pub-5238575981085443 CONTEXTO POLÍTICO.
Powered By Blogger

quinta-feira, 15 de dezembro de 2016

Arraes, Arraes, Arraes!




José Luiz Gomes



Escrevi um longo artigo sobre a biografia e a trajetória política do senhor Miguel Arraes de Alencar. Infelizmente o artigo foi escrito há um longo tempo e, por mais que o tenhamos procurado nos arquivos, não mais o encontramos. Não iríamos esperar essa efeméride para publicá-lo. Na realidade, a ideia era publicá-lo num site de pesquisa escolar mantido por nós, fornecendo mais um verbete de pesquisa, onde essas novas gerações teriam a oportunidade de conhecer um pouco mais sobre Miguel Arraes. O artigo também chegou a ser publicado no site de uma instituição de pesquisa local, mas, certamente, teríamos as mesmas dificuldades de encontrá-lo. Possivelmente, não vamos recordar por aqui tudo que havia escrito naquele artigo, mas as lembranças possíveis já nos felicitam em homenageá-lo. 

Pelo título da crônica acima um leitor mais observador logo concluirá que somos suspeitos para falar do senhor Miguel Arraes de Alencar. E é verdade. As cenas narradas por um enviado da revista IstoÉ ao Crato, no Ceará, para cobrir a visita do ex-governador aos seus irmãos, quando de sua volta do exílio, sempre nos deixam bastante emocionados. Segundo o repórter, a visita foi seguida de um cortejo de sertanejos que entoavam: É o filho de Dona Benigna! É o filho de Dona Benigna! Por falar em Dona Benigna, certa vez um preposto do Deputado Federal Jarbas Vasconcelos(PMDB) escreveu um duro artigo contra o governador, publicado num jornal local, e o refutamos no mesmo espaço, solicitando àquela articulista que tivesse mais respeito pelo filho de Dona Benigna. Estudioso da quadra política pernambucana, não raro éramos contingenciado a conhecer um pouco mais sobre este ator político. 

Pontualmente, em nossas conversas com Luciano Siqueira, Manuel Correia de Andrade, Jáder de Andrade, padre Reginaldo Velozo, os atores políticos da província ligados ao PT, sempre que possível, colhíamos alguns dados, uma opinião pessoal ou qualquer outra informação sobre o grande líder político pernambucano. Luciano Siqueira, por exemplo, quando questionado sobre as alianças de Arraes com setores conservadores da política pernambucana, sempre emendava que, apesar de não ser comunista, Arraes nunca abandonou os comunistas, estabelecendo com eles um diálogo permanente desde a década de 50. Aliás, sobre isso convém aqui fazer uma observação: Arraes foi eleito pelo primeira vez, em 1947, pelo PSD, como se sabe, uma agremiação política nada afeita ao ideário marxista. 

Profundo conhecedor das questões fundiárias da região Nordeste, o geógrafo e historiador Manuel Correia de Andrade foi convidado para integrar o seu governo. Homem de livros, Manuel teria esboçado alguma resistência em integrar o seu governo, informando-o que não entendia nada de política. Arraes ficou em silêncio por alguns instantes, pigarreou, informou-o que o estaria convidando em razão dos seus livros e emendou: Quando você receber um político e precisar negar alguma coisa, negue, mas ofereça um cafezinho. Com o saudoso Jáder de Andrade, longas tardes de conversas, algumas delas na sede do PT. Com os barbudos do PT, sempre os sermões de Dona Magdalena sobre a preocupação em torno da divisão das forças de esquerda no Estado, num aspecto por muitos desconhecido: o ativismo político de Dona Magdalena Arraes. 

Com o professor João Francisco - outro que nos deixou muito cedo - muitas conversas sobre o seu livro A Pedagogia da Revolução, onde o autor realiza uma brilhante análise de discurso sobre os governos de Cid Sampaio - Governo do Estado de Pernambuco - e o Dr. Arraes, que exercia a chefia do executivo municipal. Por essa época foi criado o Movimento de Cultura Popular, o MCP, com a participação de Anita Paes Barreto, Germano Coelho, Paulo Freire, Paulo Rosas, Abelardo da Hora e outros personagens igualmente importantes. O MCP foi criado a partir de uma proposta do grupo, prontamente aceita por Arraes, que adotou o nome a partir de uma experiência que ele havia conhecido na França. 

Há muitas coisas a se admirar no ator político Miguel Arraes de Alencar. Arraes era um democrata convicto, um político de uma profunda sensibilidade social, um nacionalista. Na crise mais aguda do Governo Lula, durante as denúncias do Mensalão, Arraes deixou a província para emprestar-lhes solidariedade, num ato jamais esquecido por Lula, que favoreceu o quanto pode o seu neto governador, Eduardo Campos. Quando governador, Arraes protagonizou grandes acordos e pequenas grandes obras. Ficaria conhecido pelo "acordo do campo". Sobre as pequenas grandes obras, poderíamos citar aqui o seu programa de eletrificação rural, apontado pelos seus críticos como atrasado, uma vez que não acompanhava a "modernidade". Sobre isso, Arraes sempre retrucava que modernidade para o homem do campo era acender um bico de luz para iluminar sua choupana, comer um cuscuz com charque com café da hora, levar uma prosa com os amigos num alpendre iluminado. 

