pub-5238575981085443 CONTEXTO POLÍTICO.
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domingo, 26 de junho de 2016

Laura Carvalho faz o melhor resumo do golpe de Michel Temer


26 de junho de 2016 às 13h19
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Quem não cabe no Orçamento do Brasil?
No levantamento realizado pelos pesquisadores Pablo Ortellado, Esther Solano e Lucia Nader em São Paulo, durante as manifestações pró-impeachment do dia 16 de agosto de 2015, dois temas chamaram a atenção.
Entre os manifestantes, 97% concordaram total ou parcialmente que os serviços públicos de saúde devem ser universais, e 96% que devem ser gratuitos.
Já sobre a universalidade e a gratuidade da educação, o apoio foi de 98% e 97% dos manifestantes, respectivamente.
“Isso é um resquício de junho de 2013″, afirmou Pablo Ortellado a uma reportagem do El País de 18/08/2015.
O resultado deste tipo de levantamento, quando somado aos resultados nas urnas das últimas quatro eleições presidenciais, sugerem que o pacto social que deu origem à Constituição de 1988 não foi desfeito.
Ao contrário, as demandas nas ruas desde 2013 e nas ocupações das escolas desde 2015 têm sido por melhorias nos serviços públicos universais, e não pela redução na sua prestação.
A regra Temer-Meirelles prevê que as despesas primárias do governo federal passem a ser reajustadas apenas pela inflação do ano anterior.
Se vigorasse no ano passado, e outros gastos não sofressem redução real, as despesas com saúde teriam sido reduzidas em 32% e os gastos com educação em 70% em 2015.
Pior. Se o PIB brasileiro crescer nos próximos 20 anos no ritmo dos anos 1980 e 1990, passaríamos de um percentual de gastos públicos em relação ao PIB da ordem de 40% para 25%, patamar semelhante ao verificado em Burkina Faso ou no Afeganistão.
E se crescêssemos às taxas mais altas que vigoraram nos anos 2000, o percentual seria ainda menor, da ordem de 19%, o que nos aproximaria de países como o Camboja e Camarões.
“A Constituição não cabe no orçamento”, argumentam seus defensores, na tentativa de transformar em técnica uma decisão que deveria ser democrática.
De fato, há uma contradição evidente entre desejar a qualidade dos serviços públicos da Dinamarca e pagar impostos da Guiné Equatorial.
O que esquecem de ressaltar é que os que pagam mais impostos no Brasil são os que têm menos condições de pagá-los.
Se os que ganham mais de 160 salários mínimos por mês tem 65,8% de seus rendimentos isentos de tributação pela Receita Federal, fica um pouco mais difícil determinar o que cabe e o que não cabe no orçamento.
O fato é que as propostas do governo interino não incluem nenhum imposto a mais para os mais ricos, mas preveem muitos direitos a menos para os demais.
Os magistrados conseguem reajuste de seus supersalários, mas a aposentadoria para os trabalhadores rurais é tratada como rombo.
A cultura, a ciência e a tecnologia ou o combate às desigualdades deixam de ser importantes.
O pagamento de juros escorchantes sobre a dívida pública não é sequer discutido, mas as despesas com os sistemas de saúde e educação são tratadas como responsáveis pela falta de margem de manobra para a política fiscal.
Essas escolhas estão sendo feitas por um governo que não teve de passar pelo debate democrático que só um processo de eleições diretas pode proporcionar.
A democracia caberia no orçamento. O que parece não caber é a nossa plutocracia oligárquica.
(Publicado originalmente no site Viomundo)

Charge!Aroeira via Facebook

Editorial: A desproporcional - e talvez inadequada - reação do Governo do Estado às denúncias do cantor André Rio.



Cada dia fico mais convencido sobre a absoluta ausência de espírito público dos nossos gestores. Além do espírito público, possivelmente, também deve faltar outras coisas, até mesmo habilidade política, porque essas medidas de força apenas ampliam o desgaste desses gestores junto à opinião pública, quando o mais correto seria ouvir as denúncias, as queixas da população e corrigir possíveis falhas na gestão da máquina, caso isso seja verificado, cumprindo aqueles princípios fundamentais que regem o serviço público, inclusive o direito do cidadão em fiscalizá-lo.

Essas considerações vem a propósito da reação do Governo do Estado de Pernambuco ao vazamento de um áudio, supostamente atribuído ao cantor André Rio, que criculou pelas redes sociais, onde se escuta alguém denunciando um esquema de propina existente em órgãos públicos do Estado, como Fundarpe e Empetur, ligados às Secretarias de Cultura e a Secretaria de Turismo, Esporte e Lazer, onde os artistas seriam contingenciados a assinarem contratos já sabendo que 50% do valor ficaria nas mãos dos operadores do esquema. É isso ou não tem contrato.  

Surpreende, neste caso, a reação dura do Governo do Estado, informando que abrirá um processo contra o cantor, assim como o pedido de instauração de investigação policial no sentido de se obter mais informações sobre este tal áudio. Aliado a essas medidas,  estão sendo veiculado manifestos de artistas informando que os órgãos do Estado agem com absoluta lisura na condução desses contratos, como se estivéssemos diante de uma "Guerra Santa', com o claro propósito de desacreditar o artista que fez a denúncia. Um desses manifestos leva a assinatura do cantor Alceu Valença, que negou que endossasse o documento.  

Creio tratar-se de uma reação desproporcional - de certa forma até intimidatória - o que não nos surpreenderia, em razão de precedentes anteriores. Não é de hoje que denúncias dessa natureza circulam pela imprensa, pelas redes sociais, aqui e alhures, independentemente de colorações partidárias. Shows contratados e não realizados tornaram-se um dos mecanismos mais eficazes de desvios de recursos públicos. Shows superfaturados tornaram-se uma praga em todo o Brasil, daí se entender que as denúncias veiculadas nesse vídeo poderiam traduzir uma nebulosa e incômoda realidade, o que, mesmo procurando preservar-se, deveria levar o poder público não ficar na defensiva, mas adotar todas as medidas necessárias no sentido de esclarecer esses fatos e punir, com rigor, aí sim, os agentes públicos ou intermediários que, por acaso, estejam levando alguma vantagem nessas transações. 

Seria o caso de abrir a 'caixa preta" desses contratos, tornando-os mais transparentes para a população, quem sabe através de uma CPI na Assembleia Legislativa do Estado, onde o Deputado Estadual do PSOL, Edilson Silva, já teria pedido explicações ao Governo do Estado sobre o assunto. O áudio vazou sem a autorização do cantor, mas é pouco provável que ele esteja mentindo, posto que essas denúncias, somente aqui no Estado, em tempos passados, chegaram limite de afastar do seu cargo um Secretário de Estado. Esses nossos gestores parecem sofrer de pouca memória também. 

Se os atores políticos que exercem função pública, de fato, desejam equacionar o problema, talvez fosse o caso de convidar o cantor André Rio para longa conversa no Campo das Princesas, através de um convite, nunca através de uma "intimação", motivada por uma denúncia que apenas precisa ser apurada com o devido rigor. No dia seguinte, um pouco mais calmo, o cantor André Rio voltou a falar sobre o assunto e entrou em cena a figura dos "intermediários', o que poderia excluir, a princípio, o envolvimento de agentes públicos nessas transações irregulares.  

sábado, 25 de junho de 2016

Editorial: Já estamos num Estado Policial no Brasil




A concepção dos três poderes sempre foi pensada pelos teóricos da democracia no sentido de que chegássemos a um equilíbrio de forças onde um poder pudesse exercer uma espécie de controle sobre os excessos ou equívocos cometidos por um dos poderes, permitindo que as minorias fossem respeitadas, que os direitos do cidadão fossem devidamente assegurados, enfim, que os arbítrios e ilegalidades fossem evitados. No quadro de instabilidade política que estamos vivendo, no entanto, tornou-se comum a expressão do tipo; não adianta recorrer ao ... ou ao ... porque eles são o golpe. Eles estão patrocinando o Estado de Exceção. Infelizmente chegamos a este estágio no Brasil, onde as instituições que deveriam preservar os princípios constitucionais e legalistas foram as primeiras a desrespeitá-los. 

