pub-5238575981085443 CONTEXTO POLÍTICO.
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domingo, 5 de julho de 2015

Eduardo Cunha e o contrato insuficiente


A redução da maioridade penal não resolve nada, mas serve de morfina aos paranóicos que acreditam que a delinquência juvenil é retrato da impunidade.





Murilo Cleto

Lula Marques / Agência PT
Neste momento, não há quem não esteja intrigado com a desfaçatez de Eduardo Cunha ao driblar a Constituição pra conseguir aprovar a emenda que reduz a idade penal no Brasil de 18 para 16 anos. Quer dizer, há: mas somente aqueles que são radicalmente favoráveis a ela. Por outro lado, OAB e a parte derrotada do Congresso já anunciaram que vão recorrer ao Supremo para denunciar a reapresentação do texto, com apenas algumas pequenas alterações, menos de 24 horas após o primeiro resultado, que não havia atingido o número necessário de votos para sua aprovação. 
 
A manobra é vedada pela carta magna, justamente porque, se possível, permitiria a sondagem antecipada de votos dissonantes no plenário - já que eles são públicos - e eventuais práticas coercitivas de convencimento para a virada pouco tempo depois.
 
Neste momento, são muitas as perguntas: como isso foi possível? Ninguém pode barrá-lo? O que explica o tamanho da aceitação de uma gambiarra com a maior referência legal do país?
 
Em Mal-Estar, Sofrimento e Sintoma: uma psicopatologia do Brasil entre muros, Christian Dunker oferece uma importante ferramenta pra desvendar esse embaraço. De acordo com o psicanalista, o modo de vida que proliferou no Brasil a partir dos anos 70 contribuiu significativamente para a dilatação do contrato social que nos rege, diante do reconhecimento de uma falência generalizada do espaço público. 
 
É no interior dos muros dos condomínios que a vida que não funcionou lá fora pode dar certo. Verdade seja dita, este é um dos ingredientes da ascensão do neoliberalismo no Ocidente a partir de então, quando todos os aspectos da vida passaram a ser incorporados pelo mercado, inclusive a segurança e a felicidade. "Porque aqui é domingo todos os dias", seduz um dos anúncios de lotes à venda.
 
Entre "iguais", a sensação de segurança aumenta exponencialmente. Por "iguais", entenda-se: aqueles que podem pagar pelo conforto de uma vida paralela a comum, aquela perigosa do lado de lá do muro. Mas, segundo Dunker, o sonho do domingo repetido virou pesadelo. E é Freud quem explica: entre semelhantes, as pequenas diferenças se avolumam, produzindo o que ele chamou de "narcisismo das pequenas diferenças". Daí a sensação de que o contrato social precisa ser constantemente refeito, atendendo pequenos e insignificantes conflitos, potencializados, no entanto, pela igualdade de condição entre os diferentes.
 
É o que ajuda a explicar o crescente fenômeno dos justiçamentos, que aumentaram brutalmente nos últimos anos junto com a ideia de que o número de leis no país é insuficiente e só contribui para a insegurança. Com a proposta de redução da maioridade penal não é diferente: não resolve, em nenhum país resolveu, mas a medida funciona como uma espécie de morfina pro sofrimento daqueles que se contaminaram com a paranoia de que a delinquência juvenil é o retrato da impunidade no país.
 
Nas redes sociais, assim como houve no próprio Congresso durante a sessão que aprovou a emenda, Cunha é ovacionado como um líder corajoso que desafiou o PT e a bancada dos Direitos Humanos. Ainda que legalmente errado, está moralmente certo diante do imaginário popular e, neste caso, a Constituição é vista somente como uma barreira, um impasse, uma burocracia. Cunha reproduz aquilo que Christian Dunker aponta como uma tendência no Brasil entre muros: é preciso alguém que ande à margem da lei pra que a lei seja restabelecida. Está longe de ser aleatória a presença do personagem de Batman nos últimos protestos por intervenção militar no país.
 
Aconteceu há pouco com Joaquim Barbosa e se repete com Cunha a materialização de um sentimento que está nas ruas e que precisa ser compreendido pra que o estado de direito não se dissolva de vez. Mais do que a idade penal, o que está em jogo é a democracia e tudo o que de mais importante ela garante, inclusive o direito de comemorar a sua derrocada.

 
*Murilo Cleto é historiador, especialista em História Cultural e mestre em Cultura e Sociedade. Atua como coordenador municipal de Cultura de Itararé-SP e professor no Colégio Objetivo e no curso de História das Faculdades Integradas de Itararé. Escreve às segundas-feiras no blog Desafinado: http://desafinado-blog.blogspot.com.br

(Publicado originalmente no site Carta Maior)

Tijolinho do Jolugue: Maju, se não fostes tu...





Algumas pessoas mais consequentes já começam a alertar sobre a necessidade de uma reação à onda conservadora que vem tomando conta do país. A engrenagem mói sistematicamente, em várias frentes, com consequências concretas nos atos de hostilidades que se verificam nas ruas e pelas redes sociais. O que ocorreu com a repórter Maria Júlia, a garota do tempo, do Jornal Nacional, da Rede Globo de Televisão, bem que poderia ser enquadrado como reflexo dessa onda conservadora. Maju, como é mais conhecida, foi duramente atingida por ofensas racistas, através da página que o jornal mantém na rede social Facebook.

As postagens alcançaram ampla repercussão, tanto no sentido favorável quanto no sentido desfavorável. Que há racismo no Brasil, parece que estamos de acordo. Em alguns casos, sutil, cordial ou adocicado, como queria o sociólogo Gilberto Freyre. Em outras situações, explícito mesmo. É que os branquelos, por vezes, não conseguem disfarçar. Essas agressões, emblematicamente, ocorrem nos chamados "redutos" da burguesia branca nacional, como os espaços de lazer dos condomínios e clubes, saguões de aeroportos, restaurantes caros etc. Concretamente, é que como se eles perguntassem: o que é que essa gente está fazendo aqui?

Nos últimos dias, então, diante dessa onda conservadora, esses grupos sociais estão sofrendo horrores. Não apenas os negros, mas a comunidade LGBT, os adolescentes em situação de risco. Em função do seu capital social, o caso de Maju ganhou uma repercussão maior, mas é só verificar as enormidades de ofensas e agressões dirigidas a esses grupos sociais, todos os dias, pelas redes sociais. Com pastores como Silas Malafaia e um presidente da Câmara Federal com a estirpe de Eduardo Cunha, não se poderia esperar sensatez, equilíbrio e respeito pela diferença. São tempos de retrocesso e obscurantismo.

