mas alguns séculos separam tais experiências do ressurgimento da democracia na Europa e na América do Norte. Não é sem sentido que ao descrever um país como democrático não seja incomum adjetivarmos o conceito para diferenciarmos da democracia baseada na simples ideia de maioria: democracia representativa, democracia liberal, democracia parlamentar etc. Há um importante cientista político[1] que argumenta que a palavra democracia, em seu sentido pleno, é algo fora do mundo real e propõe o termo poliarquia para o sistema político que inclui amplas parcelas da sociedade no processo e permite a disputa entre forças políticas diversas. O desejo da maioria não é suficiente para caracterizar as democracias contemporâneas, embora seja parte fundamental do processo. Ou seja, levar em conta os desejos da maioria, especialmente aquela expressa nas urnas, é parte fundamental da democracia, mas não é suficiente. A democracia, portanto, não tolera a tirania de uma minoria, seja ela a mais rica ou a mais forte, mas tampouco aceita a tirania da maioria. A democracia contemporânea, na verdade, é o encontro de pelo menos duas tradições surgidas em momentos históricos diferentes e em territórios diversos: por um lado, a democracia, baseada na ideia de maioria, especialmente vinda do mundo grego, por outro, o liberalismo político europeu, sustentado pela defesa de que os indivíduos são portadores de certos direitos que precedem ao próprio Estado e a qualquer tipo de maioria. Esse liberalismo não surge em conjunto com o liberalismo econômico, chamado de liberismo, embora ambas escolas de pensamento tenham se unido para enfrentar os socialistas no século XIX[1]. Esse encontro não se resolve de maneira simples e nem se dá da mesma forma nos diferentes países democráticos. Conciliar maioria e limites é tarefa complexa, dinâmica e não linear ou acumulativa. Até que ponto os desejos da maioria podem ser limitados para ainda considerarmos um país como democrático? Até onde os direitos individuais podem impedir avanços para o bem da maioria da sociedade? Quem pode rever os direitos? Pode-se afirmar que para a esquerda, que não incorporou os direitos da tradição liberal de imediato, a balança pesa mais para o lado democrático que liberal, mais para o princípio da maioria do que para os direitos individuais. O direito à propriedade, por exemplo, tem seus limites mais flexíveis para um partido de esquerda do que para os liberais. Para estes, os direitos individuais devem prevalecer frente às maiorias, mesmo que isso signifique manter certos privilégios de uma minoria de proprietários de terra, para lembrarmos da reforma agrária. O ajuste fino é que o sistema não deve pesar excessivamente para o lado dos direitos, a ponto de impedir avanços sociais, e nem para a maioria, a ponto de não respeitar a proteção aos indivíduos e às minorias que a tradição liberal política assegura. O Estado contemporâneo é organizado para refletir e organizar esse complexo encontro. O Poder Executivo e o Legislativo nas democracias representativas são baseados primordialmente no princípio majoritário e, portanto, na lógica da construção de maiorias, tanto no processo eleitoral, quanto no decisório. Os políticos são selecionados pelo voto e precisam ser apoiados por amplas parcelas do eleitorado. Como o pressuposto é que os políticos buscam continuar no poder, pessoalmente ou por meio de seus partidos, eles não devem nunca perder de vista, teoricamente, o desejo da maior parte da sociedade. Para tanto, na arena decisória, as propostas devem ser aprovadas pela maioria preocupada em preservar o voto dos eleitores. O Poder Judiciário, por sua vez, é o guardião de direitos individuais e não deve se preocupar com o clamor popular. São os juízes que funcionam como o freio aos impulsos reformadores dos políticos quando estes tomarem medidas populares, mas incompatíveis com a preservação de direitos. Se amanhã os legisladores decidirem punir a homossexualidade, exemplo hipotético, mas cabível no atual momento, caberia ao Poder Judiciário barrar tal iniciativa porque esta feriria direitos individuais e de minorias, por mais apoio que esta ideia tivesse na sociedade. Enquanto o Poder Judiciário é conservador e defensivo, no sentido de preservar direitos, o Poder Executivo e Legislativo deve ser reformador, buscando mudanças e sugerindo políticas sustentadas em maiorias populares e parlamentares. Esta ideia do encontro do liberalismo político com o princípio da maioria que resultou na democracia está presente em diversos pensadores. Guillermo O’Donnell, contudo, acredita que a democracia contemporânea é formada também pelo princípio republicano. Este princípio separa o público do privado e transforma o serviço público em uma atividade nobre, que demanda virtude e, neste sentido, é algo elitista, já que a virtude não é distribuída amplamente. Enquanto o princípio democrático é amplo, o republicanismo é restrito. Nesse mesmo sentido, enquanto o liberalismo atribui direitos defensivos aos indivíduos na esfera privada, o republicanismo atribui obrigações na esfera pública. Assim como o excesso de liberalismo em detrimento da democracia, e vice-versa, são incompatíveis com a democracia contemporânea, a supremacia do republicanismo sobre os outros princípios também é prejudicial ao modelo. O predomínio deste sobre os outros gera um Estado “paternalista de uma elite que se autopresume moralmente superior”[2]. Como estaria o Brasil atual neste tripé que forma a democracia contemporânea? O modelo brasileiro não está balanceado. A combinação de direitos, maiorias e republicanismo se desorganizou, demonstrando que nosso sistema era mais frágil do que se supunha. O lado democrático caiu num paradoxo. Ao mesmo tempo que o processo político atual baseia-se aparentemente numa maioria eventual, o desejo das urnas, típico instrumento para se ouvir os desejos dos eleitores, é desrespeitado. Por outro lado, os direitos liberais estão fragilizados, frente às decisões pouco ortodoxas dos atores do sistema de justiça. Aqueles que deveriam se afastar do clamor popular, lastreiam sua atuação no apoio das ruas. A parcela republicana, formada por agentes não-eleitos, diga-se de passagem, reforçou uma elite moralista, crente ser portadora e sabedora do interesse público, transformando-se na vertente mais forte do atual processo. O problema é que, mesmo que haja a prevalência de um princípio sobre os outros, sem algum equilíbrio, não há democracia. A questão agora é se o que estamos assistindo é permanente, a ponto de colocar em risco a própria democracia, ou é um desarranjo momentâneo, que teremos capacidade de superar em um breve futuro. Oxalá seja a segunda opção. foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil
Fábio Kerche
Fábio Kerche é Doutor em Ciência Política pela USP e pesquisador da Fundação Casa de Rui Barbosa. É autor de Virtude e Limites: Autonomia e atribuições do Ministério Público no Brasil. SP, Edusp, 2009 |
Editorial: Quem vai pagar o pato da FIESP?
Há um amigo que sempre faz questão de afirmar que vivemos, hoje, sob um Estado de Exceção Permanente, mas ainda não perdemos a esperança de que a ordem democrática, no momento tão fragilizada, seja restabelecida. Como o raciocínio do companheiro não se resume ao Brasil, até mesmo um golpe militar nos moldes da década de 60 foi tentado na Turquia. Felizmente, sem muito sucesso. Quem imaginava que isso pudesse ser retomado pelos atores que não tem muito compromisso com as instituições democráticas? Todo o "figurino" de um golpe tradicional estavam presentes ali, exceto o apoio da população civil, que saiu às ruas em defesa da democracia.
