pub-5238575981085443 CONTEXTO POLÍTICO.
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quarta-feira, 8 de julho de 2015

O linchamento como sintoma

julho 8, 2015 09:32
O linchamento como sintoma
O verdadeiro crime cometido por Cleydison Pereira Silva, espancado até a morte por justiceiros nesta segunda-feira no Maranhão, não está previsto no Código Penal. Seu assassinato desnuda a crise de representatividade que vive o país e a seletividade de uma indignação tão justa quanto pontual

Por Murilo Cleto

Aconteceu de novo. Cleydison Pereira Silva foi amarrado a um poste e espancado até a morte por um grupo de pessoas em São Luís, capital do Maranhão. Ao contrário do que se anuncia, seu crime não foi o assalto. Aliás, pode até ter sido um deles, mas não o mais importante. Pro crime de assalto, a legislação brasileira prevê de 4 a 30 anos de reclusão, conforme o caso, de acordo com o Código Penal.
Mas não é deste crime que se trata a sentença de Cleydison. 4 ou 30 anos não seriam o suficiente pra saciar o desejo de justiça daqueles que rasgaram suas roupas, arremessaram-lhe pedras e garrafas e o golpearam até que uma hemorragia o matasse de vez.
No ano passado, três episódios semelhantes ganharam destaque nacional. Em janeiro, 14 homens amarraram um adolescente também a um poste no Aterro do Flamengo, no Rio de Janeiro. No Piauí, um homem foi arremessado sobre um formigueiro com mãos e pés amarrados. Em maio, uma mulher foi linchada até a morte no Guarujá por um grupo de pessoas que a confundiu com uma praticamente de “magia negra” depois da multiplicação de um boato pelo Facebook. Só na primeira metade de 2014, foram 50 casos registrados.
Em Linchamentos: a justiça popular no Brasil (Contexto, 2015), o sociólogo José de Souza Martins sepulta de vez o mito do brasileiro cordial: o país é o que mais pratica justiçamentos no mundo. De acordo com o seu levantamento, um milhão de compatriotas participaram de linchamentos em 60 anos. E muito embora o início da década de 2000 tenha apresentado uma queda significativa dos casos, de 2013 pra cá eles têm aumentado em velocidade progressiva e não é por acaso.
Para a pesquisadora Ariadne Lima Natal, do Núcleo de Estudos da Violência da USP, há uma correlação entre a presença do Estado e os índices de justiçamento. Onde a ausência dos seus serviços é mais sentida, as chances de violência pretensamente reativa aumentam exponencialmente. E é neste sentido que o papel da mídia precisa ser problematizado.
Antes de zerar as mortes pelo tráfico no país, o Uruguai restringiu os horários dos programas policiais. No Brasil, além de reforçarem a ideia de impunidade e de alimentarem o imaginário de uma delinquência juvenil aliciada pelo crime, eles transmitem e incentivam ao vivo e sem restrições a chacina de suspeitos, alvejados a sangue frio sob os urros dos apresentadores extasiados. Rachel Sheherazade virou referência moral ao defender as ações dos justiceiros do Flamengo em rede nacional no SBT.
Doutora em estudos da segurança e professora do Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro, Jaqueline de Oliveira Muniz sustenta que o linchamento é um “fenômeno que sempre ressurge diante de ondas de temor. Diante do medo, queremos uma solução imediata, e tendemos a abrir mão das nossas regras [leis].”
Quanto maior o destaque a histórias de violência vividas pelo país, maior a sensação de que o Estado já não é digno de confiança o suficiente pra que a justiça aja por si, daí a recorrência a medidas que rompam com o contrato social vigente.
E se tem algo que 2013 deixou de legado para o país é o escancaramento da dissonância completa entre as instituições que têm por função a garantia dos direitos sociais, dentre eles a segurança, e a população, que foi às ruas com vozes distintas, mas que guardavam um importante coro anunciado: o Estado não lhe representa.
30% dos manifestantes votariam em Joaquim Barbosa para presidência da república. Logo ele, sem sequer apresentar vinculação partidária. Logo ele, juridicamente contestado por agir à margem da lei durante o processo do mensalão petista para forçar condenações, e popularmente ovacionado por satisfazer o anseio de justiça entalado na garganta dos brasileiros. Não por acaso, foi relacionado ao super-herói Batman, personagem que tem reaparecido com frequência nos protestos contra o governo Dilma.
O que eram três ou quatro tentativas de linchamento tornaram-se mais de uma por dia desde 2013. E engana-se muito ou quer fazer enganar quem diz que isso pode se tratar de um reflexo inconteste da impopularidade da presidenta: ao final do ano que marcou as Jornadas de Junho, 95,1% alegavam não confiar em legendas políticas. Passada a hecatombe, cerca de 70% permanecem céticos quanto a políticos e partidos.
Em períodos de crise de representatividade, cresce a sensação de que é preciso que se descumpra a lei pra que a lei seja restabelecida. É o que indica Christian Dunker em Mal-Estar, Sofrimento e Sintoma: uma psicopatologia do Brasil entre muros (Boitempo, 2015). De acordo com o psicanalista, a vida em condomínios, modalidade tipicamente brasileira de se viver a partir dos anos 70, contribuiu significativamente para o agravamento desse panorama. O Brasil que não deu certo, da pobreza que insiste em atravancar o caminho, foi suspenso em nome de outro que é protegido por muros altos e uma guarita com câmeras. E é esse Brasil que passou a pautar o outro a partir da imagem que dele fez: perigoso demais para as regras comuns que o regem.
Batman é isso. É a sensação de que o contrato social que orienta o país é insuficiente pra dar conta da demanda. É o “necessário” descumprimento da lei em nome dos valores que a sustentam.
Mas Ariadne Lima Natal, que é autora da dissertação 30 anos de Linchamento na Região Metropolitana de São Paulo 1980-2009, destaca um elemento importante pra intrigar aqueles que acreditam serem os linchamentos justificáveis diante da saturação da violência no país: “Os dados mostram que as vítimas de linchamento não são aleatórias. Os alvos preferenciais são os mesmos já acometidos pela violência policial e pelos homicídios. Os linchamentos dialogam com seu tempo, eles fazem parte de uma realidade e acionam um repertório que aponta quem são os extermináveis”.
No senso de justiça que move o país contra o crime, quase não são condenados brancos de classe média. O seu lugar está previsto no Código Penal. E é por isso que o último crime de Cleydison foi assaltar. Antes disso, nasceu no lugar errado e com a cor da pele errada. Morreu com 29 anos, 44 antes do que a sua expectativa de vida ao nascer, e dentro da previsão de que teria 3,7 vezes mais chances de ser assassinado ainda enquanto jovem. De um lado, virou troféu. Do outro, estatística.