Antonio David, sobre a Folha de São Paulo: Antes um jornal a serviço da ditadura, agora, do golpe.

publicado em 04 de julho de 2015 às 13:19
Carro da folha, caiado e aécio
por Antônio David, via e-mail
A Folha de S. Paulo, ‘um jornal a serviço do Brasil”, o mesmo que disponibilizava carros para a Oban durante a ditadura, agora dá espaço para golpistas fazerem propaganda de golp”. O artigo de Ronaldo Caiado neste sábado é uma demonstração eloquente.
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Caiado
Uma nova eleição é solução para a crise
Foi em meio a uma crise institucional, política, econômica, fiscal e de credibilidade que o mais eficiente plano de estabilidade econômica, em vigor desde 1º de julho de 1994, o Plano Real, comemorou 21 anos.
A previsibilidade instituída pela estabilidade monetária possibilitou o desenvolvimento tecnológico do setor agropecuário, que deu um salto de produtividade nestas mais de duas décadas.
Com 39 milhões de hectares em 1994, produzimos 81 milhões de toneladas de grãos. Em 2015, com 57,33 milhões de hectares, deveremos chegar à casa dos 200 milhões de toneladas. Enquanto a área plantada cresceu 47%, a produção deu um salto de 147%.
O setor superou as crises internacionais, passou a administrar seu passivo, herança do período inflacionário. Apesar de todo o preconceito por parte do governo, o setor agropecuário foi o principal sustentáculo da balança comercial em anos recentes, ajudando o país com uma reserva cambial de US$ 372 bilhões.
Nada obstante a importância do agronegócio, o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, diz que o ajuste fiscal e a contenção de despesas para cumprir a Lei de Responsabilidade Fiscal irão impedir gastos com subvenção econômica, que inclui os recursos destinados a equalizar taxas de juros do crédito rural, dos programas de exportação e dos programas de sustentação de preços e manutenção de estoques. Se ele diz que não vai equalizar juros, como o setor vai sobreviver?
O atual cenário, com sinais claros de agravamento, fará o PT tirar dos brasileiros a maior conquista de todos os tempos, que é o Plano Real.
Com a volta da inflação, vamos retroagir aos anos de 1990, quando o setor se endividava com créditos reajustados por taxas e indexadores, as famosas letrinhas. Para exemplificar, ao final do ano agrícola, o produtor contraía um empréstimo equivalente a 10 mil sacas de milho, mas na colheita devia 50 mil sacas.
O setor já foi punido neste ano com a não liberação do pré-custeio. Ficou inviabilizado o preparo do plantio de uma safra. Essa antecedência era importante para o produtor ter melhor capacidade de negociação.
E a pergunta que fica: a que custo será repassado esse empréstimo em cima da hora ao produtor? A que taxa de juros? Será que vão reeditar novamente as letrinhas como indexador da dívida do produtor, sem a garantia do preço mínimo? Sem o seguro agrícola?
Justo agora que imaginávamos o fim desse processo de vincular um setor tão importante como a agropecuária ao chamado Plano Safra, que avançaríamos para um Plano Plurianual, com regras claras para o setor e transmitindo segurança do ponto de vista jurídico e econômico. Infelizmente, a gestão bolivariana dos governos do PT nos sinaliza para um passado que a agricultura quer esquecer.
Além dos problemas relatados aqui, não cabe a mim, como senador da República, apenas diagnosticar o óbvio e se preocupar com o que possa acontecer, mas sim trabalhar no sentido de antecipar os fatos, mobilizar a classe política, o setor produtivo e a sociedade para o momento que vivemos: a total ingovernabilidade, com a presidente Dilma Rousseff, sem nenhuma credibilidade, atingindo o mais alto patamar de rejeição desde a redemocratização.
Sabedores da importância do setor agrícola e da ameaça que lhe aflige, devemos alçar os olhos também para essa preocupação nacional. Como brasileiros, precisamos abraçar um projeto para tirar o país da crise e promover uma correção de rumos. Para isso, defendo a realização de uma nova eleição para a Presidência da República.
(Publicado originalmente no site Viomundo)

sábado, 4 de julho de 2015

O xadrez político das eleições municipais de 2016, no Recife: Afinal, qual o papel a se exercido por Jarbas Vasconcelos nessas eleições?





José Luiz Gomes


Nessa fase inicial das costuras políticas, são comuns os blefes, o surgimento de nomes apenas com o propósito de aferir a receptividade dentro do próprio campo politico e, naturalmente, junto ao eleitorado. Uma outra estratégia é a apresentação de candidatura apenas com o propósito de barganhar nacos de poder, depois da construção de consensos em torno de tal ou qual candidato. Convém, portanto, tomar muitos cuidados com essa enxurrada de candidaturas que surgem nessa fase inicial das negociações. Outros pretensos candidatos, por sua vez, agem de uma maneira tão "agressiva", que não permitem dúvidas sobre a sua disposição.  

Em Olinda, por exemplo, em ralação a um nome específico, essa segunda hipótese pode ser confirmada, a julgar por uma série de indícios claros, adotados pelo candidato. Ele, naturalmente nega, mas até os silenciosos mosteiros já foram contagiados pela pré-campanha. No caso do Recife, pontualmente, por mais de vez, voltou-se a se especular sobre uma provável candidatura do ex-prefeito, ex-governador, ex-senador, hoje Deputado Federal, Jarbas Vasconcelos. Jarbas foi prefeito do Recife por dois mandatos, tendo deixado a Prefeitura com boas avaliações, embora essas pesquisas de avaliação de gestão estejam com o prestígio mais baixo do que poleiro de pato. 

Em todo caso, foi um prefeito bem-avaliado, tendo disputado o Palácio Antonio Farias, no seu primeiro mandato, em condições bastante adversas. Por essa época, Jarbas ainda era um ator político identificado com o campo da esquerda, capaz de mobilizar uma militância aguerrida, que foi capaz de superar muitas adversidades de campanha, como a sua situação desfavorável nas pesquisas de intenções de voto, até os momentos finais da campanha. Ainda hoje nos é nítida a imagem daqueles militantes distribuindo santinhos nos cruzamentos das avenidas principais do Recife. Jarbas mudou muito desde então. O campo político de esquerda, por onde ele construiu toda a sua trajetória política, ficou no passado. 

No segundo mandato como prefeito, já com o propósito de viabilizar-se como candidato ao Governo do Estado, abandonou os antigos companheiros para abrir espaços na Prefeitura para os "novos atores", cevados nos estertores das forças políticas mais reacionárias e conservadoras do Estado, aquelas mesmas que ele havia combatido no passado. Algumas crias da ditadura militar, formadas na escola polícia do macielismo, tornarem seus fiéis escudeiros. Era o momento da União por Pernambuco, criada num encontro histórico na fazenda de José Mendonça, o Mendonção, chefe político de Belo Jardim. Alguns antigos companheiros, então convertidos, acompanharam o líder, outros se mostraram reticentes e, coerentes, abandonaram essa nau, como foi o caso da secretária de educação jarbista, professora Edla Soares. Ainda lembro - estava com ela na sala - como essas figuras foram recepcionadas em seu gabinete no Palácio Antonio Farias. 

