Durante a primeira reunião da Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) deste ano legislativo, realizada nesta terça-feira (7), o senador Armando Monteiro ressaltou a importância da criação do Código de Defesa do Contribuinte (PLS 298/2011).
O senador destacou a necessidade de se promover um amplo debate sobre o tema, uma vez que em sua opinião, somente por meio da criação do Código do Contribuinte “se tem condições de equilibrar a relação entre fisco e contribuinte no Brasil, marcadas por muitas desigualdades”.
“O Código de Defesa do Contribuinte vai dar mais clareza na confecção das normas tributárias, admitindo o processo de compensação tributária de forma automática e transparente, dentre outras medidas que darão mais garantias ao contribuinte”, afirmou.
O parlamentar, que votou favorável ao Projeto de Lei do Senado (PLS 492/2007) – apresentado hoje na CAE -, que facilita a compensação de débitos relativos a contribuições previdenciárias com créditos de outros tributos federais, comemorou a aprovação unânime, por entender que esse projeto dá início à construção de uma relação mais justa do contribuinte com as administrações fazendárias.
“O Senado Federal retoma suas atividades com uma discussão fundamental que é o Código de Defesa do Contribuinte. Há mais de 10 anos se debate a criação do código nesta Casa. O Brasil avançou em muitas áreas, mas, infelizmente, a relação fisco/contribuinte no Brasil ainda é marcada por uma posição de extrema desigualdade. Ou seja, o Estado está cheio de prerrogativas em face do contribuinte, e o contribuinte não tem prerrogativas em face do Estado. O projeto aprovado nesta Comissão é uma boa forma de inaugurarmos algumas conquistas que o Código de Defesa do Contribuinte haverá de proporcionar ao País quando da sua aprovação pelo Senado”, comentou Armando Monteiro.
PLS 298/2011 - O projeto de criação do Código de Defesa do Contribuinte é de autoria da senadora Kátia Abreu (PSD/TO), cuja relatoria é do senador Armando Monteiro, na Comissão de Constituição, Cidadania e Justiça (CCJ). O projeto deve tramitar na CAE antes de ser apreciado no Plenário do Senado Federal.
A greve da Polícia Militar das Bahia, conforme a imprensa vem noticiando, está assumindo uma proporção perigosíssima, provocando o enfrentamento entre militares grevistas e forças do Exército e da Guarda Nacional brasileira. Antes, tumultos, invasão de prédios públicos, saques no comércio, vandalismo e dezenas de mortes foram registradas, que alguns atribuem aos próprios grevistas. Criou-se uma situação de absoluta desordem naquele Estado da Federação, governado pelo petista Jaques Wagner, ator político com um grande prestígio no Planalto. Ostentando os maiores índices de violência no país, Estados como o Rio de Janeiro, São Paulo e Pernambuco passaram a adotar uma verdadeira política de segurança pública, ou seja, monitorando a ocorrência e tipologias de crimes; definindo metas de sua redução a partir de dados confiáveis; aparelhando o aparato de segurança do Estado, inclusive a polícia científica; unificando as ações entre as polícias militar e civil; impondo a presença do Estado em zonas controladas por bandidos; aplicando mecanismos que premiam a meritocracia do trabalho dos policiais; punindo com rigor os desmandos corporativos, afastando policiais envolvidos em corrupção; privilegiando critérios técnicos e de desempenho para a ascenção na carreira; articulando a política de segurança pública às políticas públicas de acessibilidade ao bem cultural, à educação, formação técnica, emprego e renda . Com essas medidas, esses Estados estão em processo crescente de redução da criminalidade. A imagem não é muito feliz nem real, mas Pernambuco é apontado pelos maiores especialistas na área de segurança pública, como uma “ilha” no contexto de uma Região onde a violência vem crescendo a cada dia: o Nordeste. Eu afirmo que a imagem não é feliz uma vez que, apesar dos avanços - sobretudo na redução dos homicídios - a sensação de insegurança persiste e uma série de outros delitos forma ignorados ou até cresceram no período. Numa análise equivocada, a explicação para essa explosão de violência na Região Nordeste já foi apontada – imaginem- como sendo resultante do crescimento econômico da Região e a possível migração do tráfico de drogas. Embora algumas tipologias de crimes possam estar relacionadas diretamente a essas fatores, existem outras variáveis de caráter mais elucidativo, como a falha em não se conceber uma política de segurança orientada pelo planejamento, calcada em dados confiáveis, conforme já afirmamos. Estados que fizeram essa lição de casa estão vendo seus índices serem reduzidos, enquanto em outros casos, Bahia, Alagoas, Paraná, Paraíba enfrentam um surto de violência jamais observados. Que a greve da Bahia sirva de alerta para os governantes da Região e que o senhor Jaques Wagner reúna seus assessores, informe-se sobre os reais problemas de segurança pública do seu Estado e tome as providências necessárias e quando nomear alguém para a área exija um plano de trabalho. O crescimento da violência na região é fruto do descaso do Estado com a segurança.
O presidente do PSD em Pernambuco, André de Paula, saiu do encontro com o presidente estadual do PTB, senador Armando Monteiro, declarando uma visão convergente sobre a discussão que tem sido liderada pelo líder trabalhista a respeito da sucessão no Recife. “Tudo o que ouvi de Armando merece de mim reflexão e apoio. Eu acho que ele se dispôs, e é importante que a gente destaque isto, a conversar com os companheiros, a abrir espaços, a construir convergências, a fazer algumas avaliações conjuntas”, frisou André após a conversa, que aconteceu nesta segunda-feira (06), no escritório político do senador.
Armando expôs a André de Paula os argumentos que têm sido apresentados aos líderes das outras legendas sobre a responsabilidade da Frente Popular com os rumos do Recife. “Temos a obrigação de pensar e oferecer alternativas a este processo. E isto é o que nós tentamos com este diálogo com os partidos. Reconhecemos que esta não é uma construção fácil”, afirmou Armando.
O senador destacou novamente o papel central do governador Eduardo Campos na condução do processo, complementando que o diálogo entre os partidos da Frente também têm por propósito apresentar alternativas ao líder socialista. “Com a responsabilidade que tem como líder maior da aliança, a tarefa que repousa sobre os ombros do governador é difícil. Porque em última instância nós precisamos garantir que a frente continue conduzindo os destinos do Recife. O recifense quer que o projeto do Recife esteja alinhado ao de Pernambuco. É por isso que nós entendemos que devemos oferecer alternativas ao próprio governador, explicou.
Armando voltou a reconhecer a importância que o PT tem para o Recife, mas alertou que as dificuldades internas do partido em definir o nome para a disputa, não podem imobilizar a Frente. “Não sabemos exatamente qual será o desfecho deste processo (de indefinição no PT) e que custos políticos ele trará eventualmente ao próprio PT. Portanto, nós temos a obrigação, como integrantes desta Frente, de procurar alternativas”.
Complementando que o diálogo entre o PTB e o PSD também se estenderá a outros municípios pernambucanos, André de Paula avaliou positivamente o encontro. “Quero destacar que as colocações feitas por Armando são, a meu ver, muito lúcidas. O destaque para a importância da liderança do governador, a inquietação em relação a esta indefinição de uma candidatura, ou de duas candidaturas, no âmbito da Frente, a importância de que os partidos dialoguem com maior freqüência. São todas preocupações com as quais comungo”, reforçou.
André de Paula adiantou que se reunirá com o presidente da comissão provisória do PSD no Recife, o ex-vereador José Neves, com os quatro vereadores da legenda na Câmara Municipal, e com os pré-candidatos, para uma conversa, onde transmitirá o que ouviu do Senador, “tanto em relação ao que pensa quanto o que ele depreendeu dos contatos que teve com os demais partidos”.
