pub-5238575981085443 CONTEXTO POLÍTICO.
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sábado, 7 de outubro de 2017

O xadrez político das eleições estaduais de 2018, em Pernambuco: Democratas voltam a sonhar com os Coelhos

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José Luiz Gomes da Silva
 
Cientista Político
 
 
 
Religiosamente, acompanho o programa Canal Livre, da Rede Bandeirante, transmitido da madrugado do domingo para a segunda-feira. Como o programa é gravado ao meio-dia, eles bem que poderiam retransmiti-lo naqueles horários mais convenientes do que nobre, ali pelas 22:00 horas. Infelizmente, parece que a prioridade daquela empresa não é o jornalismo político. Um dos últimos programas entrevistou o Deputado Federal Rodrigo Maia(DEM), Presidente da Câmara dos Deputados. Uma das primeiras impressões é que se trata de um político muito hábil, donde talvez se entenda um pouco as especulações de que poderia tornar-se um fantoche no plano dos militares, na eventualidade de um recrudescimento do golpe institucional de 2016. Fantoche, neste caso, seria um "civil confiável". Matreiramente, os entrevistadores tentaram de tudo para atirá-lo contra o presidente Michel Temer(PMDB), sabedores das indisposições entre ambos. Não conseguiram.

Lá para as tantas, no entanto, ele fez um comentário longo, onde remontou as tessituras em torno da montagem do projeto presidencial do ex-governador pernambucano, Eduardo Campos(PSB). Por aqueles idos, Eduardo Campos costurou alianças à direita do espectro político, filiando ao PSB vários integrantes dos Democratas. Com a sua morte, talvez a tendência mais coerente aos socialistas seria voltar às suas origens, como, de fato, hoje é forte a tendência neste sentido, se considerarmos o realinhamento com os comunistas, pós-comunistas, trabalhistas e, até quem sabe, os petistas. Como o projeto de uma guinada mais ao centro estava relacionado ao ex-governador, com a sua morte, morreria, naturalmente, essa tendência do partido. O apoio ao governo do presidente Michel Temer serviu para definir esse jogo, isolando os "autênticos" e as velhas raposas Democratas, de sotaque conservador deste sempre, que esboçaram uma profunda revolta com as sanções aplicadas pela direção da legenda socialista. 

Na percepção de Rodrigo Maia, em se precisando fazer este caminho de volta, que esses descontentes voltassem a perfilar ao lado dos ex-companheiros, desta vez ajudando a alicerçar planos mais ambiciosos da legenda. As articulações estavam bastante azeitadas. No raciocínio de Rodrigo Maia, qual o problema de um aliado fiel do governo desejar seu crescimento? Nenhum, responde ele. Eis que, numa manobra inusitada e inesperada, a cúpula política do Governo Michel Temer age, no sentido de atrair o senador Fernando Bezerra Coelho para o PMDB pernambucano, criando um impasse com a direção regional da legenda, sob o controle do Deputado Federal Raul Henry, fiel escudeiro de Jarbas e vice-governador do Estado. O impasse, como se sabe, além dos problemas políticos, gerou uma disputa jurídica, decididas mais recentemente em duas liminares em favor do grupo político de Jarbas Vasconcelos.

Diante do exposto, numa linguagem comum aos advogados, qual seria o caminho do senador Fernando Bezerra Coelho? Suas movimentações indicavam que ele poderia ter alguma carta na manga, quem sabe avalizada pelo Executiva Nacional da legenda. Mas, diante da presença do Ministro da Educação, Mendonça Filho, aqui na província - inclusive em missões oficiais no reduto político da família Coelho - começou a ser aventada outra possibilidade, ou seja, o jogo ser zerado e os Coelhos migrarem, na realidade, para os Democratas. Evitando as polêmicas acerca do assunto, Mendonça Filho chegou a insinuar que o partido poderia receber em suas fileiras algo em torno de 09 socialistas, quem sabe com o concurso da família Coelho. Não seria improvável essa hipótese, diante da absoluta impossibilidade de convivência civilizada entre os Coelhos e os seguidores do ex-governador Jarbas Vasconcelos.  

Mas, como o projeto maior da frente de oposição seria o de conquistar o Governo do Estado nas próximas eleições estaduais, quanto maior o dano provocado aos ocupantes do Palácio do Campo das Princesas, tanto melhor para a frente. Uma situação ideal seria contar com os Coelhos como aliados, de preferência tirando o PMDB do palanque situacionista. É neste sentido que se especula que os Coelhos ainda não teriam jogado a toalha no tocante ao imbróglio que se formou em torno do controle do clã sobre o PMDB local. Com as barbas de molho já há algum tempo, o governador Paulo Câmara teria uma agenda com o propósito de acertar alguns pontos com o comando do PP local, na pessoa do Deputado Federal Eduardo da Fonte, que deseja uma participação maior no Governo para consolidar a aliança em torno do projeto de reeleição do governador Paulo Câmara(PSB). É bom que se diga que este partido construiu uma capilaridade política importante aqui no Estado - seguindo numa raia própria e autônoma - que não se curvou nem ao processo de eduardolização da política pernambucana. Vão com algumas cartas para a negociação.

Charge!Duke via O Dia

Charge! Renato Machado via Folha de São Paulo

Renato Machado

sexta-feira, 6 de outubro de 2017

Editorial: A propensão autoritária do brasileiro

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As pesquisas de opinião e as de intenção de voto - sobretudo essas últimas - sempre costumam causar muitas polêmicas. Particularmente não vejo problema que isso ocorra, apenas aconselho olhar os números com mais cuidado, dentro do seu contexto, de preferência - conforme aconselhava o professor José Carlos Wanderley -acrescentar alguma variável interveniente aqui e ali, para se apurar, com mais rigor, os dados apresentados por uma pesquisa. A última delas, publicada pelo jornal Folha de São Paulo, por exemplo, traz alguns dados curiosos: a profunda rejeição do brasileiro aos políticos envolvidos em corrupção, ao mesmo tempo em que apresenta o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva - já condenado e bastante encrencado nos rolos da Operação Lava Jato - liderando em todos os cenários, tornando-se imbatível num eventual segundo turno. Aparentemente, trata-se de uma contradição. Mas só aparentemente, porque o eleitorado fiel ao ex-presidente pode pensar, por exemplo, que Lula é inocente, vítima de um grande complô para inviabilizá-lo politicamente. Lula talvez não tenha vencido a guerra de comunicação.

