pub-5238575981085443 CONTEXTO POLÍTICO.
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segunda-feira, 26 de maio de 2014

Governo de Pernambuco irá investigar possíveis causas dos saques e vandalismos em Abreu e Lima


Assim que se elegeu governador do Estado de Pernambuco, o hoje candidato à Presidência da República, Eduardo Campos, buscou apoio na academia. O Pacto pela Vida, apresentado como uma das principais vitrines do seu Governo, é um exemplo disso.Aos poucos, por diversas razões, essa lua-de-mel foi se exaurindo, até a consolidação de um hiato profundo. Hoje, encontra-se na UFPE um dos principais focos de oposição ao ex-governador, inclusive no centro onde ele estudou quando mais jovem. Não raro, a arrogância cega os governantes. A soberba se encarrega de completar o serviço. Um pouco de humildade faria muito bem aos nossos gestores. Os problemas do Pacto pela Vida, por exemplo, quase todos os dias, estão sendo postos pelos acadêmicos. Agora ficamos sabendo que o Governo do Estado estaria contratando uma empresa para realizar um amplo levantamento sobre as causas dos saques e vandalismos que ocorreram na cidade de Abreu e Lima há duas semanas atrás. O objetivo seria o de evitar ou prevenir possíveis ocorrências similares. Ficamos bastante preocupados com os vieses dessas intervenções. Outro dia, o Estado fez questão de alardear que iria "punir com rigor" os envolvidos naqueles episódios.É impressionante como tudo se encaixa naquela diretriz de proteção do capital, ou seja, em nenhum momento observa-se uma preocupação do Estado em atender as legitimas demandas daquela população no que concerne às políticas públicas de saúde, educação, segurança cidadã, mobilidade, habitação, trabalho, renda etc. Desde de junho de 2013 que a população pede mudanças nessa agenda pública. Eles continuam fazendo ouvidos de moucos. Qualquer dias desses a porca torce o rabo novamente. É essa "seletividade" de ações de programas como o Pacto pela Vida - orientado para a defesa dos cidadãos-consumidores e incluídos socialmente, além do comércio - que estão levando à ruína esse Governo. O conceito de segurança pública deve contemplar as questões postas acima e não se limitar, unicamente, "punir" os transgressores, por vezes, com a morte. Há quem não curta muito a ideia de levar o sociólogo polonês Zygmunt Bauman para visitar Abreu e Lima, mas ele tem razão ao observar que esse apelo demasiado ao consumismo esgarça os laços comunitários, além de proporcionar enormes frustrações entre aqueles cidadãos induzidos/privados desse consumo. Posso assegurar que ele ficaria muito bem por aqui, saboreando as mangas Maranhão e comendo as castanhas de caju torradas com palhas de bananeiras do nosso sítio. Se chegar na invernada, ainda terá poderá experimentar as deliciosas bundas de tanajuras com farinha. Numa sociedade onde o que vale como critério de cidadania é o "ter" acesso ao consumo, aquelas hordas que não conseguem atingir esse objetivo - que também é um direito deles - certamente, terão que ser "contida" através de um Estado policialesco e repressor. Como essas contradições estão no DNA capitalista, faz sentido a observação do filósofo Slavoj Zizek, quando ele se refere à tendência de fortalecimento autoritário do exercício do poder político.Tanto aqui em Pernambuco como em outros Estados da Federação, as políticas de segurança pública estão sendo orientadas por alguns vieses profundamente equivocados, quase sempre pautadas pelo "endurecimento" das ações contras os mais vulneráveis, notadamente os contingentes populacionais mais empobrecidos, moradores das periferias, de cor negra. O que está em jogo é o novo conceito de  "cidadão", ou seja, o cara que tem acesso aos bens de consumo capitalista, que desfila com seus carrões, moram em bairros nobres, almoçam em restaurantes chiques e compram suas guloseimas nas delicatessen  nos finais de tarde. Quem não cumpre esse rito não merece o status de "cidadão". É more or less isso o que vem ocorrendo. Talvez seja o momento de rediscutir "valores" e "agenda pública". Os maiores "saqueadores" estão inseridos no aparelho de Estado, alguns sob o manto da impunidade, com uma ampla rede de proteção. Basta observar os dados mais recentes, informados pelo TCE, envolvendo prefeitos e servidores públicos "pegos" em maracutaias com o dinheiro de nossos impostos. Os rebelados, excluídos do consumo, acabaram devolvendo, em sua maioria, as mercadorias saqueadas nas lojas durante a greve da Polícia Militar. Qual o montante que esses políticos devolverão ao erário? Não vale o argumento de que uma situação poderia justificar a outra. Em certos aspectos, ambas estão equivocadas. Mas, o exemplo dos que nos governam, possivelmente, surtiria um efeito pedagógico enorme. Exemplo e sensibilidade para entender a origem do ovo da serpente, senhor governador. Vamos deixar de maquiagens. Política de segurança pública orientada quase que exclusivamente para defender o patrimônio e os cidadãos-consumidores? Isso não pode dar certo.


Eduardo Campos no Roda Viva. Mas que Roda Viva?



Já houve um tempo em que acompanhávamos com mais assiduidade o Programa Roda Viva, da TV Cultura. Tratava-se de um programa mais isento, dirigido por jornalistas que pautavam sua atuação com mais profissionalismo. De um certo tempo para cá, deliberadamente, o programa passou a adotar uma linha editorial de corte mais conservador, para alguns alinhavado com interesses tucanos. Pois bem. O programa hoje receberá o ex-governador de Pernambuco, Eduardo Campos. A sabatina começará às 22h:00 e será transmitido, em Pernambuco, pela TV Nova Nordeste, Canal 22, que retransmite o sinal da TV Cultura. Há quem informe que eles não pegarão leve com Eduardo Campos. É bem possível. Mas, em todo caso, se isso ocorrer, não significa um grande problema para o pernambucano. Afinal, Eduardo hoje adota uma estratégia orientada pelo distanciamento do senador mineiro. Quando selaram o acordo de não-agressão, cada um se via disputando um eventual segundo turno das eleições presidenciais de 2014 com a presidente Dilma Rousseff. Ainda há chances de Dilma liquidar essa fatura ainda no primeiro turno.Se tivermos um segundo turno, o mineiro leva mais chance de disputá-lo com a presidente Dilma. Dificilmente Eduardo Campos quebrará essa polarização entre PT/PSDB. Não com esse discurso e nem com esse perfil.

E se o PT tivesse tentado comprar o Aécio Bolado por 500 mil reais...

Por Redação maio 21, 2014 19:00
E se o PT tivesse tentando comprar o Aécio Bolado por 500 mil reais…

Na história da compra da Dilma Bolada, o PSDB, que foi citado como comprador do perfil, simplesmente se dá o direito de não se manifestar sobre o fato. E não é cobrado pela doce mídia a fazê-lo
Por Renato Rovai, em seu blogue. Foto de capa: Instagram/Palácio do Planalto