Esse clima de "tencionamento" é provocado por inúmeros fatores,sobretudo o choque de civilizações, que divide ocidentais e muçulmanos, cujo radicalismo, liderado pelo Estado Islâmico, vem ceifando a vida de milhares de inocentes em todos os quadrantes, em guerras e atentados terroristas. Argélia e Turquia são países que, em razão da sua composição étnica, são, naturalmente, mais vulneráveis aos confrontos de geração, como diria o cientista político americano, Samuel Huntington. Talvez por isso o mundo tenha olhado com tanta cautela a retomada do poder pelas forças legalistas do presidente Recep Tayyip Erdogan. Por incrível que possa parecer, ainda existe coisa pior do que uma Ditadura Militar: um Estado Teocrático, que é uma possibilidade não muito distante daqueles países.
Mas, de volta ao Brasil, também parece ser uma realidade que vivemos sob um Estado de Exceção, conforme já discutimos aqui pelo blog algumas vezes. Se preferirem, um clima de muita instabilidade política e econômica, onde as liberdades coletivas e o Estado Democrático de Direito ficam temporariamente em banho maria. Um outro fato que também costumamos discutir por aqui diz respeito ao combustível que moveu a engrenagem que afastou ilegitimamente a presidente Dilma Rousseff do exercício do seu mandato. Do ponto de vista geopolítico, fala-se num rearranjo de forças no continente sul americano, onde o Brasil representa um papel preponderante. Do ponto de vista econômico, os interesses internacionais parecem mirar em nossa soberania sobre a exploração do Pré-Sal, hoje já comprometida. Isso se tomarmos como referência um olhar de fora para dentro do país.
No contexto interno, alguns atores emblemáticos que estiveram diretamente envolvidos nessas urdiduras, mesmo que involuntariamente, acabaram revelando algumas dessas intenções, como um mecanismo para poupar alguns peixes graúdos de caírem na rede da Operação Lava Jato, a despeito de seu caráter de seletividade. Mas é que as coisas nem sempre saem conforme o esperado, apesar daquele juiz interromper os delatores com um "isso não interessa", sempre que eles envolvem os tucanos. Outros atores convergiram para este movimento pelos mais distintos motivos, até mesmo levado por uma falsa onda "anti-corrupção", liderada por gente mais suja do que pau de galinheiro. Este fato hoje, inclusive, abre uma dissidência até mesmo entre os "coxinhas" minimamente mais consequentes, quem sabe se sentido "lesados".
No dia de hoje, 18, as redes sociais, sobretudo o microblog Twitter estão estampando aquilo que poderia se constituir numa outra motivação de um ator que preside uma instituição, a FIESP, apontada como envolvida diretamente nessa conspiração de golpe parlamentar. O diretor da FIESP , Laodse de Abreu Duarte, deve algo em torno de 7 bilhões aos cofres públicos, na condição de pessoa física. Trata-se da pessoa física que mais deve à união. A pergunta mais óbvia, neste momento, é quem vai pagar este pato da FIESP, da plutocracia paulista, desde sempre favorável às urdiduras golpistas?
domingo, 17 de julho de 2016
O pecado original de Sérgio Moro
'Com um juiz acusador, nem Deus como advogado resolve' - A obsessão de liquidar o PT e prender Lula complica o juiz e a discutível Lava Jato.
A Operação Lava Jato, maquinada pelo juiz Sergio Moro, da 14ª Vara Criminal de Curitiba (PR), e executada por procuradores da República e pela Polícia Federal, no 27º mês de existência, enfrenta obstáculos de um lado e de outro. Ora por boas razões, ora por maus propósitos. Essas são metas guiadas pelo objetivo de “estancar a sangria”, segundo a frase suspeita do senador Romero Jucá.
Em essência são dois movimentos iguais com objetivos distintos. Um reage para conter os arrufos de Moro nos limites da legalidade, o outro costura um acordo, conforme as delações indicam, para conter e guarnecer a liberdade de empresários, funcionários públicos e políticos envolvidos com propinas bilionárias. Para esse grupo é preciso estancar a Lava Jato. A qualquer preço.
Isso é possível? Os céticos dizem sim. Os confiantes dizem não. Invisível a olho nu, a Lava Jato está sob fogo cruzado e, mais do que isso, anda pressionada por inúmeras contradições internas, inesperadas, como aquela exposta há poucos dias pelo ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal.
Eis que Mello, decano do STF, bateu de frente com a interpretação conservadora da maioria da Corte. Recentemente essa maioria, pressionada pela crença da sociedade nas soluções discutíveis da Lava Jato, tornou como regra a prisão de réus em segundo grau. Ou seja, antes do trânsito em julgado.
O ministro, conservador, foi um dos quatro votos derrotados no STF, quando o tribunal tomou a decisão de condenar “à morte” o trânsito em julgado. Nesse caso, Mello aliou-se aos juízes “garantistas”. Em princípio, são liberais.
Eis que Mello, decano do STF, bateu de frente com a interpretação conservadora da maioria da Corte. Recentemente essa maioria, pressionada pela crença da sociedade nas soluções discutíveis da Lava Jato, tornou como regra a prisão de réus em segundo grau. Ou seja, antes do trânsito em julgado.
O ministro, conservador, foi um dos quatro votos derrotados no STF, quando o tribunal tomou a decisão de condenar “à morte” o trânsito em julgado. Nesse caso, Mello aliou-se aos juízes “garantistas”. Em princípio, são liberais.
Sergio Moro não gostou do voto de Celso de Mello. Pode-se afirmar isso, embora esse espetaculoso juiz de 1ª instância não tenha se manifestado publicamente. Até agora, pelo menos.
Dallgnol pontifica: ninguém faz acordo se existe perspectiva melhor (Foto: Vladimir Platonow/ABr)
Falou sobre o caso, no entanto, o lépido procurador Deltan Dallagnol, coordenador das ações da Lava Jato, para quem a execução da pena em segundo grau não pode ser regra. Ela serve à delação premiada. Essa mudança “pode prejudicar a realização de acordos”, diz o procurador.
Dallagnol tem uma expectativa cruel quanto a isso. “O réu passa a ver o horizonte da impunidade como algo alcançável. Ninguém faz acordo, quando existe alternativa melhor do que o acordo.” Essa afirmação representa a falência da investigação policial, sem tortura psicológica ou física.
Como se sabe, não há histórico de punições dos criminosos de “colarinho-branco”. Os crimes, por aqui, são cometidos “apenas” por “pretos, pobres e prostitutas”, constatará aquele que voltar de uma visita ao sistema penitenciário.
A Operação Lava Jato, embora ainda não tenha liquidado Lula e o PT, já fez prisões inesperadas. Exceto na cúpula da política. Líderes do PMDB, com extensões do PSDB, são forças capazes de emperrar apurações do Ministério Público, comandado por Rodrigo Janot.
Não fosse uma ação originalmente comprometida politicamente, com auxílio luxuoso no Supremo, seria possível crer que a Lava Jato estivesse mudando hábitos centenários na Justiça brasileira.