Ainda no dia de ontem li um desses artigos ingênuos onde o articulista sugeria que as urdiduras de caráter golpistas poderiam ter dado uma trégua, como se eles, por iniciativa própria, resolvessem recuar de seus propósitos. Isso não irá ocorrer nunca, uma vez que golpes não se interrompem pela boa vontade de seus operadores, até porque eles nunca estiveram bem intencionados. Creio que até já escrevemos por aqui algum editorial tratando dessa questão, nos perguntando sobre os reais propósitos dessa gente. Os que sugerem essa "pausa", logo são surpreendidos, no momento seguinte, com ações espetaculares do aparato policial, como aquela que ocorreu na invasão da sede do Partido dos Trabalhadores, em São Paulo. 

Já estamos vivenciando um Estado Policial no Brasil. Até onde se sabe, a ações da PF na residência da senadora Gleisi Hoffman, por exemplo, que possui foro privilegiado, deixaram de cumprir um rito básico: não havia um mandado com o aval do STF, como se exige nesses momentos, pois apenas o STF poderia autorizar, neste caso, as mandados de busca, prisão ou condução coercitiva envolvendo uma senadora da República. Por outro lado, partindo-se de uma racionalidade, como entender aquele aparato de policiais na sede do Partido dos Trabalhadores, em São Paulo, apenas para cumprir mandado de busca e apreensões de documentos? Aquelas roupas camufladas indicam tratar-se da força de elite da Polícia Federal, utilizada numa simples operação de apreensão de computadores e documentos. 

Os golpistas sabem como agir. Sempre souberam. Estão muito bem instruídos. Até receitas de canjica os incautos telespectadores poderiam acompanhar na grade de programação de uma certa emissora que os patrocinam enquanto eles preparavam, na surdina, mais um bote contra a democracia, dando o recado de que não aceitarão outro resultado na votação definitiva do Senado Federal que não a confirmação do afastamento definitivo da presidente Dilma Rousseff. Infelizmente, como já afirmou o filósofo Gabriel Cohn, em artigo publicado aqui no blog, já dormimos o sono político que produziu o monstro. 

Desde as repressões duras do aparato policial durante as Jornadas de Junho de 2013 que o filósofo romeno Zizek já nos alertava sobre uma tendência a um "endurecimento" ao exercício do poder político. O "pé na porta", como observa Fernando Brito, do Tijolaço, antes uma prerrogativa utilizada pelo aparato policial nas favelas, hoje parece que já começa a generalizar-se, sobretudo quando se trata de forças sociais ou políticas que poderiam esboçar alguma resistência às urdiduras de caráter golpista. Naquelas Jornadas de Junho, como observou Zizek, as vinhas da ira já estavam sendo plantadas, com o aparato policial cometendo uma série de arbítrio, transformando a sagrada presunção de inocência em presunção de culpa, ilegalmente prendendo pessoas sob o argumento de que elas poderiam vir a cometer algum delito. A moda parece que pegou. Somos todos suspeitos. Tomem cuidado!  


Charge! Aroeira via Facebook

sexta-feira, 24 de junho de 2016

Áudio vazado nas redes sociais denuncia suposto recebimento de propina nos contratos celebrado entre os artistas e órgãos públicos no Estado.



O mundo artístico do Estado encontra-se em polvorosa, depois do vazamento de um áudio - atribuído ao cantor André Rio - sobre o suposto pagamento de propina a agentes públicos, através de contratos celebrados com órgãos como a Fundarpe e a Empetur, ligadas, respectivamente, às secretarias de Cultura e Turismo do Governo do Estado de Pernambuco, onde a 50% do valor acordado ficaria retido, de forma irregular, pelos operadores do esquema. Caso a denúncia seja confirmada, estaremos diante de um outro escândalo de proporções gigantescas, envolvendo a gestão socialista.

Os artistas estão "divididos". Alguns deles endossam as declarações do áudio - supostamente atribuídas ao cantor André Rio, registro - enquanto outros fizeram declarações confirmando a lisura na relação com os órgãos do governo, afirmando que jamais foram acionados com essas propostas. Marcelino Granja, Secretário de Cultura do Estado, que andava meio sumido das redes sociais, voltou com a carga toda, diante dessas denúncias, para anunciar que o cantor será acionado juridicamente. Isso, num primeiro momento, depois de ambas as secretaria soltarem uma nota informando que realizam esses contratos seguindo todas a orientações de órgãos como o Tribunal de Contas do Estado. 

Mas, logo em seguida, como que admitimos a possibilidade de alguma irregularidade, informou que irá instaurar os chamados inquéritos administrativos contra agentes públicos, caso seja confirmada a veracidade da informação. Embora do ponto de vista procedimental não se esperava dele outra atitude, é o curioso observar o expressivo número de internautas - do campo cultural - se manifestando sobre o assunto e, o mais grave, confirmando a existência dessa prática desde longas datas.   

O quilombo que parou um porto


Pequeno grupo de comunidades tradicionais do Pará conseguiu suspender licenciamento até que moradores locais sejam escutados sobre impactos da obra

Isaell Carvalho/Repórter Brasil
Quilombolas
Quilombolas vivem da pesca no rio Amazonas, onde deve ser construído o porto.
Por Piero Locatelli, de Santarém 
Mais de quatrocentasfamílias quilombolas eram invisíveis para os produtores de soja que pretendem construir um porto nas margens do Rio Amazonas, no trecho em que suas águas banham o estado do Pará. Os estudos ambientais do Porto do Maicá, em Santarém, afirmavam “não existir nenhum território quilombola na área diretamente afetada do empreendimento”. Mas, a menos de cinco quilômetros do local previsto para o porto, sete comunidades quilombolas dependem do rio para sobreviver.
Até então ignoradas, essas comunidades conseguiram obrigar o empreendimento a enxerga-las. O licenciamento da obra foi suspenso até que quilombolas e outras populações tradicionais da região do lago do Maicá sejam ouvidos pelo governo e pela empresa construtora do porto, a Embraps (Empresa Brasileira de Portos de Santarém). Eles foram obrigados a fazer o processo de consulta às comunidades da região, conforme estabelece a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho.
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O movimento de resgatar a identidade quilombola não é restrito ao local, mas representa uma dinâmica de diversas comunidades no país. (Mikaell Carvalho / Repórter Brasil)
Os quilombolas de Maicá formam um grupo pequeno, mas conseguiram um feito grande. Apesar de ter sido assinada pelo Brasil há quatorze anos, a aplicação da convenção ainda é uma novidade, e pode mudar a forma como todas as comunidades são tratadas por empreendedores no país inteiro. O documento determina que comunidades tradicionais sejam consultadas “cada vez que sejam previstas medidas legislativas ou administrativas suscetíveis de afetá-los diretamente”.
João Lira, um dos líderes da comunidade Murumuru, explica o que a letra fria da convenção significa para os quilombolas: “Eles [empresários] acham que ainda está no tempo de empurrar tudo goela a baixo, que a gente tem que aceitar calado. Mas nós sabemos que eles precisam nos ouvir, nos respeitar, e nos consultar.”
“Informações apresentadas pela Embraps demonstram o discurso carregado de uma visão colonialista e ultrapassada”
Depois de serem ignoradas pelos estudos de impacto do empreendimento, as comunidades reivindicaram o direito de serem consultadas ao Ministério Público Federal. Pedindo a suspensão do licenciamento enquanto não houvesse a consulta, duas procuradoras entraram com uma Ação Civil Pública contra a União, o estado do Pará, a empresa e a Agência Nacional de Transportes Aquaviários (ANTAQ).
As procuradoras questionam se a empresa ignorou os quilombolas por “mera incompetência” ou vontade de deixá-los invisíveis. Na ação, consta que “informações apresentadas pela Embraps demonstram o completo desconhecimento da temática […] e discurso carregado de uma visão colonialista e ultrapassada.” Um juiz federal aceitou o pedido em 12 de abril de 2016, e o processo da obra está parado desde então.