(Publicado originalmente na Revista Fórum)


terça-feira, 7 de julho de 2015

Suspeito de assalto é amarrado a poste e espancado até a morte no Maranhão

julho 7, 2015 17:12


O rapaz foi agredido com socos, chutes, pedradas e garrafadas, não resistiu e perdeu a vida ainda no local, por conta de uma hemorragia. Esse não é o primeiro caso protagonizado por “justiceiros”: em 2014, pelo menos três casos semelhantes atingiram repercussão 
Por Redação*
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Cleydison Pereira Silva tinha 29 anos (Foto: Biné Morais)
Um homem que teria cometido um assalto em São Luís (MA) na última segunda-feira (5) foi amarrado a um poste e espancado até a morte por um grupo de pessoas. Outro suspeito de ter praticado o crime, um adolescente, também linchado pela população, foi entregue à Delegacia do Adolescente Infrator (DAI) com escoriações pelo corpo.
De acordo com a Polícia Civil, a vítima era Cleydison Pereira Silva, de 29 anos. Ele teve suas roupas rasgadas e as mãos, pernas e tronco presos a um poste de luz. Agredido com socos, chutes, pedradas e garrafadas, não resistiu e perdeu a vida ainda no local, por conta de uma hemorragia.
O pai de Cleydison reconheceu o corpo do filho e disse não saber de seu envolvimentos com crimes. A polícia investiga o caso, por meio da Delegacia de Homicídios da capital maranhense, que tenta identificar os autores do assassinato.
Cleydison está longe de ser o primeiro alvo de “justiceiros” no Brasil: em 2014, pelo menos três episódios semelhantes alcançaram repercussão nacional. Em janeiro, um adolescente negro, também suspeito de ter cometido um assalto, foi amarrado por 14 homens em um poste no Aterro do Flamengo, no Rio de Janeiro, e linchado logo em seguida. No mês seguinte, em Teresina, capital do Piauí, um homem suspeito de roubo, após ser espancado, foi arremessado sobre um formigueiro com mãos e braços amarrados – à época, um jornal estrangeiro se referiu ao caso como “justiça à brasileira”. Em maio, no Guarujá, litoral de São Paulo, Fabiane Maria de Jesus foi assassinada, depois de linchada por diversas pessoas. Isso porque uma página popular no Facebook, com notícias locais, divulgou um boato de que ela seria responsável por sequestrar crianças para a “prática de magia negra”.
*Com informações do Extra
(Publicado originalmente na Revista Fórum)

