pub-5238575981085443 CONTEXTO POLÍTICO.
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terça-feira, 25 de fevereiro de 2014

A candidatura de Paulo Câmara, um frio cobrador de impostos.





José Luiz Gomes escreve

                               Difícil reagir à frieza do candidato escolhido pelo governador Eduardo Campos como postulante à sua sucessão no Palácio do Campo das Princesas, nas próximas eleições. Esse fato, aliado à sua personalidade discreta de um técnico que nunca se apresentou às urnas, talvez explique os comentários comedidos dos analistas políticos sobre o seu nome, salvo uma evidente torcida de alguns veículos de comunicação local. A rigor, o insosso Paulo Câmara, pelos primeiros pronunciamentos, terá que melhorar bastante sua performance ao falar em público, construir um discurso mais sintonizado com os companheiros de chapa, além de afirmar uma identidade própria, menos atrelada ao prefeito do Recife, embora não se negue as semelhanças quando se está em jogo o perfil técnico. 
                               Competia ao governador, como líder maior da coalizão socialista, a última palavra sobre o assunto. Seu leque de opções era expressivo e, com maior ou menor intensidade, todos se movimentavam com o propósito de serem “ungidos”. Como se sabe, alguns ficaram pelo caminho. Ora pela ousadia, ora pelas arestas, ora pela incompatibilidade evidenciada pelas pesquisas realizadas pelo marqueteiro oficial do Campo das Princesas, ora por não se adequarem à imagem que o governador tenta passar à população como candidato à Presidência da República.
                               Ao que se sabe, todos se comportaram bem. Exceção mesmo apenas para o famoso churrasco de Aldeia, organizado por “Andrei Gromiko”, que teria deixado o governador irritado. Logo no início das discussões em torno da escolha do candidato à sua sucessão, Paulo Câmara, do dono do cofre, aparecia bem na fita. Na reta final, outros nomes ascenderam e nem ele mesmo acreditava numa reviravolta, motivada por circunstâncias políticas específicas. Paulo Câmara não era o primeiro nome na lista de preferências do governador.
                               Alguns aspectos pesaram em sua decisão, um processo nevrálgico, que produziu, como já afirmamos, algumas vítimas, entre os quais o vice-governador, João Lyra Neto. Profundo equívoco considerar como verdadeiras as suas palavras de que o governador conseguiu “unir a Frente Popular”. As pesquisas realizadas pelo argentino Diego Brandy, que acompanhou todo o processo decisório, foram fundamentais. Elas apontavam um perfil de candidato “não político”, assim como ocorreu com o hoje prefeito Geraldo Júlio, nas eleições de 2010. Não por acaso, Paulo Câmara, em seus primeiros pronunciamentos, tentou “colar” sua imagem à do prefeito, apresentando-se como um técnico que será o primeiro a acordar e o último a dormir. Faltou somente o capacete.
                               Nas últimas semanas antes da decisão, surgiram várias notícias da imprensa nacional sobre a “sucessão familiar” em Pernambuco, o que teria levado o governador a “calcular” o desgaste sobre a escolha de um candidato com laços de consanguinidade junto à família Campos. Paulo Câmara não foge a esse perfil, pois é casado com uma prima “distante” da primeira-dama do Estado, Renata Campos. Em todo caso, havia postulantes mais próximos, o que, a princípio, minimizaria os danos. De fato, há parentes demais no Governo.
                               Outro fator relevante a ser considerado, é a candidatura presidencial do governador Eduardo Campos. É evidente sua escolha por um nome que pudesse ser associado à imagem da “Nova Política” que ele pretende vender ao eleitorado nas eleições de 2014. Essa “Nova Política” é o maior embuste eleitoral, mas os marqueteiros, aliados às pesquisas qualitativas e às assessorias de comunicação, são capazes de muitas proezas.
                               A campanha e os debates poderão nos informar quem é esse sujeito que atende pelo nome de Paulo Câmara. Por enquanto, ele é apenas um candidato de proveta, produzido pela prancheta dos marqueteiros do Campo das Princesas, para atender aos projetos do governador Eduardo Campos. A própria composição da chapa indica suas fragilidades. Nem os prefeitos socialistas o conhecem. Fernando Bezerra Coelho, experimentado no traquejo político, terá que suar a camisa para carregar o andor. Não deverá, sequer, contar com a ajuda do padrinho Eduardo, envolvido até o pescoço em seu projeto presidencial.