Dilmabolada
Ontem de madrugada Jeferson Monteiro, criador e administrador do personagem Dilma Bolada, escreveu um relato em que afirma que foi procurado para vender seu personagem por 500 mil reais. Deu nomes, sobrenomes e detalhes da negociação. Entre os citados, o publicitário mineiro Pedro Guadalupe, que atua para o PSDB nas redes sociais e que teria ligação com o atual governador de Minas Gerais, Alberto Pinto Coelho (PP).
Monteiro apresentou a conversa que ambos tiveram e que segue no pé da matéria. Este blogue, além de ter ouvido Monteiro, conversou com Guadalupe e a agência citada na história, a AMA.
Guadalupe diz o seguinte: “Em 29 de abril de 2014, recebi da empresa denominada AMA, que representa personalidades e canais na internet, a informação de que a Dilma Bolada participava de seu casting e fui indagado se tinha interesse em contratá-la”.
No relato publicado na noite de ontem, Jeferson Monteiro também fala da ação da AMA na sua contratação. “Há algumas semanas uma agência de publicidade (a AMA) entrou em contato comigo para conversar. Eu naturalmente aceitei porque é normal as agências procurarem blogueiros e influenciadores para parcerias, eventos, etc. Então, um dos diretores marcou uma reunião por videconferência e me explicou do que se tratava: a agência que administra diversas páginas aqui no Facebook disse que estava interessada em me convidar para o “casting” deles pois viam em mim um “potencial muito grande”.
Mesmo com o contratante e contratado confirmando a operação, a empresa AMA emitiu uma nota hoje ao final da tarde dizendo que “nunca ofereceu valor nenhum pela página Dilma Bolada, pois não trabalhamos dessa forma”. E que “a AMA não tem nenhum contrato ou oferece serviço para partido político”. Arthur Eickmann, da equipe comercial da AMA, contatado pela Fórum, disse também que “ainda não trabalhamos com a Dilma Bolada e esta parceria ainda não existiu.”
Procurado pelo blogue, Jeferson Monteiro enviou um fac-simile (imagem acima) de uma conversa com Marcio Calheiros, que se apresenta como da AMA no twiter de Jeferson. Se a AMA nunca tratou com Dilma Bolada, poderia ao menos explicar quem é Marcio Calheiros e que cargo ele tem na empresa?
Segundo Jeferson foi Márcio quem fez o contato inicial pela empresa que desembocou nos 500 mil reais que seriam pagos pelo PSDB e cujo interlocutor era Pedro Guadalupe.
Essa história da compra da Dilma Bolada é algo pra lá de alopadrado e o PSDB que foi citado como comprador do perfil simplesmente se dá o direito de não se manifestar sobre o fato. E não é cobrado pela doce mídia a fazê-lo (nós da Fórum procuramos o partido). Será que se por acaso um perfil do tipo Aécio Bolado tivesse sofrido assédio de petistas e recebido uma proposta de 500 mil reais para se vender o caso teria esse mesmo tratamento midiático?
PS: Dica do leitor Carlos. Marcio Calheiros no Linkedin: http://www.linkedin.com/pub/marcio-calheiros/31/743/85a
No Facebook: https://www.facebook.com/marciocalheirossm?fref=ts
E no Twitter: https://twitter.com/marciocalheiros
Em todos esses perfis ele aparece como diretor da AMA.
PS2: No dia 5 de fevereiro o diretor da AMA publicou a seguinte nota sobre a Dilma Bolada em seu Facebook. O que será que ele quer? Qual será a força de um personagem fictício diante de tantas informações que recebemos diariamente na internet? Sair em matéria no O GLOBO, mostra que alguma coisa a mais eles tem.#amamosinternet #internetlimpa. E dá link para essa matéria de O Globo sobre a Dilma Bolada (http://oglobo.globo.com/cultura/megazine/criador-da-dilma-bolada-pode-tirar-personagem-das-redes-sociais-11510352)
dilmaboladaepsdb (1)

domingo, 25 de maio de 2014

Michel Zaidan: Eduardo Campos e a sucessão estadual



Haverá, na próxima sucessão estadual, dois graduados cabos eleitorais em ação no nosso estado: o ex-presidente Lula e o ex-governador de Pernambuco. Qual terá mais sucesso na empreitada de transferir votos de seus eleitores   a seus candidatos?

                          Quem anda pelo interior do estado constata que o prestígio do ex-presidente é enorme. O eleitor do Lula é o mesmo de Eduardo Campos. Deve haver, em algum momento, um conflito de lealdades entre a preferência de um ou outro. No momento, quem vem perdendo apoio é o ex-governador. O PC do B e o PDT já declararam apoio a Armando Monteiro e a Dilma Rousseff. Os partidos evangélicos provavelmente marcharão com a presidenta. Curiosamente, foi o DEM que hipotecou o seu apoio a Eduardo Campos. Mas esse partido é residual e, por não apresentar nomes à candidatura majoritária, vai se acabando aos poucos na memória política do eleitor. Já a situação do PSDB é incerta e duvidosa. Teria mais a ganhar se lançasse candidatura própria em PE, quem sabe a do deputado Daniel Coelho, que teve um bom desempenho eleitoral na eleição municipal. Mas esta decisão depende de uma sinalização nacional do partido tucano. E a disputa de hegemonia entre o PSB e o PSDB pode levar sim a candidaturas próprias nos estados.

                           Caso melhore o ambiente econômico do país e as costumeiras denúncias de corrupção ou má administração dos negócios públicos vá se apagando da lembrança do eleitor (se banalizando, na verdade), é possível que o desempenho da presidente melhore nas pesquisas, e com o início do horário gratuito e o corpo-a-corpo da campanha eleitoral, com a presença de Lula, as chances de uma vitória no primeiro turno podem aumentar para Dilma.

                            Chama a atenção a dificuldade que tem a candidatura do ex-governador de Pernambuco de nacionalizar seu nome, ao contrário de Aécio Neves. O ex-mandatário do estado ainda é muito identificado com o NE, e pior ainda: com as oligarquias políticas do NE. Daí não ter ainda ultrapassado os 11% das intenções de voto.

                             O risco - para ele - é o de uma polarização entre Aécio e Dilma. O que levaria sua candidatura para baixo e transferiria votos para um dos dois primeiros colocados. O fato que até agora - mesmo com o apoio de Marina Silva - esta candidatura não empolgou (ou convenceu) ninguém. E quanto mais o discurso do candidato se aproxima de FHC e sua agenda gerencial, o medo dos fantasmas de passado aumenta.

Michel Zaidan Filho é filósofo, historiador e professor da Universidade Federal de Pernambuco