Tijolinho do Jolugue: Os urubus voando de costa da Era Dilma Rousseff


Quando estourou o escândalo do mensalão, embora tenha contado com apoio de figuras políticas como o Dr. Miguel Arraes, de conduta democrática e republicana irrepreensível, Lula teve que enfrentar uma trupe de opositores ferrenhos, políticos sem qualquer escrúpulo, mas dispostos a se aproveitar da situação para tripudiar em cima do ex-presidente. Numa expressão muito feliz, Lula se referia a essas figuras - de acordo com o jornalista Elio Gaspari - como os urubus voando de costa. Um deles, bastante conhecido e envolvido nessas articulações golpistas contra Dilma - chegou a ameaçar dar uma surra no ex-presidente. Lula emprenhou-se pessoalmente em evitar que algumas dessas figuras fossem reeleitas, temendo que transformassem a vida de Dilma Rousseff num inferno. Em alguns casos ele foi bem sucedido - Tasso Jereissati - noutros, não - Agripino Maia. À época, escrevemos alguns artigos sobre o assunto. Parece que a cada dia essa lista aumentava. Pois não é que na Era Dilma eles estão de volta! e desta vez tramando abertamente uma ruptura institucional, uma maneira de retirar a presidente do exercício legítimo do seu segundo mandato. Resiliente, somente mais recentemente, através de uma entrevista concedida ao jornal Folha de São Paulo, a presidente Dilma se pronunciou sobre o assunto. O grande debate aqui pelas redes sociais é se há ou não as condições de um pedido de impeachment. Parece não ser essa a questão. A orquestração para tirar o PT do Governo sem sendo urdida desde de longas datas. Para ser mais preciso, como o escritor Luiz Fernando Veríssimo, desde sempre, desde antes mesmo de o PT assumir o poder. Isso é produto de nossas elites políticas, inconformadas com os avanços sociais obtidos nas últimas décadas. Para esses moleques conspirarem contra de democracia não precisa de muita coisa não. Concretamente, não há motivos. Mas, quando não há motivos, eles arranjam. Curiosamente, o mesmo jornal ao qual Dilma concedeu a entrevista - um jornal que não tem lá esses pendores democráticos todo - reuniu, num almoço, numa sexta-feira, Augusto Nardes, ministro do Tribunal de Contas da União, que reprovou as contas de campanha de Dilma. Do outro lado, Ives Gandra, jurista sondado pelos tucanos sobre um possível pedido de impeachment de Dilma Rousseff. O cardápio, como afirmaRenato Lins, naturalmente, foi essa tecitura contra as instituições democráticas. No segundo governo Dilma, a lista desses urubus só tem aumentado: Aécio Neves (PSDB), Carlos Sampaio(PSDB), Cássio Cunha Lima(PSDB), Ronaldo Caiado(DEM), Agripino Maia(DEM) e Roberto Freire(PPS). Uma turma da pesada.

domingo, 5 de julho de 2015

Raimundo Carrero: entrevista.

“A literatura contribui muito com o processo educativo, mas o aluno não pode ser obrigado a ler. A leitura deve ser parte da sedução do leitor, leitura como resultado do entusiasmo do professor e a leitura deve se tornar um hábito saudável.”


 
Raimundo Carrero/Foto: Divulgação


Já entrando nas comemorações do nosso quarto ano de resistência no campo da literatura pernambucana, o DCP traz nesta edição uma entrevista exclusiva com o escritor Raimundo Carrero.
Carrero é considerado hoje como um dos ícones da literatura nacional. Nasceu na cidade de Salgueiro (PE) e chegando ao Recife, estudou e se tornou músico profissional, tocando sax num conjunto musical conhecido pelo nome de Os Tártaros. Trabalhou em rádio, televisão e no Diario de Pernambuco, atuou de forma incisiva no movimento armorial criado por Ariano Suassuna. É membro da Academia Pernambucana de Letras. Tem vários prêmios nacionais, inclusive o prêmio Jabuti no ano 2000.

DCP - Você é um homem religioso, acredita no diálogo com Deus. O ato de escrever é resultado desse diálogo ou da relação do homem com seu momento histórico, de sua relação com o mundo?

RC - Meu diálogo com Deus é permanente. Minha obra é realizada sob a bênção de Deus e acredito profundamente nisso. É Ele que me orienta e que me conduz. Estou convencido disso.


DCP - Qual a importância da literatura para a educação, você acha que poderíamos formar melhor nossos jovens a partir dela?

RC - É claro que a literatura contribui muito com o processo educativo, mas o aluno não pode ser obrigado a ler. A leitura deve ser parte da sedução do leitor, leitura como resultado do entusiasmo do professor e a leitura deve se tornar um hábito saudável.