                               No entanto, aos poucos, em doses homeopáticas, começam a surgir os bombardeios contra o cobrador de impostos. Segundo o Banco Central, até setembro último (2013), o Governo do Estado teria arrecadado menos do que gastou com o custeio da máquina, ou seja, despesas com pessoal, investimentos etc. Até recentemente, teria retirado recursos de programas como o Chapéu de Palha – de corte social – para honrar compromissos com a construtora Odebrecht em relação à Arena da Copa, o que já era previsto, num erro de avaliação das autoridades do Estado, que não esconde sua arrogância de competência técnica. Aliás, já faz algum tempo que uma professora da área de economia da Universidade Federal de Pernambuco, ao analisar em profundidade os famosos “PIBs” do Estado, concluiu que, a rigor, seus índices não se traduzem em benefícios sociais para a população.
                               Pelas redes sociais, chegam as notícias de insatisfação dos produtores e comerciantes dos polos de confecções do Estado em relação aos altíssimos impostos cobrados aos micro e pequenos empreendedores. Segundo comenta-se, as autoridades fazendárias do Estado teriam jogado pesado, realizando blitez nas estradas, apreendendo peças de tecidos, confecções prontas, etc. Caruaru, Santa Cruz do Capibaribe, Toritama, Jataúba, Brejo da Madre de Deus estão entre as cidades mais atingidas.Talvez aqui merecesse algumas considerações à política de incentivo fiscais do Governo, traduzida por alguns analistas como robinhoodiana às avessas, ou seja, através de suas práticas de isenção, acaba, no final, retirando recursos dos mais pobres para entregar aos mais ricos.  
                               Por falar em Caruaru, vem da Princesa do Agreste, quem sabe, um dos maiores focos de resistência ao nome de Paulo Câmara. Assim como ocorre com Campina Grande, no Estado vizinho da Paraíba, os arranjos políticos celebrados na Princesa do Agreste repercutem nas eleições estaduais. Caruaru é um vértice do chamado “triângulo das bermudas” eleitorais do Estado. Com o objetivo de serenar os “ânimos” entre os Lyras, o Palácio teria prometido mundos e fundos ao correligionário, inclusive, o apoio ao nome de Raquel Lyra como candidata à prefeita nas próximas eleições municipais. Não se sabe se teria combinado com José Queiroz (PDT), atual prefeito e seu escudeiro fiel naquela cidade. Do ponto de vista das formalidades, o governador teria feito barba, cabelo e bigode na Princesa do Agreste. Além dos Lyras e dos Queiroz, até o grupo do Deputado Estadual Tony Gel está com o governador. Em tese, apenas em tese, o governador, como diria uma velha raposa da política local, tem um cardápio variado: carne-de-sol, charque e, não fosse suficiente, pode subir ao Alto do Moura para dividir uma chã de bode com os novos aliados. Apesar disso, não convém apostar suas fichas num engajamento da família Lyra. Eles podem não suar a camisa pela eleição do cobrador de impostos.

                               Não restam dúvidas de que o PSB possui alguns ativos importantes no Estado. Apenas filiados ao partido, soma-se mais de cinco dezenas de prefeitos, além de outros tantos da coalizão. Governa o Estado já pelo segundo mandato. Por outro lado, com o apoio do Planalto, a oposição está montando uma chapa bastante competitiva, liderada pelo senador Armando Monteiro (PTB). Apesar do esboço de uma candidatura própria, o PP de Eduardo da Fonte deve compor a chapa, assim como o PT. Armando já entra com uma boa capilaridade política em regiões importantes do Estado e deverá contar com o apoio decisivo do Planalto, que anda com o "Galeguinho' atravessado na traqueia. Paulo Câmara, o cobrador de impostos, não terá vida fácil, como se poderia supor. 

Cássio Cunha Lima dá uma rasteira no "Mago".