 
Até bem pouco tempo, se pensava que a nossa democracia estava em céu de brigadeiro, a um passo de sua consolidação. Isso ocorria um pouco antes do golpe institucional de 2016, que afastou a ex-presidente Dilma Rousseff, legítima e legalmente eleita, através de um processo de impeachment profundamente duvidoso. Veio o golpe institucional - de um novo tipo - e agora os assanhamentos da caserna, numa perspectiva que aponta para o seu recrudescimento. As informações sobre a saúde de nossa democracia não são nossas, mas de organismos internacionais que se dedicam a monitorar esse sistema de governo em todo o mundo, com base em critérios como eleições regulares e limpas, o funcionamento das instituições, o respeito ao Estado Democrático de Direito, entre outras variáveis. Nos governos da coalizão petista, o país avançou significativamente naquilo que denominamos de democracia substantiva, ou seja, obteve uma melhor distribuição de "recursos", ao retirar mais de 35 milhões de brasileiros da extrema pobreza. 


A relação entre democracia política e democracia econômica, também suscita muitas controvérsias, mas, salvo naqueles casos onde o tirano de turno utiliza os recursos naturais do país para perpetuasse no poder - conhecida como "a maldição do petróleo" - convém enfatizar a importância de um equilíbrio entre essas duas instâncias como um fato importante para a ampliação do processo democrático. Demandas sociais e econômicas não atendidas geram protestos e insatisfações na população, comprometendo todo o edifício democrático, em última análise, sobretudo nesses dias bicudos de hoje, quando esses protestos são respondidas com intensas repressões. Neste sentido, as conquistas sociais da era Lula/Dilma foram muito importantes para construir esse equilíbrio. Uma pena que nossa elite - a mais cruel do mundo - vejo o mundo apenas a partir dos seu umbigo. Aliás, cumpre aqui fazer o registro que o perfil de nossa elite talvez seja o maior empecilho para a viabilidade da democracia entre nós. 


Mas, assim com existem mecanismos para aferir a saúde de uma democracia, o jornal Folha de São Paulo de hoje, 06, traz uma matéria interessante acerca da criação de um índice para apurar a propensão autoritária de uma sociedade. Na realidade, um índice de propensão ao apoio de posições autoritárias, criado pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública(FBSP). Também neste índice, o país não vai assim muito bem das pernas, ou seja, numa escala crescente que vai de 0 a 10, atingimos a média de 8,1. No dia a dia, com os constantes registros de práticas de crimes de intolerância, isso já seria perceptível, mas cabe aqui ainda observar os comentários dos editorialistas do jornal: "A constatação mostra-se ainda mais relevante quando os brasileiros começam a se preparar para a corrida eleitoral do próximo ano, num contexto político e social instável, em tese propício a aventuras populistas e autoritárias. A última pesquisa de intenção de voto do Instituto Datafolha, por exemplo, mostrou que entre 15% a 16% dos brasileiros estariam dispostos a embarcar numa aventura do tipo, creditando seu voto em candidatos com o perfil de um Jair Bolsonaro que, em meio a tantas tragédias provocadas pelo uso de armas, numa manifestação pública recente, afirmou que iria armar os brasileiros. 

A charge que ilustra este editorial é do cartunista Benett   

Michel Zaidan Filho: Golpe, obstrução da justiça e crime


 

Os advogados do senhor Michel Temer, atual ocupante da cadeira presidencial, deveriam passar em revista os conceitos do Direito Penal e refletir muito sobre eles, para não usá-los indevidamente ou injustamente contra ninguém. Comecemos pela vocábulo "Golpe". O que constitui um movimento golpista ou uma tentativa golpista? - Para o bom entendedor da teoria política ou do direito constitucional, trata-se de uma interrupção ou uma ruptura com a legalidade institucional, um atentado à Constituição da República ou a destituição dos governantes legitimamente eleitos pelo povo. Agora vejamos se procede a acusação da defesa de que a segunda denúncia contra Temer não passa de um golpe político contra ele.Quando houve um afastamento da Presidente Dilma pelo Congresso, sob a alegação de crime de "responsabilidade" pelas chamadas "pedaladas fiscais"- num processo eminentemente político - ninguém se pronunciou para falar de golpe, de ruptura institucional, ou atentado à Constituição. 

Pagou-se a uma advogada evangélica para a elaboração da denúncia e do pedido de Impeachment e comprou-se, no grosso e no varejo, os votos dos deputados para que votassem a favor do pedido. Depois veio a revelação,em ligações telefônicas, de que o objetivo da empreitada era outro: estancar a operação Lava-Jato e manter na impunidade uma série de parlamentares corruptos. De nada adiantou o então Advogado-geral da União, em peça muito bem fundamentada, argumentar que não havia crime de responsabilidade nenhum e o que estava em curso era um "golpe parlamentar", sob a justificativa da ingovernabilidade política. Agora, trata-se de um processo CRIMINAL, não político. Michel Temer e seus auxiliares mais próximos (Jucá, Moreira Franco e Eliseu Padilha) são acusados pelo PGR/STF de formação de quadrilha e obstrução da Justiça, baseado em provas testemunhais, gravações e documentos. Ora, quem é que deu o golpe: Temer e sua camarilha ou o ex-procurador da República?


Uma das acusações mais sérias e incontestáveis é aquela da obstrução da Justiça. Desde a primeira denúncia, se observa como o denunciado e seu colegas se valem do cargo que ilegitimamente ocupam para corromper, aliciar, cooptar, comprar ilicitamente - com dinheiro público - o apoio de deputados venais para rejeitar a denúncia contra ele. Está certíssimo o procurador Janot quando imputa a temer o crime de obstrução, porque é exatamente o que vem sendo feito nas barbas da lei, de forma escancarada. Promessas de emendas, cargos, recursos, nomeações, tudo vale para impedir que a denúncia seja apreciada e acatada, primeiro, no Conselho de Ética da Câmara dos Deputados, depois, no Plenário, onde serão necessários mais de 300 votos para que ela prossiga. Há sim, obstrução. 



O correto e ético seria o afastamento puro e simples dos denunciados de seus cargos, para que eles não fossem usados imprudentemente para evitar que as acusações sejam cabalmente apurados e acatadas, se julgadas procedentes.Pior ainda, colocar sob suspeição do acusador e pedir seu afastamento. Quem deveria ser afastado, nesse momento, são os denunciados, pois o histórico de ilicitudes não permite sequer a presunção de inocência. Finalmente, a parte mais séria: a acusação de recebimento de propinas (fala-se na cifra de mais de 500 milhões), e formação de quadrilha. Aí, nem se trata de procedimento. Trata-se de uma gravíssima acusação, apoiada em uma variedade de provas, que por si só já seria suficiente para o afastamento preventivo dos denunciados. 