DCP - Para você o leitor tem que ser fisgado pelo autor, isto é técnica ou o ato instintivo do escritor atuando no momento da criação?

RC - O autor deve ter suas técnicas de sedução. Mesmo que seja intuitivo. Mesmo parecendo contraditório, a técnica pode ser intuitiva e trabalhada pelo escritor.


DCP - Quem lhe motivou mais para você se tornar um escritor, o rock ou jornalismo?

RC - Não o rock especificamente, mas a música, a grandiosa música, por isso meu texto é musical. O jornalismo ajudou-me a disciplinar a palavra, a frase, por exemplo.


DCP - Literatura é esforço permanente?

RC - Sim. É preciso escrever e experimentar permanentemente.


DCP - Suas oficinas formam escritores?

RC - Com certeza. E tanto é verdade que tenho alunos premiados nacionalmente. Dois dos maiores exemplos são: Marcelino Freire e Débora Ferraz.


DCP - Você tem afirmado que todo escritor ou aprendiz- deve ser, antes de mais nada, um leitor voraz. A leitura é a base de tudo?

RC - A leitura é a oficina permanente do escritor. É preciso ler, ler e ler; escrever, escrever e escrever.


DCP - Com 17 livros editados, sendo um escritor premiado nacionalmente, sem ter saído do Recife para enfrentar o mercado, qual avaliação que você faz para o alcance deste sucesso?   

RC - Eu não sei se minha obra é realmente um sucesso. É o resultado, sem dúvida, de um grande esforço com prêmios, ótimas críticas, traduções e boas vendas. Mas prefiro achar que é apenas um resultado do meu empenho. Tenho grandes esperanças de ainda escrever uma grande obra.


DCP - O seu romance ‘O senhor agora vai mudar de corpo’ foi o mais importante tecnicamente produzido?

RC - O Senhor agora vai mudar de corpo é um livro técnico porque evitei o meramente emocional. Escrevi o que ensino nas oficinas.


DCP - As novas tecnologias contribuem para a formação de público leitor?

RC – Escrever no computador é muito mais simples do que escrever na máquina de datilografia. Esta, me parece, ser a principal vantagem da tecnologia. As outras tecnologias são complementares.

(Publicado originalmente no site Domingo com Poesia)

Eduardo Cunha e o contrato insuficiente


A redução da maioridade penal não resolve nada, mas serve de morfina aos paranóicos que acreditam que a delinquência juvenil é retrato da impunidade.





Murilo Cleto

Lula Marques / Agência PT
Neste momento, não há quem não esteja intrigado com a desfaçatez de Eduardo Cunha ao driblar a Constituição pra conseguir aprovar a emenda que reduz a idade penal no Brasil de 18 para 16 anos. Quer dizer, há: mas somente aqueles que são radicalmente favoráveis a ela. Por outro lado, OAB e a parte derrotada do Congresso já anunciaram que vão recorrer ao Supremo para denunciar a reapresentação do texto, com apenas algumas pequenas alterações, menos de 24 horas após o primeiro resultado, que não havia atingido o número necessário de votos para sua aprovação. 
 
A manobra é vedada pela carta magna, justamente porque, se possível, permitiria a sondagem antecipada de votos dissonantes no plenário - já que eles são públicos - e eventuais práticas coercitivas de convencimento para a virada pouco tempo depois.
 
Neste momento, são muitas as perguntas: como isso foi possível? Ninguém pode barrá-lo? O que explica o tamanho da aceitação de uma gambiarra com a maior referência legal do país?
 
Em Mal-Estar, Sofrimento e Sintoma: uma psicopatologia do Brasil entre muros, Christian Dunker oferece uma importante ferramenta pra desvendar esse embaraço. De acordo com o psicanalista, o modo de vida que proliferou no Brasil a partir dos anos 70 contribuiu significativamente para a dilatação do contrato social que nos rege, diante do reconhecimento de uma falência generalizada do espaço público. 
 
É no interior dos muros dos condomínios que a vida que não funcionou lá fora pode dar certo. Verdade seja dita, este é um dos ingredientes da ascensão do neoliberalismo no Ocidente a partir de então, quando todos os aspectos da vida passaram a ser incorporados pelo mercado, inclusive a segurança e a felicidade. "Porque aqui é domingo todos os dias", seduz um dos anúncios de lotes à venda.
 
Entre "iguais", a sensação de segurança aumenta exponencialmente. Por "iguais", entenda-se: aqueles que podem pagar pelo conforto de uma vida paralela a comum, aquela perigosa do lado de lá do muro. Mas, segundo Dunker, o sonho do domingo repetido virou pesadelo. E é Freud quem explica: entre semelhantes, as pequenas diferenças se avolumam, produzindo o que ele chamou de "narcisismo das pequenas diferenças". Daí a sensação de que o contrato social precisa ser constantemente refeito, atendendo pequenos e insignificantes conflitos, potencializados, no entanto, pela igualdade de condição entre os diferentes.
 
