pub-5238575981085443 CONTEXTO POLÍTICO.
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segunda-feira, 13 de abril de 2015

7 mitos sobre educação que acabam de ser derrubados

Exame internacional Pisa, realizado em vários países do mundo e que tem como objetivo avaliar sistemas educacionais acaba de desfazer 7 mitos sobre eficiência da educação

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Andreas Schleicher e Sistema educacional (Imagem: Pragmatismo Político)
A cada três anos, estudantes de vários países fazem o exame internacional Pisa (sigla inglesa para Programa Internacional de Avaliação de Alunos), cujo objetivo é avaliar sistemas educacionais no mundo por meio de uma série de testes em assuntos como leitura, matemática e ciências.
Cerca de 510 mil estudantes de 65 países participaram da rodada mais recente de testes, realizada em 2012. Os resultados foram divulgados em dezembro de 2013.
Brasil ocupa a posição 55 no ranking de leitura, 58 no de matemática e 59 no de ciências. Xangai (China) está no topo da lista nas três matérias, Cingapura e Hong Kong se revezam na segunda e terceira posições.
No artigo a seguir, o responsável pelo exame, Andreas Schleicher, usa dados revelados pelo Pisa para destruir alguns dos grandes mitos sobre o que seria um bom sistema de educação:
1. Alunos pobres estão destinados a fracassar na escola
Em salas de aula de todo o mundo, professores lutam para impedir que alunos mais pobres fiquem em desvantagem também no aprendizado.
No entanto, resultados do Pisa mostram que 10% dos estudantes de 15 anos de idade mais pobres em Xangai, na China, sabem mais matemática do que 10% dos estudantes mais privilegiados dosEstados Unidos e de vários países europeus.
Crianças de níveis sociais similares podem ter desempenhos muito diferentes, dependendo da escola que frequentam ou do país onde vivem. Sistemas de educação em que estudantes mais pobres são bem sucedidos tem capacidade para moderar a desigualdade social. Eles tendem a atrair os professores mais talentosos para as salas de aula mais difíceis e os diretores mais capazes para as escolas mais pobres, desafiando os estudantes com padrões altos e um ensino excelente.
Alguns americanos criticam comparações educacionais internacionais, argumentando que elas têm um valor limitado porque os Estados Unidos têm divisões socioeconômicas muito particulares.
Mas os Estados Unidos são mais ricos do que a maioria dos outros países e gastam mais dinheiro com educação do que a maioria. Pais e mães americanos têm melhor nível educacional do que a maioria dos pais e mães em outros países e a proporção de estudantes de nível socioeconômico baixo nosEUA está perto da média dos países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento (OCDE).
O que as comparações revelam é que as desvantagens socioeconômicas têm impacto particularmente forte sobre o desempenho de estudantes nos Estados Unidos.
Em outras palavras, nos Estados Unidos, dois alunos de níveis socioeconômicos diferentes variam muito mais em seu aprendizado do que se observa em outros países que integram a OCDE.
2. Países onde há muitos imigrantes têm pior desempenho
Integrar estudantes imigrantes, ou descendentes de imigrantes, pode ser um desafio.
No entanto, resultados dos exames Pisa mostram que não há relação entre a porcentagem de estudantes imigrantes – ou descendentes de imigrantes – em um dado país e o desempenho dos estudantes daquele país nos exames.
Estudantes com históricos de imigração e níveis sociais similares apresentam desempenhos variados em países diferentes, o que sugere que as escolas onde os alunos estudam fazem muito mais diferença do que os lugares de onde os alunos vêm.
3. É tudo uma questão de dinheiro
A Coreia do Sul – país com melhor desempenho (em termos individuais) em matemática na OCDE – gasta, por estudante, bem menos do que a média. O mundo não está mais dividido entre países ricos e bem educados e países pobres e mal educados. O sucesso em sistemas educacionais não depende mais de quanto dinheiro é gasto e, sim, de como o dinheiro é gasto.
Se quiserem competir em uma economia global cada vez mais focada no conhecimento, os países precisam investir em melhorias na educação. Porém, entre os integrantes da OCDE, gastos com educação por estudante explicam menos de 20% da variação no desempenho dos alunos.
Por exemplo, aos 15 anos de idade, estudantes eslovacos apresentam uma média de desempenho similar à de um estudante americano da mesma idade. No entanto, a Eslováquia gasta cerca de US$ 53.000 para educar cada estudante dos 6 aos 15 anos de idade, enquanto os Estados Unidos gastam mais de US$ 115.000 por estudante.
4. Salas de aula menores elevam o nível
Por toda parte, professores, pais e autoridades responsáveis por políticas educacionais apontam salas de aula pequenas, com poucos alunos, como essenciais para uma educação melhor e mais personalizada.