Já Armando Monteiro pretende marcar para esta semana uma conversa com o deputado federal Pastor Vilalba, do PRB. “Completada esta primeira etapa, vamos consultar os companheiros dos partidos sobre os passos que daremos a seguir, no sentido de, em uma nova fase, identificar alternativas e evidentemente nomes”, planeja.
Crédito da foto: Assessoria de imprensa/divulgação
A primeira coisa que a chamada grande imprensa faz quando alguém é alçado à condição de ministro, de presidente de um Poder ou de qualquer outro cargo de relevância é fuçar sua vida pregressa. Faz parte. Jornalismo também é isso.
A revista Época desta semana traz uma reportagem sobre o novo ministro das Cidades, Aguinaldo Ribeiro. Diz não só o que todo mundo já sabe – que ele responde a dois inquéritos no Supremo Tribunal Federal -, mas vai além, ferindo os brios esquerdistas de Dilma Roussef, ao lembrar que o avô do escolhido foi apontado como suspeito da morte do líder camponês João Pedro Teixeira, cuja história foi transformada em filme – “Cabra marcado pra morrer”. O filme, diz a matéria, é venerado pela esquerda. A esquerda de Dilma. E acha que isso é constrangedor.
Não vejo nada de constrangedor. A história mal resolvida do avô do ministro terá que ser uma mancha hereditária? Dilma participou de ações terroristas contra a ditadura e hoje prefere não ficar lembrando isso como um troféu da esquerda. Não foi a avó dela. Foi ela mesma. Isto, sim, foi um constrangimento na campanha.
Se nem Dilma quer que o seu passado a condene, porque os antepassados de Aguinaldo terão que condená-lo? O cineasta de “Cabra marcado pra morrer” diz-se “chocado” com a nomeação de Aguinaldo. “Não estou julgando o neto, mas fica simbólico”, diz ele.
Está julgando, sim. Da mesma forma que os não eleitores de Dilma a julgaram por seu passado constrangedor. Aguinaldo Ribeiro não cometeu nem foi suspeito de matar ninguém. Querem fazer com que ele pague por um crime atribuído – e nunca provado, apesar das evidências levantadas à época - ao seu avô. Isso não é julgamento?
Se prejulgar é arriscado, julgar o descendente de um suspeito é irracional.
Torço para que o ministro corresponda às expectativas não só do seu partido ou da presidente, mas dos brasileiros e dos paraibanos, em particular. Torço pelos paraibanos que “chegam lá”. Independente de partido político. Independente dos seus antepassados.
A propósito de reportagem na revista Época desta semana, na qual o governador Eduardo Campos (PSB) estaria tentando se livrar de uma condenação ainda no processo dos precatórios, a assessoria do Palácio das Princesas enviou a seguinte nota:
Publicação desta semana da Revista Época tenta dar ares de escândalo a matéria julgada, por unanimidade, pelo Supremo Tribunal Federal (STF). É como se uma instância administrativa pudesse revisar decisão da mais alta corte de Justiça da nação.
Sobre o mesmo assunto pronunciaram-se o Senado Federal, o Tribunal de Justiça de Pernambuco, o Tribunal de Contas do Estado e a Assembleia Legislativa de Pernambuco e todos esses órgãos, todos, decidiram pela absoluta regularidade da emissão de títulos públicos para pagamento de precatórios judiciais, e, em consequência, inocentando todos os injustamente imputados, inclusive o atual governador de Pernambuco, Eduardo Campos.
Em respeito à sociedade pernambucana e à opinião pública em geral e com o propósito de restabelecer a verdade tão flagrantemente vilipendiada, esclarecemos:
O Supremo Tribunal Federal (STF), no julgamento (inquérito nº 1.690 PE), em 2003, em decisão transitada em julgado, inocentou de maneira inequívoca, definitiva e irrecorrível o falecido ex-Governador Miguel Arraes e o atual Governador Eduardo Campos de qualquer irregularidade na emissão de títulos públicos calcados em precatórios judiciais.
O Senado Federal julgou regular a dita operação. A Justiça pernambucana também absolveu a todos os responsáveis pela operação. O Tribunal de Contas de Pernambuco, do mesmo modo, aprovou as contas do Governo Arraes referentes a tais emissões de títulos públicos.
A Assembléia Legislativa acompanhou a decisão do Tribunal de Contas e também aprovou a prestação de contas respectiva, obviamente por reconhecer, como expressamente foi reconhecido nas variadas instâncias, que a operação não causou prejuízos aos cofres públicos.
Assim, o caso não só está protegido pela coisa julgada administrativa e judicial, como inteiramente vencido pela ausência de qualquer questionamento remanescente, já que o assunto foi amplamente discutido nas eleições de 2006 e sequer constou da pauta eleitoral de 2010, uma vez que resolvido pelo veredicto manifestado pelo poder Judiciário, pelo Legislativo estadual e federal, pelo Tribunal de Contas do Estado e pela ausência de qualquer procedimento do Ministério Público sobre a questão.
Assunto vencido pelos fatos. Quanto à tramitação no Conselho de Recursos do Sistema Financeiro Nacional (CRSFN), de procedimento administrativo instaurado pelo Banco Central do Brasil, para fins de apuração das supostas responsabilidades já apreciadas e julgadas nos diferentes fóruns acima mencionados, é importante dizer o seguinte:
1. O Banco Central do Brasil, em primeira instância, decidiu pelo arquivamento do processo administrativo, considerando a ocorrência da prescrição. 2. Tendo havido recurso de ofício, o CRSFN decidiu, apenas pelo voto de desempate do seu Presidente, em 15 de dezembro de 2009, pela responsabilidade de integrantes da administração do Bandepe, aplicando-lhes pena de inabilitação para o exercício de cargos diretivos em instituições financeiras.
3. Essa decisão passou dois anos para ser publicada. 4. Essa decisão, com o devido respeito, além de contrariar frontalmente o posicionamento de todas as outras instâncias administrativas e judiciais, não é definitiva, encontrando-se pendente recurso administrativo interposto por alguns dos ex-administradores do Bandepe, inclusive o Governador Eduardo Campos.
5. Em tal recurso se expõe o claro conflito verificado entre a decisão administrativa e o acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Inquérito nº 1.690 PE, bem com em relação a todas as outras decisões favoráveis à operação de emissão dos títulos, onde os ex-administradores foram excluídos de responsabilidades, por não terem sido encontradas quaisquer irregularidades na operação financeira em foco.
Além do mais, ficou comprovado que não houve prejuízo para o Bandepe nem para o Estado de Pernambuco, tendo o governo seguinte, eleito pela oposição, mantido e honrado os contratos decorrentes das referidas operações, obviamente por entendê-las legítimas e plenamente regulares.
Não temos dúvidas de que os argumentos são fortes em favor da extinção também desse último procedimento em curso no BACEN, uma vez que o sistema jurídico brasileiro, por uno e harmônico, não conviveria com tamanho paradoxo e, sem dúvida, inaceitável injustiça.
O governador Eduardo Campos foi punido por fraude no sistema financeiro cometida nos anos 90 – uma nódoa que pode atrapalhar seus planos políticos
ANDREI MEIRELES
Seu voto foi efetuado com sucesso
O governador de Pernambuco, Eduardo Campos, é hoje um curinga no jogo da sucessão presidencial de 2014. Depois de virar um protagonista da política nacional, ele é cortejado tanto por petistas como por tucanos – os adversários de sempre – como uma possível opção de candidato a vice-presidente numa chapa para o Palácio do Planalto. Campos é visto ainda como uma possível terceira via na disputa pelo Palácio do Planalto, sustentada numa eventual aliança da esquerda não petista com o PSD do prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab.