sexta-feira, 23 de maio de 2014

Tijolaço: Quando se cai na real, a conversa sobre a Copa é outra

23 de maio de 2014 | 08:55 Autor: Fernando Brito

graficocopa
Com anos de atraso, a Folha publica hoje um levantamento feito pelos repórteres Gustavo Patu, Dimmi Amora e Filipe Coutinho que, como e diz nas conversas informais, “baixa a bola” dos “gastos absurdos com a Copa do Mundo”.
É o que dá ter raros momentos de jornalismo correto na mídia brasileira, porque não é nenhum “furo”, mas apenas a compilação de dados que são e sempre foram públicos.
A começar pela abertura do texto escrito pelos três:
Mesmo mais altos hoje do que o previsto inicialmente, os investimentos para a Copa representam parcela diminuta dos orçamentos públicos.
Alvos frequentes das manifestações de rua, os gastos e os empréstimos do governo federal, dos Estados e das prefeituras com a Copa somam R$ 25,8 bilhões, segundo as previsões oficiais.
O valor equivale a, por exemplo, 9% das despesas públicas anuais em educação, de R$ 280 bilhões.
Em outras palavras, é o suficiente para custear aproximadamente um mês de gastos públicos com a área.
E eles próprios se encarregam de dizer que nem sequer é assim, porque estes gastos diluíram-se pelos últimos sete anos e, sobretudo, porque uma parte ( a maior parcela, 32%) é feita com financiamentos de bancos públicos (quase toda do BNDES) e vai retornar.
Adiante falarei dela.
Bem, do gráfico publicado, conclui-se que o Governo Federal gastou R$ 5,8 bi diretamente com a Copa: R$ 2,7 bi na modernização e ampliação dos aeroportos, R$ 1,9 em segurança pública – quase tudo equipando, a fundo perdido, as polícias estaduais -, R$ 600 mil em portos, R$ 400 mil em telecomunicações  e R$ 200 milhões em gastos diversos.
Aeroportos e portos, além de serem serviços públicos essenciais ao desenvolvimento econômico, geram receitas de tarifas e concessões.
Nenhum tostão, como você vê, em estádios.
Do dinheiro dos estádios, um total de R$ 8 bilhões, perto da metade veio de financiamentos federais, através do BNDES, de duas formas: debêntures e empréstimos.
Debêntures são “letras” financeiras e, no caso do estádio, seus tomadores pagam 6,2%% de juros mais a inflação do período.
No caso dos empréstimos, os tomadores, além de oferecer garantias, têm de pagar  TJLP (taxa de juros de longo prazo), que de 2009 para cá variou entre 6,25% e 5%, mais  1,4% (taxa  BNDES + intermediação financeira), mais risco de crédito (até 4,18%), além da taxa que o o tomador pagará a o banco operar o crédito. No total, portanto, pagam juros muito semelhantes (em geral um pouco maiores, em alguns momentos frações de centésimo menores) que a taxa de juros com que o Governo capta dinheiro no mercado.
Isso quer dizer que não houve empréstimo subsidiado pelo Governo Federal?
Sim, houve,  maiores. E continuam existindo, independente de Copa.
São os recursos para obras de mobilidade urbana que, só nos empreendimentos ligados à Copa, receberam  R$ 4,4 bilhões.
Como é isso: o BNDES financia contrando TJLP + 2% no caso de o empréstimo ser tomado por Estados e Municípios ou por TJLP + 1% + risco de crédito de até 4,18% no caso do financiamento ser feito por empresa privada.
Convenhamos que  é uma forma muito mais adequada de o banco usar seus recursos em favor da população do que, como fez em 2002, aplicar R$ 281 milhões (R$ 1 bilhão, hoje, corrigidos pela taxa Selic) na Net, então propriedade dos Marinho (a família mais rica do Brasil), que estava enforcada de dívidas.
No caso dos Estados e Municípios, a grande maioria, boa parte dos gastos vem  das contrapartidas locais para obras de mobilidade (R$ 2,4 bi, ou 41%) e os restantes R$ 3,3 bilhões em gastos diretamente com obras dos estádios e com as do seu entorno (ruas, praças, pátios, passarelas).
Os números insuspeitos publicados pela Folha vêm na mesma linha daquilo que ontem se comentou aqui.
Tirando os gastos imprevistos de três governos estaduais (Sérgio Cabral , com o Maracanã, Agnelo Queiroz, com o Mané Garrinha e Aécio Neves-Anastasia como Mineirão, que começou as obras ainda na gestão do atual candidato do PSDB à Presidência), os outros dois estádios que custaram muito mais do que o inicialmente previsto, o Beira-Rio e o Itaquerão, foram  tocados pela iniciativa privada.
Há uma hidrofobia de direita implantada na mídia e em parte da classe média que eclipsa qualquer capacidade de exame racional dos fatos.
Se eu fosse um obtuso irracional, que não reconhecesse o direito de uma categoria profissional essencialíssima , como a dos professores, poderia dizer que se gastou muito mais que aquele “um mês”  de Educação que a Copa custou com as greves e paralisações (em geral, justas) do magistério.
E isso seria uma apelação, porque eu estaria colocando nos direitos dos professores a “culpa” das nossas históricas carências no setor.
Colocar na Copa a “culpa” pelos problemas da educação, da saúde, da assistência social, da habitação é, igualmente, uma estupidez.
Que só tem um fundamento, embora a maioria dos que fazem isso não o percebam: as eleições.

(Escrito por Fernando Brito, publicado originalmente no Tijolaço)

quinta-feira, 22 de maio de 2014

Dilma vence no primeiro turno, aponta nova pesquisa IBOPE

Números extraoficiais, vazados pela coluna Radar, de Lauro Jardim, apontam a presidente Dilma Rousseff com 40%, contra 20% de Aécio Neves e 11% de Eduardo Campos. Os três teriam crescido em relação à pesquisa anterior, reduzindo o percentual de indecisos, brancos e nulos

dilma campos aécio eleições 2014
Os números da pesquisa Ibope, que será divulgada nesta noite, acabam de vazar. Os dados, extraoficiais, foram divulgados pela coluna Radar, e apontam vitória da presidente Dilma Rousseff em primeiro turno. Leia abaixo:
A pesquisa que o Ibope divulga hoje à noite dará alegria a todos os candidatos. Dilma Rousseff, Aécio Neves e Eduardo Campos sobem em relação à última pesquisa Ibope, do dia 29 de abril.
Nela, Dilma aparecia com 37%, Aécio com 14% e Campos com 6%. Agora, Dilma surgirá na faixa dos 40%, Aécio no patamar de 20% e Eduardo Campos sobe aos dois dígitos, em torno dos 11%.
Em comparação com o Datafolha de duas semanas atrás, poucas mudanças. Aécio e Campos, quando se coteja as duas pesquisas, estão do mesmo tamanho. E Dilma teria crescido um pouco, fruto do momento em que as entrevistas foram feitas – imediatamente após os programas de TV do PT e no auge da supreexposição de uma campanha publicitária em que o governo exibia suas obras.
De agora até o fim da Copa, é mais do que improvável que estes números mudem – exceto, claro, se acontecer algo muito significativo durante o evento. Ou seja, é com esses números que os três principais candidatos começarão a disputa em agosto, quando sobe a temperatura de campanha.
Com os números já tornados públicos, o dia será de intensa movimentação no mercado financeiro. Ao contrário do Sensus e do Datafolha, o Ibope não chancela a possibilidade de segundo turno.
A julgar pelas movimentações anteriores, que provocaram altas das ações quando a presidente caiu, a tendência, nesta quinta-feira, seria de baixa na BM&FBovespa.
Em nome da prudência, e do respeito aos investidores, o Ibope, de Carlos Augusto Montenegro, deveria confirmar – ou não – os resultados, antecipando a divulgação da pesquisa. Caso contrário, dará margem à interpretação de que permitiu que a pesquisa fosse usada por especuladores.
247 e Radar Online
(Publicado originalmente no Pragmatismo Político)

Cais José Estelita: O urbanista do Recife é o capital



(Isso corre o risco de acabar...pode?)

Na calada da noite, a construtura Moura Dubeux iniciou o processo de demolição dos armazéns do Cais José Estelita, para inicio de um mega projeto imobiliário. Aconteceu de tudo. "Carteirada" de vereador; agressões aos militantes que para lá se dirigiram com o intuito de protestarem; especulações sobre a lisura do alvará que autoriza a demolição; a evidente promiscuidade entre poder público e iniciativa privada quando está em jogo investimentos imobiliários no Recife e, pasmem, até mesmo aqueles que estão batendo palmas para o ocorrido, festejando um Novo Recife que vem por ai. A atitude do vereador Raul Jungmann - muito elogiada até mesmo por militantes de esquerda - não merece a nossa aprovação, posto que se trata de uma atitude de puro oportunismo político. Na realidade, como bem descreveu um colega, Raul é uma espécie de personagem à procura de alguém que o leve a sério. Impressionante o contorcionismo político desse cidadão. Sua "carteirada", observo, está sendo muito criticada pelas redes sociais. O "cale a sua boca" - dirigido, segundo dizem, pelo vereador a um segurança que trabalhava no local, em qualquer circunstância, não pega bem. A advogada do grupo "Direitos Urbanos", Liane Cerne, já  estaria tomando as providências atinentes ao militante do grupo que teria sido agredido pelos seguranças da Construtora Moura Dubeux. Fica escancarada uma relação profundamente lesiva ao interesse público, estabelecida entre iniciativa privada e poder público. A engenharia é perversa, passando por cima de ideologias e qualquer coisa que o valha. Agora se discute, como se isso fizesse muito sentido, o fato de que essas negociações foram iniciadas pela gestão do PT, passando pelo PSB. Na realidade, trata-se, lembrando Gilberto Freyre (com Y) de uma inhaca residual presente na gestão pública brasileira. Difícil de remover. São licitações viciadas, nomeação de pessoas de confiança desses grupos privados para os chamados "conselhos", indicações de DAS para atuarem na administração pública, além de outros expedientes que preferimos nem comentar. Soma-se a isso os "coxinhas" de plantão, que ocupam seus espaços na imprensa para aplaudirem essas atitudes. Logo, logo, Recife será reservada apenas para aqueles cidadãos-consumidores, com acesso aos bens de consumo, protegidos pelo Pacto pela Vida. No contexto de uma política higienista, sua população mais empobrecida, gradativamente, vem sendo "tangida" para a periferia. É profundamente lastimável que o poder público - que deveria zelar pelos cidadãos consumidores ou não-consumidores - faça esse jogo nojento dessa nova face imposta pelo capital. Bem afirmou aquele grafiteiro, num muro do Hospital Ulisses Pernambucano: O urbanista do Recife é o capital.