Reduções no tamanho da classe foram a principal razão para os aumentos significativos nos gastos por estudante verificados na maioria dos países ao longo da última década.
Apesar disso, os resultados do Pisa mostram que não há relação entre o tamanho da classe e o aprendizado, seja internamente, em cada país, ou se compararmos os vários países.
E o que é mais interessante: os sistemas educacionais com melhor desempenho no Pisa tendem a dar mais prioridade à qualidade dos professores do que ao tamanho da classe. Sempre que têm de escolher entre uma sala menor e um professor melhor, escolhem a segunda opção.
Por exemplo, em vez de gastarem dinheiro com classes pequenas, eles investem em salários mais competitivos para os professores, desenvolvimento profissional constante e cargas horárias equilibradas.
5. Sistemas únicos de educação são mais justos, sistemas seletivos oferecem resultados melhores
Parece haver um consenso, entre educadores, de que sistemas educacionais não seletivos, que oferecem um mesmo programa de ensino para todos os estudantes, são a opção mais justa e igualitária. E que sistemas onde alunos aparentemente mais inteligentes são selecionados para frequentar escolas com programas diferenciados oferecem melhor qualidade e excelência de resultados.
No entanto, comparações internacionais mostram que não há incompatibilidade entre qualidade do aprendizado e igualdade. Os sistemas educacionais que apresentam melhores resultados combinam os dois modelos.
Nenhum dos países com alto índice de estratificação está no grupo de sistemas educacionais com os melhores resultados – ou entre os sistemas com a maior proporção de estudantes com o melhor desempenho.
6. O mundo digital requer novas matérias e um currículo novo
Globalização e mudanças tecnológicas estão tendo um grande impacto sobre os conteúdos que estudantes precisam aprender.
Num mundo onde somos capazes de acessar tantos conteúdos no Google, onde habilidades rotineiras estão sendo digitalizadas ou terceirizadas e onde atividades profissionais mudam constantemente, o foco deve estar em permitir que as pessoas tornem-se aprendizes para a vida toda, para que possam lidar com formas complexas de pensar e trabalhar.
Resumindo, o mundo moderno não nos recompensa mais apenas pelo que sabemos, mas pelo que podemos fazer com o que sabemos.
Como resposta, muitos países estão expandindo currículos escolares para incluir novas matérias. A tendência mais recente, reforçada pela crise financeira, foi ensinar finanças aos estudantes.
Porém, os resultados do Pisa mostram que não há relação entre o grau de educação financeira e a competência dos estudantes no assunto. Na verdade, alguns dos sistemas de educação em que os estudantes tiveram o melhor desempenho nas provas do Pisa que avaliaram competência em finanças não ensinam finanças – mas investem pesado no desenvolvimento de habilidades matemáticas profundas.
De maneira geral, nos sistemas educacionais de melhor desempenho, o currículo não é amplo e raso. Ele tende a ser rigoroso, com poucas matérias que são bem ensinadas e com grande profundidade.
7. O segredo do sucesso é o talento inato
Livros de psicólogos especializados em educação tendem a reforçar a crença de que o desempenho de um aluno brilhante resulta de inteligência inata, e não do trabalho duro. Os resultados do Pisa questionam também este mito.
Às vezes, professores se sentem culpados por pressionar estudantes tidos como menos capazes, acham injusto fazer isso com o aluno. O mais provável é que tentem fazer com que cada estudante atinja a média de desempenho dos alunos em sua classe. Na Finlândia, em Cingapura ou Xangai, por outro lado, o objetivo do professor é que alunos alcancem padrões altos em termos universais.
Uma comparação entre as notas escolares e o desempenho de estudantes no Pisa também indica que, frequentemente, professores esperam menos de alunos de nível socioeconômico mais baixo. E pode ser que os próprios alunos e seus pais também esperem menos.
A não ser que aceitem que todas as crianças podem alcançar os níveis mais altos de desempenho, é pouco provável que os sistemas educacionais (com resultados piores) possam se equiparar aos dos países com índices de aprendizado mais altos.
Na Finlândia, Japão, Cingapura, Xangai e Hong Kong, estudantes, pais, professores e o público em geral tendem a compartilhar a crença de que todos os estudantes são capazes de alcançar níveis altos.
Um dos padrões mais interessantes observados entre alguns dos países com melhor desempenho foi o abandono gradual de sistemas nos quais estudantes eram separados em diferentes tipos de escolas secundárias.
Esses países não fizeram essa transição calculando a média de desempenho (entre todos os grupos) e usando essa média como o novo padrão a ser almejado. Em vez disso, eles colocaram a nova meta lá em cima, exigindo que todos os estudantes alcançassem o nível que antes era esperado apenas dos estudantes de elite.
(Publicado originalmente no site Pragmatismo Político)