Como bem informava o professor Jorge Siqueira, o maior capital político de Arraes foi obtido quando ele dirigia o antigo Instituto do Açúcar e do Álcool. Ali, ele passou a ter um controle sobre as divisões familiares da aristocracia açucareira do Estado, que o fazia, através de alianças, cindir os votos conservadores nas eleições majoritárias. Quando foi deposto pelo golpe civil-militar de 1964, os militares se "arranjaram" com Paulo Guerra, filho dessas oligarquias. Para que, no futuro, seus filhos tivessem motivos de orgulho do pai, deixou o Palácio do Campo das Princesas pela porta da frente, honrando os votos dos pernambucanos que o haviam conduzido ao cargo através do voto. Acima de tudo, Arraes foi um homem honrado, de rara coragem cívica e espírito público. Personagem ou atores políticos como Miguel Arraes faz uma falta danada nesses momentos de instabilidade institucional que estamos vivendo. Não sei se há algum inconveniente nisso - se houver estou disposto a rever nossa posição - mas, entre tantas fotos do Dr. Arraes, resolvi ilustrar esta crônica com um flagrante obtido por seu fotógrafo oficial,Alcir Lacerda, já falecido, na praia de Porto de Galinhas, num raro momento de descontração, acompanhado da esposa Dona Magdalena.

P.S.: Contexto Político: O "banho" de nossa crônica sobre Miguel Arraes nas redes sociais.

 https://plus.google.com/110402077345751405576/posts/D8VakK9D1Jr
4 dias atrás - José Luiz Gomes da Silva Cientista Político Escrevi um longo artigo sobre a biografia e a trajetória política do senhor Miguel Arraes de Alencar. Infelizmente o ...

Arraes, Arraes, Arraes!

https://plus.google.com/110402077345751405576/posts/VaQuFncopCj
4 dias atrás - ArraesArraesArraes!

Instituto Miguel Arraes: IMA

www.institutomiguelarraes.com.br/
O centenário de nascimento de Miguel Arraes de Alencar foi lembrado na tarde desta quinta-feira, dia 15, pela direção do Lafepe, que tem como presidente ...

Biografia | IMA - Instituto Miguel Arraes

institutomiguelarraes.com.br/home/?page_id=62
29 de mar de 2014 - Miguel Arraes de Alencar era cearense de nascimento, mas construiu sua carreira política em Pernambuco e se tornou um dos maiores ...

Miguel Arraes de Alencar - Início

www.pe.gov.br/governo/galeria-de-governadores/miguel-arraes-de-alencar/
Miguel Arraes de Alencar (*1916 +2005) foi eleito pela primeira vez governador de Pernambuco pelo Partido Social Trabalhista (PST), em 1962.


Le Monde: O austericídio fiscal e o desmonte da Seguridade Social no Brasil


Terreno preparado, as contenções e/ou cortes de recursos vieram no Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO 2017) antecipando dispositivo da Proposta de Emenda Constitucional (PEC 241/2016 da Câmara dos Deputados e PEC 55 do Senado) que estabelece um teto para as despesas do governo até 2036
por Adilson Soares, Marcos Boulos, Nelson R dos Santos


As propostas de governo do presidente Michel Temer estabelecem a centralidade da política econômica, que preside e subordina as demais políticas de governo. Estas propostas visam consolidar, no âmbito do aparelho do Estado e no imaginário dos formuladores de opinião, uma visão de que as metas e os resultados fiscais se constituem atividades-fim da administração pública e não meio, tornando orgânicos os discursos e as práticas.
Em seu primeiro discurso como Ministro da Fazenda Henrique Meireles definiu, sem eufemismos, a política econômica a ser implementada no Brasil: “A prioridade hoje é o equilíbrio fiscal, vamos dar prioridade à questão da dívida...”. Para viabilizar essa política as opções do governo se restringem de um lado a contenção e/ou cortes das despesas públicas, retirando direitos e elegendo setores a serem afetados, e de outro a elevação da receita e/ou da carga tributária, contrariando interesses de setores aliados ao projeto político-econômico hora proposto.
A opção escolhida pelo governo, como politica de curto prazo, foi a contenção e cortes das despesas públicas, evitando o enfrentamento com os setores aliados propondo novos tributos e aumento de receitas. O terreno para estabelecer cortes de recursos foi alicerçado pela promulgação da Emenda Constitucional 93/2016 que possibilita a efetivação de um amplo programa de desvinculações orçamentárias para que se possa, em momento seguinte, realizar os cortes. Terreno preparado, as contenções e/ou cortes de recursos vieram no Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO 2017) antecipando dispositivo da Proposta de Emenda Constitucional (PEC 241/2016 da Câmara dos Deputados e PEC 55 do Senado) que estabelece um teto para as despesas do governo até 2036. Apesar da rejeição popular (segundo pesquisa Datafolha 60% são contrários ao projeto e 24% são mostraram favoráveis) a PEC foi aprovada na Câmara dos Deputados e no Senado Federal, em votação final, em 13/12/2016.
Analisando a estrutura de gastos do orçamento federal de 2015, verifica-se que 45% dos recursos foram gastos com a Seguridade Social e Educação, 30% foram gastos com as demais despesas do Orçamento Fiscal e 25% foram gastos com o pagamento dos Encargos Financeiros da União (juros da dívida pública). Neste cenário e considerando que o governo federal, por acordos e aceitação das imposições das agências de financiamento (FMI e Banco Mundial), não inclui e não considera os efeitos dos Encargos Financeiros da União como importante componente do ajuste fiscal, não há dúvidas de que os cortes de recursos serão dirigidos, em função do volume de recursos envolvidos e por predisposições ideológicas favoráveis ao mercado, principalmente para as áreas da Seguridade Social e Educação.
Cabe destacar que a Seguridade Social no Brasil, segundo dispositivos constitucionais (art. 165 e 195), tem uma ampla base de financiamento e dispõe de orçamento próprio e suficiente, não dependendo apenas das contribuições previdenciárias. A despeito da tentativa de construção de um discurso orgânico da sua situação deficitária, a Seguridade Social além de ser superavitária (saldo positivo de mais de 20 bi de reais em 2015) ainda tem um crédito com a União referente a recursos que foram direcionados para outros setores de governo.
Implantada a política econômica do governo Temer é possível considerar algumas consequências:
1ª) Graves retrocessos nas políticas sociais que promoveram no final do século passado e início deste a maior inclusão social no Brasil, com impactos diretos na saúde física e mental dos cidadãos;
2ª) Agudização da crise econômica, na medida em que a redução de investimentos em setores como saúde e educação, que tem importante efeito multiplicador na atividade econômica, amplia os efeitos da crise;
3ª) A insustentabilidade do esforço fiscal focado apenas nas despesas primárias na medida em os Encargos Financeiros da União, que é a conta com maior déficit estrutural do orçamento federal (representava em 1995 6% do orçamento da União e 1 vez o orçamento da saúde, e em 2015 representou 25% do orçamento da União e 4,4 vezes o orçamento da saúde), é influenciado pelas especulações e incertezas do mercado financeiro interno e externo.
Se essas consequências são previstas, se implementada a austeridade fiscal proposta pelo governo Temer, a pergunta que cabe é: há alternativas a essa politica econômica? Dado a conjuntura, alternativas como alteração da política monetária com vistas à redução da pressão dos encargos financeiros no orçamento do governo, e o aumento da capacidade arrecadatória, dentro dos marcos atuais da política fiscal e sem aumento de carga tributária, são alternativas de curto prazo à contenção e/ou corte de gastos primários e assegurariam o ajuste fiscal, enquanto se encaminham as reformas estruturais (tributária, previdenciária, trabalhista, política e administrativa) que possibilitariam que o país saísse da armadilha e do ciclo vicioso do pensamento e adoção de políticas econômicas de curto prazo.
Por estas razões, diferentemente do que pensam alguns economistas, o Brasil deve temer sim o austerícidio fiscal prenunciado, na medida em que o desmonte da Seguridade Social no Brasil representará um flagrante ataque aos direitos fundamentais definidos na Constituição Federal, produzirá um aumento nas estatísticas de morbimortalidade no Brasil e, ao contrario do propagado, muito agravará a possibilidade de retomada dos investimentos para o desenvolvimento.