Em qualquer país decente, uma acusação como essa traz consigo uma condenação moral que desabilita os acusados de exerceram função ou cargo público. Mas aqui o processo de obstrução, auxiliado pela permanência no cargo, faz dos indigitados coitadinhos, perseguidos, vítimas inocentes da perseguição cega de um membro do MP desatinado, monomaníaco e compulsivo. Nessa troca de acusações, ainda sobra o impasse institucional entre o STF e o Senado. Será que ninguém ver que esse cabo de guerra só pode reforçar a convicção daqueles que só esperam mais um pretexto para estimular mais um golpe de Estado no Brasil? - Aí, quando isso acontecer, não tem para mais ninguém. Todos perdem. Todos viram culpados perante uma Justiça de exceção. Vão voltar a estudar a Constituição e pedir a redemocratização do país, quando ajudaram a enterrar a frágil democracia que nós temos.


Michel Zaidan Filho é filósofo, historiador, cientista político, professor titular da Universidade Federal de Pernambuco e coordenador do Núcleo de Estudos Eleitorais, Partidários e da Democracia - NEEPD-UFPE

Charge! Renato Aroeira

quinta-feira, 5 de outubro de 2017

Editorial: Brasil, uma democracia trincada.


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A relação entre civis e militares no Brasil nunca mais serão as mesmas, depois do episódio das declarações do general Antonio Hamilton Martins Mourão. Não gostaria de voltar a bater nesta tecla, sob pena de nos tornarmos repetitivos e até enfadonho, em razão dos editoriais aqui já publicados, abordando o assunto. Mas, eis que dois artigos publicados recentemente pelo jornal Folha de São Paulo, um do cientista político Jorge Zaverucha, professor da UFPE, e um outro do jornalista Elio Gaspari, colocaram alguns fatos novos ao episódio, o que nos contingenciaram a voltar a escrever sobre o assunto.  Esses "fatos novos", a rigor, são velhos, pois se referem à eterna dificuldade de relacionamento entre civis e militares no Brasil, o que nos remeteu, em princípio, ao conceito de democracia delegativa, cunhado pelo cientista político argentino, Guillerme O'Donnell, em décadas passadas, tendo as experiências de democracia na América Latina como referência. No conceito do cientista político, grosso modo, é como se a democracia representativa funcionasse, mas sobre a estufa de resíduos e enclaves autoritários que podem aflorar a qualquer momento.  

O texto do professor Jorge Zaverucha faz referência ao artigo 142, mantido na constituição cidadão promulgada em 1988, por exigência dos militares, criando as circunstâncias em que as Forças Armadas poderiam intervir no processo político, sob o pretexto da garantia da lei e da ordem. Este artigo, além de suscitar bastante ambiguidade, abre o "argumento' para aventuras autoritárias. Trata-se, naturalmente, de um desses entulhos autoritário mantido na Carta Magna. O curioso é a observação do professor sobre a reação do ministro do Exército à época, o general Leônidas Pires Gonçalves, quando os civis esboçaram uma contraposição à manutenção do artigo, digamos assim, "permissivo". Leônidas teria ameaçado zerar todo o processo caso o artigo fosse retirado. Os civis aquiesceram, ou seja, mais precisamente, contemporizaram com os chefes militares, mantendo esse "dispositivo" perigosíssimo. Tanto na fala do general Antonio Hamilton quanto na fala do comandante-maior do Exército, o general Eduardo Villa Boas, as referências às circunstâncias em que poderia haver uma intervenção militar se remetem a uma previsão da Constituição. Curioso isso, não?

O artigo do jornalista Elio Gaspari remonta a alguns episódios recentes dessa relação um pouco conturbada entre civis e militares no Brasil. Mas, como o jogo também pode se dar entre militares da linha dura e militares moderados, conforme ensinava Jorge Zaverucha, Gaspari remete-se ao episódio do afastamento do então todo poderoso ministro do Exército durante a ditadura militar de 1964, Sylvio Frota, tido como da linha-dura. Gaspari não faz referência a algumas nuances desse processo, mas, como bom estrategista, Geisel preparou todo o terreno para uma eventual "reação" do militar. Convidado ao seu gabinete em Brasília, sem referência sobre o assunto a ser tratado, Sylvio recebeu a notícia de sua demissão do comando do Exército. Se coçou, ameaçou esboçar uma reação, mas sua tropa estava desaquartelada, em casa, curtindo o feriado,num churrasco em família. Era feriado em Brasília. Sylvio, Como bom soldado, sabia que um general sem divisão não é nada. 

A ex-presidente Dilma Rousseff sempre foi muito acusada de ter uma postura demasiadamente conciliadora, resiliente, contemporizadora. Mas, numa manifestação tida como indevida, protagonizada pelo mesmo general que agora fez tais declarações numa palestra, o general Antonio Hamilton Martins Mourão, adotou uma medida dura em relação à indisciplina do militar, afastando-o do Comando do Sul, o mais importante entre as guarnições do Exército. A medida de Dilma Rousseff foi mais efetiva para manter a subordinação do poder militar ao poder civil do que as "medidas" adotadas em relação a esta última declaração do general Mourão. A rigor, a rigor, ninguém sabe realmente quais foram essas medidas, tratadas pessoalmente, segundo ele mesmo declarou, entre o "Gauchão" e o Comandante do Exército, General Eduardo Villas Boas. O fato concreto, como observa Gaspari, é que os civis "piscaram". E isso não é nada bom.

Tijolinho do Contexto Político: O PMDB de Jarbas Vasconcelos.


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Creio que nem o próprio Jarbas deve gostar da expressão: o PMDB de Jarbas Vasconcelos, embora a expressão denote, simplesmente, que o partido, em cada Estado da Federação, possui uma espécie de "dono", que controla um feudo, no velho estilo patrimonialista da sociedade brasileira. Até bem pouco tempo, esses feudos eram intocáveis, independentemente dos humores da Executiva Nacional da legenda. Em épocas passadas, por exemplo, o próprio Jarbas Vasconcelos, em entrevista às páginas amarelas da revista Veja, cortou na pela e teceu duras críticas ao desvirtuamento do grêmio partidário que ele ajudou a criar em décadas passadas, então um grande instrumento de luta política no enfrentamento do regime militar instaurado no país com o golpe civil-militar de 1964. Não recebeu nenhuma reprimenda por tais declarações à revista. E olha que as declarações foram bastante contundentes. 

Em episódios recentes, mais uma vez, o PMDB pernambucano marchou contra as orientações da Executiva Nacional do partido. Jarbas declarou em alto e bom som que apoiaria os pedidos de investigação contra o ex-presidente Michel Temer(PMDB), contrariando as orientações do senador Romero Jucá, atual presidente nacional da legenda peemedebista. Num arranjo de cúpula com o senador Fernando Bezerra Coelho, dissidente do PSB, o comando da legenda resolveu intervir arbitrariamente na Executiva Regional da legenda, impondo a sua dissolução, e entregando o partido ao ex-senador socialista, que pleiteia sua candidatura ao governo do Estado nas próximas eleições estaduais de 2018. A intervenção, como se sabe, provocou forte reação dos peemedebistas pernambucanos, dispostos a barrarem a manobra, a qualquer custo. Entraram na justiça e duas liminares favoráveis aos pernambucanos já foram concedidas, apontando os equívocos - não apenas políticos - mas jurídicos da ação da Executiva Nacional. 