Como pensa parte da sociedade. Aquela que, se pudesse, tosquiaria os petistas. Esse é o ponto.
É preciso acabar com o PT e inviabilizar a vantagem eleitoral de Lula para 2018. Antes disso, porém, é necessário prender suspeitos de hábitos sujos, e de colarinhos alvos para não tornar visível o complô.
Este é o pecado original da Lava Jato. Do juiz Sergio Moro.
Este é o pecado original da Lava Jato. Do juiz Sergio Moro.
Créditos da foto: Rovena Rosa / Agência Brasil
sexta-feira, 15 de julho de 2016
O xadrez político das eleições municipais de 2016, no Recife: PT e PTB fecham acordo local, de olho nas eleições nacionais.
Nos últimos dias, foi intensa a movimentação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva(PT) aqui na província. Diríamos mesmo que foram movimentações de quem é candidato às eleições presidenciais de 2018. Aqui pelo blog, no dia de ontem, fizemos alguns comentários a esse respeito, apontando as dificuldades de o PT viabilizar uma candidatura competitiva ao pleito presidencial de 2018, mesmo que este nome seja de Luiz Inácio Lula da Silva, que já exerceu a presidência da República por dois mandatos, possuindo um recall nada desprezível. Essa confissão deixa os petistas em polvorosa, mas é preciso que seja dita.
A retomada do poder pelo campo progressista não é uma missão impossível, mas se apresenta, hoje, com algumas dificuldades inerentes. Quando entrevistado pelo Programa Roda Vida, da TV Cultura, de São Paulo, o cientista político Antonio Lavareda jogou uma ducha de água fria na pesquisa da CNI que dava uma ligeira dianteira de Lula sobre candidatos como Marina Silva(Rede) e Aécio Neves(PSDB). Dizem que Lavareda nutre uma certa simpatia pelos tucanos, mas seus argumentos foram bastante consistente ao tratar desta questão, até mesmo se remetendo a exemplos.
O PT descolou-se dos movimentos sociais, burocratizou-se, oligarquizou-se, assumiu, em parte, um perfil de partido de "quadros", aliou-se às forças retrógradas e conservadoras da política nacional, chegou ao poder e depois foi traído por essas mesmas forças. Qual o caminho a trilhar agora para a retomada do poder? Talvez não estejamos aqui diante de uma equação política muito simples. Não será surpresa se o PT enfrentá um longo período de "hibernação política" que, em última análise, poderá até lhe fazer muito bem.
Em todo caso, como a política muda como as nuvens e o governo interino enfrenta grandes adversidades neste momento inicial, melhor semear a semente para 2018. Em seu périplo por Pernambuco, Lula foi a Petrolina, Caruaru, Carpina e o Recife. Em Petrolina, fechou acordos envolvendo a candidatura do petista Odacy Amorim e, no Recife, deu aval à aliança entre o seu partido e o PTB do senador Armando Monteiro. Pelo acordo, João Paulo(PT) continuaria como cabeça de chapa e a vice caberia ao Deputado Estadual Sílvio Costa Filho, do PRB.
A aproximação entre as duas candidaturas era evidente, com a possibilidade, até mesmo, de o PT apoiar o filho do deputado Federal Sílvio Costa, um nome que tem muito crédito político na agremiação, em razão da defesa que fez da presidente afastada Dilma Rousseff, durante o processo de votação do impeachment. Mas esta era uma equação mais simples de resolver, posto que o cacique do grupo, Armando Monteiro(PTB) deve disputar o Governo do Estado nas eleições de 2018 e contará com o concurso do PT. Pesou igualmente, segundo alguns observadores, uma análise sobre as perspectiva do que poderá ocorrer na votação do Senado Federal, selando de vez o destino da presidente Dilma Rousseff.
Num primeiro teste, quando apresentado à militância petista, o deputado Sílvio Costa Filho foi bastante aplaudido. Não teria sido vítima, ainda, clivagem de idoneidade ideológica, no passado tão cobrada pelos militantes. Sílvio Costa Filho vinha atuando como um parlamentar rigorosamente de oposição ao PSB no Estado. Em razão das contingências - é Deputado Estadual - atirava mais na gestão de Paulo Câmara, mas atingia, por tabela, o prefeito Geraldo Júlio. Nos últimos meses, sua atuação contundente abriu diversas frentes de arestas com o Governo Estadual. Agia como quem, de fato, desejava encabeçar uma chapa para disputar o Palácio Antonio Farias.
Mas a vice também lhe cai bem, sobretudo se considerarmos as "entrelinhas" desse acordo, na eventualidade de uma vitória de João Paulo. Na última pesquisa de intenção de voto para a Prefeitura da Cidade do Recife, realizada pelo IPESPE, a pedido do jornal Folha de Pernambuco, o candidato do PT aparece praticamente empatado com Geraldo Júlio, do PSB, o que parece ter injetado um sangue novo às hostes petistas no Estado. Mas, se por um lado o projeto de reeleição de Geraldo Júlio enfrenta algumas "turbulências", é preciso deixar claro o desgaste de imagem que enfrenta o PT neste momento, vítima maior da investida da cruzada "anti-corrupção" - que embalou a conspiração de golpe parlamentar - que o atingiu muito mais do que qualquer outra agremiação.
As manifestações populares que pedem o "Fora Temer" por outro lado, não necessariamente, mantém vínculos orgânicos com o PT.Esse movimento, como disse aqui em editorial, está preocupado, isto sim, com a normalidade da democracia no país e a ameaça que este governo interino possa representar para a sua estabilidade.Trata-se de uma rejeição "não petista" ao governo interino do senhor Michel Temer. Se, mesmo diante das dificuldades, o PT conseguir integrar essa "onda democrática", que envolve uma juventude aguerrida e bastante consciente politicamente, talvez possamos estar diante de um cenário de contra-hegemonia anti-golpe muito importante para o país.
quinta-feira, 14 de julho de 2016
quarta-feira, 13 de julho de 2016
Editorial: #OcupeFunai, porque o golpe sofrido pelas populações indígenas é permanente
Infelizmente, já faz algum tempo que não temos notícias boas para comentar através desses editoriais diários, publicados religiosamente, todos os dias, desde o começo das urdiduras do golpe parlamentar que afastou a presidente Dilma Rousseff temporariamente da Presidência da República. De fato, talvez não tivéssemos notícias boas para comentar mesmo. Gosto muito do Lula, mas ele insiste numa conciliação de classe – costurando alianças com setores conservadores – que já conduziu o país a este impasse institucional, de consequências nefastas para a saúde de nossas instituições democráticas, assim como para o andar de baixo da pirâmide social, que, pela primeira vez em nossa História, estavam tendo seus direitos reconhecidos.
Pelo andar da carruagem política, as conquistas sociais dos governos da coalizão petista estão irremediavelmente comprometidas, o que desaconselha qualquer tipo de acordo com essa gente. Alianças com esses setores já indicaram onde podem parar: num golpe parlamentar. O que o PT precisa, na realidade, é retomar sua relação histórica e orgânica com os movimentos sociais organizados, perdida com o crescente processo de burocratização e oligarquização da legenda, que tornou-se preocupada unicamente com o flerte e o exercício do poder. O carinho com que Lula foi recebido num acampamento do Movimento dos Sem Terra, o Normandia, em Caruaru, aqui em Pernambuco, dão a dimensão sobre onde o partido deve plantar e colher os seus frutos.