Jarbas seguiu seu novo rumo político, incorporando esses novos atores ao seu grupo. Havia um projeto bastante ousado de poder, escalonado entre seus principais líderes, como Roberto Magalhães, Sérgio Guerra, os Mendonças. Só esqueceram de combinar isso com João Paulo(PT), que, com sua vitória, colocou terra naquela engrenagem de poder, quebrando uma sequência que previa a vitória da Roberto Magalhães para o Palácio Antonio Farias, naquelas eleições. As indisposições de Jarbas com os Arraes, de longas datas, apenas se agravou com essa guinada conservadora do político. 

É como se os campos ficassem ainda mais nítidos. Por essa época, já eram realizados os tradicionais cozidos, na sua residência de praia, no bairro do Janga, em Paulista. O grupo político que acompanhava o ex-governador Miguel Arraes, segundo dizem, costumava fazer chacotas com aquela "turma do cozido". Mal sabia o Dr. Arraes que, anos depois, o seu próprio neto, Eduardo Campos, se encarregaria de selar a paz entre os dois grupos políticos, se lambuzando nos cozidos oferecidos pelo senhor Jarbas, com ingredientes adquiridos no Mercado da Encruzilhada. Muitas coisas mudaram no cenário político recifense desde então e, outras, foram atropeladas pelas circunstâncias, como a morte prematura do ex-governador Eduardo Campos. Política é um misto disso tudo. Neste novo cenário - único possível para preservá-lo na política, segundo ele mesmo - Jarbas passou a emprestar apoio ao grupo político dos neo-socialistas tupiniquins, colaborando com a vitória de Geraldo Júlio, nas eleições de 2012. 

O novo arranjo político permitiu a indicação do apadrinhado de Jarbas, Raul Henry, como vice, na chapa que disputou - e venceu - as eleições para o Governo do Estado, em 2014. Eleito Deputado Federal, essa condição permitiu ao político pernambuco um protagonismo na cenário político estadual e nacional. Alinhavado às forças políticas anti-petistas, o pernambucano, circunstancialmente, assume uma condição de, pelo menos, um interlocutor privilegiado nas articulações políticas no cenário recifense. Segundo dizem, sem muito alarde, como recomenda os bons manuais de política, até recentemente, o Deputado encontrou-se com o governador Geraldo Alckmin (PSDB-SP), possivelmente, observando na cidade do Recife, um trampolim fundamental para os seus eternos projetos presidenciais de 2018. 

Nessa estratégia, seria fundamental a construção de um palanque recifense em 2016, quiçá, suficiente para dar suporte ao governador paulista, em 2018. Difícil prevê como Jarbas entraria nesse jogo, mas poderia está sendo montado um agrupamento de forças capazes de criar alguns embaraços para a reeleição de Geraldo Júlio(PSB). Essa movimentação começou a preocupar o staff político do gestor, que adotou uma série de providências no sentido de prestigiar atores políticos ligados ao ex-governador, em eventos oficiais. Raul, o afilhado preferencial e vice-governador, foi o mais beneficiado. Antes disso, porém, em Brasília, Jarbas reunia a bancada pernambucana para um regabofe. No encontro, segundo se informou, uma candidatura sua à Prefeitura do Recife foi aventada abertamente. Maduro e conciliador, o ex-prefeito parece não nutrir interesses em manter arestas no Estado, exceção para aquelas inevitáveis, como setores do partido dos trabalhadores. Essas seriam irreconciliáveis.

Até o deputado Sílvio Costa, que o havia desancado no passado, hoje se mostra um admirador do ex-senador da República. Nas últimas eleições, o seu filho, Sívio Costa Filho, vem se apresentando como uma alternativa política. Mas, a rigor, não passa de uma alternativa, sempre numa perspectiva de conquistar espaços. Vazou para a imprensa que, no diálogo mantido com o governador paulista, este último manifestou o desejo de que o PSDB apresente um candidato às eleições de 2016. As aspirações presidencias de Geraldo Alckmin nunca foram negadas. Não custa sonhar, a despeito dos problemas internos da legenda tucana. O nome hoje mais cotado entre os tucanos locais é o do Deputado Estadual, Daniel Coelho, que votou a favor da redução da maioridade penal. 

Aliás, hoje parece claro que essa legenda irá apoiar toda a pauta de interesses reacionários que forem à votação. Aliás, que pauta! redução da maioridade penal, retirada da Petrobras das operações do Pré-sal. Um momento de muito obscurantismo. Só vai à votação medidas contra os interesses republicanos, conforme desejo do senhor Eduardo Cunha. É difícil prevê qual seria o papel ou a influência de Jarbas Vasconcelos nas eleições de 2016, no Recife. No momento, trata-se apenas de uma especulação. Curiosamente, coube ao ex-governador Eduardo Campos a garantia de uma sobrevida política ao ex-senador. Isolado, ele poderia não ter sido eleito. Portanto, o apoio dos socialistas foi fundamental para a sua sobrevivência e a do seu grupo político. 

Se ele bancar uma candidatura própria ou apoiar outro nome que não o indicado pelo Palácio do Campo das Princesas, certamente, teremos aqui a ruptura de uma costura que vinha se desenrolando desde algum tempo. Se isso ocorrer, é possível que os neo-socialistas tupiniquins fiquem ausentes dos tradicionais cozidos preparados pessoalmente pelo ex-governador. Por outro lado, é muito pouco provável que ele conseguice reedidar as boas performances das aleições de outrora, algo que, certamente passa por suas ponderações. Seria um risco não calculado, cujo erro poderia representar o seu outono político, milagrosamente evitado.  

MP apura racismo e injúria contra apresentadora do tempo Maria Júlia Coutinho, da TV Globo



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Por Michèlle Canes, repórter da Agência Brasil
Os ministérios públicos (MP) dos estados do Rio de Janeiro e de São Paulo se pronunciaram nesta sexta-feira (3) a respeito das ofensas sofridas em rede social pela apresentadora da Rede Globo, Maria Júlia Coutinho. O MP de São Paulo, segundo publicação no site da instituição, anunciou que foi instaurado “procedimento investigatório criminal” para apurar prática de racismo e injúria, qualificada contra a apresentadora.
A medida foi instaurada pelo promotor de Justiça Criminal, Christiano Jorge Santos, segundo o texto, depois de tomar conhecimento dos comentários feitos pelos internautas. O MP paulista ressalta que “caso de racismo é crime imprescritível e inafiançável. Já a injúria racial prevê pena de reclusão de um a três anos”.
No Rio de Janeiro, o MP informou, também pelo site da instituição, que sua Coordenadoria de Direitos Humanos solicitou à Promotoria de Investigação Penal que acompanhe o caso, com rigor, junto à Delegacia de Repressão a Crimes de Informática. De acordo com o MP-RJ, ontem (02), a produção do Jornal Nacional publicou uma foto da apresentadora que faz a previsão do tempo. “Desde então, diversas mensagens ofensivas e de conteúdo racista têm sido direcionadas à repórter”, diz o texto.
Diante dos comentários, internautas postaram mensagens de apoio à apresentadora em diferentes redes sociais. “Destilar preconceito via internet é crime”, disse um usuário em rede social. “Por um Brasil com mais respeito e igualdade para todos”, disse outro.
Edição: Stênio Ribeiro
(Publicado originalmente no site Combate ao Racismo Ambiental)

Grécia: "Tentam derrubar o governo usando os bancos ao invés de tanques"


A reação intempestiva da euroburocracia política ao referendo deixa claro que derrotar o Syriza é também neutralizar outras iniciativas.