Depois do embate jurídico, as farpas passaram a ser trocadas através de falas e artigos publicados nos jornais locais. Em pronunciamento contraditório - uma vez que se derramava em elogios ao governador Paulo Câmara até bem pouco tempo - o senador Fernando Bezerra Coelho criticou a gestão estadual, assinalando que Pernambuco teria ficado para trás. Logo em seguida, em artigo num jornal local, o Deputado Raul Henry(PMDB) saiu em defesa do governador Paulo Câmara, reportando-se à herança maldita que ele herdou e de como, de maneira equilibrada, vem sendo conduzindo serenamente a máquina pública estadual, não permitindo seu descalabro. Trata-se de uma briga de cachorros grandes, como se dizia antigamente, uma vez que o senador se movimenta com absoluta desenvoltura, como candidato, independentemente das refregas políticas e jurídicas que vem sofrendo. É esperar para ver qual é o combustível dessa desenvoltura.  


terça-feira, 3 de outubro de 2017

Tijolinho do Contexto Político: Premiação pela apreensão de menores?

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Não tenho dúvidas de que o governador Paulo Câmara(PSB) faz todos os esforços ao seu alcance para superar os problemas de segurança pública no Estado. Pode não ter sido feliz até o momento, mas se esforça. Afinal, segurança pública deverá ser o mote da campanha de 2018, usado à exaustão pelos seus opositores, com o propósito de não permitir o seu projeto de reeleição. Agora, sinceramente, algumas medidas anunciadas - não sei se precipitadamente - por vezes surpreende, como esta última que anuncia uma premiação aos policiais pela apreensão de drogas e de menores infratores. Apreensão de drogas até que se entende, mas de menores...? Isso é coisa para deixar a pesquisadora Ronidalva Melo, falecida recentemente, de cabelos em pé, se remexendo na tumba. A pesquisadora da área de segurança pública, pertencente aos quadros da Fundação Joaquim Nabuco, até recentemente, havia produzido um minucioso trabalho sobre as instituições que aplicam medidas de caráter sócio-educativas - ou de "de ressocialização" - a esses jovens, concluindo pela absoluta incapacidade da FUNASE em enfrentar o problema dos menores infratores. Aliás, as unidades hoje convivem com rebeliões constantes, não raro, com o registro de mortes de menores em conflitos. Não raro, como afirmamos. 
 
Confesso que gostaria muito de saber sobre  o fundamento que o governador se baseou para anunciar essa medida, já bastante criticada pelos parlamentares da oposição. Estamos aqui diante de um problema estrutural dos mais complexos, governador. Seria de bom alvitre ouvir o seu staff da área de serviço social ou dos serviços de psicologia da Secretaria da Justiça para inteirar-se do problema em sua real dimensão. Se o sistema de ressocialização ele já não funciona a contento para as unidades prisionais que abrigam adultos, com os menores infratores o drama é ainda maior. Um dos problemas observados pelo pesquisadora Ronidalva estava relacionado à ausência de uma articulação maior com outras secretarias que, de fato, poderiam oferecer alguma possibilidade de reorientar a vida desses adolescentes, como a Secretaria de Educação do Estado, por exemplo, sua "menina dos olhos".
 
Levantamentos indicam que um percentual muito pequeno de menores em situação de rua não possuem família. Por absurdo que possa parecer, as ruas, às vezes, se constituem em espaços mais seguros para esses jovens, alguns deles vítimas constantes de abusos sexuais e violência domésticas em casa. Existe gente séria tratando do assunto, mas convém ficar atento aos picaretas que angariam patrocínio para as suas atividades com a exploração desse drama, inflando esses dados estatísticos. Muitos menores são apreendidos sob a rubrica de "atitudes suspeitas", seja lá o que isso signifique, uma vez que a sua própria condição o coloca neste rótulo automaticamente, sobretudo numa sociedade como a nossa, onde para ser suspeito basta ser negro, pobre ou puta. Observem a reação do público quando um deles toma um transporte coletivo, por exemplo. Numa circunstância como esta, premiar os policiais pela apreensão desses menores, torna o quadro ainda mais nebuloso, longe de se constituir em alguma solução para qualquer coisa.  

Drops político para reflexão:"Como é possível que alguém, para governar, precise ter dinheiro para pagar uma quadrilha de deputados?"




"A arena de luta do senador hoje é bastante limitada. Esforça-se para superar as medidas  restritivas impostas ao seu mandato e à sua liberdade pelo STF, assim como manter-se no ninho tucano, onde já se observa, entre as aves emplumadas da mesma espécie, uma nítida movimentação no sentido de convidá-lo a sair daquele grêmio partidário. Como no nosso sistema político necrosado a questão da ética é sintomaticamente relativa, pontualmente ainda prevalece o espírito de corpo dos seus colegas do Senado Federal, com as conhecidas manobras legislativas no sentido de se contrapor às ações adotadas pelo STF. O debate pode até ser encarado como de natureza jurídica, mas, a rigor, as motivações são de natureza política. Aécio Neves(PSDB) é parte dessa carne necrosada, assim como os "companheiros" do PT que saíram em sua defesa. A única certeza sobre o nosso sistema político é a de que ele precisa ser urgentemente repensado. Como observou o filósofo italiano, Antonio Negri, em visita ao Brasil, "como é possível que alguém para governar precise ter dinheiro para pagar uma quadrilha de deputados?"

(José Luiz Gomes, Cientista Político, em editorial publicado aqui no blog)


Drops político para reflexão: A solução para a crise está nas favelas e periferias


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"A solução para a crise está nas favelas e periferias. Basta ver o que estamos fazendo de forma independente, basta nos ouvir, basta parar de nos observar pela mira do fuzil de um policial". 


