Numa palestra recente, no Museu do Homem do Nordeste, da Fundação Joaquim Nabuco, o sociólogo francês, Michel Maffesoli, fez uma analogia bastante interessante entre o luxo e o lixo. Lembrava o teórico da sociologia do cotidiano, que a etimologia da palavra "luxo", rotineiramente associada pelo senso-comum à luxúria e ao prazer, na realidade, está associada à luxação, contusão. Como o sistema capitalista amplia - para alguns poucos privilegiados - exponencialmente essas possibilidades de acesso ao luxo, certamente isso vem ampliando o fosso que separa a elite do povo, criando situações de anomias ou disfunções sociais. Com a licença poética permitida pelo sociólogo, poderíamos afirmar que o luxo, na realidade, em certo sentido, é um lixo, sobretudo se considerarmos o fato de que seus beneficiários não dão a mínima para o andar de baixo. Nos últimos anos, o Jornal do Commércio vem produzindo alguns cadernos especiais simplesmente soberbos. Um deles, por exemplo, inspirou uma das pesquisas mais importantes da instituição, "Os Nordestes Emergentes". Vou cometer a indelicadeza de ser injusto com alguns profissionais daquele jornal, simplesmente pelo fato de não poder citar todos as grandes reportagens realizados pelo veículo. Posso citar a pesquisa etnogastronômica do jornalista Bruno Albertim, o caderno sobre o problema da fome na região Nordeste, o caderno sobre a precarização de nossas estradas e, mais recentemente, um caderno que resgata o patrimônio cultural vivo do nosso Estado, com a biografia de nossos artistas em atuação. Esse último tipo de pesquisa normalmente é negligenciado. Existe um trabalho clássico sobre o assunto, o "Reinaldo da Lua", de Sílvia Rodrigues, um levantamento único sobre o assunto, bastante pesquisado porque quem deseja saber quem foi Vitalino, quem foi Mestre Saúba, grandes artistas que se foram do nosso convívio. Em sua matéria de capa no dia de hoje, domingo, o jornal sugere uma hashtag sobre o lixo do Recife. Quando fala em lixo, refere-se à nossa responsabilidade e a do poder público sobre o destino dos resíduos sólidos espalhados pela cidade. Não é que essa questão não seja importante, mas talvez fosse mais interessante propor um debate sobre o destino daquelas crianças que vivem no lixo, como lixo. Assim como ocorre com os resíduos sólidos, penso que as responsabilidades, naquele caso específico, também compete a toda a sociedade pernambucana, traduzidas em instituições como a escola, a família, a Igreja, o Estado. Pediram uma reflexão sobre o assunto, aí vai.
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