quarta-feira, 21 de maio de 2014

Sartori: Quando a direção sindical não representa a categoria; secretário de Hadda fala em "sabotagem".

publicado em 21 de maio de 2014 às 12:37
Foto Nelson Antoine
terça-feira, 20 de maio de 2014
Sindicatos comandados por pelegos cada vez menos representativos
Motoristas cruzam os braços em São Paulo sem apoio do sindicato da categoria.
Na semana passada os motoristas e cobradores de ônibus do município do Rio de Janeiro fizeram dois dias de greve. Foi um movimento não encampado pelo sindicato da categoria, que já tinha negociado com os proprietários das empresas de ônibus e inclusive aprovado em assembléia um índice de aumento que uma parte significativa da categoria não aceitou e resolveu se organizar em uma greve paralela, utilizando-se de piquetes, fechamento de vias de acesso, terminais e garagens.
Esta situação também se repetiu ontem, 20/05, em São Paulo, depois que uma parte dos trabalhadores não concordou com o acordo firmado entre trabalhadores e patrões e partiu para uma paralisação organizada em um movimento espontâneo paralelo, que acabou por causar um verdadeiro caos no município.
Em ambas situações as autoridades municipais foram “pegas” de surpresa.
Alguns anos atrás acompanhei uma eleição para o sindicato dos condutores em Campinas. A oposição estava muito bem organizada, só era possível ver a campanha eleitoral deles na rua, não aparecia nada da situação, tudo parecia indicar que a oposição seria vitoriosa.
Depois fiquei sabendo pelos motoristas e cobradores da chapa de oposição que nos dias da eleição apareceram motoristas e até mesmo pessoas se dizendo motoristas, que eles nem sabiam que existiam. Resultado: a situação saiu vencedora.
Os membros da oposição denunciaram aquilo que seria a fraude, mas não aconteceu nada. Faz tempo que a imprensa faz o jogo dos proprietários das empresas de ônibus.
As oposições sindicais se organizam e vencem as eleições, porém não levam, porque são “derrotadas” por arranjos ilegais.
Assim, pelegos que não representam  mais a totalidade da base dos sindicatos que comandam, permanecem negociando em nome de uma categoria de trabalhadores, que na realidade quer vê-los pelas costas há muito tempo.
É exatamente isso que está acontecendo com os sindicatos dos condutores de São Paulo e do Rio de Janeiro.
As manifestações de junho e julho do ano passado mostraram que significativos setores da sociedade brasileira estão cada vez mais descrentes em governos, instituições e representações sociais no Brasil.
Nesse quadro, os sindicatos também estão inseridos, principalmente aqueles comandados por pelegos que perderam o rumo da história e teimosamente, de forma oportunista se negam a deixar o poder.
A perda de controle sobre a base sindical por parte dos pretensos dirigentes dos sindicatos dos condutores em São Paulo e no Rio de Janeiro é um sintoma desse novo momento que a sociedade brasileira vive.
Cansados de serem traídos e passados para trás os motoristas e cobradores estão partindo para fazer valer seus direitos com “suas próprias mãos”.
Simplesmente ignoraram o papel histórico e institucional de seus sindicados porque estes já há muito tempo não representam nada.
As autoridades públicas, principalmente na esfera municipal, terão que se adaptar à nova realidade e passar a buscar interlocução junto a estes novos líderes.
Caso contrário, continuaram sendo pegas de surpresa por movimentos espontâneos que são decorrentes da frustração de trabalhadores que, cada vez mais, perdem a confiança em seus sindicatos.
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Diretoria é surpreendida com atitude de alguns trabalhadores (as)
A direção do Sindicato dos Motoristas de São Paulo esclarece que foi surpreendida na manhã de hoje (20/05) com as manifestações realizadas na cidade por alguns trabalhadores (as) que se dizem contrários ao fechamento da Campanha Salarial 2014.
Ontem na Assembleia Geral, que ocorreu no final da tarde, mais de 4 mil trabalhadores (as) compareceram e aprovaram a proposta apresentada que foi de: 10% no salário; ticket mensal de R$ 445,50; PLR de R$ 850,00; melhoria dos produtos da cesta básica (o Sindicato irá determinar as marcas); 180 dias de licença maternidade; fim do Genérico e o reconhecimento da insalubridade, dando o direito a Aposentadoria Especial aos 25 anos de trabalho.
Além disso, ficou determinado a criação de uma Comissão para discutir outras questões como convênio médico, situação do setor de manutenção, ou seja, dar continuidade na resolução de problemas enfrentados pela categoria.
O Sindicato, através do seu presidente Valdevan Noventa e da sua diretoria, irá verificar de onde partem essas manifestações e o motivo real que levou os trabalhadores (as) a tomarem essa atitude, principalmente porque foi logo após terem aceitado e aprovado a proposta em Assembleia.
Sindicato dos Motoristas de São Paulo
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‘Paralisação de ônibus em SP é sabotagem’, diz secretário de Transportes
Motoristas e cobradores de ônibus mantêm paralisação em São Paulo. Jilmar Tatto diz que ‘líderes não aparecem’
21/05/14 – 7h15
SÃO PAULO – A Prefeitura de São Paulo não deu garantias de que haverá ônibus em circulação na cidade de São Paulo, no fim da tarde desta quarta-feira. Motoristas e cobradores de ônibus mantêm a paralisação do serviço, com bloqueios em trechos de avenidas importantes da capital, como Brigadeiro Faria Lima e Rebouças. A circulação dos coletivos está afetada nas regiões Norte, Sul e Oeste da cidade. Dez garagens de cinco empresas permanecem fechadas. Dez terminais de ônibus estão fechados. O rodízio de veículos está suspenso. O secretário de municipal de Transportes, Jilmar Tatto, não classifica a paralisação como greve, mas como sabotagem, já que “os líderes não aparecem”.
O superintendente Regional do Trabalho e Emprego de São Paulo Luiz Antônio Medeiros irá à garagem da Viação Santa Brígida, na Vila Jaraguá, na tarde desta quarta-feira, para negociar com os grevistas. Já Tatto, também à tarde, se reúne com o secretário de Segurança Pública, Fernando Grella Vieira, para definirem uma estratégia de tirar os ônibus estacionados nas ruas, que atrapalham o trânsito.
– Nunca vi greve depois do dissídio. Teve negociação salarial, teve assembleia e dissídio. Estava resolvido. Soa estranho, os líderes não aparecem – disse Jilmar Tatto em entrevista à TV Globo. Questionado se haverá ônibus para os usuários do transporte público no final do dia, Tatto disse apenas que “espera que isso aconteça e que a cidade não pode conviver com isso”.
Pelo segundo dia, a cidade enfrenta problemas. O engarrafamento às 7h já chegava aos 65 km de lentidão, acima da média para o horário. Neste período, o índice máximo esperado pela Companhia de Engenharia de Tráfego (CET) é de 47 km de ruas e vias congestionadas. Ao menos oito ônibus parados propositalmente interditam os dois sentidos da Avenida Guarapiranga, na altura da Avenida Guilherme Valente, Zona Sul de São Paulo. O fluxo na via só foi liberado às 6h30.
As empresas Santa Brígida, Via Sul, Gato Preto, Sambaíba e Vip M’Boi Mirim não estão funcionando. A Transpass funciona parcialmente. A Campo Belo, que tinha parado no início da manhã, voltou a funcionar também por volta das 7h. No Terminal Lapa, na Zona Oeste, está bloqueado. Os ônibus continuam estacionados, muitos deles sem as chaves, bloqueando a saída. Motoristas e cobradores que chegaram para trabalhar continuam dentro do terminal.
Por volta das 10h, os motoristas começaram um protesto na região da Avenida Brigadeiro Faria Lima, segundo a CET. Um grupo ocupa duas faixas perto da Rua Cardeal Arcoverde. Outros dois grupos ocupam uma das faixas da Avenida Eusébio Matoso e uma da Avenida Rebouças, na altura da Brigadeiro Faria Lima. Na Zona Sul, a Avenida Pirajussara foi bloqueada por dois ônibus. Também na Zona Sul, no Jardim Ângela, motoristas e cobradores fazem uma manifestação na manhã desta quarta-feira. Eles estacionaram os ônibus e caminham no sentido centro.
Ônibus pichados
Os ônibus no Terminal Lapa amanheceram pichados com a frase “Fora Noventa”, em referência ao presidente do sindicato. Motoristas que apoiam o movimento afirmaram que o sindicato não deu tempo para que a proposta fosse analisada.
– Esse acordo é deles e não nosso. Ninguém teve tempo de analisar. Esse sindicato não nos representa – afirmou um motorista, que pediu para não ser identificado.
A assistente de logística Roseli Carvalho de Sousa, 40 anos, saiu de casa em Osasco, Grande São Paulo, às 5h e até às 8h20 ainda não havia conseguido chegar ao trabalho, na rodovia Anhanguera.
Ela reclama dos transtornos: — A gente entende que eles estão no direito deles de exigir aumento, mas quem sempre paga o preço somos nós.
A CET informou que o rodízio de veículos está suspenso e carros com placas finais 5 e 6 podem circular.
Desde a terça-feira, a cidade enfrenta o caos no transporte rodoviário, os problemas começaram quando um grupo de trabalhadores descontente com o acordo assinado entre o sindicato da categoria e empresários bloquearam as vias e obrigarammotoristas que estavam trabalhando a abandonar veículos nas ruas.
Eleição no sindicato teve tiroteio
Em julho do ano passado, o Sindicato dos Motoristas de São Paulo suspendeu, por uma semana, a eleição de seus diretores. Os sindicalistas estavam na sede para retirar as urnas, mas houve confusão, tiros e a eleição terminou com oito pessoas feridas. Na época, o presidente era Isao Hosogi (Jorginho), que disputava com Edivaldo Santiago da Silva e Valdevan Noventa. Noventa é o atual presidente.
PS do Viomundo: Este é um fenômeno a ser estudado. Greves espontâneas pipocaram nas obras das hidrelétricas de Santo Antonio e Jirau, de trabalhadores que não eram ou não se viam representados por lideranças. No Rio, o mesmo se deu com os garis da Comlurb. Será descrença em lideranças? Gente insuflando o caos? A ver.