(Raull Santiago, do Coletivo Carioca Papo Reto)

Le Monde: O conservadorismo moral como reinvenção da marca MBL

TRADIÇÃO, FAMÍLIA E PROPRIEDADE

O imaginário recorrido atualmente pelo MBL é o das “guerras culturais” e da luta contra o “marxismo cultural”. A semente desta segunda ideia vem sendo plantada há muitos anos pela direita brasileira, tendo Olavo de Carvalho seu principal formulador.
Por: Gabriel de Barcelos
1 de outubro de 2017
Crédito da Imagem: Alves
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– O MBL (Movimento Brasil Livre), organização com membros investigados por diferentes crimes e financiado por partidos como o PMDB e grupos de interesse econômico dos EUA, surgiu inspirado nas formas de mobilização da juventude, como as vistas em 2013, especialmente na força das redes sociais. Isso pode ter acontecido na escolha de um nome parecido com MPL (Movimento Passe Livre). Algo semelhante foi feito com o nome de outro grupo, o “Vem pra rua”, que se valeu de uma conhecida palavra de ordem das manifestações de esquerda. Como afirma Pedro Ferreira, integrante do grupo Bonde do Rolê e um dos fundadores, do MBL: “Partimos da tese de que faltava estética e apelo para difundir na sociedade uma visão de mundo mais liberal. A esquerda contemporânea desenvolveu uma roupagem romantizada para seus ideais e, assim, formou uma militância consistente. Era preciso –com o perdão da ironia– revolucionar o liberalismo.”
– Depois de obter sucesso nas ruas, ancorado na ampla divulgação do maior meio de comunicação brasileiro, a TV Globo, obtiveram a vitória no impeachment de Dilma. Tanto pela diminuição de seu poder de mobilização nas ruas após isso, como pela necessidade de preservar Michel Temer e outros aliados, resolveram voltar a focar a ação nas redes sociais. Desmoralizados após uma série de denúncias e criticados por seguidores pelo apoio a Temer, o MBL conseguiu uma sobrevida com a viralização de seus posts, com profissionais especializados na criação de “memes”. Junto a isso, o grupo investiu em ações isoladas nas ruas, de ataque à esquerda, com a função de criar performances para a câmera, para a divulgação posterior em vídeo.
– Percebendo o fracasso da defesa das ideias neoliberais entre o povo brasileiro (eles não conseguiram convencer os trabalhadores que era bom perder direitos), partiram para um novo redirecionamento. Agindo de acordo com a lógica de mercado, fizeram algo próximo do que no marketing se chama “rebranding” (embora sem mudar a identidade visual, mas as estratégias de sua organização, a sua filosofia operacional). A aposta foi no velho conservadorismo brasileiro em relação aos costumes, à moral e à cultura, algo com muito mais chance de sucesso. Daí a tentativa de censurar escolas e exposição de arte, como velhos beatos com tochas na mão.
– O imaginário recorrido atualmente pelo MBL é o das “guerras culturais” e da luta contra o “marxismo cultural”. A semente desta segunda ideia vem sendo plantada há muitos anos pela direita brasileira, tendo Olavo de Carvalho seu principal formulador. Segundo estas teorias, a esquerda teria colocado em segundo plano a tomada revolucionária do poder, para investir na destruição dos tradicionais valores ocidentais de família, religião, moral, cabendo aos homens e mulheres de bem defender e preservar estes pilares. O discurso em questão fala muito melhor aos corações brasileiros, relativamente progressistas em termos de direitos sociais, mas conservadores em questões comportamentais-culturais. Ou seja, caímos na armadilha do MBL, estamos agora jogando o jogo escolhido por eles, num terreno agora bem mais favorável, em sintonia com a subjetividade carola do Brasil, através de uma cortina de fumaça, criada para desviar o foco de Temer e grupos políticos próximos da organização.
– O MBL vem se reinventando a todo o momento e resolveu apelar para táticas mais fáceis, falando mais às entranhas de seu público do que à racionalidade. Riscaram um fósforo e acenderam um pavio em sua cruzada moralista contra a arte, gerando um efeito manada. Se a marca MBL estava severamente comprometida, seus desvios estratégicos conseguiram manter a sua posição de grande influenciador no campo da direita.
– Infelizmente, a esquerda brasileira perdeu a sua oportunidade histórica, quando abandonou um movimento de amplo apoio popular como as greves gerais e outras mobilizações contra a reforma de Temer. Estas lutas se comunicavam diretamente com os direitos da classe trabalhadora e foram negligenciadas pela maior parte das direções de movimentos nacionais, cegas para a importância da difusão e disputa de ideias e das consciências. Além disso, há uma defasagem muito grande da esquerda em compreender as dinâmicas contemporâneas e as suas ferramentes de comunicação, especialmente entre a juventude.
– Não são poucas as referências comparativas entre a ação do MBL e a história de regimes nazi-fascistas. Contra a barbárie que se desenvolve e se avizinha em sua consolidação total, a única forma é o retorno ao foco na construção da resistência popular em defesa dos direitos e da explicitação dos interesses de classe envolvidos em grupos como o MBL. Novamente deixamos um vácuo para ser preenchido pelo fascismo. É preciso, portanto, agir logo, pensar para além da lógica eleitoral. Do contrário, nos restará no futuro olhar para o passado e pensar: por que não conseguimos impedir isso de acontecer?

Líder do MBL responde a mais de 60 processos e sofre cobrança de R$ 4,9 mi
https://noticias.uol.com.br/politica/ultimas-noticias/2016/05/08/mbl-sofre-acao-de-despejo-e-um-de-seus-lideres-tem-divida-de-r-44-milhoes.htm
Renovação Liberal: a associação familiar para onde vai o dinheiro do MBL
https://brasil.elpais.com/brasil/2017/09/26/politica/1506462642_201383.html
Áudios mostram que partidos financiaram MBL em atos pró-impeachment
https://noticias.uol.com.br/politica/ultimas-noticias/2016/05/27/maquina-de-partidos-foi-utilizada-em-atos-pro-impeachment-diz-lider-do-mbl.htm
Como organizações dos EUA financiam grupos de direita no Brasil para defender suas bandeiras
http://www.diariodocentrodomundo.com.br/como-organizacoes-dos-eua-financiam-grupos-de-direita-no-brasil-para-defender-suas-bandeiras/
A nova roupa da direita
Um dos fundadores e líderes do MBL também é cantor do Bonde do Rolê
http://www1.folha.uol.com.br/ilustrada/2016/10/1820495-um-dos-fundadores-e-lideres-do-mbl-tambem-e-cantor-do-bonde-do-role.shtml
Em protesto com baixa adesão, manifestantes defendem Lava Jato e criticam Congresso
https://noticias.uol.com.br/politica/ultimas-noticias/2017/03/26/manifestantes-protestam-contra-manobras-de-politicos-pela-impunidade.htm
Aliados de Temer, MBL é criticado pelos próprios seguidores ao defender PEC 241
https://medium.com/democratize-mídia/aliados-de-temer-mbl-é-criticado-pelos-próprios-seguidores-ao-defender-pec-241-e6df5bd608da


Para alavancar redes sociais, MBL aposta em dupla de ‘memeiros’
http://www1.folha.uol.com.br/poder/2017/08/1914163-para-alavancar-redes-sociais-mbl-aposta-em-dupla-de-memeiros.shtml

Antonio Negri: "A máquina soviética travou por falta de combustível"