Adilson Soares, Marcos Boulos, Nelson R dos Santos
Adilson Soares é Economista, especialista em finanças públicas, Doutor em Saúde Coletiva pela Universidade Estadual de Campinas/SP, Professor de Políticas Públicas de Saúde do Centro Universitário São Camilo.
Marcos Boulos  é Professor Sênior da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo/USP e Conselheiro do Conselho Regional de Medicina - CREMESP.
Nelson Rodrigues dos Santos é Professor de Saúde Coletiva, aposentado, da Universidade Estadual de Campinas/SP e Presidente do Instituto de Direito Sanitário - IDISA.


Agência Senado
14 de Dezembro de 2016
Palavras chave: DireitosgolpeTemerAusteridade fiscalcrise

Charge! Paixão via Gazeta do Povo

É preciso ouvir a voz das ruas

Helena Borges
UM DIA DE COMOÇÃO nacional. Quando todos os olhos se voltavam para o trágico acidente de avião da Associação Chapecoense de Futebol, em que 71 vidas foram repentinamente ceifadas, na noite da terça-feira, 29, parlamentares se aproveitaram da fragilidade da população e “fizeram da crise uma oportunidade”.
Enquanto a maioria dos brasileiros ainda estava em choque, profundamente abalada pelo desastre aéreo, fora dos holofotes, na calada da noite, as duas casas do Congresso votaram, cada uma, um projeto polêmico. O que pode ser chamado de, no mínimo, um golpe baixo – já que ambos vão contra a vontade popular.
A Câmara dos deputados aprovou o texto-base do projeto das dez medidas contra a corrupção. O pulo do gato: apesar de desistirem de propor a anistia ao caixa dois, os parlamentares retomaram a proposta que possibilita punir e constranger juízes e procuradores do Ministério Público. Somente PPS, PSOL, Rede e PV se posicionaram contra a emenda.
O texto final, aprovado por volta das 4h da manhã, descaracteriza completamente a proposta original. Nascidas no próprio Ministério Público, com o apoio popular de mais de dois milhões de assinaturas, medidas como a tipificação do crime de enriquecimento ilícito de funcionário público foram derrubadas. “Do jeito que vai, as dez medidas vão virar meia medida”, protestou o relator do texto original, deputado Onyx Lorenzoni (DEM-RS).
Já o Senado aprovou em sua primeira votação a PEC 55, conhecida como “PEC do Teto” ou “PEC do Fim do Mundo”, que congela os gastos do governo por 20 anos. Apresentada como única saída e constantemente cobrada pelo ministro da fazenda Henrique Meirelles, a proposta tem, sim, alternativas, mas elas não interessam ao mercado financeiro.

“É preciso atender a voz das ruas”


Foi o que disse Michel Temer em coletiva convocada no domingo, dia 27. Dois dias depois, no entanto, a hipocrisia se escancara: manifestantes eram massacrados nos jardins do planalto por se posicionarem contra a PEC do Teto enquanto senadores aprovavam a proposta a portas fechadas.



