Tive o imenso desprazer de ouvir ontem, na Rádio Jornal, onde aguardava
para dar uma entrevista, duas figuras sinistras, dessas que são convidadas a
fazer o trabalho sujo para os outros, enquanto se enxergam como grandes
protagonistas da História: o neto-genro do coronel Chico Heráclito e genro do
senador biônico Marcos Vinícius Vilaça, e o menudo e político de primeira
geração, Bruno Araújo, se regozijando pelo feito de ter ajudado a empurrar para
frente o cortejo fúnebre da democracia brasileira. É quando se produz a
inversão típica de valores, onde a democracia parece um lamentável mal -entendido(Sérgio
Buarque de Holanda): como é que acusados, réus, beneficiados por propinas de
grandes empresas se tornam – num passe de mágica – em acusadores! Estaríamos
assistindo a um filme surrealista, onde das profundezas do inferno, aparecessem
figuras espectrais se arvorando em “anjos vingadores” com espadas apontadas
para os infiéis? Esse é o quadro dantesco da política brasileira.
A se
consolidar essa imagem danada do Congresso Nacional, onde o diabo em forma de
anjo ou cordeiro, aparece com a promessa de redenção, poderíamos votar uma lei
geral (e não uma PEC pedindo eleições gerais) institucionalizando a bandalheira
no país! Quem em sã consciência pode levar a sério esse rito diabólico de
inversão? – A mídia desregulamentada e monopolizada por algumas famílias? – A
plutocracia da FIESP interessada em pagar menos impostos e reduzir direitos
trabalhistas? As igrejas neopentecostais, com seus bispos e pastores
travestidos de políticos, com a Bíblia numa das mãos, e a bandeira do Brasil,
na outra? – O judiciário acovardado? Ou um aparelho policial fora de controle?
Poderíamos usar a imagem de George Orwell: a mentira é a verdade, o roubo
é a caridade, a injustiça é a justiça e assim por diante. A comunidade
internacional ri do espetáculo mambembe de deputados fantasiados de papagaios,
fazendo declamações de amor ao Brasil, à sua igreja, ao seu povo, enquanto
passeiam impunes pelas listas de propinas das grandes empresas. Deputados “democratas”
que enaltecem a Justiça, quando ela lhes convém, mas que ao mesmo tempo
obstruem decisões dos tribunais superiores, quando não gostam ou não concordam
com elas. O que fazer com essas criaturas grotescas que apareceram na telinha.
Ensaiando o papel de “salvadores da Pátria”? – Acham que continuaram iludindo a
boa-fé da nossa gente brasileira, apostando no apoio da mídia e no ativismo do
senhor Gilmar Mendes? – Ou nos almoços de filé mignon patrocinados pela FIESP?
Em algum momento, vai ficar claro o descompasso entre o teatrinho dessa
camarilha e os interesses do país, quando o impostor se sentar –impudicamente –
na cadeira presidencial (sonhando em ser candidato em 2018). Quando começar o
processo de rapina das riquezas nacionais, a destruição das políticas
compensatórias, o ataque sistemático aos direitos dos trabalhadores e
pensionistas, quando se abrir a carnificina interna entre os aproveitadores do
botim, vamos ver o que acontecerá com a alegria e a felicidade desses
vendilhões da Pátria, dos fariseus de todas as Igrejas, dos sepulcros caiados
da Igreja Sara Nossa Terra. Aí, o diabo em pessoa, e de cara lisa, vai aparecer
para cobrar, com juros e correção monetária, a obra realizada pelos seus
empregados.
Michel Zaidan Filho é filósofo, historiador, cientista político, professor titular da Universidade Federal de Pernambuco e coordenador do Núcleo de Estudos Eleitorais, Partidários e da Democracia - NEEPD-UFPE
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