Antonio Negri: ‘A maquina soviética travou por falta de combustível’O filósofo marxista italiano Antonio Negri (Foto: Christian Werner e Alexandra Weltz)
De passagem por São Paulo para participar do seminário internacional “1917: O ano que abalou o mundo”, o filósofo italiano Antonio Negri afirmou que a Revolução Russa fracassou por conta de suas próprias contradições internas, como a constituição de uma estrutura política antes de uma econômica. E também pelos aspectos liberais, como a prática imperialista no exterior, impossibilitando o avanço da modernidade soviética.
“Os operários esgotaram os potenciais da modernidade soviética e queriam se libertar de seu domínio para produzir melhor, ter mais liberdade”, disse. “A maquina soviética, no final, travou por falta de combustível, que apenas poderia ser obtido pela renovação da produção”.
O filosofo participou da mesa “Estado, economia e política na sociedade soviética” ao lado da professora de Economia da USP Leda Paulani e do professor de Filosofia do Direito do Mackenzie Alysson Leandro Mascaro. A mediação foi da jornalista Maria Cristina Fernandes. O seminário internacional “1917: O ano que abalou o mundo” é uma iniciativa da editora Boitempo em parceria com o Sesc. 
Negri contou que teve a real dimensão da Revolução Socialista pela primeira vez aos dez anos de idade. Era 1943 e, vivendo na Pádua fascista de Mussolini, recebeu a notícia de que as cidades de Leningrado e Stalingrado, pertencentes à URSS, haviam resistido aos ataques nazi-fascistas.
“A Revolução Socialista não foi local, mas global, não porque atingiu o desejo de todo operário mundial, mas porque não podia ser apagada, estava viva”, afirma Negri. “A resistência de Leningrado e Stalingrado nos mostrou isso, era irreversível, mudou as possibilidades de configuração do poder na experiência histórica da humanidade”.
Negri relembrou que, na visão de Lênin, a revolução só seria bem-sucedida se acabasse com o Estado, concedesse todo poder aos operários, além de formas adequadas de produção e vida. “Lênin descobre um tema marxiano fundamental: não há revolução social sem uma base material que a sustente. E o Estado socialista não se orientou segundo o desejo de emancipação e liberdade do proletário, mas transformou a exploração do homem em coisa pública e privada”, afirmou.
Seminário Internacional 1917: O ano que abalou o mundo
Onde: Sesc Pinheiros, r. Pais Leme, 195, Pinheiros, São Paulo – SP
Quando: até 29/09
Quanto: R$ 18 a R$60

Charge! Laerte via Folha de São Paulo

Laerte

domingo, 1 de outubro de 2017

Charge! Renato Aroeira

Political Drops for reflection: What scares is Lula's neck


 
 
"It is a complex task to analyze the data of a research, and they often present internal contradictions that can lead to misunderstandings, as well as inform us about the inconsistency of those raw numbers." These concerns also apply to this latest survey by the Datafolha Institute - published today, day 1, with great fuss - that presents the former president Luiz Inacio Lula da Silva leading in any scenario, becoming an unbeatable candidate in an eventual second round. in real motives for the rejoicing of the PTs, who celebrate these numbers in the social networks as if it were the victory of their team at heart, in a decisive classic, in the final of the championship, with the emotion of the penalties, preferably with the Wall as the archer The first frustration is that the possibility of Lula being a candidate is almost zero. The second is that the same research shows that his ability to transfer votes is not the best. The third frustration is that he is closely followed, smelling the scabbard, by a former military candidate, with the support of conservative sectors of Brazilian society, including 46% of young people who would support a new military intervention in the country . As the international weekly reported recently, this is where the danger lies, that is, the concrete possibility of not having a candidate identified with popular aspirations - a representative of the most progressive sectors of society in the 2018 presidential race - and, on the other hand, the growth of the "myth", which can increase its margin of support in the military, becoming the iron head of the expansion of the coup project started with the deposition of President Dilma Rousseff (PT), a candidate built in the wake of a platform clearly political fascist. "

(José Luiz Gomes, political scientist, in an editorial published here on the blog)

Drops político para reflexão: O que assusta é o cangote de Lula

 
 

"Constitui-se numa tarefa complexa a análise dos dados de uma pesquisa. Eles, não raro, apresentam contradições internas que podem induzir a equívocos, assim como nos informar acerca da inconsistência daqueles números brutos. Essas preocupações também se aplicam a essa ultima pesquisa realizada pelo Instituto Datafolha - publicado hoje, dia 1º, com grande estardalhaço - que apresenta o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva liderando em qualquer cenário, tornando-se um candidato imbatível num eventual segundo turno. Os dados, no entanto, não se constituem em motivos reais para o regozijo dos petistas, que comemoram esse números nas redes sociais como se fosse a vitória do seu time de coração, num clássico decisivo, em final de campeonato, com a emoção dos pênaltis, de preferência com o Muralha como o arqueiro do time adversário. A primeira frustração é que a possibilidade de Lula ser candidato é quase zero. A segunda é que a mesma pesquisa mostra que sua capacidade de transferência de votos não é das melhores. A terceira frustração é que ele é seguido de perto, sentindo o cheiro do cangote, por um candidato de coturno, ex-militar, com o apoio de setores conservadores da sociedade brasileira, inclusive 46% dos jovens que apoiariam uma nova intervenção militar no país. Como informou recentemente um semanário internacional, é aqui que mora o perigo, ou seja, a possibilidade concreta de não termos na disputa presidencial de 2018 um candidato identificado com os anseios populares - representante dos setores mais progressista da sociedade - e, por outro lado, o crescimento do "mito", que pode ampliar sua margem de apoio no estamento militar, tornando-se o testa de ferro da ampliação do projeto golpista iniciado com a deposição da presidente Dilma Rousseff(PT), um candidato construído na esteira de uma plataforma político de cunho nitidamente fascista."
 
(José Luiz Gomes, cientista político, em editorial publicado aqui no blog)


Durval Muniz: Trabalho: direito ou favor?

