Passei esses últimos dois dias respondendo a perguntas (da imprensa) sobre as manifestações populares de domingo. Primeiro, o equívoco de compará-las com as manifestações "fora-Collor", dos anos noventa, em que pela primeira vez se afastou legalmente um Presidente da República, por improbidade administrativa. Segundo, a desigual comparação entre a baixa popularidade da Presidente Dilma, nesse início de mandato, e a baixa popularidade de Collor, no fim do seu mandato. Terceiro, a magnitude do protesto que infirmaria a tese de que só a classe média e alta estariam contra a Presidenta. E finalmente, a ideia do Impeachment e a volta da Ditadura Militar.
0 nosso país é uma nação paradoxal. Se vivêssemos sob um regime ditatorial como seriam possíveis tais manifestações de rua, em todo o país, criticando o governo, pedindo seu afastamento e a quebra das instituições políticas vigentes? - Se há manifestações amplas, plurais, heterogêneas, que dizem com toda liberdade o que querem, certamente não estamos nem no Egito nem na Venezuela. Estamos num país em que, malgrado todas as mazelas institucionais, as pessoas têm o direito de externar seus descontentamento e pedir em público o fim dessas liberdades. Outra coisa é saber a razão desses protestos. São eleitoreiros? golpistas? revanchistas ou inconformados com o resultado das eleições? - Ora, até a Presidente Dilma reconheceu erros na condução de sua política anticíclica e humildemente pediu um diálogo com a sociedade para encontrar saídas para a crise econômica e política que ora atravessamos no Brasil.
Os protestos populares não são coisa da oposição ou de ressentidos. São alimentados por problemas reais que afetam a maioria do povo brasileiro, entre os quais a corrupção é apenas um deles. Basta ver os indicadores econômicos e seu impacto sobre o bolso dos trabalhadores, sem falar no custo do ajuste fiscal. Há motivos de sobra para o descontentamento popular, sobretudo quando se comparava a esta casta de privilegiados que compõe o Poder Judiciário e o Poder Legislativo. É natural que haja uma grande indignação popular com a irrelevância de um Parlamento caro e que legisla em causa própria. Fala-se em autonomia e liberdade para votar medidas e projetos de lei. Mas a verdade é o custo, o sobrepreço que esses parlamentares fixam para cumprir suas obrigações constitucionais: fazer as leis do país.
Como disse a Chefe do Poder Executivo a corrupção é "uma velha senhora". Não nasceu ontem e nem vive exclusivamente entre nós. Como dizia a Hannah Arendt os parlamentos modernos tornaram-se mercados, onde se viabilizam interesses e objetivos que estão longe do republicanismo. E o principal modelo é a própria democracia norte-americana, apelidada por alguns de "oligarquia financeira". A diferença é que nos outros países ela é combatida e punida exemplarmente. Entre nós parece que a tese de que o crime compensa, se o criminoso não for pego pela Justiça, é amplamente aceita. Sobretudo, os crimes de colarinho branco, praticados pela nossa elite política e econômica. É o caso de se prestar atenção na punição que receberão os que foram denunciados e sentenciados na operação Lava-Jato. Claro que o pacote anticorrupção vem em boa hora e a ideia de se promover uma ampla reforma política, também. Mas sem o nascimento de uma nova cultura política republicana e a punição exemplar dos criminosos de colarinho branco - seja santos ou pecadores - é muito difícil combater a corrupção em nosso país. Numa sociedade onde os jogos de azar, o enriquecimento fácil, a elisão fiscal, o contrabando, a lavagem de dinheiro parecem ser estimulados abertamente, não é razoável que o cidadão comum fique satisfeito em pagar - caro - um ajuste fiscal, que deve alimentar a especulação financeira. É uma revolta compreensível essa.