Até fazemos algumas concessões para o jogo pragmático - e pesado - da realpolitik, mas que isso não se torne a regra de sua atuação política. As movimentações de Lula nos últimos dias, sobretudo quando se está em jogo a eleição do novo presidente da Câmara dos Deputados, infelizmente, parecem reprisar um filme antigo, de terror, daqueles que nos assustam na poltrona. Outra notícia ruim, aqui da província, são os altos índices de violência contra as mulheres. Nunca se matou tantas mulheres no Estado desde o início do Pacto pela Vida, em 2007. Volto a comentar este assunto com vocês, posto que o debate sobre a violência é uma das linhas de discussão do blog.
Noticia boa mesmo talvez seja a ocupação da sede da FUNAI, em Brasília, por representantes de diversas etnias, num protesto contra o governo interino do senhor Michel Temer. Os conflitos estão se agravando com fazendeiros e grileiros em terras indígenas ainda em litígio burocrático, tendo como resultado a morte de algumas lideranças indígenas. Tivemos alguns avanços durante os governos da coalizão petista no tocante à legislação sobre a terra e os direitos de comunidades indígenas e quilombolas, mas a tão sonhada reforma agrária continuou sendo empurrada com a barriga, em razão dos limites impostos por um presidencialismo de coalizão.
Hoje, com a retomada temporária do poder por essa coalizão de forças conservadores, o drama tende a agravar-se. Até mesmo um general que apoiou o regime militar instaurado no país com o golpe civil-militar de 1964 chegou a ser indicado para presidir a FUNAI. O protesto das comunidades indígenas levou o Ministro da Justiça a recuar da decisão. Hoje, o que as comunidades indígenas e quilombolas percebem, nitidamente, é que estamos diante de um retrocesso. O Estado de Goiás, que é um Estado onde se verifica, no momento, uma incidência mair de conflitos entre sem-terra e latifundiários, é monitorado e “cercado” pelo aparato militar federal. Quem entende de jargão militar, sabe do que estamos falando. E olha que eles não estão lá para defender a integridade física dos integrantes do Movimento dos Sem Terra.
No Maranhão, até recentemente, representantes dos movimentos indigenistas foram recepcionados por porretes pelo governo do comunista Flávio Dino(PCdoB). O que eles reivindicavam? Escolas para as comunidades indígenas. Isso ainda é reflexo da herança oligarca que o senhor governador do PCdoB não conseguiu romper. Vários integrantes do seu governo já foram aliados da oligarquia Sarney, com aqueles métodos conhecidos de tratar os movimentos sociais. O pleito das comunidades indígenas vão muito além de uma questão fundiária. Eles envolvem assistência médica, escolas entre outros problemas enfrentados. Dando uma passadinha pelo microblog Twitter, na hashtag #OcupeFunai, encontrei uma manifestação de uma internauta que talvez traduza muito bem essa questão: #OcupeFunai, porque o golpe sofrido pelas populações indígenas é permanente. O crédito desse feliz twitter é da amiga Ana Carol Belei.
terça-feira, 12 de julho de 2016
Editorial: Lula no Recife: Se o Brasil não melhorar, eu volto em 2018.
Parece não haver dúvidas de que Lula é um homem que não foge às adversidades que a vida lhes impõe. Sobreviveu há algumas delas, ainda quando criança, nascido em uma família pobre, aqui do agreste pernambucano. Depois, vieram as agruras da cidade grande, a militância sindical, a prisão ainda nos estertores do regime militar e, agora, a sanha miserável dos executores do golpe parlamentar em destruir sua imagem pública, pois trata-se de um ator político que ainda é capaz de mobilizar multidões. Ah, já ia esquecendo, sobreviveu a um câncer também. Lula sobrevive a tudo. A todos. Adversidades, como disse, ele sabe enfrentá-las.
No epicentro das parafernálias midiáticas e jurídicas com o propósito de conduzi-lo coercitivamente para depor - para protegê-lo, de acordo com aquele juiz do Paraná - ele teria declarado ao amigo Rui Falcão, presidente nacional do PT, que a sua prisão - se era isso que eles desejavam - não seria problema. Ele já havia sido preso antes. Em sua visita ao Estado de Pernambuco, o mesmo Lula de sempre, ou seja, repleto de otimismo e aquelas "tiradas" que o caracterizam como um dos fenômenos de comunicação com o público. Política é como uma cachaça boa. Quando se toma o primeiro gole, não se quer parar mais.
Questionado sobre uma eventual candidatura nas eleições presidenciais de 2018, ele sapecou que, se o Brasil não melhorar, ele poderá voltar em 2018. Apenas se o Brasil não melhorar, frisou, como quem torcesse que o governo interino encontra o rumo certo na condução do país. Será?Há quem informe que Lula tenta descolar-se da imagem de mentor político da presidente afastada, Dilma Rousseff. Outro dia chegou mesmo a elogiar algumas medidas econômicas adotadas pelo governo interino. Talvez porque tenha chegado à conclusão de que a situação de Dilma Rousseff está irremediavelmente perdida e que preciso construir alternativas no campo da centro-esquerda.
Questionado sobre uma eventual candidatura nas eleições presidenciais de 2018, ele sapecou que, se o Brasil não melhorar, ele poderá voltar em 2018. Apenas se o Brasil não melhorar, frisou, como quem torcesse que o governo interino encontra o rumo certo na condução do país. Será?Há quem informe que Lula tenta descolar-se da imagem de mentor político da presidente afastada, Dilma Rousseff. Outro dia chegou mesmo a elogiar algumas medidas econômicas adotadas pelo governo interino. Talvez porque tenha chegado à conclusão de que a situação de Dilma Rousseff está irremediavelmente perdida e que preciso construir alternativas no campo da centro-esquerda.
No Brasil, um golpe parlamentar precisa cumprir várias etapas, atender a certos ritos, mas a engrenagem mói. É preciso agora ver o que fazer, depois que acordamos desse sono político que produziu o monstro de um retrocesso político e nos mergulhou num profundo impasse institucional. Uma reversão desse processo no Senado Federal, sinceramente, é muito pouco provável que ocorra. Talvez Lula tenha jogado a toalha e trabalhe com a perspectiva das eleições presidenciais de 2018, ciente de que Dilma não volte mais ao Palácio do Planalto. Creio que até ela mesmo já teria dito que ele voltaria em 2018.
A estratégia do golpe parlamentar passou a ser usada quando se percebeu que os militares, como ocorria em décadas passadas, já não mantinham a mesma disposição de antes para as quarteladas. Eles ficam por ali, de tocaia, dando o sinal verde para a eventualidade de alguma coisa fugir ao controle da engrenagem institucional, mas se recusam a assumir o ônus diretamente. Os Governos democráticos de Honduras e Paraguai caíram assim, através de um golpe parlamentar em vias de materializar-se no país. O Brasil também pode entrar nessa galeria, criando uma situação de muita instabilidade política para os regimes democráticos do continente, dada a sua dimensão. Além do Pré-sal, eis aqui uma estratégia de geopolítica que deveria estar nos planos dos golpistas, que colocaram um homem de sua confiança no Itamarati para mudar os rumos da nossa política externa.
