pub-5238575981085443 CONTEXTO POLÍTICO: Crônica: As crônicas de Graciliano Ramos
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segunda-feira, 25 de junho de 2018

Crônica: As crônicas de Graciliano Ramos



 Resultado de imagem para Graciliano Ramos escrevendo
 José Luiz Gomes


Numa crônica que escrevi sobre o poeta Marcus Accioly, em determinado contexto, comento sobre alguns hábitos curiosos dos escritores no momento de criação. Não nos ocorre haver citado o escritor alagoano, Graciliano Ramos, mas cumpre registar aqui que Graciliano, normalmente, sentava numa escrivaninha repleta de folhas de papel, um candeeiro e uma garrafa de cachaça. Era muito metódico e exigente. Sua carreira literária reservaria, ainda, outros lances curiosos, como o percurso daquele “empurraozinho” inicial, fundamental para deslanchar a carreira de jovens candidatos a escritores. Graciliano era prefeito da cidade de Palmeira dos Índios, localizada na zona da mata alagoana, onde exercia o ofício com um espírito público invejável, coisa rara nos nossos dias, quando o gestor público costuma apoiar-se no cargo que ocupa para auferir toda espécie de vantagens, seja através do emprego de parentes, recebendo propinas, exercendo tráfico de influência... a lista é imensa e eu prefiro, leitor, deixar essa discussão para os nossos editoriais de política.  

Mas, voltando ao homem público Graciliano Ramos, encerro apenas dizendo que ele deixou bons exemplos na gestão da máquina pública, um dado de sua biografia que sempre costumo enaltecer, embora a sua condição de escritor tenha se sobressaído. Aliás, foi como gestor que ele tornou-se escritor. Seus relatórios de gestão chegaram às mãos do editor Augusto Frederico Schmidt, que se interessou bastante pelos escritos daquele prefeito que escrevia tão bem. Estava, segundo ele, no lugar errado. Esses relatórios, encaminhados ao Governo do Estado,  com fatos hilariantes sobre gestões anteriores, foram publicados, criando um vínculo mais efetivo entre o escritor e o editor, o que tornou possível a publicação dos seus livros. Há um livro de Graciliano com o sugestivo título Linhas Tortas, que reúne uma série de crônicas do escritor, publicadas em jornais alagoanos. Tenho lido essas crônicas com regularidade, notadamente, depois que observei que o escritor Raimundo Carrero, em suas oficinas literárias, sempre o recomendava como uma boa leitura para candidatos a escritores.

São crônicas antigas, publicadas em jornais alagoanos, e a primeira parte do livro, não posso deixar de confessar, apesar de grande admirador de Graciliano,  não nos foram muito atrativas. Algumas delas devem ter sidos escritas de afogadilho, para cumprir aquela missão de apenas preencher um espaço determinado do jornal. A segunda parte, quando as crônicas já aparecem com os seus respectivos títulos, aí sim, pode-se falar num mestre na arte da escrita, de onde se entende que Carrero não teria cometido nenhuma estultice em recomendá-lo. Muito ao contrário.  Entremeando as exigências impertinentes do dono do jornal - que ele sequer conhece - para aquela produção diária, conforme já nos referimos, Graciliano tira um tempinho para aprontar das suas, assim como debruçar-se sobre o oficio de escrever, dando conselhos, fazendo considerações que ajudam a construir as linhas tortas de quem se inicia no ofício de escrever. A crônica que li hoje foi justamente sobre aquele incômodo papel em branco e o caboclo naquela Angústia, sem inspiração alguma.  

Quem leu Infância, conhece bem os dramas vividos por Gracialiano Ramos em terras nordestinas, cruzando suas diversas microrregiões, morando em cidades como Quebrangulo, Buíque, Palmeira dos Índios. Uma experiência bem próxima de Vidas Secas, que incluíam surras, palmatórias no processo de alfabetização, humilhações, como em Buíque, quando era obrigado pelo pai a banhar-se num rio infestado de cobras. Numa das crônicas, confessa seu temor em findar os seus dias numa daquelas instituições disciplinares descritas pelo filósofo Michel Foucault, como um hospital psiquiátrico ou uma penitenciária. Por suas ligações com o Partido Comunista Brasileiro, cumpriu alguns anos de prisão na década de 30/40. Voltaremos a falar sobre o velho Graça, quem sabe sobre a sua experiência como prefeito de Palmeiras dos Índios, de onde se sabe coisas interessantíssimas, como a multa aplicada ao próprio pai, por manter animais soltos nas ruas. Prefeito não tem pai, dizia.

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