Correria na Esplanada após PM lançar bombas de efeito moral contra manifestantes que estavam em frente ao Congresso. (vídeo Gustavo Alves).
Abaixo, fotos do coletivo Mídia Ninja mostram a transformação dos jardins da Esplanada em campo de guerra.
manifestacao-bb
Foto: Mídia Ninja/Naiara Pontes
manifestacao-e
Foto: Mídia Ninja
manifestacao-c
Foto: Mídia Ninja
manifestacao-d
Foto: Mídia Ninja
(Publicado originalmente no Intercept Brasil)

terça-feira, 13 de dezembro de 2016

Charge! Latuff

Resultado de imagem para pec 55/CHARGE

Charge!Aroeira via Facebook

Ao celebrar as prisões de Cabral e Garotinho, você fortalece o Estado policial


Angelo Remedio
CABRAL E GAROTINHO foram politicamente feridos de morte esta semana com a decretação de suas prisões preventivas – aquelas que acontecem sem uma condenação, mas enquanto o sujeito ainda é réu. Não foi nas urnas que viram ruir seus projetos políticos de poder. Pelo contrário, foram derrotados por esse superpoder de nossa República, o intocável Poder Judiciário.
Contando com nosso maniqueísmo de costume, o Judiciário aumentou sua capacidade de formar mocinhos e bandidos em velocidade recorde e com limites cada vez mais tênues ou inexistentes. Conta para isso com sua mais fiel aliada, nossa mídia monopolista.
Com as prisões dos dois ex-governadores do Rio de Janeiro, vimos na rede uma realidade preocupante. O ranço punitivista e violento que permeia nossa sociedade não é um monopólio de políticos e cidadãos que se colocam como conservadores no jogo político cotidiano. Não está limitado a programas policiais na TV ou a pessoas que abertamente pregam a eliminação física de seus adversários. A violência por aqui foi se tornando tão banalizada, cotidiana e suscetível de indiferença, por um lado, e a população foi se vendo tão cada vez mais abandonada, por outro, que o caminho para o fortalecimento de ideologias repressivas, de clamor por fortalecimento dos aparelhos repressivo do Estado, ganha coro forte em todas as camadas da nossa sociedade.
O cidadão não se sente seguro e se sente saqueado. Respostas precisam ser dadas rápida e enfaticamente à população. O caminho está aberto cada vez mais para o fortalecimento do Estado policial como resposta.
Se a esquerda não conseguir se diferenciar no clamor público por violência – patrocinada pelo Estado ou não –, como método para resolver conflitos, provavelmente em nada contribuirá para que o fortalecimento do estado penal nos atinja de maneira brutal e violenta.
Quem ganhou foi o estado policial, cada vez mais fortalecido e insuportável.
Quão preocupante é a esquerda que comemora e vibra vendo Garotinho, um ser humano, sendo carregado apenas com o avental na ambulância para Bangu?
1054572-17112016-sam_0836
O ex-governador do Rio Anthony Garotinho deixa o Hospital Souza Aguiar, onde estava internado, para o Complexo Penitenciário de Bangu

Foto: Vladimir Platonow/Agência Brasil)
De um lado, me parece, cedem a um punitivismo cego e vingativo que permeia nossa sociedade. Querem ver sangue, sofrimento, suplício. Chegam a repetir a máxima: “tá com pena, leva pra casa”. Por outro lado, afirmam que o Estado de Direito é uma balela, uma hipocrisia, e uma ilusão na maioria das vezes. Eu não discordo. E a exceção, vocês têm razão, não começou agora.
O Brasil tem quase 300 mil presos provisórios. Provavelmente, depois de um ano presos, quase 40% deles serão absolvidos por falta de provas. Normal. Sabe por quê? Porque para a gente, eles merecem estar lá e, se foram absolvidos, o Estado é incompetente, e o tempo que ficaram presos serve para compensar pelo que supostamente não foram condenados no passado e não serão condenados no futuro. Isso é cruel, é brutal, é inaceitável. Tem que acabar.
No atual momento que o Brasil atravessa, em que garantias e direitos fundamentais são desrespeitados e relativizados cotidianamente, como vai a esquerda se portar no enfrentamento a seus adversários? Parece que o mais fácil (e mais perigoso) é se tornar também uma torcedora da “mão invisível do judiciário”, para que toque apenas em seus algozes – algo improvável, para não dizer impossível de ocorrer. Ou então vai comemorar que finalmente nosso Estado de Exceção foi democratizado e agora ele atinge os pequenos e os poderosos?
Cabral e Garotinho perderam esta semana. Quem ganhou não foi o povo ou a democracia. Quem ganhou foi o estado policial, cada vez mais fortalecido e insuportável.
O Estado Democrático de Direito -– com toda sua insuficiência, limites, falsos discursos, eu sei – está sendo derrubado dia a dia. E não é pela esquerda, por mais que esta se regojize ao ver um adversário sofrendo o castigo que julga que ele mereça. As saídas pela política se tornam cada vez mais um horizonte distante. A ditadura jurídico-midiática já começou.
(Publicado originalmente no site Intercept Brasil)


domingo, 11 de dezembro de 2016

Tranquilidade? Onde?

Resultado de imagem para exercito nas ruas do recife


Vamos por parte. Talvez assim conseguimos entender o que está se passando em nosso Estado. Neste sábado ocorreu uma reunião entre o governador Paulo Câmara, a sua assessoria de segurança pública, o ministro da Defesa, Raul Jungmann, e os comandantes militares que, de fato, assumiram o comando das operações policiais em Pernambuco. Nesses momentos, o discurso oficial dessas autoridades parecem muito bem ensaiados, sempre no sentido de demonstrar que a situação está sob controle, de que a presença das Forças Armadas seria por pouco tempo e tudo tende a normalizar-se. Até se entende que este discurso seja posto pelas autoridades, uma vez que a tendência natural seria a de tranquilizar a população. 

