Conforme já discutimos por aqui em outras ocasiões, não se improvisa na área de segurança pública. O novo plano de segurança pública concebido pelo estado simplesmente parece ignorar os avanços e conquistas do Pacto pela Vida, o que traduzimos aqui como um grave equívoco, capaz de produzir um ônus muito pesado no futuro. Os zoneamentos de áreas por incidências de delitos, por exemplo, sugere ter ignorado as zonas cinzentas, ou seja, aquelas áreas hoje já completamente sob o controle de facções do crime organizado, inclusive balneários turísticos como Porto de Galinhas, na zona sul, sob controle do Trem da Bala ou Comando do Litoral Sul, cuja droga comercializada no local é fornecida pelo Comando Vermelho. Poderíamos citar outros exemplos, mas este é bem emblemático, pois situações semelhantes ocorrem em outras estâncias de veraneios badaladas, como é o caso de Pipa, no Rio Grande do Norte ou Canoa Quebrada, no Ceará. Em Jericoacoara não tem caixa rápido, mas nada que não se resolva com um cartão de crédito.
Em última análise, a pergunta que deveria ser feita é: Por que o Pacto pela Vida não conseguiu superar alguns gargalos de segurança pública no estado? Onde o plano de segurança pública concebido no Governo de Eduardo Campos poderia ser aprimorado? Acreditamos que um pouco de humildade por aqui faria bem. O Pacto pela Vida foi reconhecido como um dos melhores planos de enfrentamento à violência urbana no país, independentemente das colorações ideológicas. Salvo melhor juízo, até reconhecimento internacional ocorreu. Com ligeiras adaptações, foi exportado para alguns Estados da federação.
Contar com o apoio da academia, aliado a um senso prático, naturalmente, também não se constituiria num problema. Sem se deixar levar pelas elocubrações teóricas apenas, posto que teríamos aqui décadas para discutirmos o problema cerne da violência e os sistemas punição ao longo da História, sob os auspícios até de entes já falecidos, como o filósofo Michel Foucault. O Pacto pela Vida contou com a participação de integrantes da academia, assim como com os diversos atores institucionais envolvidos com a questão da segurança pública no Estado.
Até recentemente, foram roubadas de uma Unidade do Arsenal de Guerra do Exército, localizada na cidade de Barueri, São Paulo, 25 metralhadoras de grosso calibre, com capacidade para derrubar aeronaves. Ação que envolveu, sem quaisquer dúvidas, a participação do crime organizado, que acabou devolvendo algumas dessas metralhadoras, uma vez que vieram sem os carregadores. Um pouco antes, no Barra da Tijuca, foram assassinados três médicos, num crime de execução, por engano, pois o propósito era o de atingir um miliciano.
Em pouco tempo, através de videoconferência e tudo, a polícia foi informada sobre as providências e a resolução do caso. O tribunal do crime organizado se reuniu e condenou à execução os operadores da missão malograda. Quatro deles foram encontrados mortos, no interior de um automóvel, através de informes do CV. No dia 24\11 a policial militar Vaneza Lobão foi assassinada numa emboscada armada próxima à sua residência. Vaneza era lotada numa espécie de unidade da corregedoria que investigava a atuação do crime organizado na comunidade de Santa Cruz, Zona Norte do Rio. Os milicianos decretaram a sua morte depois que descobriram que ela poderia está monitorando os passos do grupo na comunidade.
Nas masmorras das unidades prisionais do Estado, temos todo tipo de ocorrências. Desde aquelas que são de natureza estrutural, até algumas particularidades. Superlotação, disseminação de doenças, analfabetismo, maus-tratos, alimentação de qualidade duvidosa, lentidão da vara de execuções penais. Fatores que se configuram numa avaliação mais genérica, posto que se repetem por todas as unidades prisionais do país. O Brasil possui uma cultura do encarceramento, mas as condições para que os apenados cumpram essas penas são desumanas. O país possui a terceira população carcerária do mundo, abaixo apenas da China e dos Estados Unidos, onde os presídios se transformaram num negócio.
Outro dia encontramos por aqui a denúncia de que um presídio feminino não possuía polícia penal feminina para a execução dos trabalhos. A desproporção de policiais penais por apenados é gigantesca. Pernambuco apresenta índices preocupantes neste sentido, mesmo tendo um número expressivo de policiais já selecionados. Talvez aguardando apenas a formação na Academia de Polícia. Em ambientes assim, não seria de surpreender a penetração da zona cinzenta, ou seja, a operacionalização da banda podre, do submundo, do suborno, da extorsão, das irregularidades. Nas unidades prisionais entram drogas, telefones celulares, celas em melhores condições são comercializadas e existe a figura do "Chaveiro", que é quem, de fato, dá as coordenadas por ali. Se o Estado desconstituir a autoridade simbólica dessas lideranças, a perspectiva é a de que explosão de rebeliões.
De fato, o Pacto pela Vida não quis enfrentar este problema. Talvez porque à época, o governador entendesse que não teria condições de superá-lo. Nem aqui, nem alhures, para ser mais preciso, uma vez que existem situações até mais complicadas, como em alguns unidades prisionais do Maranhão, a de Pedrinhas, onde facções é que controlam as detentos de outras facções. Se o caboclo fugir às regras, a turma come o fígado dele no churrasco e bate uma pelada com a sua cabeça, durante o banho de sol.
No sistema carcerário brasileiro, como admitiu recentemeante o minisro do Supremo Tribunal Federal, Luiz Roberto Barroso, ocorre um dos maiores problemas de violações de direitos humanos do país. O SUSP - Sistema Único de Segurança Pública - concebido desde o primeiro Governo Lula, nunca chegou, de fato, a ser implementado. Um projeto amplo de segurança pública, que prevê uma articulação com todos os entes federados. Por aqui precisamos admitir que, mesmo sob um Governo de perfil progressista, que reconhece os direitos humanos da população carcerária, não temos avançado como desejaríamos. Há, como exemplo, um grave problema de analfabetismo entre a população carcerária, que nunca foi enfrentado.
Outro dia, o Ministério da Justiça fez o anúncio do envio de centenas de viaturas para as cidades com os maiores índices de crimes violentos contra a vida. Pernambuco, certamente, será bem contemporizado. Boas condições de trabalho são fundamentais, mas tais condições não se esgotam na oferta de viaturas. A Polícia Militar é mais discreta neste assunto, mas os sindicatos das Polícias Civil e Científica, reiteradas vezes, expuseram os problemas que enfrentam no seu cotidiano de combate à violencia no Estado. Não observamos no plano Juntos Pela Segurança, que foi apresentado pelo Governo do Estado de Pernambuco, propostas concretas concernentes a este assunto, um debate absolutamente necesssário.