Por que quilombolas?

Os quilombolas do Maicá só conseguiram ser consultados graças a um processo que começou há mais de uma década, quando os descendentes de escravos dessa região começaram a reivindicar as suas origens e, consequentemente, os seus direitos.
Desde a Constituição de 1988, os “remanescentes das comunidades dos quilombos” têm direito à propriedade definitiva das suas terras. Mas foi só no começo da década passada que as comunidades do Maicá começaram a ter conhecimento dos seus direitos.  João Lira diz que, antes disso, eles possuíam vergonha do seu passado, e se reconheciam somente como ribeirinhos. “No passado, a sociedade tentava colocar na nossa cabeça que nós tínhamos que esquecer o sofrimento do nosso povo. Com o surgimento do movimento quilombola, resgatar o passado se tornou um [motivo de] orgulho,” diz João Lira.
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Para Mário Pantoja, os quilombolas começaram a viver a “cultura de terceiros” ao longo do tempo. (Mikaell Carvalho / Repórter Brasil)
As comunidades começaram a ser reconhecidas pelo Estado graças à sua organização. Desde o final da década de 1990, eles formaram associações de moradores e começaram um diálogo maior com comunidades de outras regiões. Entre 2003 e 2007, sete delas foram certificadas pela Fundação Palmares, órgão do Governo Federal. Dentre elas, duas já foram delimitadas pelo Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) e aguardam o decreto que desapropria os terrenos de fazendeiros e outros posseiros que se encontram nas suas terras.
O movimento de resgatar a identidade quilombola não é restrito ao local, mas representa uma dinâmica de diversas comunidades no país, intensificado desde 2003, quando foi regulamentado o processo de demarcação das terras quilombolas pelo governo federal. Um movimento que costuma provocar uma pergunta polêmica: por que, afinal, um grupo se considera quilombola?
O simples fato da pergunta ser feita já incomoda Mário Pantoja de Souza, líder da associação da comunidade Murumuru. Ele explica: “se você é negro, você é olhado com preconceito. Se você é moreno ou claro, então você não é quilombola, porque você não é negro”. As casas onde eles moram, muitas vez de alvenaria e com luz elétrica, e a música mais ouvida no local, o arrocha, tampouco se encaixam em um estereótipo ligado à escravidão do passado. “Ao longo do tempo, nós aprendemos a viver a cultura de terceiros,” diz Mário. Ele conta que, hoje, a sua comunidade educa os mais jovens, para que eles tenham orgulho de serem quilombolas.
“No passado, a sociedade tentava colocar na nossa cabeça que nós tínhamos que esquecer o sofrimento do nosso povo. Com o surgimento do movimento quilombola, resgatar o passado se tornou um [motivo de] orgulho”
Em sua maioria, as comunidades foram formadas por escravos que fugiram de fazendas de cacau e se estabeleceram nas margens do rio Amazonas.  Hoje, os quilombolas que moram naqueles mesmos lugares vivem principalmente da subsistência, complementada por programas sociais e a venda do peixe, açaí e farinha. Esse modo de vida, que é distinto dos habitantes das cidades, é o que buscam proteger se opondo ao projeto do porto.

O desenvolvimento dos outros

O modo de vida dessas comunidades está em risco por um desejo alheio às necessidades delas: a busca por um caminho mais curto para a soja brasileira sair do país. Com a construção do porto, seria possível diminuir em cerca de 800 quilômetros o trajeto feito por terra pelos grãos que saem do Mato Grosso e, atualmente, necessitam passar pelo Porto de Santos. A alternativa de passar pelo Porto do Maicá, em Santarém, encurtaria em sete dias o tempo que os barcos levam para chegar à Europa. “Isso significa muito para o produtor e para o país, para a redução do custo Brasil. Você acaba investindo esse dinheiro em outra coisa, e vai gerar renda, emprego”, argumenta Pedro Riva, produtor de soja e dono de 75% da empresa que pretende construir o porto. Riva estima que serão gerados 700 empregos diretos na construção, e outros 70 posteriormente.
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Caminho que será feito pela soja antes de ser exportada. (Reprodução/Embraps)
O porto é parte de uma série de projetos com o mesmo objetivo: escoar a produção agrícola brasileira para o mercado internacional. Duas empresas estrangeiras já mostraram interesse em construir outros terminais em Santarém, o que complementaria outras rotas abertas na região. Uma delas é a construção de uma ferrovia paralela à BR-163, que permitiria levar a soja por trilhos do Mato Grosso até a cidade de Itaituba, noroeste do Pará. A outra seria uma hidrovia pelo rio Tapajós, que permitira transportar os grãos mato-grossenses pelo rio até Santarém, de onde podem ir direto para outros continentes.
As promessas de renda e emprego para a população local, que acompanham todas essas obras, são vistas de forma cética pelos quilombolas da região. “O que a gente reivindica é que o empreendedor venha não somente mostrar as coisas boas. Nós queremos saber as coisas ruins que vão acontecer com a construção desse e de outros portos” diz Mário.

“Coisas ruins”