Marcelo Justo
Tiberio Barchielli / Palazzo Chigi
A Grécia está presa numa guerra de palavras que começa com a própria convocação para o referendo. O texto é complexo, mas a pergunta é clara: sim ou não (“Ne” ou “Oxi”) ao programa de austeridade proposto pela Troica (Fundo Monetário Internacional, Banco Central Europeu e União Europeia) no dia 25 de junho. Contudo, os dirigentes europeus, como Jean Claude Juncker, presidente da Comissão Europeia, dizem que não se trata de uma votação sobre a austeridade, mas sim sobre a continuidade ou não do país na Zona Euro. 
 
A maioria dos meios europeus promovem maliciosamente esta interpretação de um referendo voltado à confrontação entre um realismo responsável e um incompetente populismo. Com algumas exceções, praticamente ninguém questiona as duvidosas credenciais de Juncker – que durante seus quinze anos como primeiro-ministro de Luxemburgo, ajudou muito a sabotar o financiamento dos estados europeus com os benefícios à evasão fiscal das multinacionais e dos multimilionários oferecidos pelo paraíso fiscal mantido em seu ducado.
 
A estratégia política e midiática é ganhar difundindo o medo do caos e do desconhecido, figuras que começam a cobrar forma com as restrições bancárias existentes desde segunda-feira (29/6). Mas os efeitos dessa guerra não terão reflexos somente na Grécia. A reação intempestiva da euroburocracia política ao referendo deixa claro que derrotar o Syriza é também neutralizar outras iniciativas visando o austericídio da Troica, como a do Podemos na Espanha. Uma vitória da estratégia de Alexis Tsipras seria uma bendição para o movimento político de Pablo Iglesias, pensando nas eleições gerais de este novembro. Carta Maior dialogou com o acadêmico grego Costas Douzinas, especialista em direito e diretor do Birkbeck Institute for the Humanities, da Universidade de Londres.
 
Carta Maior – Neste domingo, qual é a decisão que a Grécia terá que tomar? A aprovação ou não do programa de resgate proposto pela Troica ou sua manutenção na Zona Euro?
 
Costas Douzinas – Existe uma clara intenção de manipular a verdade a respeito do referendo, que é promovida por políticos como Jean Claude Juncker. O governo grego sempre esteve comprometido com o euro e a União Europeia. A única razão pela qual convocou o referendo foi para chegar a uma decisão democrática com respeito à proposta da Troica, quando as vias de negociação se esgotaram. O governo cedeu muito. Aceitou as exigências fiscais dos credores com propostas de aumentos impositivos e cortes de gastos de 7,9 bilhões de euros, mas buscou uma distribuição mais equitativa, para que 70% desse valor viesse de impostos das corporações e dos mais ricos. Pela primeira vez, as propostas foram inicialmente aceitas pelos credores, que disseram que essa era a base de um acordo. Porém, horas depois, rechaçaram a proposta. E mais que isso: faltando quatro dias para que terminasse o atual programa financeiro, eles passaram a exigir um corte de 11 bilhões de euros, e que esses esforços fossem custeados pelos mais pobres. Essa proposta foi apresentada como um ultimato, quase uma tentativa de golpe de estado financeiro. Toda a negociação foi assim, uma tentativa de derrubar o governo, usando os bancos em vez de tanques.
 
CM – O que acontecerá se os gregos preferirem a opção “não”?
 
Douzinas – O governo grego, com o respaldo democrático das urnas, voltará à mesa de negociação, para buscar um novo acordo, que seja economicamente viável e socialmente justo.
 
CM – Porém, a versão europeia é a de que o “não” significa a saída da Grécia da Zona Euro.
 
Douzinas – Outra mentira. Todos sabem perfeitamente que não há nenhum mecanismo legal para expulsar um membro da Eurozona. Estão pressionando o governo e o eleitorado grego, tentando distorcer os princípios básicos da democracia. É uma política neocolonial, algo que imagino que não surpreenderá muito os leitores do Brasil.
 
CM – Nos meios de comunicação, se fala não só da expulsão da Grécia da Zona Euro, mas também da União Europeia. Essa segunda é uma ameaça legalmente possível?
 
Douzinas – Por incrível que pareça, sim. A UE tem mecanismos para a saída de um membro, algo que já aconteceu aliás, com a Groenlândia, nos Anos 80. Mas quando se criou a Eurozona, não se incluiu nenhuma norma específica sobre os procedimentos a respeito.
 
CM – Seria essa, então, uma via para isso? Quero dizer, expulsar a Grécia da União Europeia para tirá-la, automaticamente, da Zona Euro.
 
Douzinas – Não é o que está em jogo. Nem as mais absurdas manifestações dos líderes europeus chegaram a propor isso. Temos que lembrar que a palavra Europa é uma palavra grega. Todos os princípios que formam a União Europeia estão fundados na tradição grega. E além disso, ainda que existam leis estritas sobre a saída de um membro, a verdade é que o direito está condicionado pela política. Portanto, depende muito da vontade política, e, como disse, ninguém está apostando nisso. 
 
CM – O que acontecerá se os gregos disseram “sim” à austeridade no domingo?
 
Douzinas – O referendo é uma consulta não obrigatória, mas o governo disse que vai acatar o veredito do eleitorado. Uma opção é que o governo continue com as negociações, só que mais fragilizado em sua posição. A alternativa é que renuncie. As declarações do primeiro-ministro parecem indicar que esta seria a opção preferida. Isso levaria a novas eleições, já que o parlamento, tal qual está conformado, não poderia formar um novo governo, pois o Syriza precisa de somente um deputado mais para ter uma maioria própria – nenhuma outra força política está em condições de formar governo. 
 
CM – O que aconteceria nesse caso? Porque existem compromissos financeiros que vencem este mês e não haveria um governo para tomar decisões quando se necessite tomar. Se isso ocorrer, o que será da Grécia, e do euro?
 
Douzinas – A Europa falhou em seus princípios fundacionais. Seja o que for que aconteça, creio que estamos diante de uma pergunta existencial básica na União Europeia, e os líderes terão que lidar com ela. Muitos líderes dizem que querem cada vez mais integração, mas ao mesmo tempo a estão minando. A realidade é que a única interpretação que podemos fazer da conduta da Troica é política. O objetivo é claro. Derrubar o governo, se esse não aceita as condições apresentadas, ou humilhá-lo de tal forma que seja inviável. O sucesso do Syriza e uma redução da dívida, que o mesmo FMI declarou inviável, poderia contagiar outros países, e algo parecido já se viu nas eleições regionais e municipais da Espanha, nos votos antiausteridade da Escócia e nos índices de aprovação de Sinn Fein na Irlanda, que mostram um movimento contra este tipo de ajuste. O Syriza está liderando o ataque contra a premissa neoliberal de que “não há alternativa”. Mesmo uma pequena vitória nesse caso seria um sinal contundente de que a única luta impossível é aquela que não se inicia.
 