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Nas últimas semanas, a agência Saiba Mais produziu minuciosa cobertura do conflito entre o empresário Flávio Rocha, diretor do grupo Guararapes Confecções S.A., e representantes do Ministério Público do Trabalho (MPT), motivado pela constatação, após visitas de inspeção, do que seriam inúmeras infrações no cumprimento da legislação trabalhista, por parte das chamadas facções, pequenas empresas de confecções, que foram instaladas no interior do estado, a partir de um programa de financiamento público, o Pró-Sertão, para atender exclusivamente a demanda do grupo empresarial a que pertence as lojas Riachuelo. O MPT deu entrada a uma ação civil pública que cobra na Justiça uma indenização de cerca de R$ 37,7 milhões de reais já que a empresa é acusada de usar as facções para subcontratar mão de obra, escapando assim do pagamento de direitos e obrigações trabalhistas, já que, embora pareçam ser outras empresas, as facções estão, de fato, sob o controle econômico do grupo Guararapes, que é o único comprador de toda a produção e que impõe a elas regras de produção bastante estritas, sem que essa relação esteja acobertada por qualquer tipo de contrato. No episódio, dois eventos chamaram a atenção pelo inusitado: o empresário passou a atacar, inclusive com ameaças, através das redes sociais, o MPT, notadamente a procuradora Ileana Neiva, acusando-os de perseguição, de serem responsáveis pelo desemprego no estado, por obrigarem a empresa a deslocar a sua produção para o Paraguai. O mais chocante é que o empresário organizou uma manifestação na porta da sede do MPT, oferecendo ônibus para transportar funcionários, notadamente costureiras, que trabalham na própria fábrica do grupo, que incorporando o discurso do patrão passaram a atacar o Ministério Público do Trabalho, com faixas em que se podia ler: “Aqui somos felizes”.
Esse episódio mostra a permanência, entre nós, da visão paternalista atravessando as relações no mundo do trabalho. O paternalismo, desde o período colonial, atuou mediando, legitimando e permitindo a reprodução das próprias relações entre senhores e escravos. Foi o paternalismo que permitiu que autores como Gilberto Freyre oferecessem, por vezes, uma visão idealizada e adocicada das relações escravistas. No paternalismo, como o próprio nome indica, aquele que preside a relação de trabalho, aquele que assume o lugar de senhor, de patrão aparece confundido e misturado com a figura paterna. Como um pai, ele dá acesso ao trabalho, aos meios com os quais o trabalhador vai conseguir sobreviver, em troca o trabalhador deve demonstrar gratidão, respeito e obediência. O paternalismo servia como anteparo à enorme violência física e simbólica do regime escravista, ele permitia criar zonas de afeto, de simpatia, de colaboração e até de incorporação da lógica do patrão, do senhor, pelo escravo. Como um pai, o senhor podia e devia, inclusive, castigar os escravos, em caso de desobediência ou rebeldia, como forma de educá-los, de corrigi-los e consertá-los. O paternalismo era mais atuante, ainda, nas relações com os escravos domésticos, já que a convivência cotidiana podia fazer nascer laços de afeto e de subserviência entre os escravos e seus senhores, além de funcionar como uma forma de preservação por parte do escravo dessa situação aparentemente vantajosa de estar alijado do trabalho no eito. No pós-abolição o paternalismo continuou atuando na relação com os empregados domésticos que, por isso mesmo, atravessaram o século XX sem gozarem dos mesmos direitos trabalhistas que as demais categorias de trabalhadores. Sendo tratados, muitas vezes, como pretensos membros das famílias a quem serviam, desenvolvendo relações de afeto e dependência econômica e até psicológica em relação a seus empregadores, as/os trabalhadores domésticos tiveram enorme dificuldade em reivindicarem direitos e perceberem a exploração de que eram objeto.
Dentre as muitas formas de trabalho compulsório que existiram paralelamente ao trabalho escravo, bem como no pós-abolição, envolvendo homens livres e pobres, libertos e ingênuos (ou seja, os filhos de escravos que nasceram depois da Lei do Ventre Livre), muitas delas estiveram marcadas pelo paternalismo. O paternalismo é uma relação que se estabelece entre pessoas de condição social, de status, de poder econômico e político muito desiguais. O paternalismo estabelece uma relação de hierarquia, de poder, de status que envolve um polo da relação fortalecido e um outro em situação de fragilidade. Ele mimetiza a relação entre pais e filhos, onde um detém todo o poder, detém toda a autoridade, pois trata com seres infantis, com crianças, com pessoas menores. Assim como um pai pode abusar de seu poder, pode submeter seus filhos a relações de imensa exploração e violência, assim como o pátrio poder, em nosso país, permitiu, até bem pouco tempo, que o pai fosse a autoridade máxima, dando a última palavra em tudo, assim ocorre numa relação trabalhista atravessada pelo paternalismo. No discurso do empresário Flávio Rocha a velha lógica paternalista aparece para justificar as relações de trabalho de extrema exploração a que submete os trabalhadores de seus empresas e das facções que sua empresa controla: ele faz um favor ao criar empregos para tanta gente que sem as encomendas de suas empresas não teriam onde trabalhar. Escamoteando o fato de que a relação de trabalho capitalista é uma relação de exploração, da qual quem mais se beneficia é o patrão e não o trabalhador, ele faz questão de aparecer como um benemérito, como um bom pai que dá o sustento a milhares de pessoas, como o provedor das milhares de costureiras que explora. Em levantamento preliminar feito pela agência Saiba Mais calcula-se em cerca de 2,3 mil o número de ações trabalhistas, por incumprimento da legislação, por parte do empresário entusiasta de primeira hora do golpe contra a democracia e do desmonte da legislação trabalhista trazida pela lei que permitiu a terceirização em todas as atividades.
Como um pai manipulador, utiliza do seu poder e da dependência dos trabalhadores dos empregos que oferece, mesmo sendo empregos de má qualidade, para usá-los como massa de manobra de seus interesses econômicos e políticos, mesmo dispondo de uma bancada, tanto na Assembleia Legislativa, quanto no Congresso Nacional, disposta a defender seus interesses. O ato que organizou, transportando seus trabalhadores para apitar e gritar palavras de ordem em frente a sede do MPT, mostra como o paternalismo é manipulador e como ele pode levar a vítima a introjetar a lógica do carrasco. Talvez suas atitudes disparatadas se devam ao fato de que volta a ter claras pretensões eleitorais, lançando-se candidato a vice-presidente da República, numa dobradinha com o prefeito de São Paulo, João Dória, que usa e abusa do discurso do empresário e gestor eficientes que, ao mesmo tempo, fornecem as condições dos mais pobres viverem. Acusando de populismo aqueles que defendem as políticas sociais, que dariam o peixe mas não ensinariam a pescar, esses senhores se colocam como aqueles que oferecem oportunidades, que, conforme o ideário neoliberal, oferecem condições de cada um empreender, ser empresários de sua própria vida. No entanto, seu empreendimento vem sendo sustentado há décadas por isenções de impostos, incentivos fiscais, financiamento público. O Pró-Sertão é um programa que, na verdade, foi elaborado para beneficiar exclusivamente o grupo Guararapes. Assim são os nossos empresários, eles são sempre contra o Estado, a intervenção estatal na economia, eles são a favor da iniciativa privada, somente quando o Estado não os beneficia ou quando não vem em seu socorro, em caso de dificuldades. Aí o paternalismo se transfere para o Estado, é ele que deve atender com o dinheiro público, com o dinheiro dos impostos pagos por todos, os interesses privados, sob a justificativa de que esses oferecem o trabalho, fazem o favor de oferecer o trabalho.