Eduardo Campos precisou de dez anos para montar o cacife que hoje lhe abre esse amplo leque de alternativas políticas. Em 1997, quando estreou no cenário político nacional, sua condição era bem diferente: ele teve de se defender numa CPI do Congresso Nacional que investigou um gigantesco esquema de fraudes com títulos públicos, conhecido como Escândalo dos Precatórios (leia o quadro abaixo). Na ocasião, Eduardo Campos tinha 32 anos e era conhecido apenas como neto e herdeiro político do governador Miguel Arraes, um expoente da esquerda brasileira, de quem era secretário da Fazenda (naqueles tempos, o nepotismo ainda não era proibido por lei).
O escândalo teve um custo político: Miguel Arraes disputou e perdeu a reeleição, em 1998. Oito anos depois, Eduardo Campos conseguiu se eleger governador de Pernambuco e exibiu na campanha sua absolvição no caso dos precatórios pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Com mais de 80% dos votos, Eduardo Campos se reelegeu em 2010, numa campanha em que o Escândalo dos Precatórios deixou de ser relevante.
Seus adversários na campanha de 2010 dormiram no ponto. A absolvição pela Justiça livrou Eduardo Campos do problema penal. Mas ele não conseguiu a mesma certidão de “nada consta” em outro julgamento, de natureza administrativa. ÉPOCA teve acesso a documentos inéditos que revelam que, cinco anos depois da decisão do STF, Eduardo Campos e dois ex-diretores do Banco do Estado de Pernambuco (Bandepe), o antigo banco público de Pernambuco, voltaram a ser julgados pelo Escândalo dos Precatórios. E, desta vez, condenados. Em dezembro de 2009, o Conselho de Recursos do Sistema Financeiro Nacional (CRSFN) julgou que o governador e Wanderley Benjamin de Souza e Jorge Luiz Carneiro de Carvalho, ex-diretores do Bandepe, cometeram “infração grave” na negociação irregular de títulos públicos. O trio foi proibido de exercer cargos de direção na administração de instituições fiscalizadas pelo Banco Central – como os bancos públicos e privados. A punição, por um período de três anos, vigorará até dezembro de 2012.
No mercado, o CRSFN é chamado de Conselhinho. O diminutivo se aplica apenas ao apelido. Na verdade, trata-se de um colegiado poderoso. Ele é composto de oito conselheiros – quatro indicados pelo governo e outros quatro de entidades de classe como a Febraban. São eles que julgam, em segunda e última instância, recursos contra decisões sobre penalidades administrativas aplicadas pelo Banco Central, pela Comissão de Valores Mobiliários e pela Secretaria de Comércio Exterior. No ano passado, o Conselhinho rejeitou um recurso do ex-banqueiro Salvatore Alberto Cacciola contra a decisão do Banco Central que o proibiu de exercer cargos em empresas financeiras por cinco anos.
No julgamento do governador, o Conselhinho examinou as peças do processo administrativo do Banco Central no 0101090149 e pareceres da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN). O governador foi condenado. Além de secretário da Fazenda, Eduardo Campos era integrante do Conselho de Administração do Bandepe. Segundo a documentação, Campos assinou documentos que permitiram o golpe financeiro, como secretário, tinha conhecimento de toda a operação e permitiu, “ou deliberadamente provocou”, o envolvimento do banco no negócio lesivo ao Estado. Alguns conselheiros entenderam que, mesmo havendo provas da autoria das infrações, pelo tempo decorrido não poderia mais haver punição porque as irregularidades prescreveram. Prevaleceu, no entanto, a interpretação de que o julgamento ocorria ainda em tempo hábil, e havia provas suficientes para a condenação de Campos e dos dois ex-diretores do Bandepe.
Essas provas constam do processo administrativo, concluído em fevereiro de 2005 pelo Departamento de Combate a Ilícitos Cambiais e Financeiros do Banco Central. ÉPOCA também teve acesso a essa documentação. Ela descreve com minúcias como foi montada a fraude. A fórmula da negociata foi criada em São Paulo por Wágner Batista Ramos, coordenador da Dívida Pública da prefeitura paulistana na gestão de Paulo Maluf (1993-1997) – e exportada país afora. A jogada valia-se de uma brecha aberta por uma emenda constitucional de março de 1993. Aprovada para impor controle à farra financeira que vigorava em Estados e municípios, a emenda proibiu novas emissões de títulos públicos estaduais e municipais até 31 de dezembro de 1999. Ela abriu, no entanto, uma exceção para a emissão de títulos destinados ao pagamento das divídas resultantes de sentenças judiciais – conhecidos como precatórios – que estavam pendentes em 5 de outubro de 1988, data de promulgação da Constituição.
AS TRÊS FASES DA FRAUDE
A fraude, de acordo com o método desenvolvido por Wágner Ramos, começava com a emissão de títulos públicos em valores muito acima das dívidas reais. O segundo passo era vender esses papéis supervalorizados com grandes descontos a um banco privado. O terceiro passo era combinar com vários intermediários a negociação sucessiva dos títulos. Eles realizavam compras e vendas no mesmo dia (operações conhecidas no mercado como day trade) a preços crescentes. Isso permitia ganhos imediatos aos participantes, pois quem comprava revendia a um valor maior ao elo seguinte da cadeia. Os intermediários agiam como laranjas e, muitas vezes, nem sequer tinham capital compatível para comprar títulos com os valores envolvidos. No fechamento da operação, no mesmo dia aparecia um comprador final capitalizado, geralmente um fundo de investimento ou de previdência privada. Bastava a esse último comprador pagar pelo título menos do que o governo pagaria ao saldar a dívida para ter lucro também.
Na negociação dos títulos públicos de Pernambuco, os lucros foram para doleiros
No caso de Pernambuco, dívidas vencidas de R$ 234.618,05, pendentes em 5 de outubro 1988, viraram justificativa para o Estado emitir, entre junho e novembro de 1996, R$ 480 milhões em títulos estaduais. O objetivo alegado era o governo pernambucano captar dinheiro no mercado para os débitos pendentes. Na ponta do lápis, os papéis emitidos pelo Bandepe representaram 2.045 vezes o montante das dívidas vencidas.
O Banco Vetor foi o primeiro a comprar os títulos, com descontos que variaram de 20,32% a 31,59%. A escolha desse banco foi feita sem licitação, sob o argumento da “notória especialização”. A investigação do Banco Central derrubou a tese, pois o Vetor contratou o próprio Wágner Ramos, por meio da corretora Perfil, para montar toda a operação. Além disso, os editais de venda dos títulos foram publicados na véspera da data limite para que o governo recebesse propostas de compra, para dificultar o surgimento de concorrentes ao Banco Vetor. “Na realidade, nenhuma oferta houve para a compra dos papéis”, diz um documento do BC. Depois de passar pelos intermediários, os títulos do Bandepe chegaram aos compradores finais com descontos entre 1,63% e 2,51%.
Em vez de vender os papéis ao Banco Vetor com descontos entre 20,32% e 32,59%, teria sido possível ao Estado, portanto, oferecer um desconto bem menor e receber mais dinheiro, se a venda tivesse sido feita aos compradores finais. “Se o Bandepe tivesse efetuado a venda direta dos títulos aos reais investidores finais, o Estado teria obtido uma redução de custos da ordem de R$ 61,983 milhões; a esse valor, devem ser acrescidos ainda os R$ 22,133 milhões relativos ao pagamento da taxa de sucesso ao Banco Vetor”, diz o documento do BC.