Mas, a rigor, as coisas não estão "sob controle" coisa nenhuma. Quem foi que disse que Forças Armadas nas ruas, realizando operações de segurança pública - repito que elas não estão preparadas para isso - poderia ser adjetivada como uma situação "sob controle"? Na realidade, estamos diante de uma situação excepcional, num momento em que o país atravessa uma grave crise institucional, vulnerável, portanto, a arrotos autoritários. O Estado de Pernambuco, por sua vez, isto sim, parece ter "perdido o controle" da nevrálgica área de segurança pública. Eis aqui mais um motivo para o nosso pessimismo, uma vez que as negociações com a Polícia Militar foram transferidas para Janeiro de 2017. É certo que já estamos no finalzinho do ano, mas não convém esquecer que nessa ápoca do ano é grande o fluxo de pessoas comprando nas ruas, transportando valores, o que potencializa a ocorrências de delitos. De imediato, isso significa, como antecipou o ministro Jungmann, que as tropas federais permaneçam mais tempo no Estado. 

Portanto, apesar de entender as razões do governador Paulo Saraiva Câmara(PSB), não vejo o menor motivo para os informes que dão conta de que a situação é de "absoluta tranquilidade". Não é e a tendência é que a mesma permaneça nesse diapasão por um longo tempo, dada a recessão econômica, a incapacidade de respostas dos entes federados aos pleitos dos servidores e à jabuticaba institucional em que estamos metidos, uma vez que os pressupostos democráticos estão irremediavelmente comprometidos pela "agenda" neoliberal ora em curso no país. São como água e óleo. Não se coadunam. É o tipo de agenda que jamais poderia ser negociada em praça pública, olhando nos olhos dos eleitores. Daí a ruptura institucional de corte autoritário. 

Charge! Benett via Facebook

"Cada vez mais a educação é um negócio"

Em entrevista, o educador e filósofo Gaudêncio Frigotto faz um retrospecto dos acertos e erros dos últimos governos na educação brasileira.


Eduardo Sá - Fazendo Média





Com a reforma do ensino médio estamos resgatando retrocessos que remetem ao que há de pior na história da educação brasileira, e a juventude está ocupando as escolas porque essa geração não vê um futuro seguro para sua vida. Esses são alguns dos principais elementos que o educador e filósofo Gaudêncio Frigotto, professor do Programa de Pós Graduação em Políticas Públicas e Formação Humana da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), atribui ao atual cenário de crise na educação brasileira. O pensador, discípulo de Paulo Freire, tem visitado algumas ocupações e conversado com os alunos para entender melhor esse processo, além de acompanhar atentamente as mudanças realizadas pelo governo de Michel Temer.

Na entrevista ao Fazendo Media, ele faz um retrospecto dos acertos e erros dos últimos governos na educação brasileira. Frigotto destaca ainda o surgimento de movimentos junto ao empresariado, como o Escola Sem Partido, que se tornaram hegemônicos nas decisões do ensino nacional. Para ele, a educação vista como um negócio e não um direito é o que mais prejudica as próximas gerações.

Parceiro de movimentos sociais como o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), o professor defende a aproximação com os jovens para um diálogo em busca de um bem maior: uma educação pública de qualidade para todos. Embora o cenário no médio prazo seja auspicioso, segundo ele, existem sinais de um acúmulo de lutas e consciência que nos trazem esperanças com essa juventude e outros movimentos para o futuro.

O que tem de avanço e retrocesso nesses anos de governo do PT em relação à educação?



Quando o Lula assumiu o governo havia um grupo que tinha pensado o Plano Nacional de Educação (PNDE). O contra ponto era as políticas de educação dos anos 90 no contexto do neoliberalismo e, sobretudo, o restabelecimento da dualidade na educação básica com o decreto 2.208/96. E recuperar, portanto, o debate da Lei de Diretrizes e Bases (LDB) da Constituinte da educação básica como direito social e subjetivo. Quais são os avanços? Se restabeleceu na educação básica o ensino médio como sua parte final, numa perspectiva integrada: não separar o técnico e o político do humano, uma educação básica com a ciência, a cultura e o trabalho como suporte ao jovem para sua autonomia e cidadania. Ou seja, se posicionar na sociedade ativamente e ter as bases para se inserir no mundo do trabalho. E do ponto de vista de política educacional, sem dúvida nenhuma a criação e expansão dos Institutos Federais com a sua interiorização. Isso tem extraordinários ganhos, apesar dos seus problemas. A criação de 17 universidades também, como a Fronteira Sul, que tem um papel enorme e é uma reivindicação dos movimentos sociais. Seu desenho é totalmente diferente, onde os movimentos são parte da gestão da universidade. São avanços significativos, e por isso não comungo com os que dizem que o governo Lula foi igual ao FHC na educação.

Quais foram os problemas, então?

Por volta de 2005 viu se que o governo não tinha um projeto claro de sociedade, e nem de educação. Se constituiu mais um projeto de poder, do que um diálogo com a sociedade. Aí começam, inclusive, as cisões dentro do próprio PT. Olhando hoje para trás, o capital com as forças que são donas dos instrumentos de produção quando viram o Lula assumindo o governo com aquela base social acendeu um sinal vermelho. Por isso se organizou na sua divergência e prioridade como classe, e no campo da educação surgiram duas frentes que acabaram dominantes e pautaram a educação a partir de 2006 no Ministério da Educação e nos estados e municípios. O Todos Pela Educação em 2005, que é incorporado no PDE em 2006, com um grupo de 14 empresários como financiadores e mais 18 colaboradores, que são na verdade os vampiros que querem fazer da educação um negócio ou direcionar qual o método, o currículo, etc. Antes disso, em 2004, começou a surgir o movimento Escola Sem Partido. A economia ia bem com até 6% do PIB e esses empresários ganharam muito dinheiro, porque a transferência e distribuição de renda pelo salário mínimo e pelas políticas sociais é uma margem muito pequena em relação ao que se pagou de juros da dívida interna. Mas a partir de 2012, especialmente no final do governo Dilma, a crise mundial do capital veio forte no Brasil e essa classe organizada disse basta à transferência de renda e políticas públicas. A partir de 2014 se cunhou isso com os mortadelas, que são aqueles que só comiam mortadela e começaram a ser incluídos, como os índios, quilombolas, mulheres, cotas, etc.