Tradução: Victor Farinelli
(Publicado originalmente no portal Carta Maior)

quinta-feira, 2 de julho de 2015

Tijolinho do Jolugue: Como diria o Conselheiro, é o fim dos tempos.



Tempos bicudos estes que estamos vivendo. Sinceramente, não sabemos onde isso pode parar. É como se o círculo contra os valores da democracia, do respeito às leis, da conduta republicana, da defesa do interesse nacional, da ética estivesse chegando ao fim. Três episódios ou situações são emblemáticas desse estágio a que nós estamos nos referindo: o primeiro dele são os adesivos que estão circulando nos automóveis, adquiridos ao valor R$ 35,00, onde aparece uma montagem com a foto da presidente Dilma Rousseff, despida da cintura para baixo, e a indicação de uma bomba da gasolina, numa clara alusão a um possível estupro ou coito carnal. Uma excrescência sem limite, uma profunda falta de respeito com a presidente. Uma outra dimensão desse problema diz respeito à manobra do Presidente da Câmara dos Deputados, senhor Eduardo Cunha, que, derrotado numa primeira votação contra a redução da maioridade penal, numa manobra ardilosa e inconstitucional, recolocou a matéria para uma segunda votação, desta vez conseguindo atingir seus objetivos iniciais, ou seja, aprová-la. 

Alguns deputados foram "convencidos" a mudarem os seus votos.  Por fim, as manobras não menos perniciosas operadas pelo senhor José Serra no sentido de retirar a Petrobras das operações do pré-sal, o que significaria, em última análise, um processo de privatização daquela reserva de petróleo. Segundo dizem, Serra cumpre apenas o seu papel nesse script, uma manobra que, no final, está alicerçada em todas essas escaramuças contra o Governo Dilma, a começar pelas ações do Juiz Moro, numa postura bastante seletiva para atingir o PT, hoje duramente criticada por um dos ministros do STF. O ardil de José Serra significa que não estamos vendo muitos filmes sobre a teoria da conspiração.

Tijolinho do Jolugue: Polícia Civil do Estado realiza mais uma mobilização


Policiais saíram em caminhada da Rua da Aurora até o Palácio das Princesas (Foto: Ana Regina / TV Globo)


Neste momento, debaixo de toda chuva, os policiais civis do Estado estão em plena mobilização pelas avenidas do centro da cidade. Desta vez, não apenas os agentes. Delegados - e, possivelmente o pessoal da Polícia Científica - também estão acompanhando as manifestações. O Pacto Pela Vida perdeu a coordenação e,com ela, começaram a surgir uma série de problemas, inclusive a o aumento dos chamados crimes violentos intencionais - CVLIs - o principal indicador utilizado pelo Estado para aferir os índices de violência. Segundo as próprias fontes palacianas, esses primeiros seis meses de governo do senhor Paulo Câmara tem sido dedicados a "colocar a casa em ordem", reduzindo despesas, cortando gastos e, preferencialmente, aumentando as receitas do Estado. Em tese, é uma área que o governador conhece bem, uma vez que foi cevado nas finanças públicas do Estado. 

É bom que se diga que o quadro não está bom para ninguém, nas diversas esferas da Federação. A postura no sentido de equilibrar as contas do Estado, impõe-se naturalmente, em razão das circunstâncias adversas. Só não entendo como ele irá se arranjar com as inúmeras categorias de servidores públicos que reivindicam uma recomposição salarial. No caso dos policiais civis, de acordo com o sindicato da categoria, Pernambuco paga o menor salário do país a um agente de polícia. Segundo os dados apresentados pelo Governo, o Estado estaria no limite dos gastos com a folha, previstos na Lei de Responsabilidade Fiscal, ou seja, 46,6%. Para ser mais preciso, os gastos com a folha de pagamento estaria um pouco acima deste limite. Que nos perdoem os policiais civis - entendo que o pleito é justo, por uma série de fatores - mas deflagrar uma greve num quadro recessivo como este é uma temeridade. 

O Governo Federal ofereceu ao pessoal do Executivo um percentual de 21% divididos em 4 anos, a partir de Janeiro de 2016. Nós não sabemos nem se chegamos vivos até lá. E, se chegarmos, a inflação já teria corroído esses percentuais muito antes de recebê-los. Esse país está vivendo um momento muito difícil, e isso não está circunscrito apenas às questões econômicas. Vejam os adesivos que estão circulando contra Dilma. Vejam as manobras inconstitucionais de um cidadão que responde pela Presidência da Câmara dos Deputados, com o propósito de aprovar a redução da maioridade penal . Embora haja esses "constrangimentos", senhor Paulo Câmara, muita coisa pode ser feita pela segurança pública do Estado. Aliás, precisa ser feita. Estão ocorrendo falhas clamorosas no Pacto Pela Vida e a reversão dessa situação passa, tão somente, por atitudes mais condizentes, como a retomada das reuniões regulares, a intimação aos atores envolvidos, numa palavra, vontade política. O Pacto Pela Vida entrou num processo de inércia que parece não mais ter volta.

Michel Zaidan Filho: O fim do abolicionismo penal

 