O Banco Central, no entanto, não conseguiu rastrear onde foi parar o dinheiro. Segundo a conclusão do processo administrativo, assinada pelo gerente técnico do BC José Arnaldo Dotta, grande parte dos lucros com a ciranda com os títulos parou em contas de doleiros. “Como os recursos saíram de empresas não integrantes do Sistema Financeiro Nacional, principalmente no caso dos valores remetidos ao exterior, tornou-se impossível saber o destino final.”
Consta do processo do Conselhinho uma peça de defesa, apresentada pelos advogados de Eduardo Campos em setembro de 2002. Eles pedem o encerramento da investigação por entender que o caso estava prescrito, uma vez que, entre a ocorrência da emissão de títulos públicos em Pernambuco e a intimação a Eduardo Campos pelo Banco Central, haviam se passado seis anos. “Não cabe mais à autoridade administrativa a apuração do fato por não tê-la promovido dentro do prazo legal”, escreveu o advogado José Henrique Wanderley Filho.
ÉPOCA procurou o governador Eduardo Campos. Sua assessoria de imprensa enviou uma nota, também assinada pelo advogado José Henrique Wanderley Filho. Ele afirma que a decisão do Conselhinho “ainda não é definitiva, além de contrariar frontalmente o posicionamento de todas as outras instâncias administrativas e judiciais”. Em dezembro passado, dois anos depois da decisão do Conselhinho, a defesa de Eduardo Campos apresentou recurso pedindo a revisão da condenação. “Tal recurso expõe o claro conflito verificado entre a decisão administrativa e o acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal”, diz o advogado.
Enquanto seus advogados apresentavam defesa ao Banco Central, Eduardo Campos se destacava em 2002 no Congresso Nacional como um político bem informado que esbanjava simpatia, sabia ouvir e sempre tinha boas histórias para contar. Apesar de seu partido, o PSB, ter o ex-governador Anthony Garotinho como candidato ao Palácio do Planalto, Eduardo Campos – e o avô, Miguel Arraes – mantinha antigas e boas relações com o petista Luiz Inácio Lula da Silva.
Em dezembro de 2003, o Supremo Tribunal Federal excluiu Campos do processo dos precatórios. Foi o suficiente para ele ser nomeado por Lula, em 2004, ministro da Ciência e Tecnologia. Em junho de 2005, em pleno escândalo do mensalão, Campos trocou o governo pelo Congresso para reforçar a defesa do governo no Parlamento. A retribuição foi generosa. Na disputa pelo governo de Pernambuco em 2006, Lula se manteve neutro entre Campos e o petista Humberto Costa no primeiro turno. No segundo turno, o apoio de Lula foi decisivo para Campos derrotar Mendonça Filho (DEM).
FICHA LIMPA OU FICHA SUJA?
No Palácio das Princesas, sede do governo de Pernambuco, Eduardo Campos, com a ajuda de Lula, transformou o Estado num canteiro de obras. Tornou-se o governador mais popular do país e, em 2010, concorreu a uma reeleição tranquila. Seu principal adversário, o senador Jarbas Vasconcellos (PMDB), obteve 14% dos votos.
Não há consenso entre os juristas se a punição a Eduardo Campos pode torná-lo um ficha suja
Hoje, o sucesso de Eduardo Campos extrapola o Estado. O senador Aécio Neves (PSDB-MG), o mais provável candidato tucano à Presidência da República em 2014, confidenciou a interlocutores que gostaria de ter Eduardo Campos como seu vice. Os dois tiveram uma parceria em Minas Gerais, decisiva para a eleição, em 2008, de Márcio Lacerda (PSB) para prefeito de Belo Horizonte. Embora procurem preservar as boas relações com o aliado, os petistas observam com desconfiança esses movimentos do governador de Pernambuco.
Um dos trunfos de Campos é seu inconteste controle do PSB. A estratégia adotada em 2010 de rifar a candidatura presidencial do ex-ministro Ciro Gomes para apoiar a eleição de Dilma Rousseff deu bons resultados. Com a eleição de seis governadores, o partido ganhou músculo nas urnas. Com isso, Campos se cacifou também para compor uma eventual chapa da presidente Dilma Rousseff à reeleição. Ele também exibiu força ao conseguir manter seu apadrinhado político Fernando Bezerra como ministro da Integração Nacional, apesar de uma saraivada de denúncias.
A revelação de uma condenação por um órgão técnico composto de conselheiros indicados pelo Ministério da Fazenda nos governos aliados de Lula e Dilma pode turvar o horizonte do governador pernambucano. Ouvidos sob a condição de anonimato, juristas consultados por ÉPOCA divergiram sobre o possível enquadramento da condenação de Eduardo Campos na Lei da Ficha Limpa. Para uns, a decisão do Conselhinho não torna Campos um ficha suja, porque a Lei da Ficha Limpa se refere explicitamente à condenação proferida por “órgão colegiado judicial” – não é o caso do Conselhinho. Outros juristas lembram que, noutro trecho, a lei abre brecha para uma possível punição. Trata-se do parágrafo que torna inelegível por oito anos quem for condenado por irregularidade insanável “em decisão irrecorrível do órgão competente, salvo se esta tiver sido suspensa ou anulada pelo Poder Judiciário”. No plano administrativo, o Conselhinho é a última instância. É uma questão que só pode ser dirimida pela própria Justiça, até porque a Lei da Ficha Limpa está sub judice no STF.