É o que ajuda a explicar o crescente fenômeno dos justiçamentos, que aumentaram brutalmente nos últimos anos junto com a ideia de que o número de leis no país é insuficiente e só contribui para a insegurança. Com a proposta de redução da maioridade penal não é diferente: não resolve, em nenhum país resolveu, mas a medida funciona como uma espécie de morfina pro sofrimento daqueles que se contaminaram com a paranoia de que a delinquência juvenil é o retrato da impunidade no país.
 
Nas redes sociais, assim como houve no próprio Congresso durante a sessão que aprovou a emenda, Cunha é ovacionado como um líder corajoso que desafiou o PT e a bancada dos Direitos Humanos. Ainda que legalmente errado, está moralmente certo diante do imaginário popular e, neste caso, a Constituição é vista somente como uma barreira, um impasse, uma burocracia. Cunha reproduz aquilo que Christian Dunker aponta como uma tendência no Brasil entre muros: é preciso alguém que ande à margem da lei pra que a lei seja restabelecida. Está longe de ser aleatória a presença do personagem de Batman nos últimos protestos por intervenção militar no país.
 
Aconteceu há pouco com Joaquim Barbosa e se repete com Cunha a materialização de um sentimento que está nas ruas e que precisa ser compreendido pra que o estado de direito não se dissolva de vez. Mais do que a idade penal, o que está em jogo é a democracia e tudo o que de mais importante ela garante, inclusive o direito de comemorar a sua derrocada.

 
*Murilo Cleto é historiador, especialista em História Cultural e mestre em Cultura e Sociedade. Atua como coordenador municipal de Cultura de Itararé-SP e professor no Colégio Objetivo e no curso de História das Faculdades Integradas de Itararé. Escreve às segundas-feiras no blog Desafinado: http://desafinado-blog.blogspot.com.br

(Publicado originalmente no site Carta Maior)

Tijolinho do Jolugue: Maju, se não fostes tu...





Algumas pessoas mais consequentes já começam a alertar sobre a necessidade de uma reação à onda conservadora que vem tomando conta do país. A engrenagem mói sistematicamente, em várias frentes, com consequências concretas nos atos de hostilidades que se verificam nas ruas e pelas redes sociais. O que ocorreu com a repórter Maria Júlia, a garota do tempo, do Jornal Nacional, da Rede Globo de Televisão, bem que poderia ser enquadrado como reflexo dessa onda conservadora. Maju, como é mais conhecida, foi duramente atingida por ofensas racistas, através da página que o jornal mantém na rede social Facebook.

As postagens alcançaram ampla repercussão, tanto no sentido favorável quanto no sentido desfavorável. Que há racismo no Brasil, parece que estamos de acordo. Em alguns casos, sutil, cordial ou adocicado, como queria o sociólogo Gilberto Freyre. Em outras situações, explícito mesmo. É que os branquelos, por vezes, não conseguem disfarçar. Essas agressões, emblematicamente, ocorrem nos chamados "redutos" da burguesia branca nacional, como os espaços de lazer dos condomínios e clubes, saguões de aeroportos, restaurantes caros etc. Concretamente, é que como se eles perguntassem: o que é que essa gente está fazendo aqui?

Nos últimos dias, então, diante dessa onda conservadora, esses grupos sociais estão sofrendo horrores. Não apenas os negros, mas a comunidade LGBT, os adolescentes em situação de risco. Em função do seu capital social, o caso de Maju ganhou uma repercussão maior, mas é só verificar as enormidades de ofensas e agressões dirigidas a esses grupos sociais, todos os dias, pelas redes sociais. Com pastores como Silas Malafaia e um presidente da Câmara Federal com a estirpe de Eduardo Cunha, não se poderia esperar sensatez, equilíbrio e respeito pela diferença. São tempos de retrocesso e obscurantismo.