                          É um triste paradoxo constatar que, numa época em que aumenta a violência e a criminalidade violenta, o garantismo jurídico seja substituído pelo chamado "terrorismo penal", através daquela odiosa inversão em que a vítima se transforma em réu. A grande maioria das pessoas tende a tomar o efeito pela causa e responsabilizar criminalmente os excluídos de todas as oportunidades sociais pelos transtornos da sociedade. Em primeiro lugar, todos somos responsáveis por esses transtornos. Ninguém está, absolutamente, isento de responsabilidade pelos problemas da nossa sociedade. Por comissão ou omissão, cada um de nós tem parte nesse desajuste moral que assistimos pelo rádio, a TV, os jornais e as redes sociais.Segundo, é pouco cristão adotar a vindinta, a retaliação, o ódio como forma de tratar aqueles que nos ofendem ou nos ameaçam, sobretudo quando se trata de menores e incapazes moralmente. Terceiro, não é boa política criminal endossar  o ponto de vista Kantiano da "retribuição" como fundamento do direito penal, ou a chamada "lei de Talião": olho por olho, dente por dente. Não é esse o fundamento da pena ou do castigo. A não ser que não acreditemos mais nas palavras: ressocialização, reeducação, reinserção do apenado ao convívio social. Aí, seria mais honesto defender as políticas de higienização social, faxina social ou o puro extermínio daqueles que ameaçam à "paz social".
                      Esse preâmbulo foi feito a propósito da manobra regimental (ou chicana regimental) que permitiu a aprovação da emenda que antecipa a maioridade penal para os jovens e adolescentes de 16 anos. A PEC já tinha sido derrotada na primeira votação na Câmara dos Deputados. Mas graças a um artifício regimental, o discípulo da Igreja Sara Nossa Terra conseguiu reapresentá-la, sob o argumento de que se tratava de um outro texto, um outro projeto de lei. Não sei se vai ou não prosperar essa manobra, que ainda tem de passar por uma segunda votação, na Câmara, e duas votações no Senado. É possível que seja modificada no Senado, se for formado um consenso em torno da proposta do PSDB, que aumenta o tempo de internação dos menores delinquentes e aumenta a pena para os maiores que aliciam jovens para o cometimento de ilícitos penais.
                      0 que chama mais atenção é o perfil dos que serão atingidos por essa perversa manobra, caso ela prospere: menores e adolescentes pretos, pardos, pobres e analfabetos. Será este o contingente alcançado pelo "terrorismo penal" da bancada da bala e da Bíblia, na Câmara dos Deputados. Ao invés de mais escolas de tempo integral, mais bolsas de estudo, mais profissionalização, lazer e oportunidades sociais, mais cadeias, mais celas, mais vagas nas prisões superlotadas de detentos e apenados. Seria mais honesto defender uma política de extermínio social, sem cotas, para este grupo. Admitir que o fabuloso processo de (EX)inclusão social brasileiro não comporta esse grupo. Ou que a sombra de Cesare Lombroso voltou a pairar sobre a cabeça de legisladores (evangélicos) e  juristas. É que há um relativo consenso na população brasileiro de que o paraíso não é para todos. É para alguns. E que  "o crime de colarinho branco" compensa no Brasil. Rende aposentadoria milionária, estandarte e dia feriado.
                       Aqueles que costumam esgrimir o Poder de Polícia contra os outros e a necessidade de prisão para os mais pobres,  provavelmente nunca foram presos (e acham que nunca serão). Invoque-se o exemplo do Pizzolato na Itália ou de Maluf na cela da Polícia Federal de São Paulo! Ou dos ricos empresários pegos na Operação Lava-jato: é chato, deselegante e pouco confortável ser preso no Brasil. As cadeias não são devidamente aparelhadas, são úmidas, frias ou quentes, não tem televisão, frigobar ou um cardápio sob medida, com comida italiana ou árabe. Ou seja, cadeia mesmo só para pobre e miserável que só depende da defensoria pública e do juiz das execuções penais. Para os demais, liberdade assistida ou prisão domiciliar, com pizza e coca-cola e jogos do Brasil.
                      Segundo o sociólogo francês Pierre Bourdieu, o "habitus" e o "Animus" limita a história de vida das pessoas, mais ou menos determinando o destino de cada um, em sociedades competitivas e desiguais. Mas nada, absolutamente nada impede de que aqueles que vieram de baixo, que não nasceram em berço de ouro, não foram a Boston para aprender inglês, possam mudar esse destino e ter uma vida melhor. Tudo depende da disposição, da vontade política da sociedade em oferecer oportunidades sociais, educacionais, profissionais, artísticas que resgatem esses milhões de jovens e crianças brasileira....da morte certa na guilhotina que está sendo preparada para eles.

Michel Zaidan Filho é filósofo, historiador, cientista político, professor titular da Universidade Federal de Pernambuco e coordenador do Núcleo de Estudos Eleitorais, Partidários e da Democracia - NEEPD-UFPE
                           

quarta-feira, 1 de julho de 2015

Crônicas do Cotidiano: Literatura de Engenho


 

Confesso que fiquei fascinado pela leitura do livro do professor Diego José Fernandes Freire, "Contando o Passado, Tecendo a Saudade", sobre a construção simbólica do engenho açucareiro em José Lins do Rego. Na realidade trata-se de uma tese, mas escrita sem os rigores - não raro chatos e estéreis - do campo acadêmico. Por sinal, muito bem escrita. Um calhamaço de 400 páginas, capazes de prender a atenção do leitor desde o início até a última página. Somos suspeitos para falar do assunto. Tudo que diz respeito à literatura regionalista nos interessam de imediato. Nossas leituras começaram com os textos de Machado de Assis. Somente depois, bem depois, é que comecei a ler os romances da literatura de engenho, escritos pelo escritor paraibano, José Lins do Rego. Um livro após o outro, verdadeiramente encantado com a vida na bagaceira.  

Começamos e não mais paramos. Os estudiosos costumam estabelecer alguns ciclos específicos de sua produção literária, como os livros que compõem o chamado "ciclo da cana-de-açúcar", que vai do período de apogeu dos engenhos de fogo morto até a sua completa decadência, motivada pelo avanço tecnológico e as mudanças das relações sociais de produção, com o fim do período escravocrata. O próprio escritor cometeu idas e vindas em sua obra, penso que imbuído pelo sentimento de "saudade" dos seus verdes anos no Engenho Corredor, que pertencia ao seu avô. 

Não tivemos a oportunidade de conhecer engenhos na nossa infância. Quando muito, algumas viagens pelos partidos de cana que margeiam a zona da mata do Estado de Pernambuco, ou mesmo a contemplação das inúmeras referências arquitetônicas - já em ruínas - dos antigos engenhos da região. As leituras desses romances nos transportavam àqueles tempos, como num passe de mágica. Ainda hoje, quando penso em proibir meus filhos de brincarem na lama, tomarem um banho de chuva ou mergulharem nos açudes, a lembrança de que nos vem à mente é a do personagem de "Meus Verdes Anos" que, acometido de fortes crises de asma, ficava prostrado numa cama enquanto os moleques faziam suas algazarras nos quintais e alpendres das casas grandes. Como "Meus Verdes Anos" é o mais auto-biográfico dos livros do autor, era o próprio José Lins naquele isolamento imposto pelos familiares. 

A leitura do livro de Diego ampliou bastante nosso conhecimento sobre a literatura de engenho. trouxe-nos alguns fatos novos e, de certa forma, alvissareiros. Em inúmeros momentos, nos deparamos com um  discurso construído em torno da influência do sociólogo Gilberto Freyre sobre o escritor José Lins do Rego. Aliás, coube ao sociólogo de Apipucos a construção desse discurso, salvaguardando as opiniões em contrário. Os dois mantinham uma relação de muita amizade e, de fato, trocavam muitas ideias sobre literatura. Casa Grande & Senzala e Menino de Engenho são quase do mesmo ano. A partir de um determinado momento, poder-se-ia afirmar que os dois faziam uma espécie de "dobradinha". Enquanto Gilberto se dedicava ao ensaísmo histórico, José Lins romanceava a vida nos engenhos. 