Há um período em que os pais vão ficando órfãos dos próprios filhos.É que as crianças crescem. Independentes de nós, como árvores, tagarelas e pássaros estabanados, elas crescem sem pedir licença. Crescem como a inflação, independente do governo e da vontade popular. Entre os estupros dos preços, os disparos dos discursos e o assalto das estações, elas crescem com uma estridência alegre e, às vezes, com alardeada arrogância. Mas não crescem todos os dias, de igual maneira; crescem, de repente. Um dia se assentam perto de você no terraço e dizem uma frase de tal maturidade que você sente que não pode mais trocar as fraldas daquela criatura. Onde e como andou crescendo aquela danadinha que você não percebeu? Cadê aquele cheirinho de leite sobre a pele? Cadê a pazinha de brincar na areia, as festinhas de aniversário com palhaços, amiguinhos e o primeiro uniforme do maternal? Ela está crescendo num ritual de obediência orgânica e desobediência civil. E você está agora ali, na porta da discoteca, esperando que ela não apenas cresça, mas apareça. Ali estão muitos pais, ao volante, esperando que saiam esfuziantes sobre patins, cabelos soltos sobre as ancas. Essas são as nossas filhas, em pleno cio, lindas potrancas. Entre hambúrgueres e refrigerantes nas esquinas, lá estão elas, com o uniforme de sua geração: incômodas mochilas da moda nos ombros ou, então com a suéter amarrada na cintura. Está quente, a gente diz que vão estragar a suéter, mas não tem jeito, é o emblema da geração. Pois ali estamos, depois do primeiro e do segundo casamento, com essa barba de jovem executivo ou intelectual em ascensão, as mães, às vezes, já com a primeira plástica e o casamento recomposto. Essas são as filhas que conseguimos gerar e amar, apesar dos golpes dos ventos, das colheitas, das notícias e da ditadura das horas. E elas crescem meio amestradas, vendo como redigimos nossas teses e nos doutoramos nos nossos erros. Há um período em que os pais vão ficando órfãos dos próprios filhos. Longe já vai o momento em que o primeiro mênstruo foi recebido como um impacto de rosas vermelhas. Não mais as colheremos nas portas das discotecas e festas, quando surgiam entre gírias e canções. Passou o tempo do balé, da cultura francesa e inglesa. Saíram do banco de trás e passaram para o volante de suas próprias vidas. Só nos resta dizer “bonne route, bonne route”, como naquela canção francesa narrando a emoção do pai quando a filha oferece o primeiro jantar no apartamento dela. Deveríamos ter ido mais vezes à cama delas ao anoitecer para ouvir sua alma respirando conversas e confidências entre os lençóis da infância, e os adolescentes cobertores daquele quarto cheio de colagens, posteres e agendas coloridas de pilô. Não, não as levamos suficientemente ao maldito “drive-in”, ao Tablado para ver “Pluft”, não lhes demos suficientes hambúrgueres e cocas, não lhes compramos todos os sorvetes e roupas merecidas. Elas cresceram sem que esgotássemos nelas todo o nosso afeto. No princípio subiam a serra ou iam à casa de praia entre embrulhos, comidas, engarrafamentos, natais, páscoas, piscinas e amiguinhas. Sim, havia as brigas dentro do carro, a disputa pela janela, os pedidos de sorvetes e sanduíches infantis. Depois chegou a idade em que subir para a casa de campo com os pais começou a ser um esforço, um sofrimento, pois era impossível deixar a turma aqui na praia e os primeiros namorados. Esse exílio dos pais, esse divórcio dos filhos, vai durar sete anos bíblicos. Agora é hora de os pais na montanha terem a solidão que queriam, mas, de repente, exalarem contagiosa saudade daquelas pestes. O jeito é esperar. Qualquer hora podem nos dar netos. O neto é a hora do carinho ocioso e estocado, não exercido nos próprios filhos e que não pode morrer conosco. Por isso, os avós são tão desmesurados e distribuem tão incontrolável afeição. Os netos são a última oportunidade de reeditar o nosso afeto. Por isso, é necessário fazer alguma coisa a mais, antes que elas cresçam.
Recebimento de propina, apropriação de bem público, funcionários fantasmas. Fraudes em licitações, desvio de recursos e superfaturamento. Negligência e facilitação. Corrupção. Essa é apenas parte da lista de muitas investigações conduzidas pelas autoridades da segurança pública e instituições independentes, como o Ministério Público. O alvo: servidores públicos impulsionados e arquitetados por empresários, advogados e políticos que teriam colaborado para tornar os crimes realidade. O MP, as polícias Civil, Militar e Federal, além do órgãos controladores do Estado têm se mantido atentos a práticas delituosas. Reflexo disso é a quantidade de operações e inquéritos conduzidos visando escancarar os delitos praticados.
Adriano AbreuMaria do Livramento Miranda Clementino, cientista social e pesquisadora da UFRN
Operações Sinal Fechado, Pecado Capital, Mensalão da Vila, QI, Judas, Hefesto foram deflagradas recentemente. Ainda existem outros casos mais antigos, mas que permanecem em processo de julgamento: como Hígia e Via Ápia. Em todos esses casos, são investigadas más práticas de funcionários públicos. Eles teriam orquestrado ou facilitado, de alguma forma, diversos tipos de crimes. Há investigações correndo no Tribunal de Justiça do Estado, no Departamento de Trânsito do Estado, na Secretaria de Saúde e no próprio Governo do Estado do Rio Grande do Norte.
Chefes de departamento, diretores-presidentes, procurador jurídico e outros servidores teriam trocados os cargos de confiança, ou as carreiras estáveis, que possuíam no Estado em nome de benefícios, nem sempre regulares. Alguns foram pegos, outros certamente permanecem impunes e na atribuição normalizada das suas funções. Um detalhe comum a todos é o fato de serem de classe média e média alta e terem um elevado grau de instrução.
Apesar das investigações em andamento, o procurador-geral de Justiça, Manoel Onofre Neto, critica o controle interno. Esses órgãos, destacou o procurador em entrevista publicada no dia 29 de janeiro na TRIBUNA DO NORTE, trabalham de "forma superficial e alegoricamente, sempre com a conivência do gestor, que não empresta a atenção devida". Outro problema que Onofre Neto vê é a divulgação muito tímida das prestações de contas. Em 76 municípios do Estado os portais da transparência ainda não foram criados.
O procurador-geral de Justiça considera a autonomia, o fortalecimento, a valorização e a estruturação das unidades de controle interno nos órgãos como providências importantíssimas a serem observadas pelos gestores, sobretudo pela função preventiva e corretiva que elas desempenham. "Muitas vezes, o gestor encara tais unidades como emperradoras dos processos internos, o que é um grande erro".
No final de janeiro, o juiz da 4ª Vara Criminal de Natal, Raimundo Carlyle de Oliveira parece ter dado uma resposta à altura contra a impunidade tão mal vista na sociedade. Na oportunidade, dezesseis pessoas foram condenadas após terem se corrompido em favor de empresas para alterar o Plano Diretor da cidade. Os envolvidos, dentre eles vereadores e servidores da Câmara Municipal, recorreram da condenação.
'Corrupção é uma atividade coletiva'
"Quando você burla as leis, certamente não o faz sozinho. A administração pública possui preceitos e é aí que percebemos que o ato corrupto não é de responsabilidade de uma única pessoa". A análise é de Maria do Livramento Miranda Clementino, cientista social, economista e chefe do Departamento de Gestão de Políticas Públicas da Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Para a especialista, ética e transparência podem auxiliar nas reduções de casos de corrupção investigados recentemente no Rio Grande do Norte. "Ética e transparência caminham juntos. Se não tem transparência, não tem ética. Na missão do gestor público há essa obrigação". A responsável pelo graduação de Gestão de Políticas Públicas da UFRN vai além. Cobra da população uma fiscalização mais ativa e diz que a sociedade acaba por delegar tal responsabilidade a outras instituições. "O Ministério Público é uma instituição que tem credibilidade com a população. Mas nós não podemos nos omitir do mesmo exercício de fiscalização. É o que está faltando". Os recorrentes casos de apuração sobre indícios de corrupção na administração pública ocorre em decorrência de uma maior rigor na investigação. A interpretação da professora Maria do Livramento é detalhada na entrevista que concedeu à TRIBUNA DO NORTE. Confira:
Diversas investigações foram iniciadas durante esse ano e o ano passado em virtude de suspeitas de corrupção na administração pública. A quantidade de inquérito e ações conduzidas pela Polícia Civil, Polícia Militar, Polícia Civil, Ministério Público Estadual e Federal saltaram aos olhos. Estão "roubando" mais ou a investigação está mais rigorosa?
A minha opinião é que se está investigando mais. Isso é o resultado de processos de avanço no sistema democrático brasileiro. A constituição de 1988 completou 20 anos e os instrumentos democráticos permitidos por ela já estão em prática. Com a Constituição de 88 houve uma descentralização das políticas públicas. Na oportunidade, Houveh uma falsa impressão de que tal descentralização teria facilitado a corrupção de recursos públicos. Os gestores públicos tem que se pautar nos princípios básicos da ética e transparência. Com isso e os controles sociais do Estado, sendo operados a contento, a corrupção se reduz.
Como os administradores encaram a responsabilidade de serem éticos e transparentes nas atividades que praticam?