Antonio David, sobre a Folha de São Paulo: Antes um jornal a serviço da ditadura, agora, do golpe.

publicado em 04 de julho de 2015 às 13:19
Carro da folha, caiado e aécio
por Antônio David, via e-mail
A Folha de S. Paulo, ‘um jornal a serviço do Brasil”, o mesmo que disponibilizava carros para a Oban durante a ditadura, agora dá espaço para golpistas fazerem propaganda de golp”. O artigo de Ronaldo Caiado neste sábado é uma demonstração eloquente.
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Caiado
Uma nova eleição é solução para a crise
Foi em meio a uma crise institucional, política, econômica, fiscal e de credibilidade que o mais eficiente plano de estabilidade econômica, em vigor desde 1º de julho de 1994, o Plano Real, comemorou 21 anos.
A previsibilidade instituída pela estabilidade monetária possibilitou o desenvolvimento tecnológico do setor agropecuário, que deu um salto de produtividade nestas mais de duas décadas.
Com 39 milhões de hectares em 1994, produzimos 81 milhões de toneladas de grãos. Em 2015, com 57,33 milhões de hectares, deveremos chegar à casa dos 200 milhões de toneladas. Enquanto a área plantada cresceu 47%, a produção deu um salto de 147%.
O setor superou as crises internacionais, passou a administrar seu passivo, herança do período inflacionário. Apesar de todo o preconceito por parte do governo, o setor agropecuário foi o principal sustentáculo da balança comercial em anos recentes, ajudando o país com uma reserva cambial de US$ 372 bilhões.
Nada obstante a importância do agronegócio, o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, diz que o ajuste fiscal e a contenção de despesas para cumprir a Lei de Responsabilidade Fiscal irão impedir gastos com subvenção econômica, que inclui os recursos destinados a equalizar taxas de juros do crédito rural, dos programas de exportação e dos programas de sustentação de preços e manutenção de estoques. Se ele diz que não vai equalizar juros, como o setor vai sobreviver?
O atual cenário, com sinais claros de agravamento, fará o PT tirar dos brasileiros a maior conquista de todos os tempos, que é o Plano Real.
Com a volta da inflação, vamos retroagir aos anos de 1990, quando o setor se endividava com créditos reajustados por taxas e indexadores, as famosas letrinhas. Para exemplificar, ao final do ano agrícola, o produtor contraía um empréstimo equivalente a 10 mil sacas de milho, mas na colheita devia 50 mil sacas.
O setor já foi punido neste ano com a não liberação do pré-custeio. Ficou inviabilizado o preparo do plantio de uma safra. Essa antecedência era importante para o produtor ter melhor capacidade de negociação.
E a pergunta que fica: a que custo será repassado esse empréstimo em cima da hora ao produtor? A que taxa de juros? Será que vão reeditar novamente as letrinhas como indexador da dívida do produtor, sem a garantia do preço mínimo? Sem o seguro agrícola?
Justo agora que imaginávamos o fim desse processo de vincular um setor tão importante como a agropecuária ao chamado Plano Safra, que avançaríamos para um Plano Plurianual, com regras claras para o setor e transmitindo segurança do ponto de vista jurídico e econômico. Infelizmente, a gestão bolivariana dos governos do PT nos sinaliza para um passado que a agricultura quer esquecer.
Além dos problemas relatados aqui, não cabe a mim, como senador da República, apenas diagnosticar o óbvio e se preocupar com o que possa acontecer, mas sim trabalhar no sentido de antecipar os fatos, mobilizar a classe política, o setor produtivo e a sociedade para o momento que vivemos: a total ingovernabilidade, com a presidente Dilma Rousseff, sem nenhuma credibilidade, atingindo o mais alto patamar de rejeição desde a redemocratização.
Sabedores da importância do setor agrícola e da ameaça que lhe aflige, devemos alçar os olhos também para essa preocupação nacional. Como brasileiros, precisamos abraçar um projeto para tirar o país da crise e promover uma correção de rumos. Para isso, defendo a realização de uma nova eleição para a Presidência da República.
(Publicado originalmente no site Viomundo)

sábado, 4 de julho de 2015

O xadrez político das eleições municipais de 2016, no Recife: Afinal, qual o papel a se exercido por Jarbas Vasconcelos nessas eleições?





José Luiz Gomes


Nessa fase inicial das costuras políticas, são comuns os blefes, o surgimento de nomes apenas com o propósito de aferir a receptividade dentro do próprio campo politico e, naturalmente, junto ao eleitorado. Uma outra estratégia é a apresentação de candidatura apenas com o propósito de barganhar nacos de poder, depois da construção de consensos em torno de tal ou qual candidato. Convém, portanto, tomar muitos cuidados com essa enxurrada de candidaturas que surgem nessa fase inicial das negociações. Outros pretensos candidatos, por sua vez, agem de uma maneira tão "agressiva", que não permitem dúvidas sobre a sua disposição.  

Em Olinda, por exemplo, em ralação a um nome específico, essa segunda hipótese pode ser confirmada, a julgar por uma série de indícios claros, adotados pelo candidato. Ele, naturalmente nega, mas até os silenciosos mosteiros já foram contagiados pela pré-campanha. No caso do Recife, pontualmente, por mais de vez, voltou-se a se especular sobre uma provável candidatura do ex-prefeito, ex-governador, ex-senador, hoje Deputado Federal, Jarbas Vasconcelos. Jarbas foi prefeito do Recife por dois mandatos, tendo deixado a Prefeitura com boas avaliações, embora essas pesquisas de avaliação de gestão estejam com o prestígio mais baixo do que poleiro de pato. 