As próximas eleições para o Governo da Paraíba terão alguns ingredientes especiais. Pelo andar da carruagem política, Ricardo Coutinho(PSB) e Cássio Cunha Lima(PSDB), antes aliados, deverão se enfrentar nas urnas, produzindo uma disputa acirrada e inédita, entre dois candidatos praticamente invictos em eleições majoritárias. A ascensão do "Mago" é um fato que ficará registrado nas anais políticos do Estado. Militante estudantil, capitaneando um projeto político arrojado, ele saiu de vereador a governador de Estado em apenas 13 anos. Ao longo dessa trajetória, muitos amigos e antigos companheiros foram ficando pelo caminho, a exemplo do ex-prefeito de João de Pessoa, Luciano Agra, que realizou um conjunto de obras significativas para a cidade.   Possivelmente, o melhor prefeito das últimas décadas, apesar de uma gestão que durou apenas dois anos e meio. Amigos que tiveram uma participação fundamental na construção de sua bem-sucedida carreira política. Quando estou naquele Estado, uma de minhas paixões é acompanhar o debate político que ali ocorre, seja assistindo bons programas televisivos ou conversando com os amigos sobre os termômetros da temperatura política local. Até bem pouco tempo, o "Mago" era um ativo participante das redes sociais, com quem trocávamos algumas ideias pelo microblog Twitter. Peça-chave na construção de sua condução ao Palácio da Redenção, Cássio Cunha Lima abandonou o barco socialista, apesar dos inúmeros apelos do governador de Pernambuco, Eduardo Campos. Quando esteve em Pernambuco recentemente, o senador mineiro, Aécio Neves (PSDB), teria aconselhado a Eduardo Campos a desistir da ideia. Oficialmente Cássio é candidato e lidera todas as pesquisas até o momento, criando um grande embaraço para o socialista Ricardo Coutinho. Apesar de hábil, Ricardo não possui as manhas de um legítimo herdeiro da família Cunha Lima, cevada nos estertores da política paraibana há décadas. Um companheiro jornalista nos confidenciou recentemente, num caloroso almoço de domingo no restaurante Mangai, que quando surge uma raposa no galinheiro da política paraibana, logo se conclui que apenas os Cunha Lima saberiam como enfrentá-la. Ardiloso, todas as previsões indicam que ele dará uma rasteira no "Mago", uma de suas últimas crias. Se preparou o bote, sabe que não voltará de mãos vazias. 

Dulce Pandolfi: "Mudar é difícil, mas é possível".




Hoje é dia de comemoração e de muita homenagem. São comemorações e homenagens com múltiplos significados. Para vocês, formandos, o início de um novo ciclo. Para os pais, a alegria e a sensação do dever cumprido. Para a Fundação Getúlio Vargas, mais uma meta atingida. Para os homenageados, a satisfação pela escolha. Para mim, e, certamente, para o Claudio, uma emoção forte por esse momento especial. 

De início, é necessário destacar que compartilhar essa homenagem com o também pernambucano Paulo Freire é uma grande honra. E esse é um compartilhamento que tem muitos sentidos pessoais e históricos. 

Lembro que no início dos anos 1960, eu, estudante secundarista em Recife, acompanhava, entusiasmadamente, a batalha que Paulo Freire travava com os educadores mais tradicionais. Ele insistia: “não basta saber ler Eva viu a uva. É preciso compreender qual a posição que Eva ocupa no seu contexto social, quem trabalha para produzir a uva e quem lucra com a produção da uva.” Dessa boa briga resultou um dos mais belos movimentos culturais do país: o MCP, o Movimento de Cultura Popular. Pouco tempo depois, considerado persona não grata pela ditadura implantada no Brasil em 1964, Paulo Freire foi preso e expulso do país, mas seu método de ensinar saiu de Recife e ganhou o mundo. Hoje, ele é reconhecido internacionalmente como um dos maiores pensadores no campo da educação do século XX. 

Sabemos que compreender os processos sociais e entender o sentido das ações humanas é objetivo dos cientistas sociais. Portanto, mesmo de uma forma bem breve, cabe refletir sobre os sentidos presentes nesse momento ritual, presentes nessa homenagem. 

Ainda que com intensidade variada e por motivos diversos, 2013 foi um ano que marcou o país, o Cpdoc da Fundação Getúlio Vargas, a vida de vocês, a minha vida e a vida de Claudio. 
Foi o ano que movimentos sociais explodiram em diversas cidades do Brasil; foi o ano que a luta contra a tortura, uma luta muito cara para mim, ganhou maior expressão na sociedade brasileira; foi o ano que vocês, os formandos de 2013, exerceram o direito de se indignar e com criatividade e firmeza enfrentaram práticas institucionais autoritárias incongruentes com as mais básicas lições de convívio democrático. Assim, vocês mostraram, como costumava dizer Paulo Freire, que “mudar é difícil, mas é possível”. 