Boa parte das ‘coisas ruins’ ficaram de fora do Estudo de Impacto Ambiental (EIA) da Embraps, onde os impactos já deveriam ter sido detalhados. Advogada da ONG Terra de Direitos, que presta assessoria jurídica às comunidades, Layza Queiroz afirma que os quilombolas navegam hoje um “mar de incertezas” sobre o projeto, mas algumas das consequências da construção já são previsíveis.
“O que a gente reivindica é que o empreendedor venha não somente mostrar as coisas boas. Nós queremos saber as coisas ruins que vão acontecer com a construção desse e de outros portos”
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Barcos em Santarém, onde os quilombolas levam seus peixes para a venda. (Mikaell Carvalho/Repórter Brasil)
Um deles seria o impacto sobre a pesca. O estudo não afirma que medidas serão tomadas para a preservação dos peixes, responsáveis pela sustentação diária das comunidades. A empresa se resume a dizer que serão tomadas medidas de proteção às espécies em risco de extinção no rio Amazonas, ou seja, somente duas das mais de 150 que vivem ali.
Os quilombolas ainda temem que a área aterrada pelo porto possa afetar a reprodução dos peixes, já que o lago funciona como um berçário. “A preocupação não é agora, é daqui a dez anos: como é que vamos alimentar nossos filhos, nossos netos?”, pergunta João Lira. O advogado da empresa, Andrew Raseira, afirma que as obras “não devem assorear” o terreno e impactar a reprodução dos peixes.
O estudo da empresa também não fala sobre como a obra afetará a navegação dos quilombolas. Zé Maria, morador da comunidade de São José do Itaqui, só possui acesso à sua casa pelo rio. Com a construção, ele teme não conseguir chegar mais à cidade pelo seu caminho diário. “Assim como a gente vai levar alimentos, a gente também vai buscar,” diz o líder da comunidade, preocupado. Ele receia que o porto o faça desviar pelo braço mais forte do rio Amazonas, um caminho mais longo e perigoso para pequenas embarcações. O advogado da empresa afirma que, como as esteiras serão suspensas, e as embarcações poderão passar por baixo dela, a obra não deve afetar a navegação dos quilombolas.
Outra preocupação é com a estrada que será aberta pela prefeitura para levar uma grande quantidade de caminhões ao local. Quilombolas entrevistados pela reportagem temem que o tráfico de caminhões tenha consequências para as comunidades, como poluição ambiental e sonora. Somente o pátio de triagem tem capacidade de receber 938 caminhões por dia.
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Pedro Martins, advogado da Terra de Direitos, afirma que a falta de titulação agrava os outros problemas dos quilombolas. (Mikaell Carvalho/Repórter Brasil)
Os estudos da empresa afirmam que a estrada não provocará “impactos significativos nas populações residentes do entorno da área do empreendimento.” Eles também argumentam que “todos os equipamentos com alta capacidade de emissão de ruídos serão alvo de isolamento acústico”.
“Foram empregos só no início das obras. Depois, a gente só vai ficar com o desemprego e com as mazelas que o projeto vai trazer”
A promessa é vista com ceticismo. João Lira acredita que o projeto não irá trazer “nenhum benefício” para as comunidades da região. Ele faz um paralelo com o porto da empresa multinacional Cargil, construído em 2003. “Foram empregos só no início das obras. Depois, eles trazem a mão-de-obra especializada, gente de outros estados, de outras regiões ou até de outros países. Aí a gente só vai ficar com o desemprego e com as mazelas que o projeto vai trazer.”
A construção do porto também deve agravar outro problema no local: a falta de titulação das terras das comunidades. Com a construção, a expectativa é de que o preço da terra suba na região. Isso tornaria mais difícil a retirada de fazendas que estão dentro de áreas quilombolas. De acordo com o processo de titulação, essas fazendas ainda devem ser indenizadas pelo poder público a valores de mercado, explica o advogado Pedro Martins, da Terra de Direitos. Depois que o porto for construído, essa indenização deve ficar ainda mais cara, e portanto, improvável de ser quitada pelo governo federal.
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Quilombolas fazem paralelo entre o Porto do Maicá e o terminal construído pela Cargil no começo da década. (Lilo Clareto/Repórter Brasil)

Como será a consulta?

Todos esses problemas jamais foram apresentados às comunidades, e a aplicação da Convenção 169 surge justamente como uma garantia de que a população local tenha conhecimento detalhado dos impactos, possam opinar sobre a obra, contribuindo com seu conhecimento do local,além de  reivindicar compensações para quem for afetado por elas , propor mudanças fundamentais no projeto e até mostrar uma posição contrária à construção.
Mas, dependendo da forma como ela for feita, a consulta pode se tonar inócua. A decisão judicial não estabelece detalhes sobre o processo, resume-se a afirmar que o licenciamento deve ser suspenso “até que seja demonstrada a efetiva realização do procedimento de consulta livre, prévia e informada às populações quilombolas e tradicionais situadas na sua área de influência direta”.
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Quilombolas tem forma de organização própria que deve ser respeitada na consulta. (Mikaell Carvalho/Repórter Brasil)
Para a procuradora Fabiana Schneider, responsável pelo caso, são as próprias comunidades que devem dizer como a consulta deve ser feita. Segundo ela, só assim a forma de se organizar de cada uma delas será respeitada. Para isso, deve ser elaborado um protocolo de consulta: documento com detalhes sobre como, onde e de que forma eles devem ser ouvidos. “Cada comunidade vai ter uma forma de decisão. Uma decisão coletiva, ou uma forma de decisão centrada na sua liderança, seja um cacique, seja uma liderança quilombola, então essa é a forma que não é dita por nós. Não somos nós que vamos decidir por eles,” diz a procuradora. Atualmente, a Federação das Organizações Quilombolas de Santarém já elabora um protocolo de consulta.
Já a Embraps se adianta à elaboração das regras pelas comunidades. Pedro Riva afirma já ter contratado uma empresa para a consulta. Sem detalhar como ela será feita, ele conta que os trabalhos “já foram iniciados”, e somente aguarda uma autorização da Fundação Palmares. “Está tudo prontinho. Aí espero que o Ministério Público nos libere para marcar essa audiência pública e fazer acontecer,” diz o produtor de soja.
Presidente da Federação das Organizações Quilombolas de Santarém, Dileudo Guimarães não acredita que a consulta proposta por Riva possa funcionar. Assim como a maioria dos quilombolas ouvidos pela reportagem, ele vê  o processo como uma oportunidade de descobrir e mostrar porque eles serão prejudicados pela obra.
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Dileudo vê a consulta como uma oportunidade de mostrar porque eles serão prejudicados pela obra. (Mikaell Carvalho/Repórter Brasil)
O maior desafio da consulta é equilibrar, na mesma balança, forças díspares. De um lado, um dos maiores setores econômicos do país com o argumento do desenvolvimento. De outro, comunidades que vivem de modo sustentável e que, devido aos impactos do empreendimento, seriam obrigadas a deixar o local onde vivem para engrossar as periferias das cidades.
A decisão passa por um elemento delicado que as populações das cidades costumam ter dificuldade em entender: a sobrevivência de um modo de vida. Mesmo assim, Mário explica e espera ser ouvido: “se a gente perder isso aqui, é praticamente perder a nossa vida”.
A reportagem foi corrigida em 22/06/2016, pois informava incorretamente que o MPF entrou com Ação Civil Pública contra o Incra e a Fundação Palmares. Os dois órgãos foram somente intimados a informar “o interesse em integrar o polo ativo da demanda” pelo MPF e pelo MPE/PA.
*Publicado originalmente em Repórter Brasil

Editorial: O mistério em torno da morte do 5º elemento da Operação Turbulência. Chamem o Sanguinetti!





Naquele rumoroso escândalo de corrupção que culminou com o afastamento do presidente Fernando Collor de Mello da presidência da República, através de um processo de impeachment - este com fundamentação jurídica -, foi assassinado, juntamente com a namorada, em sua casa na praia de Guaxuma, no litoral alagoano, o senhor Paulo César Farias, o PC Farias, num caso típico dos melhores romances policiais. Bastou a notícia de sua morte ser confirmada e o aparelho de Estado, através de seus agentes, anunciou imediatamente que a sua morte teria sido provocada por sua namorada, Suzana Marcolino, que o teria matado e, logo depois, cometido suicídio. 

Para que essa versão fosse confirmada, convidaram o legista Badan Palhares, à época, aquele ator com o maior "capital simbólico" naquele campo específico, uma autoridade respeitada mundialmente, com livros publicados, professor de uma grande universidade, com convites para dar palestras em todo o mundo. Convidado àquele Estado, Badan foi tratado como uma estrela, com direito a passeios de lanchas pelo litoral, hospedagem nos melhores hotéis, saboreando, certamente, petiscos marinhos acompanhados de um bom whisky. Defendeu essa tese até às últimas consequências, embora tenha sido contestado por dois outros peritos, Ricardo Molina e George Sanguinetti, este último do próprio Estado, que passou a desconfiar desta tese pela pressa do aparelho de Estado em apresentá-la como conclusiva. 