(Publicado originalmente no site Viomundo)

A carta de Vladimir Safatle, professor de filosofia da USP, ex-candidato do PSOL ao Governo Paulista.

Vladimir Safatle, professor de filosofia da USP que postulava a candidatura ao governo paulista pelo PSOL está fora da disputa. Partido indicou o cartunista Gilberto Maringoni para seu lugar

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Vladimir Safatle (Reprodução)
Vladimir Safatle, professor de filosofia da USP que postulava a candidatura ao governo paulista pelo PSOL, está fora da disputa pelo Palácio dos Bandeirantes.
Irritado com a legenda e o processo de disputa interna, Safatle questiona o tratamento que recebeu e a relação com a direção do partido. No domingo (18.mai.2014), o diretório paulista do PSOL indicou o historiador e cartunista Gilberto Maringoni para seu lugar.
Segundo o professor, a candidatura ao governo paulista nunca foi uma prioridade para o partido e isso tornou o conflito “inevitável”. Ele diz que e-mails privados para a direção da legenda foram publicados sem a sua autorização, o que poderia abrir espaço para uma ação na Justiça.
Safatle compara o desfecho de sua pré-campanha a uma peça de teatro. “É uma comédia que todo mundo vê de longe, os caras da esquerda se matando como se as questões internas fossem as mais importantes do mundo, um vaudeville [gênero teatral] do século 19, mostrando mais uma vez que a esquerda não está madura para apresentar uma alternativa crível”, diz.
Leia abaixo a íntegra da carta de Safatle, originalmente publicada em Diário da Liberdade:
Carta de Vladimir Safatle aos militantes do PSOL
Eu gostaria de aproveitar esta espaço para falar aos militantes do PSOL, este conjunto impressionante de sujeitos conscientes de seu lugar na história de transformação pela qual nosso país passará. Gostaria de falar com vocês com a segurança de quem sabe que lutamos pelos mesmos desejos, que nos indignamos da mesma forma e com as mesmas intensidades. Queremos as mesmas coisas e, certamente, estaremos juntos por muito tempo. Tudo está apenas começando.
Sei que muitos de vocês se entusiasmaram com a possibilidade de minha candidatura a governador em São Paulo e se decepcionaram, alguns amargamente, quando leram uma “nota interna” do diretório estadual anunciando minha pretensa renúncia. Certamente, os motivos lhe pareceram ainda mais decepcionantes. Mais sei que muitos são conscientes de como uma história só mostra seu verdadeiro sentido quando juntamos todos os seus lados. E há um lado faltante que gostaria de acrescentar a essa história. Por isto, àqueles que fizeram um juízo sobre o que ocorreu, peço que o suspendam momentaneamente. A história é diferente daquela que circulou nos últimos dias e só não me manifestei imediatamente porque esperava que ela se resolvesse de outra forma.
Há alguns setores da esquerda que, em momentos de crise, preferem ressuscitar velhos personagens de romance político ruim, como o traidor, o egocêntrico que não se sacrifica como os outros, o infiltrado, o entusiasta ingênuo, entre tantos outros que vocês já viram mais de uma vez. Melhor seria compreender tais crises como exposição de problemas estruturais que precisam ser abordados de frente caso queiramos alcançar nossos objetivos de transformação social.
Fui convidado a candidatar-me pelo partido no segundo semestre do ano passado. Depois das manifestações de junho, eu e o partido estávamos de acordo da necessidade de uma intervenção no debate eleitoral brasileiro tendo em vista a defesa de uma pauta renovada de esquerda. Havia uma convergência a respeito da importância de dar tradução programática ao profundo descontentamento social no qual o Brasil entrou, principalmente desde 2013. Desde o momento que entrei no PSOL, em outubro do ano passado (e esta era a primeira vez na vida que entrava em um partido, o que demonstra a seriedade do ato e de minha implicação subjetiva), usei o tempo para construir seminários sobre desafios de governo, levar as ideias do partido à frente, participar de inúmeras atividades partidárias, avaliar a pertinência da candidatura a partir da conjuntura e conservar espaços na imprensa que me pareciam fundamentais para o debate que gostaríamos de fazer. A ideia de deixar a decisão para abril era a mais plausível. Vinte e quatro horas depois de me filiar ao PSOL fui mandado embora da TV Cultura. Temia que a aceitação prematura da candidatura fechasse ainda mais portas que usava para divulgar nossas posições na grande imprensa. Usei este tempo também para refletir sobre o significado de uma candidatura, sobre o que seria possível fazer e se, de fato, esta era a melhor escolha de atuação política.
A partir de meados de abril, começamos a discutir questões práticas como política de alianças e infraestrutura para a campanha. Desde o início eu insistira na importância de uma política ampla de alianças à esquerda. Engajei-me pessoalmente em discutir com partidos como PSTU e Rede nestes últimos meses. Conversei várias vezes com suas lideranças. As negociações com o PSTU prosperaram, o interesse em constituir uma frente de esquerda era claro. Para mim, a constituição de uma frente era condição fundamental para impor uma dinâmica sólida de mobilização na campanha e para inaugurar uma outra forma de fazer política que não fossem refém de interesses partidários imediatos. Por isto, insisti que seria melhor definirmos inicialmente a frente antes de lançarmos a candidatura. Sabia da resistência de certos setores do partido à ideia, mas não via como concebível recuar nas alianças se o próprio PSTU lançara um manifesto, o qual assinei, pedindo a constituição da frente.
Noto ainda que esta posição se referia apenas à situação em São Paulo. Nunca interferi ou sugeri o que deveria ser feito em outros estados, e seria delirante acreditar que falaria algo a respeito. Enxergava que uma frente de esquerda nacional seria a melhor resposta para a situação política atual. Continuo pensando que nada será feito neste país sem uma política efetiva de frente que supere a fragmentação fratricida e entediante à qual a esquerda parece querer sempre retornar. Ninguém precisa de uma política especular, na qual procuramos apenas espelhos de nós mesmos. Podemos atuar politicamente compondo com nossas dissonâncias. Sei que muitos de vocês também acreditam neste pensamento.