Quem são esses empresários, são das universidades e colégios particulares?

São o setor industrial, bancos, meios de comunicação, tudo, e os institutos como o Ayrton Senna, o Lemann e o Itaú, dentre outros. O reflexo disto é o golpe, que se materializa também na educação. A face oculta da face clara do golpe, que é o capital e seus aparelhos, como a mídia, o setor jurídico, o parlamento, setores da polícia federal, são os grandes braços do capital que executam o golpe. A face oculta é a criminalização do PT, sobretudo com a expressão petralha, que na verdade é uma crítica ao pensamento divergente. Como disse o Veríssimo numa crônica recente, justiça social se tornou sinônimo de inimigo. O explícito disso é a PEC 241, que agora é 55 no Senado, é a conta: vai se cobrir o fígado da classe trabalhadora e eliminar todas as políticas de avanços. Vão tirar migalhas para pagar juros da dívida e fazer com que ano que vem noticiem de novo que mais 11 mil brasileiros estão na lista dos maiores milionários do mundo.

Na educação temos o PL que trata da Escola Sem Partindo tentando transformar em lei aquilo que era uma disputa: só é válido ensinar na escola aquilo que é do partido, do mercado na verdade. Ninguém é imbecil de achar que queremos uma escola de um partido como PSDB, PT, etc. Não, a grande disputa é a questão da neutralidade: a escola tem que ensinar, mas não educar. A interpretação que vale é a de acordo com os trâmites, ou as visões da neutralidade científica que interessam ao mercado. Então a Escola Sem Partido é uma guilhotina que se coloca de censura e autocensura à análise: a ciência pelo que debate é política.

Na maior parte das análises políticas e sociológicas dos livros, por exemplo, nos caracterizam como uma nação européia. Mas aí outro historiador vai dizer: cuidado porque de 1500 a 1850 a cada branco europeu colonizador vieram seis negros, então na história da humanidade somos uma nação mais africana. No fundo a concepção mercantil de educação foi tomando a gestão da escola, depois o currículo, o método e agora eles dizem “cala a boca professor” com a Escola Sem Partido. É uma guilhotina, e com uma diferença radical da censura da ditadura civil e militar nos anos 60: o dedo duro era conhecido e pago para dedurar o que não devia ser dito nas aulas, mas hoje pode ser o meu colega, o meu aluno, o pai do aluno ou o diretor da escola. Quebra-se absolutamente o que é orgânico na relação pedagógica, que é a confiança.

Uma contradição difícil de explicar é que quando nos referimos à educação sempre aparecem nomes como Anísio Teixeira, Paulo Freire e Darcy Ribeiro, dentre outros, que são pensadores com inúmeros livros publicados mundo afora e condecorados em universidades em vários países. Por que os que pensaram a educação de forma mais generosa e democrática, são criticados pelo poder hegemônico e mal vistos no senso comum no Brasil?

A última vez que me informei, Paulo Freire já havia sido traduzido em 27 idiomas e a Pedagogia do Oprimido é um clássico. Darcy Ribeiro com o Processo Civilizatório é outro clássico, assim como Anísio Teixeira, Florestan Fernandes, dentre outros, como Celso Furtado noutro ângulo. Essa contradição se explica pelo tipo de classe dominante que temos. Para ela, reforma agrária era coisa comunista, por exemplo. Japão fez reforma agrária! E a não reforma agrária significa hoje o entorno de grandes cidades absolutamente inabitável com favelas e todos os problemas. Isso é diferente das classes dominantes do capitalismo central, como disse Florestan Fernandes, que fizeram uma revolução burguesa mas garantiram primeiro a construção de uma nação e de direitos mais universais com menos desigualdade.

Os autores que defendem a universalidade da educação, como Paulo Freire, que educar é ajudar a criança, o jovem ou o adulto a ler o mundo, a interpretar, a tornar-se sujeito, esse tipo de formação para a classe dominante brasileira é uma ofensa, um empecilho. Os próprios empresários e os intelectuais a eles vinculados, como o sociólogo [José] Pastore, falaram em apagão educacional se referindo a pequenos setores da economia que exigem trabalho complexo e não tem gente preparada para isso. Mas quem produziu esse apagão? E a própria imagem de apagão mostra a visão medíocre dessa classe, imaginando que você forma um profissional qualificado como se corrige um problema de falta de luz. Um apagão é momentâneo, mas o processo educativo é de larga duração. Na verdade é coerente, para a classe dominante não é contraditório. Como o sociólogo Francisco de Oliveira coloca muito bem: é uma sociedade que produz a miséria, e se alimenta dela.

E manipulam, porque qualquer pensamento divergente é de comunista mas Paulo Freire nunca foi comunista. Num debate da TV Cultura com um dos fundadores da Escola Sem Partido, o Miguel Nagib, ele disse: esse petista Paulo Freire, que escreveu os livros, etc. Até o âncora corrigiu: mas olha, o Paulo Freire escreveu esses livros antes do PT existir. É uma classe dominante anti nação, povo e direitos elementares de morar, ter saúde, locomoção e educação. É uma classe de estigma colonizador e escravocrata como poucas no mundo, que faz com que cheguemos ao século XXI com 13 milhões de analfabetos e 9,5 milhões dizendo que não estudam ou não trabalham. São esses os candidatos do Degase e das prisões.