O que Diego insinua, no entanto, é que pessoas como Olívio Montenegro,que conhecia muito bem literatura e fez várias indicações de livro para o escritor paraibano, quiçá, possa ter exercido uma influência ainda maior sobre a carreira literária dele do que o autor de Casa Grande & Senzala. Coube a Joaquim Nabuco, no entanto, a condição de precursor da chamada literatura de engenho. Joaquim Nabuco viveu até os 08 anos de idade no Engenho Massangana, que pertenceu à sua família, e que hoje é administrado pela Fundação Joaquim Nabuco. Num dos capítulos do livro "Minha Formação", o diplomata pernambucana abre um espaço para descrever o engenho onde ele passou parte de sua infância, precisamente num capítulo que leva o nome do engenho: "Massangana".

Escrito bem antes da "Bagaceira", de José Américo de Almeida, e "Menino de Engenho", de José Lins do Rego, coube ao pernambucano a primazia de ter, digamos assim, inaugurado a literatura de engenho. Os pernambucanos, aliás, estão muito bem representados na roda literária da literatura de engenho. O romance "Senhora de Engenho", de Mário Sette, outro pernambucano, se configura como outra obra tão importante quanto a de Joaquim Nabuco, no contexto deste circuito literário. Perdão se não usamos o termo correto.

Há algo curioso que sempre mencionamos quando tratamos do Engenho Massangana. No documentário "Cabra Marcado para Morrer" de Eduardo Coutinho, em certo momento, é mencionado que o líder camponês paraibano, João Pedro Teixeira, fugindo dos seus algozes, que já o ameaçavam de morte, vem para Pernambuco e passa a residir em Jaboatão dos Guararapes. Neste mesmo excerto, é posto que ele chegou a trabalhar no Engenho Massangana. 

O romance de Mário Sette também alcançou grande repercussão, tendo sido adaptado para o teatro, com direito à trilha de Capiba, gravada por Nelson Gonçalves. Trata-se da conhecida "Maria Betânia". O livro de Mário contou com várias edições, tendo vendido bastante para os padrões da época. O mais importante, entretanto, é que foi muito bem recebido pela crítica. Mário Sette, diferente de José Lins, Joaquim Nabuco e Gilberto Freyre, não foi um menino de engenho, na verdadeira acepção da palavra. Menino urbano, filho de comerciantes, sem as contas pagas pela família, Mário não conheceu la dolce vita. Conta os familiares que, numa viagem à cidade de Tracunhaém, a trabalho, em idos bem remotos, Mário apaixonou-se pela cidade e resolveu escrever seu romance rural. Ao contrário de Nabuco, Mário Sette também não teria avançado muito nos círculos acadêmicos, tendo concluído apenas o ensino médio. 

Mário escreveu bastante, em mais de um gênero. No site mantido pela família é possível ter a dimensão dessa produção literária. Veja o que diz o seu filho, Hilton Sette, sobre a experiência do pai, que, conforme já afirmamos, foi até à cidade de Tracunhaém, inspecionar a agencia postal local:


Meu pai evoca em MEMÓRIAS ÍNTIMAS e em APONTAMENTOS AUTOBIOGRÁFICOS (inéditos) as suas reações de agrado e encantamento experimentadas nessa curta e imprevista excursão à Zona Canavieira. Numa certa manhã, a novidade de uma viagem de trem, o sol a doirar o verde da paisagem, os partidos de cana beirando a linha férrea, ocorrências de matas coroando os cimos das elevações, o rumorejar de riachos nos fundos dos vales, aqui e ali a presença de banguês com suas casas-grandes, suas "moitas", seus bueiros fumegantes, seus aromas de mel cozinhando.

A primitiva vila semi-rural acolheu-o e cativou-o com o pitoresco do arruado e com a hospitalidade de sua gente. A simplicidade do casario em redor da igreja, o pátio relvado com peças de roupa a "quarar", a brisa cheirando a mato, os dedos de prosa com os que iam postar ou buscar correspondência, o almoço oferecido pelo Agente Postal, depois de cumprida a inspeção. E, à tardinha, o regresso, enquanto as sombras cresciam, a aragem refrescava ainda mais, a quietude envolvia todo o cenário, e o futuro autor de SENHORA DE ENGENHO trazia na lembrança para ali localizar o engenho Águas Claras do Coronel Cazuza.

Como essa "construção discursiva" não se limita tão somente à literatura, afinal, Diego foi orientando de Durval Muniz,coube ao também menino de engenho, o pintor Cícero Dias, retratar, através dos seus quadros, o universo dos engenhos - um conceito bem mais amplo - que não se resume apenas à arquitetura e nem ao maquinário, mas a todo um complexo de vivências, para fazer jus à letra da música da Banda de Pau e Corda. Cícero, aliás, foi o pintor preferido dos escritores da chamada literatura de engenho. Bem nascido, o pintor pernambucano passou a infância em três engenhos pertencentes aos seus familiares.

José Luiz Gomes 

P.S.: Convém fazer aqui algumas considerações. Apesar de inicialmente ambientado num engenho, a narrativa do livro de José Américo de Almeida, A Bagaceira, apresentado como a obra inaugural da literatura regional, não se resume a uma obra que trata das vivências do universo simbólico dos engenhos. Daí, portanto, não ser classificada como "literatura de engenho". Por outro lado, como deve-se estabelecer a distinção entre literatura regional e literatura de engenho, a obra de José Américo, salvo opinião em contrário, continua com o status de obra seminal da literatura regional.  

Tijolinho do Jolugue: Dilma e Kissinger: Ossos da diplomacia?


Henry Kissinger foi pinçado do circuito acadêmico para o campo político, mais precisamente, para as relações internacionais. Durante os anos da Guerra Fria, como chanceler de Richard Nixon, reinou soberano na diplomacia americana. Os atores são "selecionados" mediante uma série de contingenciamentos. Kissinger foi um ator perfeitamente adaptado ao establishment norte-americano. Mas, quem na realidade é Kissinger, que durante décadas mandou e desmandou na política externa dos Estados Unidos. Apenas um bom diplomata? um ator político hábil? Um analista mais isento poderia afirmar que, de fato, ele possuía essas qualidades. Do contrário, assim como o seu amigo russo, Andrey Gromiko, não teria sobrevivido durante tantos anos naquela engrenagem de poder repleta de escaramuças. Mas Kissinger tem um outro lado. Um lado de perversões, cometidas durante a sua gestão, patrocinadas pelo Governo Americano, do qual ele foi cúmplice. Isso envolve desestabilizações de governos legalmente constituídos;golpes de Estado; assassinatos de opositores; torturas; perseguições e coisas afins. O bem informado jornalista Elio Gaspari chegou a encontrar documentos oficiais comprometedores, que provam o "sinal verde" da diplomacia americana para assassinar opositores. Chegamos a escrever um artigo sobre este assunto. Diplomacia é diplomacia. Tem dessas coisas. Contingenciada pelo protocolo, a presidente Dilma Rousseff foi obrigada a apertar a mão desse crápula. Ela, que esteve na luta armada, certamente sabe o que este cidadão representou para os interesses nacionais na década de 60.