Em todo caso, foi um prefeito bem-avaliado, tendo disputado o Palácio Antonio Farias, no seu primeiro mandato, em condições bastante adversas. Por essa época, Jarbas ainda era um ator político identificado com o campo da esquerda, capaz de mobilizar uma militância aguerrida, que foi capaz de superar muitas adversidades de campanha, como a sua situação desfavorável nas pesquisas de intenções de voto, até os momentos finais da campanha. Ainda hoje nos é nítida a imagem daqueles militantes distribuindo santinhos nos cruzamentos das avenidas principais do Recife. Jarbas mudou muito desde então. O campo político de esquerda, por onde ele construiu toda a sua trajetória política, ficou no passado. 

No segundo mandato como prefeito, já com o propósito de viabilizar-se como candidato ao Governo do Estado, abandonou os antigos companheiros para abrir espaços na Prefeitura para os "novos atores", cevados nos estertores das forças políticas mais reacionárias e conservadoras do Estado, aquelas mesmas que ele havia combatido no passado. Algumas crias da ditadura militar, formadas na escola polícia do macielismo, tornarem seus fiéis escudeiros. Era o momento da União por Pernambuco, criada num encontro histórico na fazenda de José Mendonça, o Mendonção, chefe político de Belo Jardim. Alguns antigos companheiros, então convertidos, acompanharam o líder, outros se mostraram reticentes e, coerentes, abandonaram essa nau, como foi o caso da secretária de educação jarbista, professora Edla Soares. Ainda lembro - estava com ela na sala - como essas figuras foram recepcionadas em seu gabinete no Palácio Antonio Farias. 

Jarbas seguiu seu novo rumo político, incorporando esses novos atores ao seu grupo. Havia um projeto bastante ousado de poder, escalonado entre seus principais líderes, como Roberto Magalhães, Sérgio Guerra, os Mendonças. Só esqueceram de combinar isso com João Paulo(PT), que, com sua vitória, colocou terra naquela engrenagem de poder, quebrando uma sequência que previa a vitória da Roberto Magalhães para o Palácio Antonio Farias, naquelas eleições. As indisposições de Jarbas com os Arraes, de longas datas, apenas se agravou com essa guinada conservadora do político. 

É como se os campos ficassem ainda mais nítidos. Por essa época, já eram realizados os tradicionais cozidos, na sua residência de praia, no bairro do Janga, em Paulista. O grupo político que acompanhava o ex-governador Miguel Arraes, segundo dizem, costumava fazer chacotas com aquela "turma do cozido". Mal sabia o Dr. Arraes que, anos depois, o seu próprio neto, Eduardo Campos, se encarregaria de selar a paz entre os dois grupos políticos, se lambuzando nos cozidos oferecidos pelo senhor Jarbas, com ingredientes adquiridos no Mercado da Encruzilhada. Muitas coisas mudaram no cenário político recifense desde então e, outras, foram atropeladas pelas circunstâncias, como a morte prematura do ex-governador Eduardo Campos. Política é um misto disso tudo. Neste novo cenário - único possível para preservá-lo na política, segundo ele mesmo - Jarbas passou a emprestar apoio ao grupo político dos neo-socialistas tupiniquins, colaborando com a vitória de Geraldo Júlio, nas eleições de 2012. 

O novo arranjo político permitiu a indicação do apadrinhado de Jarbas, Raul Henry, como vice, na chapa que disputou - e venceu - as eleições para o Governo do Estado, em 2014. Eleito Deputado Federal, essa condição permitiu ao político pernambuco um protagonismo na cenário político estadual e nacional. Alinhavado às forças políticas anti-petistas, o pernambucano, circunstancialmente, assume uma condição de, pelo menos, um interlocutor privilegiado nas articulações políticas no cenário recifense. Segundo dizem, sem muito alarde, como recomenda os bons manuais de política, até recentemente, o Deputado encontrou-se com o governador Geraldo Alckmin (PSDB-SP), possivelmente, observando na cidade do Recife, um trampolim fundamental para os seus eternos projetos presidenciais de 2018. 