No entanto, ao discutirmos a infraestrutura descobri o ponto mais frágil. A “nota interna” emitida pelo diretório nacional a respeito de minha pretensa renúncia à candidatura expõe tal questão como se tratasse praticamente de um delírio megalomaníaco de minha parte. Ela passa a imagem de que o partido chegara a exaustão de suas possibilidades e de que eu fora completamente insensível a isto. Tal visão é simplesmente falsa.
Primeiro, a minha última palavra não foi de renúncia, mas de aceitar a oficializar a candidatura a partir do momento que o partido conseguisse assegurar condições mínimas para o embate. Foi o partido que entendeu não haver mais tempo e que melhor seria escolher outro nome. Ninguém faria diferente se, como eu, tivesse descoberto, pela primeira vez apenas em abril, não haver nada em caixa para a campanha e que apenas a televisão e o material gráfico estariam assegurados. Durante meses ninguém me alertara para isto, expondo a real situação apenas na reta final. Eu amo demais as ideias políticas para deixá-las naufragar por falta de planejamento estratégico mínimo.
Nós gostamos de dizer, como ouvimos pela primeira vez nos movimentos Occupy, que representamos “os outros 99%”. Mas para tanto não é possível, ao menos em São Paulo, continuar tendo 1% dos votos. Este 1% não nos representa e não temos o direito de nos acomodar a ele. Durante várias vezes que discuti a infra-estrutura para a campanha, ouvi que 2% de votos estaria bom. Não penso assim, acho esta raciocínio completamente equivocado e se pensasse desta forma, não teria aceito entrar no debate em torno da candidatura. Queria saber a quem interessa que nosso partido continue pequeno. Pensar assim é abrir o caminho para a desqualificação de nossas ideias, dar a impressão de que elas não falam com quase ninguém. Por isto, é verdade, agi como quem queria impedir o partido de se acomodar ao seu tamanho. Continuo acreditando que estava certo e espero que outros também o façam.
No entanto, creio que, no fundo, a candidatura para o governo não era uma prioridade do partido. Senão seria difícil explicar porque o diretório estadual nunca foi atrás de possíveis doadores que indiquei há semanas e porque ele nunca aceitou discutir com membros da frente, como o PSTU, que estavam claramente dispostos a contribuir financeiramente de maneira substancial para a viabilidade financeira da campanha. Durante quase um mês, nada foi feito para melhorar a situação de nossa infra-estrutura, mesmo depois que pedi um cuidado especial com isto. Só quando disse não aceitar a candidatura nessas condições que algo foi efetivamente feito. Sei que o diretório é composto de pessoas extremamente dedicadas e engajadas, muitas das quais tenho real admiração, mas creio que, por várias razões, ouve uma falta de sensibilidade à importância deste problema.
O que foi exigido por mim nos permitiria fazer o mínimo: organizar atividades, contratar uma pequena equipe de pessoas que eu poderia trazer para a campanha, acrescentando-a às forças do partido para auxiliar no planejamento da campanha, na comunicação, assessoria jurídica (pois fora alertado por amigos em outras campanhas que os processos se avolumariam), assessoria de imprensa e na inteligência (montagem de dossiers temáticos, checagem de dados, pesquisa sobre problemas). Eu sabia que essa campanha seria particularmente violenta, pois se a candidatura crescesse, partidos como o PT se voltariam de maneira maciça contra nós. Eu tinha informações de não ser para eles pensável permitir que uma alternativa de esquerda demonstre densidade eleitoral em São Paulo. O que queria era ter o mínimo de condições para suportar o processo com o mínimo de planejamento de longo prazo sem obrigar as pessoas envolvida e se submeterem a trabalho voluntários. Só.
Mas os últimos dias foram a prova de que eu estava correto. Enquanto a direção estadual tornou pública uma “nota interna” que colocava toda a responsabilidade do processo em minhas costas, eu mesmo ia atrás de recursos. Conversei com contatos que havia passado ao partido e que nunca foram procurados, conversei com o PSTU que se dispôs, de imediato, a contribuir com oitenta mil reais, sendo que poderiam conseguir mais caso fosse chamado para uma reunião, que ao final nunca houve, 
a fim de discutir a viabilidade financeira da campanha eleitoral. Ao final, eu conseguira sozinho metade do que precisávamos. Esperava ter a oportunidade de sentar com as inúmeras alas do partido e procurar destravar a situação.
No entanto, na última sexta descobri que, enfim o diretório estadual havia entrado em contato com pessoas, que eu mesmo indiquei há semanas, dispostas a ajudar financeiramente. Havia apenas um detalhe: eles entraram em contato para pedir auxílio a outro candidato a governador. Se as possibilidades do partido haviam chegado a exaustão, então porque só depois que minha candidatura foi descartada o diretório estadual procurou ir atrás de doadores que eu mesmo indicara? Qual o sentido de uma atitude desta natureza?
Como disse desde o começo, entrei no partido para ficar. Creio que esta é a melhor alternativa para construirmos uma nova esquerda no Brasil e deslocarmos o eixo do debate político. Eu aceitei colocar meu nome na disputa como uma “intervenção cidadã”. Não tenho interesse em constituir uma carreira política, sou um professor que gosta do que faz. Mas acredito que há momentos nos quais devemos entrar no debate público a fim de abrir portas para que outros possam passar por elas. Este, de fato, era meu objetivo. Por isto, não funciona comigo o cálculo das ações eleitorais que se acumulam. Isto faz sentido para quem quer construir uma carreira política. Meu objetivo era simplesmente ter as condições básicas para fazer uma boa campanha capaz de mostrar a densidade eleitoral que a esquerda pode ter. Sei que isto é possível e, não sendo desta vez, tenho certeza de que faremos isto em outro momento. De toda forma, o mais importante de tudo foi ter a oportunidade de me aproximar da militância e conhecer seus desejos, descobrir a riqueza de seu engajamento e compromisso. Este é o grupo do qual quero fazer parte. Como disse no início, tudo está apenas começando.