Foi ainda com Paulo Freire que aprendi, e espero ter conseguido passar isso para vocês nas minhas aulas, que ensinar não é apenas transmitir conhecimento, mas é, sobretudo, criar as possibilidades para a própria produção do conhecimento. Como vocês bem sabem, produzir conhecimento exige investigação, análise e capacidade crítica. Como estudantes, vocês fizeram uso da crítica como arma para cobrar coerência e enfrentar o autoritarismo. Com isso, vocês marcaram a história do Cpdoc. Essa e outras experiências fora da sala de aula somadas ao aprendizado adquirido na sala de aula, certamente farão de vocês bons profissionais. Profissionais que compreendam os processos sociais e entendam o sentido das ações humanas, sabendo que o trabalho intelectual para ser eficaz, assim como uma vida para ser bem vivida, exige dedicação, abnegação e vocação. Profissionais que saibam perguntar e estabelecer diálogos como um método de investigação eficaz para desvendar os sentidos dos pensamentos e práticas que movem a sociedade. Profissionais sempre dispostos a se renovar, a se submeter e a promover contínuos aprendizados. 

Com essa perspectiva, antes de concluir, quero prestar aqui duas homenagens. A primeira é para meus amigos e ex colegas de trabalho Lucia Lippi, Maria Celina D’Araújo, Marly Motta, Dora Rocha, Helena Bomeny, Mario Grynszpan, Cristiane Jalles, Angela Castro Gomes e Claudio Pinheiro, que saíram ou foram demitidos do Cpdoc e com quem tanto aprendi. Não sei quantos de vocês foram seus alunos. Os que estão ingressando na Escola de Ciências Sociais da FGV, escola que esses profissionais dedicados, abnegados e vocacionados ajudaram a construir, lamentavelmente, não terão mais esse privilégio. 
A segunda homenagem é para os alunos de História e Ciências Sociais da FGV, muito especialmente para Aline, Gabriela, Felipe, João Pedro, José, Layssa, Marcelle, Thiago, e Victor, os formandos de 2013. Segundo o dicionário Aurélio, patrono é sinônimo de padroeiro, padrinho, advogado. E naquela batalha travada em setembro de 2013 quando eu e Claudio, considerados personas não gratas, fomos demitidos do Cpdoc, vocês entraram na briga de corpo e alma e atuaram como nossos padrinhos, nossos padroeiros, nossos advogados. Enfim, nesse sentido, vocês foram nossos patronos.
Por tudo, mas, sobretudo, pela ela boa briga e pela corajosa homenagem, meu muito obrigada. 




Dulce Pandolfi

21/2/2014

E se um beija-flor pousar na sua janela?

Vigilância Líquida, mais recente obra traduzida do autor polonês, estuda a crescente e muita vez perigosa demanda por "segurança" e sua ameça à política.



Léa Maria Aarão Reis
ista.edu
Depois de criar a consagrada expressão modernidadelíquida para a vida contemporânea – fluida, inconstante, insegura e insatisfatória – e a mesma conceituação para a pós-modernidade, uma modernidade tardia e “perturbadora” como a que vivemos hoje; e após inscrever vários best sellers sobre o assunto(Modernidade líquida, Amor líquido, Vida líquida e Medo líquido) na sua vasta obra literária, o polonês Zygmunt Bauman, 83 anos de idade e sempre transbordando de energia, publicou no Brasil, há apenas um mês, mais um volume do que podemos chamar de série - ou de coleção.
 
Vigilância líquida (Liquid Surveillance [A Conversation]), editado no Brasil pela Zahar, é o resultado de recentes conversas de Bauman, professor emérito das universidades de Varsóvia e de Leeds, na Grã Bretanha, com o amigo David Lyon, professor da Universidade de Queens, no Canadá, que assim como ele também é sociólogo e estuda os mecanismos de controle e vigilância da sociedade, no caso a sociedade líquida, e as demandas de “segurança” crescentes – muitas delas artificiais, como as que procuram classificar como terrorismo determinadas manifestações políticas - estimuladas por empresas de tecnologia ou, com frequência, pelos interesses de ocasião de grupos e partidos políticos.
 
O objetivo do livro, segundo Bauman e Lyon, é a compreensão crítica da nossa sociedade pontilhada de câmeras de vídeo, por exemplo, que se multiplicam nos espaços públicos. É sobre a vigilância que aumenta sobre os indivíduos quando fazem suas compras mais rotineiras. O controle originado na participação nas redes sociais, notwitterfacebook (“o privado é público, é algo a ser celebrado e consumido tanto por incontáveis ‘amigos’ quanto por ‘usuários’ ocasionais”, lembram os autores) ou uma simples busca, uma pesquisa no google que resulta no monitoramento, sem o nosso conhecimento, da intimidade de cada um. Os “fragmentos de dados pessoais obtidos para um objetivo são facilmente usados para outro fim”.
 