Por remar contra a maré, Sanguinetti enfrentou muitas dificuldades em se contrapor a esta versão oficial, inclusive no que concerne à faculdade de acesso às provas do crime. Seus elementos periciais, no início, se limitavam, praticamente, a algumas fotos da cena da crime. Mesmo assim, seus argumentos foram ganhando força junto à opinião pública, que passou a ouvi-lo, convidá-lo para debates. Nesses debates, ele sempre se saía muito bem, contestando as teses levantadas pelo senhor Badan Palhares, de forma cabal, apontando os erros técnicos de suas conclusões. No final, poderíamos afirmar que a versão oficial do caso ficou totalmente desmoralizada, mesmo que, a princípio, contestada por uma figura apresentada à época como "folclórica". 

No curso da Operação Turbulência, por uma dessas ironias do destino, Pernambuco passou a ter também o seu "PC", o empresário Paulo César Barros Morato, um dos principais envolvidos nas investigações da Polícia Federal, no âmbito da Operação Turbulência, que foi encontrado morto aqui num motel da cidade de Olinda. Na Terça-Feira, quando foi desencadeada a operação, a capital e a região metropolitana do Recife foi palco de uma megaoperação da PF, envolvendo 200 policiais, com dezenas de mandados de busca e condução coercitiva, além de 05 mandatos de prisão preventiva, dos quais 04 deles foram cumpridos, restando um, exatamente o de Paulo César Barros Morato, desde então, dado como foragido pela Polícia Federal. Era o quinto elemento, um ator dos mais relevantes no contexto da engrenagem de operações da quadrilha, com um vasto conhecimento sobre seus métodos. 

Pelos cálculos da PF, as irregularidades cometidas por essa quadrilha teriam movimentado a fabulosa quantia de 600 milhões de reais, entre ilícitos como lavagem de dinheiro, desvios de recursos públicos, pagamento de propina e caixa dois de campanha, onde suspeita-se que, possivelmente, teria sido beneficiado o ex-governador Eduardo Campos, na campanha que o conduziu ao Palácio do Campo das Princesas, nas eleições de 2010. O esquema era muito bem azeitado, de onde se pode concluir que continuariam agindo, favorecendo o então candidato presidencial, morto numa aeronave que pertenceria a um desses empresários envolvidos. Antes de mais nada gostaríamos de informar que quem chegou a essas conclusões foi a Polícia Federal. 

Por enquanto, a morte do empresário está envolta num grande mistério. De acordo com os funcionários, no momento em que a operação se desenrolava, na manhã da Terça-Feira, por volta das 11:30 horas, Paulo César Barros Morato se trancou no hotel, começando a levantar suspeita pelo tempo de permanência, assim como pelo mau cheiro que começou a exalar do quarto onde ele estava hospedado. A Polícia Civil do Estado esteve no local, realizou os procedimentos de praxe e manteve o silêncio sobre o caso.

Mas, começaram a surgir alguns elementos intrincados nesse caso, como se não bastassem o enredo em que ele já está envolvido. Circulou a versão de que a Polícia Técnica do Estado teria sido recomendada a interromper o trabalho que realizava no local, sem uma justificativa aparentemente aceitável. Até o momento, a linha de investigação remete sempre à possibilidade de uma morte natural, talvez causada por algum problema cardíaco. Um médico legista teria descartada essa hipótese. Hoje, dia 24,  um jornal local especula, com base na ouvida de um legista do IML, sobre a possibilidade de envenenamento. Vários pen drives e celulares foram apreendidos no quarto do hotel e encaminhados para a Polícia Federal. Sugere-se que ele estava fugindo com provas importantes, se é que essas informações ainda estejam nesses pen drives e celulares. Vamos torcer que eles ainda contenham algumas informações que possam ajudar nas investigações, mas creio que já está  na hora de convidarmos o Sanguinetti. 

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Turbulência no mundo político pernambucano. Um acidente de 600 milhões de reais.

P.S.: do Realpolitik: Algum tempo depois, comprovada a inconsistência do laudo técnico apresentado pelo médico legista Badan Palhares, a justiça de Alagoas reabriu o caso PC Farias, levando a julgamento os quatro policiais militares que faziam sua segurança, sob a suspeita de terem participado do duplo homicídio. No final do julgamento, os acusados foram inocentados por "clemência". O laudo técnico emitido pelo médico legista da Unicamp, quando confrontado com os argumentos do também médico legista George Sanguinetti, foi vergonhosamente refutado. Naquele caso específico, hoje parece não haver mais nenhuma dúvida de se tratou de um duplo homicídio. Peritos e médicos legistas de todo o país, no final, acabaram convencidos pelos argumentos de George Sanguinetti: As cenas do crime foram completamente alteradas no sentido de sugerir um crime passional; não se cometem crimes passionais com com apenas dois disparos letais. Nesses crimes, imbuído do ódio, o matador costuma dar vários disparos; a trajetória da bala que matou PC Fárias não condizia com a estatura física (altura) de Suzana Marcolino. Neste caso, até o Badan Palhares admitiu que os seus argumentos iam por terra caso não fosse correta as medidas que ele possuía sobre a verdadeira altura de Suzana. O problema é que ninguém mais encontrou qualquer registro sobre a verdadeira altura de Suzana. Nem no IML, tampouco numa academia que ela frequentava. Essas informações sumiram; Sanguinetti teria encontrado indícios do homicídio de Suzana, mas, justamente essas evidências - um ossinho que fica abaixo do ouvido - foi levado pelo legista paulista, possivelmente como "lembrança" do caso. 

O caso do Paulo César Morato, o PC Pernambucano, também não deixa de ser emblemático. Reportagem do jornal Folha de Pernambuco, de hoje, dia 25, informava que tudo conduz para a comprovação de que ele, de fato, era apenas um "laranja" a serviço dos megas operadores do esquema. Morava de aluguel, em Tamandaré, onde possuía uma loja de conserto de celulares. Seria um disfarce? Quanto à sua morte, ainda nada conclusivo. O familiares ainda não compareceram para reconhecer o corpo.   

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quinta-feira, 23 de junho de 2016

Editorial: O espetáculo midiático da Operação Custo Brasil



Politicamente, nos colocamos à esquerda do PT. Quem acompanha nossas postagens aqui pelo blog sabe que, não raro, estamos apontando os equívocos do partido, seja nas suas concepções teóricas, organizacionais ou mesmo nas suas práticas de governo, que acabaram desfigurando o partido ao longo de sua história, fato comprovado pela crescente "esquizofrenia" de sua burocracia dirigente em relação às bases sociais fundadoras da agremiação. Hoje, alguns atores relevantes da agremiação já esboçam a necessidade de fazer este caminho de volta. Se a esquerda precisa ser reinventada, o PT precisa ser recriado. Por outro lado, não deixamos de enaltecer os acertos do partido, que não foram poucos. 

Por outro lado, não dá para acompanhar o espetáculo e as urdiduras que estão por trás dessa Operação Custo Brasil, uma espécie de desdobramento da Operação Lava Jato. Se há irregularidades, elas precisam ser apuradas e os responsáveis punidos, não importa se deste ou daquele partido. Trata-se de um princípio. Agora não deixa de ser escandaloso observar um sujeito como Eduardo Cunha solto e um Paulo Bernardo preso, principalmente nessas circunstâncias: na medida em que se aproximam a votação definitiva sobre o afastamento da presidente Dilma Rousseff no Senado Federal; marcada por mais um espetáculo midiático, como a enorme repercussão desses fatos na edição do Jornal Nacional do dia hoje, 23, assim como a presença de tropas de elite da PF na sede do Partido dos Trabalhadores, em São Paulo; e o mais grave, a possível irregularidade na "invasão" da residência da senadora Gleisi Hoffmann(PT), sem mandado respaldado pelo STF, uma vez que se trata de uma senadora da república, com foro privilegiado. Assim com ocorreu com a divulgação irregular dos grampos e do mandado de condução coercitiva expedido contra Lula - para protegê-lo, segundo o juiz que o emitiu - a invasão da residência da senadora entra no rol do desrespeito ao ordenamento jurídico do país. 