Tijolinho Real: O céu é para os esquerdista, Eduardo Galeano


Morreu o escritor e ensaísta uruguaio Eduardo Galeano. Tinha 74 anos de idade. Logo na adolescência, li "As veias abertas da América Latina", um livro que causaria em mim uma grande inquietude, assim como a "Pedagogia do Oprimido", do educador pernambucano, Paulo Freire. Parafraseando Paulo Freire, essa "inquietude" era um sinal de consciência sobre a realidade que precisávamos conhecer para mudá-la. Em seus campos de atuação específicas, ambos os pensadores foram muito importantes para as reflexões da esquerda latino-americana. De tão radical, confesso que nunca fui muito simpático àqueles olhos azuis do Jorge Castañeda, apesar dele ter escrito aquele ensaio clássico sobre a esquerda latina-americana e uma biografia impecável do "Che". Desde então, não deixo de acompanhar os escritos, as entrevistas, os ensaios do escritor paraguaio. Galeano viveu as agruras de quem teve a coragem de se contrapor ao status quo. Foi exilado, ameaçado de morte, teve que deixar seu país, fugindo dos seus algozes. Galeano sempre demonstrou muita determinação e coragem na defesa de suas ideias. As "interdições" do desenvolvimento latino-americano era uma das suas preocupações. O percurso seria "natural" ou determinado por conjunturas alheias à nossa vontade? Em certa medida e muito antes de pedir que "esquecêssemos o que ele havia escrito", penso que o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, da Teoria da Dependência, ainda que anpassant, flertou com Eduardo Galeano. Antes de morrer, o ex-presidente venezuelano, Hugo Chaves, presenteou o presidente americano, Barack Obama, com um exemplar do livro clássico de Eduardo Galeano. Um protesto aos desmandos imperialistas no continente. Obama recebeu o presente constrangido. Voltamos a nos encontrar na seleção para o mestrado em ciência política da UFPE. Ali estava um texto, em inglês, de Galeano, para ser traduzido e comentado. Fomos de vento em popa. Ele tratava do desmoronamento da experiência do socialismo realmente existente, e informava que, comparada ao capitalismo, nós éramos uns adolescentes. E que também não se podia jogar a "criança" fora juntamente com a "água suja". É verdade. O céu é para os esquerdistas, Galeano.

Eduardo Galeano, o caçador de vozes.