E pensar que, até então, assistíamos ao que ocorria em Honduras e no Paraguai de camarote, como se isso nunca fosse chegar por aqui. Quantos de nós não acreditamos que, de fato, Manuel Zelaya estava ficando "doido", com aquelas suas supostas "manias de perseguição" por agentes americanos? Pois bem. Para lembramos daquele adágio popular, Honduras e Paraguai eram os nossos vizinhos do lado. Não fizemos nada quando eles foram acusados disso e daquilo até que chegou a nossa vez e já não havia a quem reclamar. Afinal, o Brasil estava muito além de uma simples republiqueta de bananas. Zelaya foi retirado de sua casa, pelos militares, e levado à força para a Costa Rica, onde cumpriu um exílio forçado. Creio que, em menos de 10 dias, Lugo foi apeado do poder do Paraguai, num procedimento que, a julgar pelo que vem ocorrendo no Brasil, está se tornando rotina: utiliza-se de artimanhas para, através de um instrumento previsível e legal - o impeachment, por exemplo - afastarem presidentes eleitos, legitimados pelas urnas, sem nem mesmo um crime de responsabilidade.
Com algumas reservas - a corrupção que envolveu alguns de seus membros é uma delas - sou um eterno entusiasta do legado social deixado pelos governos da coalizão petista. A tendência é que este governo interino ( ou usurpador?) promova uma verdadeira erosão nessas conquistas, assim como tolha as liberdades coletivas e garantias e direitos constitucionais do cidadão. Mas devo admitir que, diante de circunstâncias tão adversas, a retomada de um governo de corte popular no Brasil não será uma tarefa muito simples. Há muitos obstáculos que precisam ser superados. Desde os institucionais até mesmo os operacionais, uma vez que as fontes de financiamento de campanha tendem a minguarem. Mas, como diz Lula, para quem sobreviveu até aos 05 anos, naquelas condições precárias de Caetés, nada é impossível.
P.S.: Do Realpolitik. O radialista Geraldo Freire, que aparece na foto acima, ao lado de Lula, contou que foi hostilizado, ao gritos de golpista, em razão dessa entrevista realizada com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, na cidade de Petrolina. Foi salvo pelo Deputado Federal Sílvio Costa Filho, que o defendeu da ira de uma galega muito braba, que partiu para cima dele. Não entro no mérito da concessão da entrevista, mas as posições do radialista são bem conhecidas, afinadas com as forças conservadoras que engendraram o afastamento de Dilma Rousseff da Presidência da República. Lula é um cara pragmático e conciliador. Essa conciliação de classe permitiu que o PT chegasse ao poder, mas deu no que deu. Não é por aí, Lula.
Crédito da Foto: Rádio Jornal
segunda-feira, 11 de julho de 2016
Le Monde Diplomatique: Arte para todos, dinheiro para alguns
Simbolizada nos anos 1960 e 1970 por um espírito de revolta, da minissaia ao movimento punk, Londres define novamente certa vanguarda. A cidade não apenas colocou na moda a arte contemporânea, assim como essa arte, que parecia reservada à elite, é agora apresentada como um agente de transformação social
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por Evelyne Pieller e Marie-Noël |
A arte é o Santo Graal”, afirma Sadie Coles com o sorriso emocionado de quem fez uma confidência. Ela tem a elegância discretamente rock’n’roll e a tranquilidade graciosa daqueles que estabelecem a relação entre os artistas e os colecionadores. Em 2014, ela se encontrava, segundo o jornal The Guardian, no ranking das “personalidades mais poderosas do mundo da arte”. Negociante de arte (art dealer), ela reina em duas grandes galerias delicadamente minimalistas. Coles nos recebe na galeria da Kingly Street, aberta em 1997, no coração da antiga Swinging London. Tudo é branco, vasto, claro, com pedestais, mas vazio, e luxuosamente iluminado por uma cúpula de vidro antiga. O valor de negócios mundial do mercado de arte contemporânea, no qual Londres ocupa o segundo lugar, aumentou mais de dez vezes em quinze anos. No entanto, em nenhum momento iremos falar de dinheiro durante nossa conversa bebendo um expresso – sem dúvida mais internacional do que o chá –, e sim de valores muito mais morais, mesmo que vagos. Antes de se tornar independente, Coles foi business manager do célebre Jeff Koons, autor de esculturas de inox e brinquedos infláveis. Hoje, além de suas atividades londrinas, ela aconselha o Deutsche Bank em suas coleções de international young art. Para ela, “a arte é o que dá sentido à vida”. Sua galeria então não é apenas um investimento a longo prazo em tempo e em dinheiro: é também o meio de concretizar a relação que ela mantém com os artistas, fundada na “duração, na fidelidade, no coração”. No momento de nossa visita, ela estava propondo uma exposição de Rudolf Stingel. Enormes fotos de animais: raposas, javalis, ursos, às vezes num fundo de neve. Observamos: “É louco como isso se parece com fotos de calendários dos correios”. Precisamente, são. Ou, mais exatamente, são fotografias de um calendário alemão projetadas sobre uma tela e sobre as quais o artista, italiano de língua alemã (e naturalizado norte-americano), acrescenta pinceladas. Estas, mesmo que difíceis de notar, testemunham, segundo o release de imprensa, a “lenta construção da imagem”, que vai assim oscilar “entre emoção e banalidade” para se tornar “uma metáfora da própria memória”. “Santo Graal”... em todos os sentidos do termo, pois Stingel é uma estrela: ele expôs no Palácio Grassi de Veneza – propriedade do bilionário francês François Pinault –, na Galeria Gagosian de Londres, em diversos museus, e hoje está classificado em 11º lugar pelo ArtPrice, o líder dos bancos de dados sobre a cotação e os índices da arte. Uma de suas últimas telas foi vendida por US$ 2 milhões. Ele tem um atrativo: revende muito bem. Não é preciso dizer, e efetivamente não será dito, que o galerista fica com 50% do preço de venda de uma obra. É inclusive provável que, para os artistas mais rentáveis, a porcentagem seja calculada de outra forma. As transações talvez não sejam unicamente uma questão sentimental. Mas Coles, que também propõe vendas na internet – ou seja, de fotografias –, que ela chama de “espaço aberto”, prefere ressaltar que sua galeria funciona como um “local de iniciação para os novos colecionadores” e que ela ajuda seus clientes a constituir conjuntos coerentes. Ela se emprega também em convencê-los a se tornarem doadores em benefício de museus, que ela considera “essenciais”. Pura beleza da arte: ela permite que o comércio se evapore em um caminho espiritual, uma ação virtuosa, sem contar o apoio oblíquo, mas eficaz, à ação pública. Não podemos ficar completamente convencidos e rir (por dentro) às gargalhadas diante desses truques de mágica que maquiam a especulação de embelezamento da alma... Não é pouca coisa o fato de que Londres estampa a maior porcentagem de habitantes que frequentam museus (a cidade possui 173, e 875 galerias): 50% contra 35% na França. Ela também