(Publicado originalmente no site Pragmatismo Político)

terça-feira, 20 de maio de 2014

"O inimigo interno é, no conceito de pacificação de hoje, o povo todo das favelas"

Tânia Rego/ABr
Para Maria Helena Moreira Alves, professora aposentada da Universidade Estadual do Rio de Janeiro, que acaba de lançar o livro Vivendo no fogo cruzado, o Bope entra nas casas, arromba as portas, bate nas pessoas. Ela afirma que ouviu relatos de mulheres que falavam “Graças a Deus meu marido não estava em casa, porque quando tem homem eles matam”
20/05/2014
Viviane Tavares
do Rio de Janeiro (RJ)
O Brasil inteiro se acostumou a assis­tir, por anos a fio,a notícias da violência que caracterizava a vida de uma de suas cidades: em qualquer canto desse país, todo mundo sabia que, no Rio de Janei­ro, traficantes de drogas instalados nas favelas imprimiam um clima de guerra à população.
Em 2009, o Brasil inteiro recebeu, com otimismo, o anúncio de uma polí­tica que expulsaria o tráfico, ‘pacifican­do’ as favelas cariocas. Cinco anos de­pois, esse mesmo Brasil inteiro assiste, na tela da mesma TV, a cenas em que moradores dessas comunidades inter­ditam ruas, queimam pneus em protes­to e atacam a sede da Unidade de Po­lícia Pacificadora (UPP), chorando seus mortos – só que, agora, pela polícia.Depois de passar seis meses visitando, conhecendo e entrevistando pessoas de diversas favelas cariocas, Maria Hele­na Moreira Alves, professora aposenta­da da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), acaba de lançar o livro Vivendo no fogo cruzado, que ajuda a entender esse processo.
Nesta entrevista, ela explica que o projeto de pacificação que chegou ao Brasil tem origens num programa nor­te-americano que foi aplicado durante a Guerra do Vietnã e que tem semelhança com a experiência de outros países, co­mo a Colômbia. Ela localiza na ditadu­ra o início da construção de um inimi­go interno, que hoje se identifica com as populações de favela. E alerta: as pes­soas reagem quando começam a perder seus filhos.
A política de ‘pacificação’ no Brasil vem desde Duque de Caxias, passa por Canudos e hoje é encontrada nas favelas. Como se deu isso historicamente e como você avalia o que temos hoje?
Maria Helena Moreira Alves – É claro que já temos todo um precedente que apoia isso, mas o que nós temos ho­je, o programa da UPP e o termo paci­ficação, está ligado diretamente ao pro­grama dos Estados Unidos na Guerra do Vietnã, que, aqui, está ligado à dou­trina de segurança interna, que foi apli­cada durante toda a ditadura militar. Isso foi criado durante a ditadura, não foi com Duque de Caxias nem com a es­cravidão. Apesar de podermos dizer que o Bope [Batalhão de Operações de Poli­cias Especiais] parece o capitão do ma­to, na verdade ele é um soldado armado para enfrentar uma guerra interna, e o inimigo interno é, no conceito da paci­ficação de hoje, o povo todo das favelas.
Costuma-se dizer que a referência da UPP aqui no Brasil veio da Colômbia. Você diz que veio do Vietnã. O que há em comum na experiência de Brasil, Colômbia e Vietnã?
Têm em comum o cerco, a tomada do território, o trabalho primeiro mili­tar, seguido de um trabalho social. No Rio, o trabalho social nunca chegou, fi­cou só no repressivo. Em Bogotá sim, teve mais trabalho social, que também não foi adiante, mas a repressão foi mais intensa. O Vietnã foi o modelo, com um programa que se chamava Pacification Hamlets. Era o cerco das aldeias que eles achavam que estavam sob influên­cia dos vietcongues, em áreas do Vietnã do Sul, que estava em guerra com o Viet­nã do Norte. Os Estados Unidos apoia­vam o Vietnã do Sul, mas havia várias áreas que estavam sob influência dos vietcongues. E nesses territórios eles fi­zeram o Pacification Hamlets, que se­guia muito o modelo que agora a gente vê da UPP: primeiro uma invasão militar do território, seletivamente eliminando os líderes mais importantes; depois uma segunda onda de repressão que envolvia tortura não seletiva – já não eram os lí­deres, mas qualquer pessoa comum que eles pegavam, torturavam e jogavam pa­ra as outras verem, como parte do ter­ror; e controle de modo que a aldeia fi­casse pacificada pelo medo. Mas vinha uma segunda etapa que era para ga­nhar corações e mentes, com programas de educação, esportes em geral e saúde também, com muita coisa voltada para crianças. A ideia era dividir a comunida­de, que algumas pessoas que estivessem envolvidas em programas sociais achas­sem bom e tentassem ignorar a parte re­pressiva. E a parte repressiva passava a ser mais escondida. No caso do Vietnã, quando houve o massacre muito famo­so em My Lai, o povo se rebelou e os Es­tados Unidos tiveram que fugir quando perderam a guerra. E o mesmo vai acon­tecer no Brasil. Chega um momento em que a política de terror gera mais raiva do que medo. É parte da própria sobre­vivência: qualquer animal quando es­tá muito acuado se defende atacando. E essa reação vem quando você começa, por exemplo, a perder seus filhos.
Qual é o objetivo da pacificação e quem está sendo pacificado?
A população que está sofrendo esse processo é aquela que não é útil para o sistema econômico. Então, se eliminá­-la, não faz falta. O que eles estão eli­minando são os jovens pobres, negros, analfabetos que não servem para a mão de obra, aquela mão de obra fácil, que já tem muito. Em termos de direitos hu­manos, o Brasil é um dos piores países. É sempre importante lembrar que esta­mos em um país que não está em guerra declarada, embora o ex-governador do Rio de Janeiro tenha declarado guer­ra, mas isso foi da cabeça dele. O Bra­sil está em situação de rebelião popular, mas não é uma guerra civil, ainda. Es­pero que não venha a ser. Se continu­ar essa pressão, até pode vir a ser, co­mo é o caso da Colômbia. Muitos ca­sos, como o da Nicarágua, com o levan­te de Manágua, que eu vivi quando mo­rei lá, foram causados também pelo ter­ror, que controla até certo ponto. De­pois, quando você não tem mais espe­rança, acaba o medo. O levante de Ma­nágua foi quando aconteceu a operação Herodes, no final do governo contra os sandinistas, na qual eles mandaram ro­dear certas áreas mais combativas de Manágua, retiraram à noite das casas os maiores de dez anos e metralharam na rua, com argumento de que eles já estavam entrando na Frente Sandinista de Libertação Nacional. É muito pareci­do com a forma como a polícia brasilei­ra fala que o jovem vai virar traficante: “Nasceu, vira criminoso”. E eles mata­ram tantas crianças, que houve uma re­belião total, as pessoas se juntaram aos sandinistas e fortaleceram o movimen­to, que ganhou a revolução. E as pesso­as falaram que acabou o medo quando não tinham mais nada a perder. Hoje, o que temos? O Bope entra nas casas, arromba as portas, bate nas pessoas... Ouvi relatos de mulheres que falavam “Graças a Deus meu marido não esta­va em casa, porque quando tem homem eles matam”.
Mas, nos exemplos que você cita, como o da Nicarágua, havia forças de esquerda organizada com a qual a população revoltosa se aliou. Como isso se dá no Brasil?
Nós temos um exemplo histórico úni­co no Brasil de organização de revolta popular, que são os quilombos. Infeliz­mente, não se trabalha muito com isso, mas somos um dos únicos países que teve uma revolução popular de escra­vos que chegaram a fundar cidades, fo­ram mais de 8 mil quilombos. Eu acho que ainda temos essa cultura nas fave­las pelo trabalho comunitário, o chama­do mutirão. Existe muito dos quilom­bos nesse sentido. Fiquei admirada de ver que, quando começava um tiroteio nas favelas, apareciam pessoas de tudo quanto era lugar e esvaziavam a esco­la em 20 minutos. Retiravam mil crian­ças, não necessariamente deles, mas de vizinhos, e elas ficavam protegidas até os pais voltarem. É uma organização comunitária muito profunda de solida­riedade. Não é que as pessoas estejam a favor do tráfico ou achem o tráfico me­lhor do que a polícia, mas diziam o se­guinte: o traficante local é da comuni­dade, nós temos menos medo dele por­que se você não for diretamente contra ele, ele não faz nada com você nem com a sua família, já a polícia não, vai con­tra todo mundo. A diretora de uma das escolas em que eu estive no Complexo do Alemão me contou que, durante um tiroteio muito grande, houve um mo­mento em que o Bope entrou, com Ca­veirão e tudo, e começou a dar tiros de dentro da escola. Tiraram até telhas pa­ra dar tiro. E no dia seguinte veio o che­fe do tráfico reclamar com ela, dizendo: ‘como é que você deixa uma coisa des­sas? Eu tenho filho nessa escola’.