Por vezes somos contingenciados a acompanhar esses noticiários apenas para formarmos nossas opiniões acerca de sua "linha editorial". Alguns escândalos recentes foram solenemente ignorados pelo JN. De volta das férias, Alexandre Garcia foi tratar, em seus comentários, da violência na fronteira entre o Brasil e o Paraguai. Até uma matéria como a erosão da barreira do Cabo Branco, em João Pessoa, ganhou destaque em horário nobre na grade da emissora. Uma matéria "requentada", uma vez que já havíamos visto, por mais de uma vez, nas nossas férias em Jacumã. Só faltaram mesmo as receitas de bolo. Por aqui, em Pernambuco, os chamados "grandes jornais" deixaram de mencionar o nome de um ex-governador que, segundo as investigações da PF, poderia ser um dos beneficiários da Operação Turbulência. 

Hoje, não. Como sempre, estava tudo muito bem coordenado. Há imagens, vistas no JN, dos policiais federais chegando à sede do PT, em São Paulo, logo de madrugada. As fotos circulam nas redes sociais como um emblema dos "coxinhas". Aliás, convém registrar aqui a visita de "cortesia" do Ministro da Justiça do governo interino àquele juiz do Paraná, creio que uma semana antes da Operação Custo Brasil. Engana-se quem pensa que essa engrenagem tenha dado alguma trégua. São raposas felpudas, engordadas no arbítrio, com um grau de ardilosidade surpreendente. Aqui e ali fazem uma "média ponderada" apenas para distrair a plateia, como o pedido de prisão da cúpula do PMDB, onde já se sabia que seria recusado. 

  


O jogo pesado da Operação Turbulência - empresário é encontrado morto em Hotel em Olinda






O empresário Paulo César Barros Morato, um dos principais envolvidos nas investigações da Polícia Federal, no âmbito da Operação Turbulência, foi encontrado morto num motel aqui da cidade de Olinda. Na Terça-Feira, quando foi desencadeada a operação, a capital e a região metropolitana do Recife foi palco de uma megaoperação, envolvendo 200 policiais, com dezenas de mandados de busca e condução coercitiva, além de 05 mandatos de prisão preventiva, dos quais 04 deles foram cumpridos, restando um, exatamente o de Paulo César Barros Morato, desde então, dado como foragido pela Polícia Federal.

Pelos cálculos da PF, as irregularidades cometidas por essa quadrilha teriam movimentado a fabulosa quantia de 600 milhões de reais, entre ilícitos como lavagem de dinheiro, desvios de recursos públicos, pagamento de propina e caixa dois de campanha, onde, possivelmente, teria sido beneficiado o ex-governador Eduardo Campos, na campanha que o conduziu ao Palácio do Campo das Princesas, nas eleições de 2010. O esquema era muito bem azeitado, de onde se pode concluir que continuariam agindo, favorecendo o então candidato presidencial, morto numa aeronave que pertenceria a um desses empresários envolvidos. Antes de mais nada gostaríamos de informar que quem chegou a essas conclusões foi a Polícia Federal. 

Por enquanto, a morte do empresário está envolta num grande mistério. De acordo com os funcionários, no momento em que a operação se desenrolava - um dos empresários foi detido quando se exercitava numa academia no bairro de Boa Viagem - Paulo César Barros Morato  se trancou no hotel, começando a levantar suspeita pelo tempo de permanência, assim como pelo mau cheiro que começou a exalar do quarto onde ele estava hospedado. A Polícia Civil do Estado esteve no local, realizou os procedimentos de praxe e manteve o silêncio sobre o caso.  


Editorial: O PT e a Revolução dos Bichos


Como leitura do dia de hoje, destacaria um artigo do professor Saullo Diniz, publicado no site Pragmatismo Político, intitulado, “Ascensão e Queda de um Partido Popular”. Devo confessar a vocês que o nosso primeiro impulso ao escrever este artigo no dia de hoje foi a campanha movida pelas redes sociais contra o deputado Jair Bolsonaro, depois de suas reiteradas manifestações públicas de caráter fascista, machista, homofóbica e apologista da ditadura militar, que levaram à sua interpelação pelo STF. Mas creio que os internautas, pelas redes sociais, já deram conta do recado, levando a hashtag #SomosTodosCotraBolsonaro a ocupar o primeiro lugar no Trend do microblog Twitter. Bem aqui para nós, está ficando muito chato falar sobre este cidadão. Não há mais nada o que dizer sobre ele e, talvez por isso, vários internautas estão se limitando a fazer piadas de mau-gosto sobre temas dos mais sérios, como a “cultura do estupro”. Profundamente lamentável que alguém encontre inspiração para fazer gracinha com este assunto nas redes sociais, mas por ali circula de tudo. Quem tiver curiosidade, recomendaria que dessem uma olhadinha no que se publicou sobre o assunto. Há até a fala da esposa de Bolsonaro afirmando que ele é um bom moço, um bom pai de família... gente muito boa!

Uma das razões que nos levaram a ler o artigo de Saullo Diniz é que ele reflete sobre o fim de um partido, o PT, simbolicamente, se desejarmos, o fim de uma era: A Era Petista. Encerra-se, melancolicamente, aquela utopia que movia os movimentos sociais organizados, trabalhadores urbanos e do campo, movimento estudantil, pastorais da Igreja progressista, sindicatos, intelectuais de classe média, todos imbuídos de construir um projeto diferente de se fazer política e tocar a máquina pública. Para sermos mais preciso, quando o PT, de fato, fez a diferença na gestão da coisa pública, com algumas experiências emblemáticas como a gestão de cidades como Porto Alegre, por exemplo.

Para reforçar seus argumentos – guardando-se sempre a ressalva entre a fábula e a vida real – Saullo nos recorda de um livro, escrito por George Oswell, ainda na década de 40, onde o autor inglês, satiricamente, faz uma crítica ao processo de ascensão do socialismo, do tipo totalitário, especificamente o stalinismo. Li em trechos biográficos que George Oswell que ele foi um militante socialista na juventude, cerrou fileira na guerra civil espanhola do lado dos socialistas, mas, posteriormente, teria se desencantado com os rumos da experiência do socialismo real na antiga União Soviética, tornando-se um crítico do socialismo. A Revolução dos uma Bichos traduz, nas letras, exatamente,  esse seu desencanto pelo socialismo. 

Em resumo, o livro conta a história de animais que são explorados por humanos numa fazenda. Em assembleia, os animais, liderados pelos porcos, se rebelam e reorganizam os processos sociais e produtivos indo, gradativamente, reproduzindo as relações sociais de produção a que eles se contrapunham – o capitalismo – além de incorporarem hábitos tipicamente associados a esse modo de produção, como os luxos da burguesia. No final, os porcos se transformaram em humanos exploradores, já não sendo possível distinguir um grupo de outro. Lá pelo final do seu artigo, Saullo lembra da passagem do educador Paulo Feire pela Secretaria de Educação de São Paulo, na gestão de Luíza Erundina. Vale aqui a ressalva de que Paulo, no seu processo educativo, tinha sempre a preocupação de não tornar o oprimido num opressor, numa tendência que parece até natural, em razão dos referenciais simbólicos. A educação, como uma prática libertadora, se contrapõe à essa tendência. 