Todo este imensurável material, arquivado em gigantescos bancos de dados de perfis,está prontos para ser usado e manipulado a qualquer momento. Em um aeroporto, durante uma inocente viagem de férias, em um check in de hotel ou numa abordagem policial. Bancos de dados que fazem dos mecanismos de controle daquele futuro pintado por Orwell um ameno refresco de laranja. Mas, ao mesmo tempo, assim como em 1984estamos todos (ou estaremos) perfilados à revelia e controlados por um poder já hoje invisível.
 
David Lyon escreve: “Somos permanentemente checados, monitorados, testados, avaliados, apreciados e julgados.” E lembra: vigilância para proteção é uma coisa; vigilância para controle, outra.
 
Os acessos online, as senhas para ingressar em prédios comerciais e mesmo residenciais (esses, já há tempos de uso comum nas grandes cidades dos países centrais), os cartões de controle em código, o login, a leitura de impressões digitais em bancos, a apresentação de documento de identidade requerida com frequência cada vez maior, enfim, a “vigilância é uma dimensão central da modernidade”, diz Bauman, concluindo sobre essa invasão (des)controlada. E a própria invasão, líquida e fluida por sua vez, e por isto mesmo despercebida pelos ingênuos e pelos distraídos, exerce controle e vigilância permanente, se infiltrando e se espalhando em todas as áreas da vida líquida e “perturbadora”, no dizer de Lyon.
 
Mas além desse tipo de modernidade que tem se “liquidificado” (como define Bauman), em novas e diferentes maneiras, e para além do mantra de Marx e Engels do “tudo que é sólido se desmancha no ar” e do ambiente perigoso do deleto, desconecto, bloqueio, os dois sociólogos trazem suas reflexões, em Vigilância líquida, para um outro aspecto do controle/vigilância invisível - o político, tão ou mais perigoso da inquietante atualidade.
 
Mídias sociais e drones; a aterrorizante vigilância pan-ótica (no caso, pós-pan-ótica) criada na arquitetura de prisões de última geração; a (in) segurança no cotidiano; o consumismo e a classificação social (ser um árabe ou um muçulmano, hoje, pode ser um problema em qualquer aeroporto ou fronteira; e, dependendo do momento da chamadaconjuntura, o mesmo ocorre para um latino-americano: um mexicano, um venezuelano, por exemplo, num aeroporto dos Estados Unidos). Estes são temas do livro publicado agora.
 
Concluindo a conversa entre Bauman e Lyon, considerações sobre Ética e Esperança. “A vigilância digital é uma espada afiada cuja eficiência ainda não sabemos como reduzir”, escreve o pensador polonês. “É uma espada com dois gumes que ainda não sabemos manejar com segurança.”
 
No aspecto político, evidentemente o 11 de setembro foi um marco fundamental para a expansão desordenada das novas tecnologias de espionagem e vigilância. No seu livro, Bauman sublinha “o aumento espetacular do número de drones reduzidos ao tamanho de uma libélula ou de um beija-flor confortavelmente empoleirado no peitoril de uma janela; ambos (drone e beija-flor) destinados, na saborosa expressão do engenheiro espacial americano Greg Parker, a ‘desaparecer em meio à paisagem’.
 
Ele relembra que mais de 1900 insurgentes nas áreas tribais do Paquistão foram mortos por drones americanos – os famosos predators – desde 2006.
 
Reduzidos agora ao tamanho de pássaros, mas preferivelmente de insetos - osdesigners militares já trabalham nesses drones mais avançados. Os movimentos de voo das mariposas, por exemplo, são mais fáceis para a tecnologia imitar do que o bater de asas dos pássaros.
 
Pergunta-se, enquanto as mariposas não entram em cena – ou melhor, na paisagem: o que você fará se, de repente, um dia, um beija-flor vier e pousar na sua janela?
 
Para Bauman, vive-se a época do divórcio entre o Poder e a Política – pelo menos na Europa onde, mesmo ainda eficiente comparado aos padrões nacionais, o sistema do bem-estar social está sendo desmantelado. “Poder e Política estão se separando (...) e a política parece irrelevante para os problemas e temores da vida das pessoas. O Estado perdeu Poder e não consegue manter e cumprir as promessas feitas há 50 anos; sem ele, oferece-se cada vez menos aos cidadãos.”
 
Para Zygmunt Bauman, a qualidade da democracia, que viveu sua época de ouro há meio século, está hoje em decadência. Uma visão eurocentrista a registrar o que se passava, na época, no velho continente europeu. O oposto do que vivemos, então, no Brasil e no continente sul-americano.
 