conta com o maior número de estudantes inscritos em escolas de arte: a University of the Arts London, que reúne seis estabelecimentos, forma o principal polo europeu de ensino artístico. Evidentemente, a arte, em particular a contemporânea, parece ser “democratizada” aqui. Resta tentar compreender como e por quê. Engajamento como valor agregado Andrea Schlieker é director da White Cube Bermondsey, uma das galerias (duas em Londres, uma em Hong Kong) do importante negociante de arte Jay Joplin, 120 funcionários, o único real peso-pesado britânico no Reino Unido. Aqui também tudo é branco, vazio,1 iluminado por cúpulas de vidro. Mas... sem pedestais e impressionantemente vasto: 55.440 metros quadrados, a maior galeria da Europa quando de sua abertura em 2011. Schlieker, que toma o cuidado de avisar logo no início que não cuida das vendas, evoca a “gigantesca mutação” que aconteceu nestes últimos anos: “Há trinta anos, a arte contemporânea atingia pouquíssimas pessoas; hoje ela invadiu a vida de um grande número de pessoas”. Isso se deveria ao fato de que a arte teria se tornado um “agente de mudança social”. Essa suntuosa galeria, que conta entre seus artistas com Tracey Emin, Sarah Lucas, Damien Hirst, Chris Ofili, Anselm Kiefer..., efetua, segundo sua diretora, um trabalho parecido com o de um museu, apresentando igualmente os jovens artistas “emergentes” e os valores seguros, até mesmo as vanguardas clássicas. Mas ela também tem relação, o que é mais inesperado, com um centro cultural: performances musicais gratuitas todos os domingos, encontros com os artistas, programa educativo aberto aos moradores do bairro – para os quais também são organizadas visitas das exposições comentadas pelos curadores –, conferências no auditório de sessenta lugares etc. A vontade de democratizar o acesso à arte não se reduz ao education program (dez funcionários): ela é apoiada por uma programação que procura misturar as disciplinas. Assim, o guitarrista Thurston Moore, cujo grupo de rock Sonic Youth conheceu um vivo e tenaz sucesso, tocou com o artista plástico Christian Marclay e com a London Sinfonietta, uma orquestra de câmara especializada na “música clássica contemporânea”, em performances públicas que flertavam com a improvisação. “A arte vai até as pessoas”, resume Schlieker, que insiste com convicção sobre a importância de apoiar obras socialmente engajadas, “como a ‘escultura social’ de Joseph Beuys” ou os projetos do norte-americano Theaster Gates, que “incitam a criação de comunidades culturais ao agir como catalisadores de um engajamento social que leva a uma mudança política e espacial” – para citar sua apresentação pela White Cube Bermondsey. Gates pratica a arte como tantas outras ações de engajamento social. Quando renova uma casa abandonada em um bairro pobre de Chicago, sua cidade, para transformá-la em biblioteca, ele financia as obras por meio da venda de suas esculturas, cujo material provém do próprio local, o que ele chama de “arte imobiliária”. “Contra o abismo cada vez maior entre ricos e pobres, as performances com missão social como as de Theaster Gates, frequentemente fora da ‘caixa branca’ [White Cube], oferecem reparação para o corpo, o espírito e a alma”, continua Schlieker – o que certamente é aprovado, mesmo que de maneira inesperada, por Pinault, que o acolheu no Palácio Grassi. E ela precisa: “Todas essas iniciativas valorizam muito a galeria”. Com um pouco de fôlego, podemos ir a pé da Bermondsey até a Tate Modern, que abriga uma coleção nacional de arte moderna e contemporânea britânica e internacional. Às margens do Tâmisa, a vista é surpreendente. Os Docklands, nascidos de uma empreitada de “regeneração” urbana lançada no início dos anos 1980 pelo governo de Margaret Thatcher, transformaram aquele que foi o primeiro porto de comércio mundial do século XIX em terceiro maior centro de negócios da capital. No lugar das docas e dos hangares, agora se encontram arranha-céus, escritórios e residências de luxo. É esplêndido, é desconcertante. Um sonho de Manhattan, misturado com ficção científica distópica.2 Evidentemente, dos dois lados do Tâmisa os preços do mercado imobiliário explodiram, e o East End, onde se propõe de maneira bem-humorada um tour de Jack, o Estripador,3 claramente bom para o turismo, não é mais apenas o bairro da miséria. Lojas de orgânicos e galerias prosperam, e nota-se a olho nu onde termina o avanço da elitização: quando os lixos não parecem ser recolhidos regularmente, quando os prédios não são reformados, quando a população é em sua maioria de origem imigrante. A passarela de pedestres do Millenium Bridge, realizada em 2000 para a abertura da Tate Modern, aparece como um símbolo do futuro que os políticos desejavam para Londres, já que ela religa a Catedral de Saint-Paul e a City a essa joia da vanguarda, enquanto sobre o Tâmisa patrulha a brigada fluvial e passam zumbindo barcos motorizados bem apresentados. A Tate Modern foi edificada sobre uma central elétrica abandonada. Sua maior atração é sem dúvida o Turbine Hall, a antiga sala das máquinas, que abriga instalações de sucesso financiadas pela empresa sul-coreana Hyundai Motor Company. De outubro de 2015 a abril de 2016, Abraham Cruzvillegas propunha ali a Empty Lot: dezenas e dezenas de caixas de madeira triangulares cheias de terra pega em Londres dispostas sobre cilindros. Nelas cresceram ao longo dos meses grama, flores ou nada, segundo a qualidade da terra recolhida. Segundo o site da Tate Modern, isso “suscita um questionamento sobre a cidade e a natureza, e uma mais ampla reflexão sobre a sorte, a mudança e a esperança”. Quem poderia acreditar... Como em todos os museus públicos, o acesso à coleção é gratuito, e as exposições temporárias – seis por ano – são pagas (entre 20 e 32 euros). O título de uma pequena exposição, Witty, Sexy, Gimmicky: Pop 1857-67, parece amplamente correspondente ao projeto que anima a Tate Modern. Brilhante, sexy, astucioso: pop! Diretor da Tate Modern de 2011 a janeiro deste ano, Chris Dercon é belga e charmoso. Aparência simples, cuidadosamente trabalhada. O chique moderno, pouco a ver com a imagem tradicional do conservador de museu. Ele conhece todo mundo, principalmente as celebridades, e todo mundo o conhece, o que facilitou a instalação dos comitês ou das fundações (Tate Asia Pacific Acquisitions Committee, Tate Americas Foundation...). Existem quatro Tates: a Tate Britain, que essencialmente abriga as coleções de arte britânica clássica; a Tate Modern; e dois museus descentralizados, um em Liverpool, nas docas, e outro em St. Ives, na Cornualha, que têm a mesma função da Tate Modern. Dercon avalia em cerca de oitocentos o número de funcionários dessas quatro Tates. A Tate Modern conta com 25 conservadores e uma equipe educacional cujo número exato de efetivos ele desconhece – os outros setores são terceirizados. Uma batalha de ketchup Se a Tate Modern é um sucesso (5,3 milhões