Conceitualmente, a rigor, na Era Petista ocorreu uma "conciliação de classe". Não tivemos uma revolução no Brasil, salvo se quisermos considerar, por exemplo, os milhões de brasileiros que saíram da extrema pobreza nos governos de coalizão petista, assim como a geração de jovens entre 18 e 22 anos, de estratos sociais fragilizados, que conseguiriam entrar numa universidade pública e concluíram seus cursos. 83% dos pais desses jovens não tiveram a oportunidade de realizarem um curso superior, o que representa uma grande revolução no ensino público superior no Brasil. Mas, revolução - daquelas que contrapõe uma classe contra a outra e chega-se a uma ruptura, nós não tivemos. Aliás, conforme já discutimos por aqui, este é o país das alianças. As recentes manobras golpistas refletem exatamente, a inconformação da elite e de setores da classe média contra o andar de baixo da pirâmide social. 

Depois de tecer seus comentários sobre a brilhante trajetória do PT, Saullo lamenta o “deslocamento” do partido de suas bases e uma perigosa aproximação com forças políticas bem distante dos seus ideais, como o PMDB. Foram tantas concessões - em nome de uma pseudo governabilidade, - que o partido acabou se transformando em "mais do mesmo". Fez o jogo das raposas e acabou sucumbindo diante de suas espertezas. Deixa-nos uma reflexão de Emecida: quando os caminhos se confundem, é necessário voltar ao começo.

quarta-feira, 22 de junho de 2016

O xadrez político das eleições municipais de 2016, no Recife: As turbulências que poderão afetar as eleições municipais do Recife.





No início desta semana, como resultado de uma pesquisa realizada pelo IPESPE sobre as próximas eleições municipais do Recife, em 2016, publicamos um artigo aqui no blog onde, no final, concluíamos, a partir das considerações do cientista político Antonio Lavareda, que, naquelas eleições, tudo seria possível, inclusive nada, em razão do seu caráter de imprevisibilidade. Há, ali, alguns indicadores importantes, traduzidos friamente pelos números apresentados. Chama a nossa atenção, por exemplo, a margem de “insegurança” que ronda o projeto de reeleição do prefeito Geraldo Júlio, do PSB. Até a data das eleições ele precisaria, de acordo com Lavareda, melhorar sensivelmente os indicadores de avaliação de sua gestão, se deseja se reeleger. 

Não é uma tarefa impossível. A campanha, inclusive, pode cumprir essa missão. Mas, há pouco mais de 04 meses da campanha surge um fato novo: a Operação Turbulência, realizada pela Polícia Federal aqui no Estado, onde aponta-se indícios de irregularidades de toda ordem – até mesmo desvios de recursos públicos – envolvendo agentes públicos e atores políticos que, de alguma forma, estão diretamente ligados à gestão do socialista. A questão que se coloca é como isso irá se refletir na campanha, já que está sendo utilizada contra o gestor, também massacrado pelas redes sociais no dia ontem. A tal "ligação", registre-se, está relacionada ao fato de os atores envolvidos nessa Operação Turbulência, de acordo com a Polícia Federal, pertencerem aos quadros do PSB, partido do prefeito Geraldo Júlio. 

Os socialistas se movimentam como podem, mas há uma convicção entre eles sobre a premente e fundamental necessidade de reeleger o prefeito Geraldo Júlio, no Recife. Há muitas coisas em jogo naquelas eleições, como o “batismo” político do grupo técnico de auxiliares do ex-governador, como é o caso de Geraldo Júlio e Paulo Câmara. Batizados, esses atores passam a ganhar um novo status no contexto da correlação de forças internas da agremiação, inclusive entre as “raposas” políticas matreiramente afastadas de cena durante o reinado do ex-governador Eduardo Campos. Um tropeço de Geraldo Júlio aqui na capital, por sua vez, também poderá representar algumas dificuldades sérias para o projeto de reeleição de Paulo Câmara, em 2018, criando um inferno astral socialista difícil de gerenciar. 

Há quem assegure que o partido tem uma forte liderança aqui no Estado, entre os remanescentes familiares do ex-governador. Seria quem bate o prego e vira a ponta,quem, na realidade, dá as cartas do jogo entre os socialistas no Estado. Como essa figura atua nos bastidores da política, fazendo questão de manter uma certa discrição, preferimos acreditar que, na realidade, o partido ainda sofre uma espécie de orfandade de liderança com a morte do ex-governador. A “acomodação” do grupo nos executivos estadual e municipal, pode ser um fator facilitador da construção dessa possível liderança. A perda desses espaços de poder, por sua vez, pode agravar, ainda mais,  a soldagem dessas divergências ou a construção de algum consenso entre esses atores políticos.Vale aqui o ditado popular nordestino. Casa onde falta comida, todos brigam e ninguém tem razão. 

Se, para esses atores políticos, no exercício do poder, as coisas são difíceis, imaginem sem ele. Neste clima, é realmente improvável que algum analista político arrisque alguma previsão sobre o que deverá ocorrer em outubro, quando o recifense saírem às ruas para escolher o seu prefeito. Nada sugere que os graves problemas econômicos que estamos enfrentando sejam superados até lá. O termômetro político também não tende a arrefecer-se, dada as denúncias que pesam sobre os atores políticos que usurparam o poder no plano nacional, em meio às manobras hoje bastante criticada pela sociedade brasileira, até mesmo entre os “coxinhas” mais consequentes.As vaias dirigidas a Paulinho do Força, durante voo, não nos parecem que tenham sido provocadas por "petistas" ressentidos.  

Há, por outro lado, um conjunto de forças políticas, formadas principalmente entre jovens, mobilizados pelo defesa da democracia, o que inclui, por tabela, o respeito ao mandato da ex-presidente Dilma Rousseff. Os gritos de “golpistas” são ensurdecedores. Ecoam, nos shopping center, nas repartições públicas, nas aeronaves, nos aeroportos, em praça pública. Para alguns analistas, quiçá, poderiam ser um indício da volta das "Jornadas de Junho”. Um governo com este perfil, que transformou o país numa republiqueta de bananas, nas palavras sábias do sociólogo Sérgio Pinheiro, não tem legitimidade. Nasce – e talvez até se mantenha – pelo uso da força, das urdiduras escusas. Mas, o signo da ilegitimidade, parece ser mesmo um fardo muito pesado para se carregar. 

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terça-feira, 21 de junho de 2016

Editorial: Turbulência no mundo político pernambucano. Um acidente de 600 milhões de reais.



Acabo de ler, nas redes sociais, um comentário do cientista político Roberto Numeriano sobre uma campanha político do ex-governador Eduardo Campos. Dizia ele que, ao passar ali pelo bairro da Torre, aqui no Recife, observou nada menos do que 30 carros da marca gol, novinhos em folha, utilizados na campanha do então governador. À época, suas reflexões se referiam, tão somente, ao poderio econômico da campanha do candidato, enquanto outros dispunham de recursos bem mais modestos, o que, infelizmente, acabava se refletindo no resultado final das eleições. Depois da Operação Turbulência, desencadeada pela Polícia Federal, no dia de hoje, em Pernambuco, não paira mais qualquer dúvida sobre o arsenal de irregularidades que envolviam os apoiadores daquela campanha. 