Agora, sobre rebelião popular, é outra coisa. Acho que você tem razão. Nós não temos condições hoje de organizar ne­nhuma resistência – eu nem diria rebe­lião – com caminhos dirigidos, como tí­nhamos esperança, quando fundamos o PT, de que o partido fizesse esse papel. Seria o caminho da classe trabalhadora guiada pelo PT para um jeito petista de governar, mudando todas as referências, não fazendo alianças, inclusive com uma coisa que também não aconteceu, e que é triste, que era o novo movimento sindical ser autônomo, não ligado a nenhum go­verno. Durante um tempo isso foi mui­to forte, mas hoje a CUT tem dirigentes no governo, acabou a autonomia do mo­vimento sindical e, de certa maneira, de outros movimentos também. Então, di­minuíram os movimentos sociais como uma corrente que possa organizar o povo e não existe partido que possa organizar o povo em geral, porque todos estão vin­culados a uma política de interesses. Isso é muito grave porque a população deixou de acreditar nas instituições. E o que po­de ser uma rebelião popular, então? Pode ser uma explosão social, do tipo queima tudo, quebra tudo, sem direção, que po­de virar fascista ou pode ser só quebra­-quebra e ter um massacre geral de re­pressão e voltar à situação de repressão interna das comunidades mais pobres. Até ter outra explosão. Isso acontece em vários países. Tem que ter um grande lí­der carismático e todo um movimento por trás organizado para conseguir is­so. E o Brasil não tem mais nem um líder carismático. Eu acho que o Lula ainda é, mas já não tem mais a força da condução de um movimento, como tinha antes. Ele podia ter feito isso em 2002, acho que ti­nha 80% de aprovação para fazer trans­formações profundas. Na hora em que não fez, em que começou a fazer alianças para governar dentro do modelo político que existe, tirou essa possibilidade. E ho­je em dia acho que o povo está descrente. Então nós podemos ter uma situação de muita confusão, muita briga na rua, mas sem uma condução política.
Você disse que a política de segurança mudou muito pouco, mas muitas pessoas acreditaram nas UPPs. Por quê?
Acho que as pessoas tiveram uma es­perança muito grande por chegarem outras coisas com a UPP. E se foi ven­do, com o passar do tempo, que não era isso. Lembro de uma frase de uma mo­radora da Rocinha [favela do Rio de Ja­neiro] que, quando perguntada se era a favor da UPP, respondeu: ‘Estou em si­lêncio’. E foi indagada que, se estava em silêncio é porque estava gostando, e ela respondeu que o silêncio significava o medo. Se você mora lá, diante da vio­lência, não é possível dizer que é contra, com sua família na mira de uma metra­lhadora em cada esquina. E essa popu­lação está em um fogo cruzado porque os donos do morro ainda estão lá, mas os mandantes estão fora da favela. No livro Vivendo no fogo cruzado, a entre­vista com Beltrame [secretário de se­gurança do Rio de Janeiro] mostra que não tem traficante nas favelas, que eles moram fora das favelas, o que existe é o pequeno tráfico, vendido em envelopi­nho de R$ 300. O governo não está com véu nos olhos e sabe quem comanda o tráfico e quem comanda o tráfico é in­ternacional.
Ainda é cedo para avaliar a estratégia adotada no Brasil, como defende o secretário de segurança pública do Rio de Janeiro José Mariano Beltrame? O que já dá para avaliar hoje?
A UPP está muito clara. É possí­vel avaliar há muito tempo. O Beltra­me, por ser um intelectual e ter uma certa vivência que vai além da UPP, ele não gosta muito do programa. In­clusive na entrevista do livro [Vivendo no fogo cruzado] ele diz que não gosta do nome ‘pacificação’ por chamar mui­ta atenção ao que realmente é. O que não está claro é por que o governo fede­ral está apoiando. E por que a Ministra de Direitos Humanos chora quando vê uma notícia como a da mulher arrasta­da [Cláudia Silva Ferreira], a do Ama­rildo, e depois não faz nada de concre­to. Não tem uma intervenção do Go­verno Federal. E tinha na época do Lu­la, isso eu tenho que dar crédito a ele, mas ele acabou se aliando ao Cabral, e a aliança com o Cabral foi mais impor­tante do que os direitos humanos. Ali­ás, ele nos falou isso em uma das entre­vistas: que faria aliança até com o diabo se fosse necessário para o Brasil apro­var as leis sociais para acabar com a pobreza. ‘E para passar as leis no Con­gresso, eu preciso do PMDB. E o PM­DB no Rio é o Cabral. Eu tenho que me aliar ao Cabral’, ele disse. Era uma crí­tica dele mesmo ao sistema de governo. Ainda estávamos no Pronasci [Progra­ma Nacional de Segurança Pública com Cidadania], mas ele já sabia que o pro­grama iria morrer. O que precisamos é uma reforma geral, temos que rever a Constituição. Antes eu falava de des­militarizar, mas agora eu defendo que a PM deve ser abolida. Precisamos de uma polícia civil para lidar com o povo, melhorá-la, treiná-la, trabalhar com in­teligência, não pode ser os que estão aí hoje, mas acho muito difícil. A PM está nas mãos dos governadores.
Por que o Pronasci não vingou?
Eu acho que existem interesses por trás que estão vinculados ao crime or­ganizado e que não querem que o pro­grama dê certo. Realmente não inte­ressa a muita gente poderosa – eu não diria que está no poder, diria podero­sa – do crime organizado internacio­nal, que está vinculado com o crime lo­cal, que isso dê certo. É mais fácil com­prar a polícia, formar miliciano, do que ter uma polícia eficaz que trabalha com a comunidade e vai prevenir crime. Is­so é bem claro. Os governadores não querem porque têm o Exército nas suas mãos e muitas vezes defendem interes­ses não só deles, mas interesses econô­micos próprios. Vi uma notícia de que a senadora Kátia Abreu está apresen­tando um projeto no Congresso que eli­mina o cadastro das empresas que têm trabalho escravo. Isso é muito grave e mostra como ainda existem interesses até para manter a escravidão.
A investigação coordenada por Philipp Alston, relator especial da ONU sobre Execuções Extrajudiciais, Sumárias ou Arbitrárias, aponta diversas iniciativas como o fim da polícia militar e do caveirão, a instalação da ouvidoria da polícia de forma séria e a eliminação dos ‘autos de resistência’ ou ‘resistência seguida de morte’ para o avanço da segurança pública no país. Isso pode ajudar?
As sugestões do Philipp são impor­tantes porque vêm da ONU, mas Luiz Eduardo Soares já falava isso e con­tinua falando. Hoje a OAB já assumiu esse discurso. É importante que seja a ONU porque há possibilidade de san­ções sobre o Governo Federal. E não vai ter esse papo de que não posso inter­vir porque a Constituição não deixa. Is­so é difícil porque faz parte da geopolí­tica internacional não falar da violência do Brasil, não falar mal da UPP, não fa­zer sanção. Se o que está acontecendo no Brasil fosse na Ucrânia seria um es­cândalo internacional. Há todo um es­quema internacional, porque querem que o Brasil continue fazendo o seu pa­pel de subimpério. A doutrina de se­gurança nacional com desenvolvimen­to existe ainda e o papel geopolítico do Brasil como a Escola Superior de Guer­ra concedeu ainda está vigente dentro do contexto geopolítico internacional. Não é à toa que o Obama deu palmadi­nha nas costas do Lula e falou que ele é o cara. O Lula não entendeu o que isso quis dizer. Ele é o cara ideal para con­duzir o país em uma geopolítica que in­teressa aos Estados Unidos, que nunca quiseram reformas políticas profundas no Brasil. Pode ter o Mujica no Uruguai que eles aguentam, dão prêmio, mas o Brasil é outro papo. O Brasil tem fron­teira em quase toda a América Latina, domina o Atlântico inteiro, de lado a la­do, com isso domina a África, e isso tu­do está dentro da concepção da doutri­na de segurança nacional e internacio­nal da Escola Superior de Guerra. (Es­cola Politécnica de Saúde Joaquim Ve­nâncio/Fiocruz)
(Publicado originalmente no Brasil de Fato)