Existem aqueles controles que são operados pelo próprio Estado, com instrumentos fortes regidos por lei para realizar o controle do gasto público. A Lei de Responsabilidade Fiscal, o Portal da Transparência são instrumentos que permitem dar visibilidade ao tratamento da coisa pública.
Onde é preciso melhorar?
O que a gente precisa melhorar são os controles exercidos pela população, os chamados controle social. Isso precisa avançar. A sociedade acaba delegando essa responsabilidade a outras instituições de credibilidade, como o Ministério Público. É preciso que a sociedade se organize e que os conselhos gestores funcionem efetivamente.
Como a senhora avalia o nível de transparência do serviço público no Rio Grande do Norte?
A ética e transparência caminham juntos. Se não tem transparência, não há ética. Na missão do gestor público há essa obrigação. No momento em que não dou a visibilidade necessária aos atos administrativos, estou retendo informações importantes para que o controle por parte da sociedade possa acontecer.
Algumas das investigações que estão sendo conduzidas diz respeito ao trato com a Lei de Licitações - como exemplo a operação Sinal Fechado. Licitação é um tema que demanda atenção especial quando crimes de corrupção são apurados?
Uma questão fundamental de se analisar é a manipulação dos processos licitatórios. A ausência de licitação deve ocorrer sempre em situações extremas, como calamidades públicas. É necessário o aprimoramento da legislação. O controle tem que ser coercitivo. A transparência é importantíssima.
Os esquemas expostos pela polícia judiciária e pelos ministério públicos apontaram a formação de quadrilhas para a suposta concretização dos desvios de recursos. É possível ser corrupto sozinho dentro da administração pública?
Quando você burla, o que supostamente está acontecendo em alguns casos, a corrupção não acontece com uma única pessoa. Isso por causa do princípio que rege a administração pública, a solidariedade. O ato está embasado em quem decide, quem quem faz e quem paga. A decisão coletiva é importante para a garantia do cumprimento correto dos deveres.
A senhora está à frente do Departamento de Gestão de Políticas Públicas. Como o curso criado recentemente debate essas temáticas?
Gerir que dizer fazer, implementar. Nossos alunos são aqueles que, em algum nível da hierarquia pública, tomarão decisões. O curso está pautado nesse princípio que eu falei: ética, transparência e participação. É um curso teórico-prático. Aqui eles treinam em "laboratórios" as implementações das políticas públicas no Brasil devem postar em prática.
Operação Sinal Fechado
(Ministério Público Estadual)
O quê?
Investiga dois casos de fraudes em licitações públicas ligadas ao Departamento Estadual de Trânsito (Detran). A operação chamou atenção pelas autoridades que nela acabaram envolvidas. O suplente de senador João Faustino chegou a ser preso. Os ex-governadores Vilma Maria de Faria e Iberê Ferreira de Souza tiveram o nome diretamente ligados. Empresários, advogados e ex-gestores de repartições públicas ficaram detidos e tiveram que prestar esclarecimentos aos promotores de Justiça.
Quem?
O líder do esquema seria o advogado George Anderson Olímpio da Silveira. Atuava junto a diretores do Detran, como o ex-diretor da autarquia Carlos Theodorico Bezerra e o procurador jurídico Marcus Vinícius Furtado da Cunha. Pessoas eram subornadas com propinas para supostamente facilitar a autação do grupo dentro do Detran. No total, além dos já citados, foram denunciados pelo MP à Justiça 31 pessoas. Empresários e outros advogados compõem a lista.
Como?
São investigadas duas fraudes distintas no Detran. A primeira seria irregularidade no registro de contrato de financiamento de carros junto a cartórios. Apesar de já proibida, a atividade continuava ocorrendo e rendeu milhões a suposta quadrilha. Também foi alvo de uma tentativa de fraude a licitação para a contratação do Consórcio Inspar, que realizaria a inspeção veicular no RN.
Em que ponto está o caso?
O Ministério Público já ofereceu denúncia à 6ª Vara Criminal do RN. A juíza Emanuella Cristina Pereira Fernandes aguarda o remetimento da defesa prévia, a qual tem direito alguns dos denunciados. A investigação do MP pode ser recusada, aceita integralmente ou em parte. A partir daí, tem início os trâmites jurídicos para a realização do julgamento. O advogado George Anderson Olímpio da Silveira e o empresário Édson Cézar Cavalcante permanecem presos.
Operação Pecado Capital
(Ministérios Públicos Federal e Estadual)
O quê?
O caso apura irregularidades e desvios no Ipem/RN no período de 2007 a 2010.
Quem?
Foram presos Rychardson de Macedo, Rhandson Rosário de Macedo Bernardo, Adriano Flávio Cardoso Nogueira, Aécio Aluízio Fernandes de Faria, Daniel Vale Bezerra
Como?
O IPEM contratava pessoas que nunca iam trabalhar. O salário era dividido entre o funcionário fantasma e o esquema. As contratações eram realizadas através da empresa FF Construções e Serviços ME, no valor de R$ 1,4 mil. Desse montante, R$ 1,1 mil ficava com o esquema e R$ 300 com o funcionário fantasma. Nesse bolo, foram contratados "amigos, namoradas, ex-namoradas, parentes de amigos e apadrinhados políticos" de Rychardson de Macedo Bernardo
Em que ponto está o caso?
Rychardson foi liberado durante o mês de janeiro do alojamento em que era mantido na sede do Comando-geral da Polícia Militar. A Operação entrará em nova fase a partir do dia 13 de fevereiro juiz federal Janilson Bezerra Siqueira, que substitui Walter Nunes da Silva Júnior, definiu a data como início dos depoimentos dos réus e de testemunhas
Operação Judas
(Polícia Civil e Ministério Público Estadual)
O quê?
São investigados suspeitos de desvios na divisão de precatórios do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte. Foram presas durante essa semana. Além da prisão, foi decretado a quebra dos sigilos fiscal, bancário e telefônico dos seis suspeitos e o seqüestro dos bens, incluindo as contas bancárias, casa em Natal e na praia de Baía Formosa, carros de luxo, entre outros.
Quem?
Foram presas cinco pessoas, entre elas Carla Ubarana, ex-chefe do setor de precatórios do TJ, e seu marido, George Leal. Além disso, a operação, que contou com sete equipes compostos por promotores, delegados e agentes, realizou busca e apreensão em sete locais. Também foram detidos Carlos Eduardo Palhares, Cláudia Suely Silva e Pedro Luís Neto .
Como?
Suspeita-se que guias de pagamento eram duplicadas e valores milionários eram depositados na conta de laranjas.
Em que ponto está o caso?
A investigação permanece ocorrendo por membros do Ministério Público e Polícia Civil. Agora ocorre a análise dos documentos.
O candidato do PT à prefeitura de São Paulo critica stalinistas, trotskistas, neoliberais e também alguns petistas – por terem atacado Kassab na campanha de 2008
ANGELA PINHO E RICARDO MENDONÇA
Quando o ex-presidente Lula deu os primeiros sinais a favor da candidatura de Dilma Rousseff à Presidência, muita gente desconfiou da viabilidade daquela operação política. Dilma nunca disputara eleição, era desconhecida do grande público e não parecia ter aquela desenvoltura típica dos políticos tradicionais. Agora, os petistas acham que podem repetir o feito com o acadêmico Fernando Haddad, pré-candidato a prefeito de São Paulo, neófito em disputas eleitorais. Depois de morar oito anos em Brasília, ele deixou o Ministério da Educação há dez dias para se dedicar exclusivamente à eleição. Feita em dois encontros, esta foi a primeira entrevista de Haddad após ele desembarcar definitivamente na cidade que quer governar.