de visitantes em 2014, quarto maior museu do mundo em número de frequentadores), principalmente entre os jovens, é porque ela funciona “como uma ágora”, ressalta Dercon. Mas também, acrescenta ele, porque “favorece os encontros”: “12% dos visitantes vêm para admirar, 12% para aprender e 50% para realizar encontros”. Ele ainda apresenta outra razão para esse sucesso: “Desde Marcel Duchamp, o espaço cultural das artes plásticas se abriu, o público não é mais especializado, e o museu é agora capaz de acolher outras disciplinas. Precisamos de outras configurações espaciais. É o que buscam também a dança e o teatro. Por exemplo, o coreógrafo Boris Charmatz veio com noventa bailarinos convidados. O público o viu trabalhar, e o Turbine Hall se transformou por uma noite em dance floor (pista de dança)”. Melhor ainda: ele considera que o museu, em plena revitalização, ajuda os gêneros em via de extinção: “A pop music está desaparecendo; o museu lhe dá uma história. É o que fez o MoMa [Museum of Modern Art, em Nova York], que combina design, artes e música”. Ele programa então performances e shows (Kraftwerk, grupo alemão de música eletrônica fundado em 1970, que voltou a ser tendência, por exemplo). Essa mistura de fronteiras corresponde à sua definição do trabalho de um curador: “Colocar dois objetos juntos”. A Tate Modern reorganiza regularmente as coleções, oferecendo percursos temáticos, e não mais cronológicos, associando os artistas contemporâneos “tornados” vanguardas clássicas (Poesia e sonho, sobre os surrealistas, comportava uma “câmara de artista” consagrada a Joseph Beuys). Apoiado no management horizontal pregado por Dercon, que se proíbe de impor uma escolha artística, esse procedimento pretende misturar os públicos, seduzir, surpreender, para além dos saberes acadêmicos. O museu se torna centro de iniciação à arte, incluindo pelas vias do desenvolvimento criativo pessoal: “programa educativo”, despertador, como Live Art for Adults and Kids – que propõe fazer roupas usando alimentos, disputar uma batalha de ketchup etc.; e exposições diversas desejadas especialmente pelo Department for Culture, Media and Sport, mais ou menos o equivalente do Ministério da Cultura, em direção dos menos favorecidos e das minorias. Tantos elementos que lembram certas características da galeria privada White Cube: nos dois casos, trata-se de democratizar o acesso às vanguardas, por muito tempo as mais fechadas ao grande público. Virtuosas, porque contribuem para o desenvolvimento – se não do saber e da confrontação à obra, pelo menos de uma relação descomplexada em relação à arte, que, também neste caso, não está mais embaraçada por hierarquias –, tais iniciativas criam uma “grande valorização”, o que, no caso do museu, acrescenta uma importância determinante para encontrar fundos. Isso porque as subvenções, em queda constante, representam apenas de 30% a 40% do orçamento necessário. A bilheteria e as atividades derivadas (lojas, cafés, restaurantes) só preenchem uma parte do que falta. O chamado às doações – “Keep Tate Modern Free” (“Mantenham a Tate Modern gratuita”) – é obsessivo, mas se apresenta de forma variada: ticket incluindo uma porcentagem de doação, notas que podem ser depositadas em caixas nos halls e no vestiário, cotas de membros (a partir de 70 libras), mecenato ou patrocínio. Os museus não podem mais comprar no mercado da arte, pois os preços não param de aumentar nas vendas em leilões: em 2015, Nurse, de Roy Lichtenstein (1964), e Nº 10, de Mark Rothko (1961), foram vendidos respectivamente por US$ 95,4 milhões e US$ 81,9 milhões. Isso tem como consequência suplementar ameaçar até mesmo sua capacidade de realizar exposições, já que os valores dos seguros andam junto com as flutuações do mercado.4 Mas os conselhos de administração e os dirigentes políticos exigem diversas entradas que só podem ser fornecidas, a curto prazo, pelo recurso a grandes nomes. Dercon, que declara dar provas de um “obscuro otimismo”, não hesita em dizer às “Olgas”, como ele apelida as esposas dos oligarcas russos, numerosos em Londres: “Senhora, a senhora tem muito dinheiro”. Ele faz o mesmo com os ubers, todos os start-uppers que enriqueceram. E também não tem melindres junto ao mecenato de empresa, o que dá seus frutos. Não apenas a Hyundai financiou a compra de nove obras do sul-coreano Nam June Paik, como também, e principalmente, se comprometeu por onze anos com um valor de 5 milhões de libras. Isso pode fazer sonhar, mas a empresa teve a gentileza de explicar sua generosidade: “Na Hyundai, temos consciência de que as pessoas têm uma conexão emocional com o automóvel, e é o mesmo sentimento que conecta as pessoas com a arte de qualidade”.5 Em outros termos, a Hyundai sofre com um déficit de imagem e pretende remediá-lo associando-se à “marca imaterial” que é o museu. Sem dúvida porque sabe combinar popularidade e aura de elitista, apresentar a arte como festiva, convivial, capaz de reunir pessoas, em um maravilhoso movimento de apagamento daquilo que divide ou discrimina. Assim, “a comunicação entre os artistas, as pessoas e as empresas ativa possibilidades e sugere novas visões”.6 Uma operação win-win (todos saem ganhando), para que surja o melhor dos mundos, por fim harmônico e excitante. A esfera da distinção O novo (muito, muito) rico, que surgiu em massa no início dos anos 1990, também é objeto de todos os desejos. Ele investe no mercado imobiliário ou em diamantes, mas é para afirmar seu lugar na esfera da distinção que ele se torna colecionador e frequentemente patron (mecenas) de museus, o que lhe dá acesso aos conselhos de administração. Ele acaba, cada vez mais, abrindo seu próprio museu – Bernard Arnault em Paris, com a Fundação Louis Vuitton, Pinault em Veneza, Dasha Zhukova (uma “Olga”, a companheira de Roman Abramovitch) com o Garage Center for Contemporary Culture em Moscou etc. Sua generosidade não é totalmente desinteressada: se ele financia o museu, lugar reputado por excelência pela especialidade, pela independência intelectual e pelo saber desinteressado, é porque dá a um artista um valor que se repercute imediatamente no mercado. O fato de os oito comitês de aquisição da Tate Modern serem compostos não apenas por prescritores (especialistas em recomendar a compra de obras de arte), mas também por mecenas, deve revelar alguma coisa. O caso então é quase simples no quesito negócios, mas um pouco menos simples para o museu. “O grupo de artistas que os patrocinadores ou os mecenas privados estão prontos a financiar é muito pequeno. Em 1999, até mesmo Jackson Pollock não era um nome possível na Royal Academy of Arts”, observa Jeremy Lewison, diretor das coleções para a abertura da Tate Modern que deixou o museu em 2002 para se tornar conselheiro independente. Agora membro da Royal Academy of Arts, uma instituição privada dirigida por artistas e arquitetos, ele não compartilha da euforia geral, da qual participa até mesmo o