Tijolinho do Jolugue: Redução da maioridade penal foi rejeitada.


 
 
A rejeição, pela Câmara Federal, da Proposta de Emenda à Constituição - PEC 171/93 - que previa a redução da maioridade penal de 18 para 16 anos, em casos de crimes graves e hediondos, é algo que precisa ser bastante comemorado pela sociedade brasileira. Nos últimos meses, o país vem sendo sacudido por uma espécie de "marcha da insensatez", uma espécie de clamor conservador e, para alguns, com  componentes de caráter golpista. Várias pessoas sérias - às quais respeitamos bastante - já se pronunciaram sobre este assunto. A redução da maioridade penal seria uma dessas aberrantes insensatez. 

Por vezes nos perguntamos como as pessoas que defendem essa excrescência não conseguem dimensionar as verdadeiras razões que conduzem os menores ao mundo do crime e dos delitos. Por consequência, a redução também não contribuiria para a diminuição dos crimes ou delitos cometidos pelos menores de idade. No país já existe uma pena de morte oficializada, responsável pela eliminação física de milhares de menores todos os anos. O Estado de Alagoas é o que oferece a condição de maior vulnerabilidade para os jovens pobres e negros. Em outras palavras, é o Estado da Federação que mais mata jovens com essas características. 

Coincidentemente, numa demonstração clara de que pouca coisa mudou nesse país nos últimos anos, os grupos de extermínio atuam exatamente nas antigas terras de quilombo, na zona da mata alagoana. O que o jovem brasileiro precisa é de uma escola decente, de inserção profissional e produtiva,enfim, que os seus direitos sejam preservados e garantidos pelo Estado. Por enquanto, infelizmente, a solução tem sido matá-los ou encarcerá-los em ambientes inóspitos, que não oferecem as mínimas condições de ressocialização. Num quadro como este, é absurdamente incoerente pensarmos em redução da maioridade penal.  Penso que o chargista Laerte foi muito feliz na charge que ilustra essa postagem. 

Tijolinho do Jolugue: Como anda a gestão de Geraldo Julio?

 
 
Nas eleições municipais de 2012, escrevemos uma série de 30 artigos abordando os bastidores daquelas eleições. Já nos sugeriram uma possível publicação, mas nos mantivemos reticentes quanto a essa possibilidade. O que não nos faltam é o entusiasmo de continuar acompanhando as movimentações dos atores políticos, já em razão das eleições municipais de 2016, o que já nos levou a produzir dois artigos sobre esse tema. Já no final daquela série de artigos - mas ainda muito antes dos resultados das eleições - havíamos preconizado uma inevitável vitória de Geraldo Julio (PSB). Confesso que não fomos muito duros, à época, com o futuro prefeito Geraldo Julio. Afinal, por aquele período - a despeito das escaramuças já existentes - o ex-governador Eduardo Campos ainda era um aliado da coalizão petista. 

À época, o artigo foi bastante festejado pelo staff do atual prefeito do Recife.Talvez por isso, a gestão de Geraldo Julio foi tão pouco comentada em nosso blog. Somente mais recentemente, é que esse processo foi destravado, sobretudo em razão dos graves problemas com a condução da política educacional do município do Recife. Convém esclarecer que não havia, de nossa parte, nenhuma simpatia ou torcida em particular pela vitória de Geraldo Julio. Apenas as circunstâncias analisadas daquelas eleições indicavam uma inevitável vitória do candidato do ex-governador Eduardo Campos. 

Há um consenso de que o ex-prefeito do Recife, João da Costa(PT), não fez uma boa gestão do município do Recife.Descer aos detalhes pensamos ser desnecessário.Como administração do município é coisa do cotidiano, o cidadão recifense deve ter ainda na memória sua relação com problemas como limpeza dos canais, mobilidade urbana, recolhimento do lixo, calçadas esburacadas, deslizamento de barreiras, obras inacabadas e coisas afins. Pesou contra João da Costa, igualmente, o rompimento político com o seu padrinho, o também ex-prefeito João Paulo. João da Costa dormiu com o inimigo durante toda a sua gestão. João, o matuto de Angelim, foi fustigado internamente por caciques graúdos da legenda, no plano local e nacional. Embora com problemas na gestão, João da Costa mostrou um hábil articulador no plano interno da legenda. Deu várias cipoadas em atores muito mais experientes.

Foi exatamente aqui que, aliado a outras escaramuças, o ex-governador Eduardo Campos viu a oportunidade única de conquistar para a sua legenda o Palácio Antonio Farias. Formou-se uma grande expectativa em torno da futura gestão de Geraldo Julio a frente da Prefeitura da Cidade do Recife. Convém esclarecer, entretanto, que ela veio no bojo de uma baita campanha de marketing institucional que apontava Pernambuco como um dos Estados mais bem geridos da Federação. A expectativa - em certa medida falsa - é que o Recife repetisse a proeza. Com a morte do ex-governador, logo, as fichas começaram a cair. 

Não apenas pela liderança que ele exercia sobre os seus comandados, mas, sobretudo, em razão de manter junto ao imaginário popular um discurso de bom gestor, de tocador de obras, de captador de recursos e investimentos e de liderança inconteste. Esse discurso ancorava seu projeto presidencial, abortados com a sua morte. No dia de ontem, em razão das duas mortes ocorridas durante aquela tromba d'água que caiu no Recife, logo alguns opositores vieram a público para creditar a responsabilidade sobre o ocorrido à gestão do prefeito Geraldo Julio. A gestão de Geraldo não vai nada bem. Isso é sabido. Assim como as águas que caíram no Recife, a gestão encontra-se numa enxurrada de problemas. 

Não enxergamos como um comportamento positivo esse frenesi em apontar as tragédias que ocorreram como resultado da má gestão do prefeito.A ansiedade é tão grande que chega-se a pensar que havia alguém torcendo para que essas tragédias ocorressem. Recife tem alguns problemas estruturais que nunca foram enfrentados a contento. As inundações, em dias de chuvas torrenciais, é um bom exemplo. Qual foi a gestão que conseguiu enfrentar esse problema? O ex-prefeito, Roberto Magalhães, costumava afirmar que o Recife era um prato, numa referência à edificação da cidade, em alguns trechos, bem abaixo do nível do mar. 

Para que se tenha uma ideia, aquela trecho do bairro do Benfica, em frente ao Clube Internacional, chega a ser 3,5 metros abaixo do nível do mar. Uma verdadeira cratera. Os pontos finais de algumas galerias foram simplesmente obstruídos com a construção de moradias irregulares. Há, aqui, o que chamamos de um refluxo. Lixos são jogados nas encostas dos morros. O incidente que resultou nas duas mortes são o resultado de lixo encharcado, que torna-se um peso insuportável para terrenos frágeis. Infelizmente, esses problemas devem continuar, independentemente de quem esteja ocupando a cadeira de prefeito no Palácio Antonio Farias. Muita coisa precisa ser feita pelo poder público municipal, preferencialmente com a colaboração da população.