Na cena da realidade atual onde, segundo o sociólogo, “estamos todos numa solidão e numa multidão ao mesmo tempo”, Bauman repisa dois dos conceitos básicos do seu pensamento – a segurança e a liberdade. Sem a segunda a primeira é “escravidão”, em suas palavras. Mas para alcançar a segurança é preciso entregar um pouco da liberdade. Ganha-se algo por um lado, perde-se pelo outro. “E ninguém encontrou ainda a fórmula de ouro da mistura perfeita,” diz ele.
 
O que não significa que, livre, o indivíduo encontre a forma suprema da segurança na (in)segurança.
 
Otimista, e criticando os falsos gurus de hoje que ganham fortunas escrevendo livros e dando cursos sobre como encontrar a felicidade, Bauman conclui em Vigilância líquida: “A história não vai destruir nossas esperanças – desde que escutemos seu aviso.”
 
Ou que o tal beija-flor não pouse, de repente, no peitoril da nossa janela.
 
 
Em tempo: esta semana, Edward Snodewn observou a propósito da questão da vigilância de massa digital:
 
"Hoje, uma pessoa comum não pode pegar o telefone , enviar e-mail a um amigo ou encomendar um livro sem  registrarem suas atividades que estão sendo criados em arquivos e analisados por pessoas com autoridade para colocá-lo na cadeia. Eu sei: eu sentei naquela mesa. Eu digitei os nomes.

Quando sabemos que estamos sendo observados nós nos impomos restrições sobre nosso comportamento - mesmo atividades claramente inocentes - da mesma forma como se nós fossemos obrigados a fazê-lo. Os sistemas de vigilância em massa de hoje, os sistemas que preventivamente automatizam a captura indiscriminada de registros privados, constituem uma espécie de vigilância do tipo máquina do tempo - uma máquina que simplesmente não pode funcionar sem violar nossa liberdade. E isto permite que os governos examinem cada decisão que você já fez, cada amigo com quem você já falou. Mesmo um erro bem-intencionado pode transformar uma vida de cabeça para baixo.

Para preservar as nossas sociedades livres temos de nos defender não só contra inimigos distantes, mas contra as políticas domésticas." (Ou seja, nacionais/N. R.)

(Publicado originalmente no Portal Carta Maior)

domingo, 23 de fevereiro de 2014

A candidatura de Paulo Câmara, o cobrador de impostos

Uma olhada nos jornais locais e apenas notícias positivas sobre o candidato escolhido pelo governador Eduardo Campos, para sucedê-lo nas próximas eleições, como postulante da coalizão socialista. Trata-se de um quadro técnico, homem de pulso, do núcleo duro do governador, oriundo do Tribunal de Contas do Estado e casado com uma filha de uma prima legítima do governador. Dentre os demais postulantes, talvez o "parente" mais afastado, minimizando o aspecto da sucessão "familiar" no Estado. Essa variável, afinal, segundo dizem, "afunilou" bastante as opções do ex-chefe do Executivo pernambucano, cuja preferência não recairia sobre o nome de João Câmara. O marqueteiro oficial do Campo das Princesas, Brandy teria subsidiado o governador, assim como ocorreu com o hoje prefeito Geraldo Júlio, com dados que indicavam que a escolha deveria recair sobre um quadro técnico, bem sintonizado com o "discurso" de Eduardo Campos como postulante às eleições para a Presidência da República em 2014. O fato de ser um novato, que nunca participou de uma eleição, traz alguns ativos para o candidato, mas não deixa de ser um problema. Inexperiente, terá que contar com o suor do candidato ao Senado na chapa, o ex-Ministro da Integração, Fernando Bezerra Coelho. Nem os prefeitos socialistas o conhecem. Sua vantagem nesse sentido é que o ex-ministro vinha construindo uma capilaridade política estratégica no interior do Estado, ainda na condição de ministro. Como não é homem de meia-sola, se topou a parada, deve integrar-se plenamente na campanha. Como candidato presidencial, Eduardo não poderá emprestar a Câmara o apoio que gostaria. Não haveria disponibilidade para isso. Os socialistas estão muito bem-estruturados no Estado, um grande ativo para o candidato. Paulo Câmara, no entanto, não se movimentava como os demais. Fico bastante preocupado com esses candidatos de 'proveta" gestados nas pranchetas dos marqueteiros. A metodologia e os "vieses" comprometem os resultados dessas pesquisas. Na realidade, Paulo Câmara coaduna-se muito bem, em certa medida, aos interesses palacianos. Não será uma eleição fácil para Eduardo Campos. Há alguns anos atrás, os analistas afirmavam que ele elegeria um "poste". A chapa apresentada seria "ungida". Não é bem assim. Os focos de insatisfações tendem a crescer entre aqueles que ficaram pelo caminho. Muitos são os chamados, pouco os escolhidos. O comportamento desses atores no próximo pleito é uma incógnita. O mais visível deles é o atual governador João Lyra Neto, oriundo de Caruaru, uma cidade importante nas composições políticas para o Governo do Estado. Por aquelas bandas, o governador teria feito 'barba, cabelo e bigode", mas o rancor dos Lyras é uma peça nada desprezível no tabuleiro eleitoral. Caruaru, nesse aspecto, está para Pernambuco, assim como Campina Grande está para Paraíba. As definições de chapas majoritárias passam por "arranjos" políticos nessas cidades. Segundo comenta-se, para abafar as mágoas, o governador teria prometido mundos e fundos para os Lyras, inclusive o apoio ao nome de Raquel Lyra como candidata à Prefeitura Municipal da Princesa do Agreste nas próximas eleições municipais. Resta saber se teria combinado com o seu principal escudeiro no município, Roberto Queiroz. Petrolina, outra cidade importante no tabuleiro político do Estado, é outro foco de resistência, apesar da origem petrolinense do candidato ao Senado Fernando Bezerra Coelho. Apesar de ser do PMDB, Júlio Lóssio abriu uma dissidência responsável por sucessivas derrotas ao Campo das Princesas e ao núcleo dos Coelhos ligados ao FBC. Por outro lado, com o apoio do Planalto, a oposição está montando uma chapa bastante competitiva, liderada pelo senador Armando Monteiro(PTB). Apesar do esboço de uma candidatura própria, o PP de Eduardo da Fonte deve compor a chapa, assim como o PT. Armando já entra com uma boa capilaridade política em regiões importantes do Estado e deverá contar com o apoio decisivo do Planalto, que anda com o "Galeguinho' atravessado na traqueia. Paulo Câmara, o cobrador de impostos, não terá vida fácil. Em função de suas ações, segundo comenta-se, também haveria focos de insatisfações entre os empreendedores do pólo de confecções do Estado, violentamente perseguidos pelas autoridades fazendárias.