Essa idolatria do trabalho, essa visão de que o trabalho deve centrar a vida de uma pessoa, mesmo que seja marcado pela exploração e por condições adversas, nasceu com o mundo burguês. Temos uma visão moralizante e até salvacionista do trabalho: dizemos que ele dignifica, que ele deve ser usado para recuperar os presidiários, que ele deve ser usado como terapia contra a loucura, etc. No entanto, essa ideologia trabalhista, que configura e contamina até mesmo as forças da esquerda, reafirmam um componente subjetivo fundamental sem o qual o capitalismo não se sustentaria: o desejo de se submeter ao trabalho, mesmo que ele já não tenha as características do trabalho artesanal ou autônomo, destruídos pela concorrência com a grande indústria capitalista: marcado pela livre iniciativa (que agora passa a ser do empreendedor, do capitalista), detendo o controle do tempo de trabalho e da produção (agora transferido para a mão dos patrões), um trabalho criativo, inventivo, para ser monótono e repetitivo, marcado pela produção em série. No entanto, continuamos a fazer apologia ao trabalho, mesmo que ele signifique a subordinação, inclusive subjetiva, como mostra a adesão dos trabalhadores da Guararapes ao discurso do patrão, aos ditames do mercado.
A visão negativa do trabalhador, na sociedade brasileira, advinda da escravidão, favorece a brutal exploração que sofrem os trabalhadores, os baixos salários que recebem, as condições aviltantes de trabalho a que se submetem: o grupo Guararapes já teve que assinar junto ao Ministério Público do Trabalho, por mais de uma vez, Termos de Ajustamento de Conduta em que reconhecia ter descumprido a legislação trabalhista e ter submetido seus empregados a situações vexatórias como o controle das idas ao banheiro e os submetido a um ritmo de produção que levou muitos ao adoecimento. Por termos sido uma sociedade escravista, o trabalho manual ou braçal, entre nós, foi visto, durante muito tempo, como atividade destinada a gentinha, a pessoas de baixa condição social. O trabalho só passou a ser uma atividade valorizada, considerada central na vida das pessoas, atribuidora de dignidade e identidade na sociedade capitalista, no mundo burguês. A ética do trabalho, a incorporação do trabalho como um valor é ainda mais recente numa sociedade como a nossa, onde as marcas da escravidão ainda perseguem aqueles que se dedicam ao trabalho manual. Nossos patrões ainda escondem em seu paletó o chicote de senhor de escravos, o relho senhorial. O sonho de muito deles, confessado explicitamente por alguns, nos últimos tempos, é o fim de qualquer legislação protetora dos direitos dos trabalhadores. A aprovação no Congresso Nacional da prevalência do negociado sobre o legislado, abre margem para a retirada da mediação do Estado nas relações de trabalho, que foi sempre o sonho de nossos empresários. Partir do pressuposto que uma costureira, vivendo numa pequena cidade do interior do Rio Grande do Norte, que só tem o emprego na facção, mesmo que seja para ganhar um salário de fome, como única alternativa de sobrevivência, vai conseguir negociar com seu patrão, com o grupo Guararapes, melhores salários e condição de trabalho, é acreditar que a gazela negocia com o leão faminto a sua sobrevivência. Nossos empresários sonham com o retorno a uma situação em que possam explorar a mão de obra do trabalhador o máximo possível e, paternalisticamente, oferecer para eles presentinhos no final do ano, tapinhas nas costas quando for considerado operário padrão, coelhinhos de chocolate na Páscoa, com a marca da empresa, ou com os dizeres que estava estampado numa mão portada na marcha em defesa do grupo Guararapes: “Nossa marca é o caráter”. Ainda usarão seus empregados para fazerem o marketing da empresa. Sempre que possível, patrões submetem os trabalhadores a condições de trabalho análogas a de escravos e babam de ódio quando a Justiça do Trabalho interfere nessas relações. Em Unaí, Minas Gerais, fiscais do Ministério do Trabalho foram assassinados por denunciarem a presença de trabalho escravo em fazendas da região. A bancada ruralista reivindica a revogação da lei que permite a desapropriação das terras para fim de reforma agrária em caso de flagrante uso de trabalho escravo.
A cidadania implica o questionamento de toda e qualquer prática paternalista. A cidadania do trabalhador se efetiva à medida que ele passar a ser um sujeito de direito, um sujeito que possui direitos reconhecidos e estabelecidos de forma universal e impessoal. O paternalismo mina a cidadania pois estabelece relações desiguais, personalistas e de privilégio. O pai não lida com seus filhos do mesmo jeito, estabelece preferências, gratifica uns mais do que outros, escolhe a seu bel prazer a quem vai beneficiar, mais ou menos. Se o Código Civil passou a reger as relações familiares foi para que o Estado limitasse o poder discricionário dos pais sobre os filhos. Se a legislação trabalhista existe, se a Justiça do Trabalho existe é para que o Estado medie as relações patrões e empregados, sem fazer distinções ou estabelecer privilégios entre eles. Não importa o número de empregos que uma empresa forneça, esses empregos não são favores ou dádivas, eles visam o lucro, eles visam a extração do sobretrabalho dos operários, portanto devem ter uma função social recolhendo os impostos e obedecendo a legislação trabalhista, como uma forma de divisão dos lucros com a sociedade. Isso é o que se chama função social da empresa ou da propriedade. Foi o trabalho dos funcionários que fizeram nascer ou crescer a fortuna do empresário, foram os investimentos em infraestrutura de transporte, energia ou comunicação, por parte do Estado, que permitiram esse lucro, portanto, devolver parcela dele em forma de impostos e salários, de condições de trabalho dignas não é nenhum favor. O empresário não é bonzinho porque oferece empregos, sem eles seu capital não geraria lucro e riqueza. O paternalismo oferece uma visão distorcida das relações entre capital e trabalho. Aquele que mais se beneficia da relação trabalhista, o patrão, aparece como o benfeitor, enquanto o empregado, que menos benefícios recebe, aparece como o beneficiário. Numa sociedade republicana, num Estado de direito, não importa quem seja, que fortuna tenha, quantos empregos forneça, quantas empresas tenha, todos devem se submeter às leis, cumpri-las e fazê-las cumprir. Como está explícita em nossas leis, o trabalho é um direito do cidadão. A oferta de trabalho de boa qualidade é uma obrigação do Estado e da iniciativa privada, não é nenhum favor, nenhuma dádiva.
 
Durval Muniz é professor titular da Universidade Federal do Rio Grande do Norte
 
(Publicado originalmente no site da Saiba Mais Agencia de Reportagem, aqui reproduzido com a autorização do autor)

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