Department for Culture, Media and Sport, que gosta de saudar o espírito empreendedor dos museus. Para Lewison, “todo mundo faz a mesma coisa, explora os mesmos nomes em todos os cantos do mundo. Os museus estão condenados aos blockbusters”. Koons, Ai Weiwei, Bill Viola: artistas que se tornaram celebridades, enquanto, “no que se refere aos séculos XIX e XX, os valores seguros são Paul Cézanne, os impressionistas, Vincent van Gogh, Paul Gauguin, Edvard Munch, Henri Matisse, Pablo Picasso, Salvador Dalí, Andy Warhol e, mais recentemente, Francis Bacon, Mark Rothko, Alberto Giacometti”. Mas quem decide o valor de um artista? O mercado. Para penetrar nele, o iniciante precisa de um talento estratégico, uma boa rede e principalmente um negociante de artes. Este último vai garantir a ele uma presença na mídia e nas custosas feiras internacionais,7 que “suscitam as obras especificamente concebidas para elas”, segundo Lewison. Os compradores, sempre os mesmos, intervêm como doadores na concepção das exposições. De modo geral, as fronteiras entre a indústria e a instituição são porosas: Ai Weiwei, depois de uma exposição muito corrida na Royal Academy of Arts, fez um evento no início de 2016 na grande loja parisiense Le Bon Marché Rive Gauche, propriedade de Arnault; as Serpentine Galleries, instituições públicas londrinas, são apoiadas pela Fondation Luma, de Maja Hoffmann, herdeira dos laboratórios farmacêuticos Hoffmann-La Roche – e Hans-Ulrich Obrist, codiretor das Serpentine, é um de seus conselheiros. Dercon reconhece com cansaço que “a arte se tornou uma moeda que se troca em particular nas vendas a leilão” – principalmente as da Sotheby’s e da Christie’s (propriedade desde 1998 de Pinault), cujas performances são tão caprichosas quanto as da Bolsa. E apenas “3% dos artistas tiram proveito disso”. Mas, por suas obras “frequentemente provocantes, até mesmo chocantes”, esses 3% que podemos ver em qualquer lugar impediriam o mundo “de cair num conformismo burguês” e o incitariam “a se questionar”, segundo os preceitos com um humor sério de Pinault.8 “Vibrante, efêmera, dinâmica” Contra o “conformismo burguês”, os “elementos de linguagem” que se repetem nos cartazes explicativos das salas da Tate, assim como nas paredes de diversas galerias de arte contemporânea, propõem valores extraordinários. A obra, sempre “vibrante, efêmera, dinâmica”, é “fluxo, magnetismo” e principalmente “resistência”, palavra fetiche. Em suma, o conjunto é “inspirador”. Feito de puros “bibelôs de inanidade sonora”, como dizia outrora um poeta, esse código global para uma arte global, que podemos encontrar em Nova York, Berlim ou Paris, nos faz perceber a obsessão pela novidade, pela sensação, pelo fun, e o desprezo pela reflexão em proveito da “sensação”. O museu, ao desenvolver o edu-tainment, como diz Lewison, entre missão educativa e entertainment (entretenimento), celebra uma modernidade identificada com o fun, com a conexão, com a ilusão do acesso livre, que se tornou igual e rápido para todos, sobre o fundo da hibridação das artes e da postura antissistema. É a manifestação desse poder de influência que é validado pela imprensa, pelos patrocinadores e pelo público, unidos pelos mesmos gostos; e, sem essa validação, rapidamente se é fora de moda e marginalizado. Como diz Dercon, “vivemos em um pequeno círculo”. Ele acrescenta serenamente: “De qualquer forma, o sistema vai implodir”. Não se sabe se devemos compartilhar desse ponto de vista (otimista), mas é verdade que alguns sinais aparecem. Em particular, a tendência dos colecionadores e dos museus de retornar para as vanguardas dos anos 1950: Karel Appel, Hans Hartung, Jean Dubuffet voltam à moda, e sua cota sobe. Necessidade, para os “novos herdeiros” cobertos de dólares e que tomam pouco a pouco consciência de sua ignorância, de descobrir os velhos valores, segundo Dercon; medo de que a bolha não estoure, talvez também. Gerhard Richter, o artista europeu mais cotado, declarou em março de 2015 à revista semanal alemã Die Zeit, depois da venda de sua pintura Abstraktes Bild (1986) pelo preço recorde de US$ 46,3 milhões: “Esse valor tem algo de chocante”.9 Hoje, Lewison acrescentou às suas atividades de conselheiro e historiador da arte uma participação no conselho de administração de um teatro londrino, e fala disso com uma paixão comedida, mas evidente. Em janeiro, Dercon deixou a Tate Modern para tomar a direção do Volksbühne, teatro berlinense muito importante administrado desde 1992 pelo diretor Frank Castorf. Ele parece nem ter hesitado “entre os rituais de levantar fundos e os rituais do teatro”. Tendo vindo a Londres na esperança ilusória de encontrar aqui uma energia única na Europa, uma jovem artista francesa encontrada na Serpentine Sackler Gallery, onde ela é vigia, não hesita: está cansada de dividir um apartamento com quatro pessoas na periferia, sem espaço para um ateliê, tendo a obrigação de trabalhar em tempo integral para pagar o aluguel e o transporte. Está voltando para a França. Em junho de 2016, a Tate Modern vai abrir sua “extensão”: uma pirâmide retorcida de dez andares que a amplia em 60%. E busca 30 milhões de libras. No mesmo momento, a White Cube vai propor um de seus “artistas internacionalmente aclamados” em uma galeria temporária instalada em Glyndebourne. A cada verão, acontece ali um festival de ópera famoso pelo charme único de seus piqueniques, dos quais se participa usando vestido de festa e smoking. O preço da entrada gira em torno de 400 libras. É possível que se trate de arte contemporânea como agente de mudança social. É tão inspirador...
Evelyne Pieller e Marie-Noël
*Evelyne Pieller é jornalista; e Marie-Noël Rio é escritora.Ilustração: Yves Consentino/cc 1 Para entender essa obsessão pelo branco e pelo vazio, cf. Brian O’Doherty, White Cube. L’espace de la galerie et son idéologie [White Cube. O espaço da galeria e sua ideologia], Presses du Réel, Paris, 2008. 2 Uma utopia negativa. 3 “Jack, o Estripador” é o apelido dado a um assassino de prostitutas do East End em 1888 que nunca foi identificado. 4 No Reino Unido, o Estado dá sua garantia por meio da National Indemnity. Não é o caso em todos os países. 5 “Hyundai pour 11 ans avec la Tate Modern” [Hyundai por 11 anos com a Tate Modern], The Art Marketing Company, 23 jan. 2014. Disponível em: www.artmarketingcompany.com. 6 “Art Insight #13: Chris Dercon”. Disponível em: http://brand.hyundai.com. 7 Ler Anne Vigna, “Au Brésil, des collectionneurs d’art très courtisés” [No Brasil, colecionadores de arte muito cortejados], Le Monde Diplomatique, nov. 2015. 8 Citado em Roland Moreno, Victoire du bordel ambiant [Vitória da bagunça ambiente], L’Archipel, Montréal, 2011. 9 ArtNet News, 23 dez. 2015. Disponível em: https://news.artnet.com. |
03 de Maio de 2016 |
Palavras chave: arte, Londres, Inglaterra, Reino Unido, moderno, democratização, galeria, elite |
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