quinta-feira, 20 de fevereiro de 2014

Acabou a novela. Paulo Câmara é o escolhido.


Não se pode dizer, necessariamente, que o atual Secretário da Fazenda do Governo de Pernambuco, Paulo Câmara, possivelmente o escolhido pelo governador Eduardo Campos para tentar sucedê-lo no Palácio do Campo das Princesas, seja um azarão. Eduardo deu "corda" à extensa lista de pretendentes para que se movimentassem, habilitando-se ao cargo de canditado ao Governo do Estado pelo PSB. Com maior ou menor ousadaia, todos fizeram a lição de casa. Paulo Câmara é um novato, possui algumas arestas na máquina partidária, é casado com uma prima distante de Renata Campos, esposa do governador, mas talvez seja o menos chamuscado. Nove fora os demais concorrentes, Câmara possui um perfil técnico, recaindo a escolha sobre um quadro que possa reproduzir o que ocorreu com Geraldo Júlio quando concorreu à Prefeitura da Cidade do Recife em 2010. Essa é a aposta socialista, que pretende jogar a carga da experiência política na candidatura a senador de Fernando Bezerra Coelho, que ainda não disse se aceita ou não. Se aceitar, certamente, será uma peça importante no tabuleiro sucessório de 2014. Se recusar, abre um precedente perigoso nas hostes socialistas, consolidando uma dissidência que já vem sendo esboçada pelos que ficaram pelo caminho, a exemplo do vice-governador, João Lyra Neto. Circunstâncias políticas específicas, conforme já afirmamos anteriormente, reorientaram a escolha do governador. Apesar de seus atributos, Paulo não figurava entre os primeiros nomes da lista de Eduardo Campos. Ainda penso que "Andrei Gromiko" encabeçava essa lista. Conhece a engrangem da máquina estadual como poucos. Possui informações privilegiadas.

quarta-feira, 19 de fevereiro de 2014

DETRAN: o poder de mando das velhas oligarquias políticas do Estado.