A lista das falcatruas é extensa, como já disse, envolvendo empresas de fachada, propinas pagas a políticos e empreiteiras, lavagem de dinheiro, malversação de recursos públicos. Num trabalho minucioso, a PF chegou à fabulosa cifra de 600 milhões de reais movimentados por essa quadrilha, que operava desde 2010. Transações irregulares começaram a levantar a suspeita da Polícia Federal, que iniciou o trabalho de investigações que culminou com a operação de hoje - denominada de Turbulência - numa referência ao jatinho CESSNA Citattion, que transportava o então candidato à Presidência da República, Eduardo Campos, quando de sua morte. Agora fica claro porque havia tantas controversas em relação ao real proprietário daquela aeronave. Ninguém assumia ser o seu dono. 

A Operação Turbulência é uma megaoperação, envolvendo 200 policiais federais, com 60 mandados judiciais, sendo 33 de busca de apreensão, 24 de condução coercitiva e 05 de prisão preventiva, essas últimas envolvendo diretamente os possíveis proprietários daquela aeronave, como os empresários João Carlos Lyra e Apolo Santana Vieira. Dos mandatos de prisão preventiva, 04 foram cumpridos e um dos acusados encontra-se foragido. Certa vez chegamos a dizer por aqui que temíamos bastante que este grupo chegasse ao poder. Agora sabe-se porque. Estávamos construindo aqui na província um líder cheio de bravatas contra os mau-costumes de nossa política, mas que, na realidade, estava até mais enlameado por eles do que aqueles que ele tanto criticava. Com o devido respeito, costumávamos afirmar que, diante dos fatos que indicavam tamanhas irregularidades com os negócios públicos, o acidade teria sido "providencial". A bem de nossa frágil república. 

Essa oligarquia política que passou a controlar o Estado de Pernambuco é perigosíssima, extremamente danosa aos interesses público. Utiliza-se de métodos fascistas para ameaçar, amedrontar, caluniar e difamar aqueles que se contrapõem aos seus interesses escusos. Os métodos são sórdidos, volto a repetir. Num desses períodos de Páscoa, recebemos a visita de um "coelho" - penso que vocês deduzem de quem estou falando - enfurecido em nossa timiline da rede Facebook, em razão de nossas críticas ao então candidato Eduardo Campos. O professor e cientista político Michel Zaidan quantas vezes não foi atacado por esse grupo, chegando-se ao limite do processo movido contra ele pelo atual governador do Estado, Paulo Câmara(PSB). 

E a blogueira, Noélia Brito, então? que sofreu horrores, vítima de inúmeros processos por apontar ou denunciar alguns desses desvios de conduta de agentes públicos. Hoje, como se diz lá pelas bandas do interior, estamos todos de alma lavada. A justiça foi feita. É emblemático que um site de notícias locais tenha sido tão enfático nas cobranças sobre um pronunciamento da família, dos atores políticos ligados ao ex-governador, do partido PSB, através de sua Executiva Estadual e Nacional. Ninguém fala nada. Nem a família, nem o partido, nem o governador do Estado, Paulo Câmara(PSB), que chegou ao poder através do apadrinhamento do ex-governador Eduardo Campos. Com toda a modéstia, o espaço aqui do blog é bastante democrático.   

Não deixe de ler também:

O mistério em torno da morte do 5º elemento da Operação Turbulência. 



  

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segunda-feira, 20 de junho de 2016

Editorial: O fantasma das desigualdades sociais volta a nos assustar. Que país é este?




Dois grandes economistas que, nos governos de coalizão petista ocuparam cargos estratégicos no tocante à concepção e implementação de políticas redistributivas de renda, Márcio Pochmann e Marcelo Neri, já advertiam sobre a possibilidade de o país voltar a enfrentar um retrocesso no enfrentamento dos problemas de desigualdades de renda. Mesmo contando com fortes contingenciamentos, a presidente afastada Dilma Rousseff fazia o impossível para não comprometer os recursos dos programas sociais. O governo interino, no entanto, como já se previa, não teve o mesmo pudor em usar a tesoura. Uma verdade, no entanto, precisa ser dita, a economia já vinha muito mal das pernas no segundo mandato da presidente Dilma Rousseff, com altos índices de desemprego e déficit nas contas públicas.

Neste cenário, naturalmente, aquelas políticas que, nos governos de coalizão petista foram responsáveis por tirar milhões de brasileiros da extrema pobreza, certamente, ficariam comprometidas. Comprometidas, creio, ainda mais, se considerarmos as prioridades desse governo interino, até mesmo politicamente, posto que uma das razões que moveram as forças sociais e políticas que tinham como propósito afastar a presidente Dilma Rousseff do poder era exatamente suas preocupações com o andar de baixo da pirâmide social. Assim como também se sabe que, hoje,  definitivamente, não era a corrupção o combustível que movia os golpistas. 

O que se observa, no momento, é um verdadeiro desmonte dessas políticas, seja induzidas por nossas fragilidades econômicas, seja induzidas pela ausência de "vontade" politica do governo interino com esse problema, que nos acompanha durante séculos, desde nossa formação colonial escravocrata. De acordo com o professor Rodolfo Hoffman, da USP, em matéria publicada pelo jornal Folha de São Paulo, mesmo utilizando uma métrica que não é a mais adequada - a mais adequada seria a do IBGE, que só sai em setembro - já é possível concluir que, a escalada do desemprego vem acelerando a desigualdade de distribuição de renda. A metodologia utilizada pelo pesquisador da USP, para medir essa desigualdade, é orientada pela relação entre "ocupados e "desocupados". Desde o início do mandato da presidente Dilma Rousseff até hoje, ocorreu um aumento de desempregados da ordem de 3%. Pulou de 7,9% para 10,9%. 

O Brasil ainda figura entre os países mais desiguais do mundo. Na minha época de graduação, era comum a nossa "concorrência" com os países mais miseráveis do continente africano. Quem não se lembra disso? Tivemos alguns problemas nos governos da coalizão petista, mas um dos grandes legados que ficarão para a sua história foram exatamente as políticas redistributivas de renda, responsáveis por tirar milhões de brasileiros da extrema pobreza. Organismos internacionais idôneos e isentos chegaram a reconhecer esse mérito. Conforme discutimos num dos nossos últimos editoriais, além da questão humanitária, em longo prazo, se mantidas, essas políticas redistributivas de renda e de democratização ao acesso ao ensino superior, no final, daria uma grande contribuição à consolidação de nossa democracia. 

Há muita controvérsias entre os estudiosos sobre essa relação entre economia e democracia. Para alguns autores, o desenvolvimento econômico - naturalmente que aliado a outros fatores - é um dos determinantes na construção e consolidação dos regimes democráticos. Outros autores, no entanto, minimizam essa importância. Países ricos, possuidores de grandes reservas de recursos naturais, por exemplo, não caminharam, necessariamente, para a democracia. Muito ao contrário. Sobre os padrões de educação de um país e as possibilidades de construção de regimes democráticos, por sua vez, há uma unanimidade entre eles. 

P.S.: do Realpolitik. Não sei se vocês repararam mas, no dia de hoje, os principais jornais da Rede Globo parecem ter dado uma trégua aos problemas de corrupção no governo interino do senhor Michel Temer. Até uma matéria sobre os problemas de erosão na barreira de Cabo Branco, em João Pessoa, entrou na pauta em horário nobre, numa típica manobra conhecida como enchimento de linguiça. A foto acima é da Ilha de Deus, uma localidade aqui do bairro da Imbiribeira, no Recife. O rebento que, por aqui, aos 05 anos, não sabe nadar, pescar e se virar com o cotidiano das condições precárias de vida, não sobrevive. Ouvi isso de um líder comunitário, numa palestra na Fundação Joaquim Nabuco.