Um fenômeno que vem em paralelo a esse processo é a ascensão de uma juventude com uma nova consciência e ocupando as escolas em todo o Brasil. Qual a origem disso?

Antes gostaria de fazer uma ligação da PEC da Escola Sem Partido e a reforma do ensino médio, que é uma interdição de 85% dos jovens que frequentam escolas a terem um futuro. De criar uma base de conhecimento e valores para se tornar sujeito ativo na sociedade. E também uma interdição para que eles possam aspirar ao trabalho complexo, além de trazer três retrocessos que existiram de pior na nossa história. Nos anos 30 a reforma Capanema com a não equivalência do ramo industrial, de serviços e agrícola para ter acesso à universidade, que foi corrigido em 1961: a Lei 5.692 pega o que tem de pior da ditadura, que é a profissionalização precoce. O Decreto 2.208 do FHC e Paulo Renato também traz a dualidade, e agora liberando inclusive os professores da parte flexível da reforma de não precisar de licenciatura. E a educação básica foi então decretada por Medida Provisória por Ato Institucional, e o ensino médio não faz mais parte. O Plano Nacional de Educação ficou escanteado, e dessa virulência vem a mobilização dos jovens. Especialmente os secundaristas, que entenderam essa relação entre a hostilidade econômica e os seus futuros no mundo do trabalho. Sem uma boa escola não vão competir para entrar numa universidade nem no mercado de trabalho.

O jovem desde sempre é sensor, porque na adolescência ele catalisa e é muito sensível à falsidade. Hoje tem muita manipulação, mas a própria cisão de classe às vezes é rompida. Esse movimento Ocupa da educação começa em torno de 2004 no Chile, é um movimento dos jovens que estão querendo ter futuro e não uma vida provisória em suspenso. É um gérmen importantíssimo para mostrar que as políticas e decisões tomadas são contra o futuro dessa geração. Tem que haver um diálogo, porque sem ele os jovens não aprendem com os acertos da geração adulta e não aprendem com os seus erros. É preciso fazer essa aproximação ouvindo a partir da agenda dos jovens, e o que é mais fantástico é a clareza dos secundaristas de que eles não devem atingir o patrimônio público, manter uma ordem e ter solidariedade. Tem diferenciações, mas tem lições importantíssimas que nos dão esperança. Como diz o Florestan, são os homens e mulheres em luta que fecham ou abrem o circuito da história. Estão fechando um circuito da história negativo no Brasil, mas também tem forças sinalizando que não será eterno. O grande ganho dessa juventude é que ela não será mais a mesma.

Estão acontecendo diversas atividades extracurriculares nessas ocupações, e muitos dizem que é uma grande formação que não têm na sala de aula e um aprendizado que vão levar para a vida inteira. Essa geração é um sinal para um futuro de embate político e de conflitos?
São contextos muito diversos, a geração que foi ao embate na década de 80 foi educada na ditadura e era um momento de participação mais ampla da sociedade com a constituinte. Tinha um foco de sair de um circuito de extrema violência para uma democracia, e na década de 90 foi uma violência do neoliberalismo e um movimento mais institucional das associações científicas e culturais. Sem dúvida a juventude não se movimentou tanto, apesar de ter sido sempre disputada por partidos políticos, igreja, tráfico, mercado, etc. O movimento de agora é porque nesses 15 anos houve um processo com novos sujeitos emergindo. As ocupações não são de jovens de classe média, os secundaristas em sua maioria são classe popular: tem os segmentos de negros, mulheres, LGBT, tudo isso foi construído em políticas que permitiram voz e formação na sociedade. É o novo, por isso é um processo positivo das políticas de inclusão. Esse movimento tem um veio do aprendizado dos jovens da luta do Chile que foi extremamente bem sucedida, mas também por causa da particularidade do nosso processo histórico. Aqui o neoliberalismo chegou depois, e tivemos essa experiência de olhar para o andar debaixo ainda que com políticas mais assistenciais do que com reformas estruturais.

Quando falamos em educação sempre remetemos às grandes cidades, mas no governo do PT teve muita escola rural fechada. Como é essa questão da educação pra dentrão do país?

Cada vez mais a educação é considerada não como um direito social, mas como um negócio. Por isso a ideia da educação como custo, e não como direito. Por outro lado, para você pagar a dívida do país tem que ter criado a responsabilidade fiscal. Todo um esforço do país é pago em juros de uma dívida que é uma imoralidade, um crime. Então os municípios e estados enxugam o custo, fecha a escola, mata uma cultura, tira o menino do seu habitat, etc. Os movimentos sociais, especialmente os do campo, lutam muito contra isso. O novo do ponto de vista de concepção pedagógica vem daí, a pedagogia do MST, da via Campesina e outros movimentos diz que não quer uma educação para o campo e nem pelo campo: querem uma educação do campo. Existem sujeitos e conhecimentos, é desta particularidade que temos de partir para um conhecimento que possa dar na cidade e no campo. A política de esvaziamento do campo e fechamento de escolas vem da ideia de que a educação não é um direito: é um serviço e, portanto, tem que ser tratada por critérios de mercado. Ou seja, um processo de crescente mercantilização dos direitos, mas há resistência.

E incomoda, porque bateram recentemente na porta da escola Florestan Fernandes, do MST.

Por isso tentam marginalizar o pensamento divergente, e criticam esses pensadores que ajudavam a pensar, a ver a nossa diversidade e os nossos direitos. Isso é uma expressão dessa truculência do golpe, que vai tirar e já está tirando direitos em todos os campos.