ÉPOCA – Lula e Dilma estão dando conselhos ao senhor?
Fernando Haddad – Conversamos frequentemente.
ÉPOCA – Que conselhos eles dão?
Haddad – São observações, preocupações, antecipações...
ÉPOCA – Dê um exemplo concreto.
Haddad – O tipo de ataque que vai ser feito. A presidenta sofreu muitos ataques pessoais, difamação, injúria. Ela fala sobre como lidar com esse tipo de provocação. A vida pública é difícil por esse lado... Você quer fazer um debate de nível, e aí de repente sai alguém com comentários que você nem compreende a intenção. Olha, o maior drama que a presidenta Dilma sofreu foi essa coisa de rebaixar o debate, de usar a crença e a fé das pessoas, estimular a intolerância, criminalizar comportamentos, não se solidarizar com dramas pessoais. A campanha é um momento precioso: a sociedade se reúne em torno da discussão pública. Mas às vezes involui. Ela me dá diversas sugestões de como resistir a eventuais ataques desse tipo.
ÉPOCA – Na última eleição municipal, a campanha do PT perguntou se o prefeito Gilberto Kassab era casado e tinha filhos.
Haddad – Foi um equívoco. O partido reconheceu. E veja a diferença: a campanha admitiu o erro, assumiu o erro e se retratou. É diferente de uma prática que foi usada sistematicamente e da qual não se fez autocrítica até hoje.
ÉPOCA – Por falar em autocrítica, o senhor vai passar a campanha toda respondendo sobre as falhas do Enem.
Haddad – O Enem é um trunfo importantíssimo. Uma de nossas maiores realizações foi inscrever 5 milhões de brasileiros para concorrer a 450 mil vagas na universidade. Acabou com 95 vestibulares. As pesquisas dão conta de um número recorde de aprovação. O Enem americano tem 85 anos e enfrenta problemas até hoje. Não sou estrategista, mas é um tiro na água que vão dar se quiserem acertar no Enem.
ÉPOCA – Ficou a imagem de um exame com problemas de gestão.
Haddad – Uma imagem artificialmente construída. Em 2009, realmente houve um problema grave. Mas depois foram questões muito pontuais. Em 2010, 0,1% das pessoas refizeram a prova à custa da gráfica que errou num lote de impressão. Em 2011, foi um colégio afetado pela questão do pré-teste. Um.
ÉPOCA – O senhor escreveu um livro chamado Em defesa do socialismo. O que é ser socialista?
Haddad – Eu sou um socialista. O socialismo, em minha opinião, tem dois compromissos importantes. O primeiro é a recusa de toda experiência autoritária em nome da igualdade. Entrei no movimento estudantil numa quadra histórica em que ainda havia forte presença de stalinistas e trotskistas. E nunca militei nessas organizações, justamente em virtude do viés autoritário. Então, sou de linhagem mais frankfurtiana, por assim dizer.
ÉPOCA – E o segundo compromisso?
Haddad – É o apreço pela agenda da igualdade, a ampliação de oportunidades, a emancipação dos indivíduos. Pela intolerância em relação à desigualdade e tolerância em relação à diversidade. Até fico impressionado com a quantidade de neoliberais ex-comunistas. É notável. A pessoa é neoliberal, mas foi comunista na juventude, o que revela certa coerência na forma, mas incoerência no conteúdo. Eram autoritários de esquerda, viraram autoritários de direita. E não prestaram contas dessa trajetória. Defendiam o Estado absoluto, defendem agora o mercado absoluto. Então essa recusa ao autoritarismo – estatal ou de mercado – é o apreço pela diversidade e a busca por equalização de oportunidades e combate à desigualdade.
ÉPOCA – A presidente Dilma acabou de ir a Cuba, o que chamou a atenção para a temática dos direitos humanos. É um país que, em sua opinião, preza por essa recusa ao autoritarismo?
Haddad – Direitos humanos é um tema que foi alargado ao longo dos séculos. Nos primórdios, os direitos sociais não eram considerados. Então, até compreendo quando alguém faz referência aos direitos sociais em Cuba, sobretudo no que diz respeito à saúde e à educação. Mas penso que isso não pode servir de pretexto para que outros direitos sejam sonegados. Direitos humanos, na ótica do socialismo moderno, tem de abranger os direitos civis, políticos e os sociais.
ÉPOCA – Então o senhor diria que, em Cuba, os direitos políticos são sonegados?
Haddad – Eles não são tratados de uma maneira tão atenciosa como os direitos sociais.
ÉPOCA – O senhor foi morar em Brasília em 2003, está voltando agora. Nesse intervalo, o que mais mudou em São Paulo?
Haddad – Sem dúvida, o trânsito. É notável como as coisas ficaram mais complexas. E não sei se as pessoas se dão conta, mas a cidade ficou mais escura. Pouca iluminação pública.
ÉPOCA – É impressão sua ou o senhor tem algum dado objetivo?
Haddad – Não, é uma percepção forte de que a cidade está menos iluminada à noite e, portanto, menos segura. Outro dia, falei com pessoas que têm a mesma percepção. Falaram que é o projeto Cidade Limpa, que retirou os outdoors. Aquilo iluminava muito mais do que se supunha.
ÉPOCA – Mas o senhor quer a volta dos outdoors?
Haddad – Não. Da iluminação. Temos de repensar a iluminação para reocupar a cidade à noite. Isso vai trazer segurança.
"O Kassab colocou, em primeiro lugar, uma aliança em torno da candidatura de José Serra. Depois, uma candidatura própria. E falou do PT como terceira alternativa"
ÉPOCA – No transporte, que medidas concretas pretende tomar?
Haddad – Não é questão de prometer. Havia um plano com ênfase forte em corredor de ônibus. Nossa gestão (2001-2004) fez um investimento importante, combinando corredores e bilhete único, mais integração com outros modais. Não houve continuidade. Estou convencido de que São Paulo deve privilegiar o transporte público. Podemos, em parceria com o governo federal, resgatar aquele projeto e atualizá-lo.
ÉPOCA – O PT paulistano sempre fez oposição à gestão do prefeito Kassab. Como agora ele pode ir para seu palanque?
Haddad – O prefeito hierarquizou as prioridades dele, colocando em primeiro lugar uma aliança em torno da candidatura José Serra. Depois, uma candidatura própria. E falou do PT como terceira alternativa. De nosso lado, estamos cumprindo o roteiro como havíamos anunciado, intensificando conversas com os partidos da base aliada do governo Dilma.
ÉPOCA – O senhor descarta uma aliança com o PSD de Kassab?
Haddad – Veja bem: estamos numa eleição complexa, que será decidida, provavelmente, em dois turnos. Nenhuma eleição em São Paulo foi resolvida num turno só. Temos de definir a estratégia com nossos parceiros. Às vezes você pode até descartar uma aliança, mas não pode descartar apoio. Você precisa de apoio para governar. Agora, o que não vou fazer é atropelar o PT. O PT é a força que minha candidatura tem.
ÉPOCA – O senhor já disse que a USP não pode ser tratada como a Cracolândia nem a Cracolândia como a USP. Em relação à atuação da Polícia Militar, como deve ser tratada cada uma delas?
Haddad – A força militar no campus pode gerar estresse desnecessário. Acho que tem de reforçar a segurança nos campi. No MEC, fizemos muito investimento nisso, com empresas de segurança. A UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro) estava com um problema crônico e melhorou muito sem a necessidade de força militar. Depois da prisão dos estudantes (da USP), houve o espancamento de um estudante negro por um policial, que chegou a apontar o revólver para os estudantes.