Nessa estratégia, seria fundamental a construção de um palanque recifense em 2016, quiçá, suficiente para dar suporte ao governador paulista, em 2018. Difícil prevê como Jarbas entraria nesse jogo, mas poderia está sendo montado um agrupamento de forças capazes de criar alguns embaraços para a reeleição de Geraldo Júlio(PSB). Essa movimentação começou a preocupar o staff político do gestor, que adotou uma série de providências no sentido de prestigiar atores políticos ligados ao ex-governador, em eventos oficiais. Raul, o afilhado preferencial e vice-governador, foi o mais beneficiado. Antes disso, porém, em Brasília, Jarbas reunia a bancada pernambucana para um regabofe. No encontro, segundo se informou, uma candidatura sua à Prefeitura do Recife foi aventada abertamente. Maduro e conciliador, o ex-prefeito parece não nutrir interesses em manter arestas no Estado, exceção para aquelas inevitáveis, como setores do partido dos trabalhadores. Essas seriam irreconciliáveis.

Até o deputado Sílvio Costa, que o havia desancado no passado, hoje se mostra um admirador do ex-senador da República. Nas últimas eleições, o seu filho, Sívio Costa Filho, vem se apresentando como uma alternativa política. Mas, a rigor, não passa de uma alternativa, sempre numa perspectiva de conquistar espaços. Vazou para a imprensa que, no diálogo mantido com o governador paulista, este último manifestou o desejo de que o PSDB apresente um candidato às eleições de 2016. As aspirações presidencias de Geraldo Alckmin nunca foram negadas. Não custa sonhar, a despeito dos problemas internos da legenda tucana. O nome hoje mais cotado entre os tucanos locais é o do Deputado Estadual, Daniel Coelho, que votou a favor da redução da maioridade penal. 

Aliás, hoje parece claro que essa legenda irá apoiar toda a pauta de interesses reacionários que forem à votação. Aliás, que pauta! redução da maioridade penal, retirada da Petrobras das operações do Pré-sal. Um momento de muito obscurantismo. Só vai à votação medidas contra os interesses republicanos, conforme desejo do senhor Eduardo Cunha. É difícil prevê qual seria o papel ou a influência de Jarbas Vasconcelos nas eleições de 2016, no Recife. No momento, trata-se apenas de uma especulação. Curiosamente, coube ao ex-governador Eduardo Campos a garantia de uma sobrevida política ao ex-senador. Isolado, ele poderia não ter sido eleito. Portanto, o apoio dos socialistas foi fundamental para a sua sobrevivência e a do seu grupo político. 

Se ele bancar uma candidatura própria ou apoiar outro nome que não o indicado pelo Palácio do Campo das Princesas, certamente, teremos aqui a ruptura de uma costura que vinha se desenrolando desde algum tempo. Se isso ocorrer, é possível que os neo-socialistas tupiniquins fiquem ausentes dos tradicionais cozidos preparados pessoalmente pelo ex-governador. Por outro lado, é muito pouco provável que ele conseguice reedidar as boas performances das aleições de outrora, algo que, certamente passa por suas ponderações. Seria um risco não calculado, cujo erro poderia representar o seu outono político, milagrosamente evitado.  

MP apura racismo e injúria contra apresentadora do tempo Maria Júlia Coutinho, da TV Globo



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Por Michèlle Canes, repórter da Agência Brasil
Os ministérios públicos (MP) dos estados do Rio de Janeiro e de São Paulo se pronunciaram nesta sexta-feira (3) a respeito das ofensas sofridas em rede social pela apresentadora da Rede Globo, Maria Júlia Coutinho. O MP de São Paulo, segundo publicação no site da instituição, anunciou que foi instaurado “procedimento investigatório criminal” para apurar prática de racismo e injúria, qualificada contra a apresentadora.
A medida foi instaurada pelo promotor de Justiça Criminal, Christiano Jorge Santos, segundo o texto, depois de tomar conhecimento dos comentários feitos pelos internautas. O MP paulista ressalta que “caso de racismo é crime imprescritível e inafiançável. Já a injúria racial prevê pena de reclusão de um a três anos”.
No Rio de Janeiro, o MP informou, também pelo site da instituição, que sua Coordenadoria de Direitos Humanos solicitou à Promotoria de Investigação Penal que acompanhe o caso, com rigor, junto à Delegacia de Repressão a Crimes de Informática. De acordo com o MP-RJ, ontem (02), a produção do Jornal Nacional publicou uma foto da apresentadora que faz a previsão do tempo. “Desde então, diversas mensagens ofensivas e de conteúdo racista têm sido direcionadas à repórter”, diz o texto.
Diante dos comentários, internautas postaram mensagens de apoio à apresentadora em diferentes redes sociais. “Destilar preconceito via internet é crime”, disse um usuário em rede social. “Por um Brasil com mais respeito e igualdade para todos”, disse outro.
Edição: Stênio Ribeiro
(Publicado originalmente no site Combate ao Racismo Ambiental)