Com base nessa transição de governo, quais são os sinais do que virá pela frente?

O cenário no médio prazo não é auspicioso. Ontem estava lendo uma entrevista do prefeito de São Paulo, que é uma tendência no mundo de culpar o Estado, da direita para a extrema direita. No Rio de Janeiro é o fundamentalismo religioso, que torna Deus uma mercadoria, junto ao fundamentalismo do mercado. A votação do Bolsonaro aqui é preocupante, assim como a votação localizada do Crivella nas comunidades pobres onde atua o pastor. Então o desenho, no médio e curto prazo, será de anos duros. Mas a história não é linear: esses movimentos apontam que há resistência, há acúmulo, forças. Porém, tenho ouvido muito que o campo crítico deveria ter se organizado como o campo do capital, ao invés de ficar debatendo o seus problemas e dividindo. Buscar um denominador comum no pluralismo, de sorte que fomos surpreendidos. Ninguém com mais de 60 anos que passou pela ditadura vai te dizer que se podia imaginar chegar a 2016 com esse cenário, por mais grave que fosse a crise. Para renascer das cinzas, a primeira coisa é fazer esse inventário como estamos tentando aqui.

Um fator interessante é que essa geração não previa, e também não entende essa nova geração. Os jovens chegam com uma nova dinâmica organizativa, de forma mais horizontal, e não dialogam tanto com os partidos e movimentos.

Porque os partidos tais como estão, inclusive isso foi um dos erros do PT, não pensam mais em sociedade e sim no mandato. Partido vira lugar de emprego, e não de representação da sociedade. Há um descrédito nos partidos, e isso é muito ruim. Os sindicatos idem, se encastelaram muito e se formou um emprego. É difícil fazer generalizações, mas também esqueceram em boa medida a sociedade. Há um descrédito na política, e por outro lado isso dificulta o diálogo de gerações. Mas não vai haver mudança sem organização: precisamos do sindicato, dos partidos e do Estado, mas não desse. Precisamos de um regramento jurídico, e os jovens contestam isso, assim como contestam a própria escola. O aluno não gosta da escola porque ela não é escola, é um espaço pouco educativo, não tem salas legais, o professor não tem tempo, não tem biblioteca nem espaço para lazer ou cultura. Como diz Miguel Arroyo, mais escola dessa escola que horror.

Os alunos estão pedindo exatamente isso: espaço para se organizar, tempo integral para não só ter aula de física, matemática, química, etc. Quando existe um clima educativo, os jovens gostam de ficar, até porque muitas vezes a comunidade não tem os recursos que a escola tem. Na Escola Joaquim Venâncio da Fiocruz, por exemplo, a garotada canta, faz teatro, namora, tem violão, oficinas, enfim, é uma escola que educa. Então, esse diálogo tem de ser mobilizado pelos dois lados. Por parte do jovem entender que estudar, especialmente quem vem da classe popular, exige esforço, disciplina e é importante. A classe dominante faz uma reforma de ensino que desqualifica a escola, mas os filhos deles estão em sala de aula com tempo integral e tudo que negam aos jovens da classe popular. E esse jovem também fica infeliz, tem centros de psicologia que tratam hoje só filho de classe média alta. Então é restabelecer o diálogo, que não é necessariamente concordância. Diálogo é pôr em comum visões e tirar proveito, no sentido de qualificar a luta inclusive dos próprios jovens. Os jovens não ganham falando só pra si e nem os adultos, e do ponto de vista dos adultos nós temos de ouvi-los atentamente. A experiência nas ocupações no Rio mostra que o diálogo é possível, e é um ganho extraordinário. Muitas vezes os jovens nos corrigem num diálogo que é fraterno, cujo objetivo é um bem maior. Qual o grande problema dos jovens hoje? O que fazer com o futuro, a insegurança, a sensação de não poder se programar, e temos de ajudá-los.


(Publicado originalmente no portal Carta Maior)

Charge!Laerte via Facebook

sábado, 10 de dezembro de 2016

Artigo: O fim da democracia


Imagem relacionada

José Luiz Gomes

A nossa fé na democracia é algo tão profunda que, não raro, nos recusamos a discutir o seu fim. Mas, por outro lado, já faz algum tempo que não temos motivos para este otimismo. Um regime que antes se orgulhava de apresentar-se como um governo do povo, pelo povo e para o povo, como informava o editor do jornal Le Monde Diplomatique, Sílvio Caccia Bava, tornou-se um governo das grandes corporações, pelas corporações e para as corporações, principalmente as grandes corporações financeiras. Diante deste fato, ainda é possível falarmos "naquela democracia" ou ela descaracterizou-se de tal modo que nos contingenciam a tratá-la de uma outra maneira? Mesmo diante de nossa capenga experiência democrática, já havia aqueles pensadores que demonstravam uma impossibilidade estrutural da mesma consolidar-se entre nós. Isso quando a nossa referência eram os pressupostos básicos de uma democracia liberal.

Hoje, quando as políticas neoliberais apresentam-se com uma face das mais cruéis - a dos ajustes fiscais, assédio aos direitos e endurecimento do poder político - há quem jogue a toalha e não veja qualquer possibilidade de convivência dessa plataforma econômica sob um regime democrático. Cabe aqui uma pergunta: que tipo de democracia comportaria a implementação dessas políticas neoliberais. Daí se entender a "necessidade" dos golpes do século XXI. Diante de uma plataforma democrática - e, portanto, negociada com a população - essas medidas serão amplamente rejeitadas. (...)

(Conteúdo exclusivo, liberado apenas para os assinantes do blog)