ÉPOCA – Mas tirar a Polícia Militar da USP não é tratar os alunos como privilegiados?
Haddad – É a questão da especificidade de um campus universitário. O risco é transformar repressão civil em repressão política. Esses limites, dentro de uma universidade, são tênues. A universidade é um lugar de um debate permanente, de contestação permanente. Ela tem a capacidade de formular projetos sobre sua própria segurança. Não é o caso da Cracolândia, onde você tem o tráfico e a presença de crianças.
ÉPOCA – O senhor acha que a ação da PM na USP foi repressão política?
Haddad – Em relação aos meninos indiciados, os três que estavam dentro do carro, de certa maneira foi. O tratamento que eles receberam ali não foi o que deve ser dado a eventuais usuários. Foi um tratamento de cidadão de segunda categoria.
ÉPOCA – E a Cracolândia?
Haddad – A questão da saúde pública ficou subalterna. O que as pessoas corretamente dizem é que, nessas operações, a saúde pública e a assistência têm de estar muito presentes.
ÉPOCA – O ex-presidente Fernando Henrique passou a defender a descriminalização da maconha. O que o senhor acha disso?
Haddad – É um tema que deve envolver especialistas de muitas áreas. Uma visão que está se consolidando é a ideia de que o usuário enfrenta um problema de saúde. A questão da descriminalização é federal. Na prefeitura, o papel é acolher quem precisa de atendimento. Fico um pouco preocupado com essa perspectiva (descriminalização) pelo seguinte: no caso do álcool, a droga é legal, mas a venda para menor de idade é ilegal. Não temos o controle de bebida alcoólica. Vamos mexer (na legislação) sem ter controle sobre uma droga lícita?
ÉPOCA – O descontrole não é maior justamente porque é ilícita?
Haddad – Meu temor é tornar o jovem ainda mais vulnerável. Mas o debate é rico, precisa ser feito.
>>Ricardo Mendonça, um dos autores desta entrevista, no Twitter: @RMendonca09
Moradores do Pinheirinho sentiram a mão pesada da polícia paulista. Foto: Reuters/Latinstock
Uma pergunta perturbadora. Pode ser considerado civilizado um país cuja Justiça determina, sem qualquer motivo de urgência e com emprego de tropa de choque da Polícia Militar, a expulsão violenta dos seus lares de 1,5 mil famílias pobres, com apreensão de todos os seus pertences e uso da tática militar da surpresa e a agravante de não lhes ser ofertado um teto substitutivo de abrigo?
A resposta, por evidente, é negativa. Com efeito, o fato aconteceu no domingo 22, por força de mandado judicial expedido nos autos de uma ação de reintegração de posse em Pinheirinho, na cidade paulista de São José dos Campos, uma área com 1,3 milhão de metros quadrados e cerca de 6 mil moradores, todos sem títulos de propriedade e cuja ocupação daquele espaço remonta a 2004.
A decisão de reintegração foi da juíza da 6ª Vara da Comarca que, num Brasil com direito de matriz romana, se esqueceu de uma velha lição da lavra do jurista e político Giuvenzius Celso Figlio e encartada no Digesto: Jus est ars boni et aequis (o Direito é a arte do bom e do equitativo).
Fora isso, a decisão foi precipitada. Os canais conciliatórios estavam abertos e soluções alternativas justas poderiam ser alcançadas, como, por exemplo, a desapropriação por utilidade social. No particular, havia, além de um protocolo de intenções a tramitar no Ministério das Cidades, um acordo de adiamento da reintegração com prazo de vigência em curso.
Mais ainda, no âmbito jurisdicional existia um conflito de competência entre a Justiça estadual, que determinara a reintegração, e a federal, com liminar a suspender a desocupação. Esse conflito só foi resolvido, em sede liminar, pelo presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e quando a tropa de choque da PM, com bombas e projéteis de borracha, já desalojara mais de 2 mil moradores, com muitas mães, como mostraram as fotografias dos jornais, a carregar os seus pequenos filhos. Esse conflito de jurisdição poderia ter sido motivador, pela Justiça paulista, de adiamento da reintegração. Por parte de Ari Pargendler, poderia esse presidente do STJ usar a sua conhecida arte amistosa de fazer lobby, demonstrada na tentativa de obter uma vaga de ministra para a cunhada, para suspender a reintegração e encaminhar a questão a exame colegiado do STJ. Não se deve olvidar, ainda, que um representante da presidenta Dilma Rousseff estava no Pinheirinho e procurava encontrar soluções definitivas. Em vez de um acordo, o representante federal experimentou lesões provocadas por balas de borracha disparadas pela PM.
Numa ação de reintegração de posse de área grande e com muitos ocupantes, a regra básica a orientar o juiz do processo é buscar, à exaustão, conciliações e evitar medidas traumáticas. A reintegração coercitiva só deve ocorrer excepcionalmente e não era o caso da executada no Pinheirinho. Essa grande e valiosa gleba-bairro, com casas de alvenaria, barracos, comércio e até biblioteca municipal, está registrada como de propriedade da Selecta Comércio e Indústria S.A. No momento, o Pinheirinho integra o acervo ativo da massa falida da empresa, cujo processo de falência se arrasta sem solução por mais de dez anos.
A Selecta era uma holding controlada pelo megaespeculador Naji Nahas, que já quase quebrou a Bolsa de Valores do Rio de Janeiro e acabou indiciado, e preso cautelarmente, na Operação Satiagraha. Essa operação, frise-se, restou anulada em 2011 pelo STJ, sob o leguleio tabaréu de vedada participação, ainda que meramente burocrática e em apoio à repressão à criminalidade organizada por poderosos e potentes, de agentes da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), lotados juntos ao Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República.
Nahas nunca foi condenado criminalmente pela Justiça e beneficiou-se do efeito ampliativo da liminar de soltura concedida pelo ministro Gilmar Mendes em favor do banqueiro Daniel Dantas. Na falência da Selecta não há notícia de crime falimentar e, no Brasil, esses delitos são quase sempre alcançados pela prescrição.
Numa falência, como estabelece a legislação, há previsão para devolução, pagos os credores, de sobras aos sócios e acionistas da empresa falida. Não se descarta isso, com a grande valorização do Pinheirinho. E não é incomum, quando a massa falida possui propriedades em valorização, antigos sócios, por laranjas, comprarem créditos, negociados barato em face da tramitação demorada da falência.
O caso do Pinheirinho, pela iniquidade, faz lembrar Pierre Joseph Proudhon, célebre filósofo e revolucionário. Em 1840, ele publicou o seu primeiro ensaio político-econômico com uma pergunta na capa da obra: “O que é a propriedade?” Para Proudhon, ícone dos socialistas e contrário ao marxismo, “a propriedade é liberdade” e passa a ser condenável quando se torna “poder do homem sobre o homem”. Aí, ele conclui: “A propriedade é um furto”.
O desembarque da presidenta Dilma Rousseff a Pernambuco esta semana, para visitar obras da transposição do Rio São Francisco, é aguardado com ansiedade pelos políticos locais. Acredita-se que somente ela poderá apaziguar as tensas relações entre o PSB e o PT no Estado. De olho na corrida presidencial de 2014, o governador Eduardo Campos tem se distanciado dos petistas. Enquanto o PT se movimenta em Ipojuca, Petrolina e Garanhuns, consideradas bastiões do PSB, Campos retalia e ameaça lançar o ministro da Integração, Fernando Bezerra, na disputa por Recife. A briga está feia. E a esperança é que Dilma ponha ordem na base aliada.