Há um grande economista brasileiro, premiado pela ANPOCS, que surpreendeu o mundo acadêmico com a sua tese de doutoramento. A tese, muito questionada pela banca examinadora, estudava o drama das desigualdades e da pobreza no país a partir de um olhar não dos empobrecidos, mas sobre o imaginário dos ricos, ou seja, como eles se viam, como eles imaginavam porque chegaram lá, suas percepções sobre justiça social, etc. Um dos aspectos observados pelo autor é que os ricos possuem um grau de capilaridade social bem mais acentuado do que os empobrecidos, ou seja, conhecem pessoas influentes que facilitam sua entrada, por exemplo, no mercado de trabalho, geralmente em cargos de confiança, muito bem-remunerados. Quando não, assumem os negócios da família, mas sempre muito bem posicionados na pirâmide social. Com os filhos da pobreza, salvo raras exceções, ocorre um caminho tortuoso. Normalmente começam a vida com um estágio remunerado, depois seguem para um emprego de salário mínimo durante o dia e, normalmente, uma faculdade durante a noite, realizada com grande sacrifício pessoal. Para essa turma do andar de baixo atingir um salário acima de 10 mínimos por mês vai uma longa jornada. O que ocorreu recentemente no DETRAN-PE é um exemplo disso. Concretizada a aliança com os tucanos no Estado, coube àquele partido a gestão do órgão. Um grão-tucano local teria indicado várias pessoas para assumirem posições de chefia no órgão, inclusive uma jovem de apenas 21 anos, o que revoltou funcionários mais antigos, de carreira, concursados, muito mais experientes. O que espanta, no caso, não são apenas os critérios utilizados para a ocupação desses cargos numa sociedade como a brasileira, de raiz patrimonialista profunda. Surpreende, igualmente, o discurso oficial do Governo do Estado no sentido de adoção da meritocracia na gestão da máquina, da substituição do velho poder de mando das oligarquias políticas do Estado. Logo em seguida, vazou para a imprensa que os apadrinhados do Governo teriam acesso, com antecedência, a informações sobre as blitzes da Lei Seca realizadas pelo DETRAN, em conjunto com outros órgãos. Mais uma evidência de que pouco coisa mudou nos costumes políticos do Estado. Cabe a pergunta: O que há de novo nessa "Nova Política"? 

Tijolaço do Jolugue: Os "gargalos" dos pontos de cultura.


Participando de um processo seletivo, fomos ler o relatório de avaliação do IPEA sobre os chamados pontos de cultura, programa do MINC que destina recursos públicos, conveninados com Governos Estaduais e Municipais, mediante avaliações de projetos, para arranjos culturais comunitários, subsidiando-os em vários aspectos, inclusive em todos os elos da cadeia produtiva. Hoje o Programa já atinge quase três mil pontos de cultura espalhados em todo o país, atingindo comunidades quilombolas, indígenas e GLBT. De acordo com um expoente da Escola de Frankfurt, Walter Benjamin, não existem objetivos sensatos na política. Talvez possamos afirmar que, no que concerne às políticas culturais implementadas no país na Era Lula/Dilma haja, sim, um elevado grau de sensatez, traduzido numa prática que se aproxima do politicamente correto e busca atingir, sem oa rancores da chamada "cultura da elite", a universalidade, equidade e maior democracia cultural, um fato inédito em nosso país. Há alguns problemas, observados pelo próprio IPEA, mas nada que contamine os propósitos essenciais do Programa Cultura Viva. Há, de fato, alguns gargalos, como a própria gestão desses pontos de cultura e a sua comunicação institucional, o que ainda é precária, mas até nesse quesito o Estado vem acertando a mão, procedendo uma espécie de avaliação por baixo, ouvindo as partes envolvidas, de forma qualitativa e não impondo critérios concebidos na capital federal. Por outro lado, o monitoramento constante do Programa, permite que os gestores possam aperfeiçoá-lo constantemente, corringindo seus rumos.

terça-feira, 18 de fevereiro de 2014

A revolução não será (3) (+playlist)

Para quem tinha dúvidas sobre onde a direita quer chegar

publicado em 16 de fevereiro de 2014 às 0:13

da Redação
“Não custa lembrar que, no auge do mensalão, quando sentiu que seu mandato poderia estar em risco, o ex-presidente Lula ameaçou recorrer à força das ruas para se segurar no poder — e o MST era uma de suas escoras”, escreve a Veja na edição desta semana.
Fato. E é por isso que a direita avança no sentido de criminalizar os movimentos sociais, usando todo tipo de artimanha.
Depois do Psol, será a vez do calejado MST. As ruas, afinal, devem ficar livres apenas para a direita. Como ela reivindica para si, por exemplo, na Venezuela. Como aconteceu nos Estados Unidos, com a criminalização e a perseguição a integrantes do Occupy.
Abaixo, o discurso de João Pedro Stédile no VI Congresso do MST, em Brasília.
Nosso agradecimento à Conceição Oliveira, a Maria Frô.

(Publicado originalmente no Viomundo)