Outra coisa é ir à rua pedir um golpe de Estado ou o afastamento de uma Presidenta recém-eleita, sem base jurídica ou legal para isso. Aí trata-se de um crime de lesa-democracia, liberticida, que deve ser combatido pelas instâncias legais e judiciárias. Fazer propaganda pública - em inglês - por uma intervenção militar no Brasil não é só uma irresponsabilidade grande é um crime contra as liberdades públicas em nosso país. Se as instituições judiciárias e policiais, bem como a imprensa - não estivessem fazendo o seu trabalho, sem interferência do governo ou de partidos, seriam o caso de denunciar junto a OEA, a ONU ou ao TPI, a falta de liberdade no Brasil. Mas não é o que está acontecendo. Toda essa manifestação de descontentamento tem sido alimentada pelas informações da Operação Lava-Jato e da ampla cobertura dos meios de comunicação de massa. A democracia não é um torneio ou um campeonato de quem é contra ou a favor, é um regime de formação racional da opinião e vontade política da sociedade. E só se faz isso com o mais amplo direito à informação.
Infelizmente, nem o Congresso nem o ambiente econômico têm ajudado nesse momento. E isso agrava a sensação de uma crise institucional no país. Diálogo, prudência e espírito público ajudariam muito a buscar saídas para essa crise.
Michel Zaidan Filho é filósofo, historiador, cientista político, professor da Universidade Federal de Pernambuco e coordenador do Núcleo de Estudos Eleitorais, Partidários e da Democracia - NEEPD-UFPE.



!["Efeito Coxinhas: Teori rejeita pedido de investigação de Dilma Rousseff.
A partir dessa postagem, estaremos publicando no blog uma série de comentários acerca do que estamos chamando de "efeito coxinhas", ou seja, uma análise das repercussões - no Governo e na Oposição - das manifestações do último dia 15, que reuniu dois milhões de pessoas em todo o país, pedindo, entre outras coisas, o impeachment da presidente Dilma Rousseff. Dilma Rousseff, de fato, enfrenta um problema de turbulência no início do seu segundo mandato. A economia não vai bem; a política está paralisada; o escândalo de corrupção na Petrobras se avoluma e complica-se a cada dia. Por outro lado, não há como envolver Dilma nessas falcatruas. Hoje, pela manhã, lembrei a um cidadão que se apresentou como Pedro, em comentário a um artigo nosso publicado no Blog de @[100001814996553:2048:Jamildo Melo], que Dilma, de fato, tem as mãos limpas. Ainda na condição de ministra de Lula, já comprava brigas feias no Governo em torno dos famigerados "aditivos" que, além de representar um mecanismo de desvios de verbas públicas, atrasavam investimentos públicos fundamentais para a população. Até mesmo obras como a transposição das águas do Rio São Francisco foram atingidas por esse expediente. Esse parece ser o mesmo raciocínio da turma do STF, que não deram a mínima por um pedido de investigação da presidente protocolado pelo PPS, através do Deputado @[100006157330669:2048:Raul Jungmann]. O açodamento foi tão grande que esqueceram de assinar a petição. Mas, se assinassem, a postura de Teori não seria outra. Há uma turma ensandecida pedindo a cabeça da presidente, mas não há argumento para isso. Durante as manifestações do último dia 15, havia muitas faixas pedindo a volta dos militares, numa clara demonstração de desrespeito ao Estado Democrático de Direito. Eu não sei se chamo isso de burrice ou falta de responsabilidade, uma vez os padrões de conscientização política observados eram extremamente precários. Penso tratar-se de pessoas que não dimensionam corretamente o que isso representou para o país. O que precisamos e lutar diuturnamente para fortalecer nossas instituições democráticas, deixando um legado de consolidação democrática para os nossos filhos. Deveríamos, isso sim, ampliar as conquistas sociais obtidas nos últimos anos, permitindo a diminuição do hiato politico entre democracia política e econômica. Fotos tiradas das manifestações na Bahia, por exemplo, parece mostrar um país de 500 anos atrás, evidenciando a necessidade de ampliar as pontes entre o andar de cima e o andar de baixo. Enquanto os coxinhas brancos ( e amarelos) desfilavam tranquilamente, os negros observavam nas arquibancadas."](https://fbcdn-sphotos-b-a.akamaihd.net/hphotos-ak-xpf1/v/t1.0-9/11045400_911650848878949_6402672737831429656_n.jpg?oh=9d52622409cc68be232015b7d9f24d95&oe=55BAAE52&__gda__=1437829688_fda1bad0ab58836d5a1400a84f7bfa99)

