Há sempre uma guerra de narrativas quando ocorrem manifestações de rua no país, sejam aquelas ensejadas pela direita, seja aquelas ensejadas pela esquerda. A esquerda manteve a hegemonia das ruas durante décadas no país, mas, principalmente a partir de 2013, começou a perder terreno, no bojo das mobilizações que começaram com um simples protesto me razão do aumento do bilhete de passagem do transporte coletivo. O jogo se manteve assim durante um bom tempo, com avenidas, praças e praias conhecidas enfeitadas de verde e amarelo, as cores adotadas pelo bolsonarismo. Ontem, 21, no entanto, o cenário começou a mudar. Convocadas para protestar contra a PEC da Blindagem e contra o PL da Anistia, as manifestações organizadas por partidos, artistas e movimentos de esquerda conseguiram mobilizar uma quantidade expressiva de pessoas neste domingo.
É preciso analisar, neste caso, aqueles ingredientes a mais - e não estamos aqui falando de Gil, Paulinho da Viola, Caetano Veloso ou Chico Buarque - que possam ter suscitado na população o desejo de se posicionarem contra algumas dessas excrescências ou propostas indecentes que estão circulando nos corredores da capital federal, traduzidas por seus articuladores como um movimento de pacificação do país. Em si, a pacificação é bem-vinda. O país não suporta tanta indisposição entre os Três Poderes da República, uma tendência que parece recrudescer cada vez mais. Possivelmente, no entanto, o caminho não seria dando tapinhas nas costas de golpistas ou abrindo as porteiras para as farras de ilicitudes, algo que já ocorre sob vigilância ostensiva. Imaginem os senhores uma licenciosidade generalizada.
Já existe um sentimento de arrependimento entre os políticos que votaram a favor da PEC da Blindagem na Câmara dos Deputados. A tendência é que tal PEC não seja referendada quando apreciada pelo Senado Federal. O senador Alessandro Vieira(MDB-SE), relator da mesma, já antecipou que se posicionará contrário à sua aprovação, o que não se constitui nenhuma surpresa quando consideramos a sua agenda de atuação como homem público. Alessandro Vieira foi delegado de polícia e deve saber muito bem o que significa para os mal- intencionados essas brechas ou afrouxamentos da legislação. Se os gatunos do erário já agem à revelia da lei, imaginem diante dessas licenciosidades.