Eduardo Galeano, o caçador de vozes

outubro 19, 2011 23:25
O escritor uruguaio Eduardo Galeano fala do destino dos países latino-americanos, faz a defesa dos ideais de esquerda e decreta: o único pecado que não deve ser cometido é o pecado contra a esperança
Por Glauco Faria e Nicolau Soares
O ano é 1996. O escritor uruguaio Eduardo Galeano estava em um encontro em Chiapas, México, com integrantes do movimento zapatista, entre os quais o próprio subcomandante Marcos. Em meio a conversas e debates, algo o perturbava. Aquele não era um dia qualquer.
No entanto, o que tirava o sossego de Galeano não eram os focos de tensão entre os rebeldes e o governo, nem algum acontecimento no cenário político internacional, mas uma partida de futebol. Tratava-se da final do torneio de futebol masculino nas Olimpíadas de Atlanta entre as seleções de Argentina e Nigéria.
Como assistir o jogo em meio à extensa programação do dia? Em um intervalo entre uma reunião e outra, o uruguaio não se conteve. Fingiu ir ao banheiro e saiu escondido para o hotel onde estava hospedado. Quando voltou, perguntaram-lhe: “Eduardo, onde estavas?”. Disfarçou e deu uma desculpa qualquer. “Nunca tive coragem de admitir que fugi para ver o jogo.”
O futebol é tema recorrente de comparações e de histórias de Galeano, que fez essa confidência à Fórum em meio à sua participação no I Festival Latino-Americano de Música Camponesa, realizado em Curitiba em novembro do ano passado. Na ocasião, o escritor falou a milhares de integrantes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra, o MST.
O uruguaio, que conseguiu tocar milhões de leitores com o clássico As Veias Abertas da América Latina, seduz os espectadores que acompanham suas palestras. Com um português impecável e uma serenidade inabalável, recorre a histórias e parábolas para ilustrar suas contundentes críticas ao modelo neoliberal e aos rumos da esquerda e dos países do continente latino-americano. Mas em cada trecho de sua fala faz questão de deixar uma palavra de esperança e reafirmação de valores caros aos movimentos progressistas. Durante sua estada no evento, Fórum acompanhou os passos do escritor e traz abaixo os principais trechos de sua entrevista exclusiva, assim como da palestra que realizou no evento. Apesar de ser sábado e ter jogo do Brasileiro na televisão, dessa vez, Galeano não escapou.
Ser de esquerda
É difícil fazer um catálogo dos ideais de esquerda. Eu diria que são os mais ligados às idéias da liberdade, da comunhão com a natureza, da preservação da vida, não só humana, mas da vida do planeta, que é nossa casa. E é a certeza de que fazemos parte de um arco-íris de diversas cores e que o racismo está nos deixando cegos para essa maravilha que é a diversidade humana e da vida no mundo. Porque o melhor do mundo é a quantidade de mundos que ele contém. Essas seriam algumas coisas básicas.
Ocorre hoje a ressurreição dos laços solidários, não digo mortos, mas muito feridos, quebrados, a partir da imposição de uma escala de valores fundada na salvação pessoal, na idéia de que o outro é um competidor e um inimigo, não um companheiro. Que é uma ameaça e não uma promessa. Acredito, como um homem de esquerda, que alguém sempre  tem alguma coisa para dizer que valha a pena escutar. Os trinta e poucos anos transcorridos desde que escrevi As Veias Abertas da América Latina indicam que alguns desses valores já não têm a força que antes tinham. Por exemplo, nos anos 70, ninguém discutia que a pobreza era filha da injustiça. Era a esquerda quem denunciava, mas ninguém discutia. O centro aprovava e a direita não discutia, calava a boca. Agora, é uma minoria que continua acreditando nisso. Para a maioria dos opinion makers, os fabricantes de opinião do mundo, a pobreza é o castigo que a ineficiência merece. Isso é uma mudança de valores radical.
Boas notícias
É muito difícil perceber que projetos e idéias são interessantes, mas eles existem. Há casos como o plebiscito da água, que me parece uma coisa digna de contágio, merece ser imitada por outros países. Mas não tenho muita esperança, porque o Uruguai já fez um outro plebiscito em 1992 sobre a privatização das empresas públicas em que 72% da população votaram contra e ninguém imitou isso, que é um exercício de democracia elementar. Quando você está tomando uma medida que vai afetar o destino de várias gerações, como é a privatização dos recursos essenciais de um país, é necessário consultar à população.
Mas além dessas coisas, que são muito concretas, palpáveis, é difícil fazer uma lista das boas notícias. Mas elas existem o tempo todo, às vezes em uma escala local que não tem a menor repercussão, mas que é verdadeira.
Efeito Lewinsky
O governador Requião, em um almoço, me dizia que nenhum jornal brasileiro publicou nenhuma linha sobre o plebiscito da água que ocorreu no Uruguai. E foi um fato muito importante, não por ter acontecido no meu país, não vou fazer patriotadas bobas, mas porque foi o  primeiro país a fazer uma consulta pública sobre o uso de um recurso natural perecível como é a água. Foram 65% dos uruguaios a favor de uma emenda constitucional que garante que a água continuará sendo  propriedade pública e não um negócio privado. Isso não apareceu nos jornais, não era notícia.
Há um controle mundial nos meios de comunicação que já é hora de ser quebrado. Uso como exemplo o ano de  1998, quando o mundo ficou condenado a ler, escutar e assistir, dia  após dia, às notícias do romance entre o presidente do planeta e aquela gordinha voraz, Monica Lewinsky. Você tomava café da manhã com ela, almoçava com ela, jantava com ela… Um ano inteiro. Um dia,  estava na Europa e abri um jornal que era pura Monica Lewinsky. E aí, perdida, havia uma notícia, na última coluna da página sete, dizendo que as três organizações ecológicas mais importantes do mundo haviam se juntado em Londres para divulgar um relatório seriíssimo que revelava que, em meio século, o mundo tinha perdido um terço de seus recursos naturais. Isso não teve a menor importância. Um terço dos  recursos é fácil de dizer, mas se você pensa na dimensão desse crime gigantesco… O mundo tinha perdido em cinqüenta anos um terço de seus recursos e não tinha espaço para isso no jornal, porque estavam  ocupados com a outra história.
O processo do Fórum
Percebo uma multiplicação da energia criativa na sociedade civil da América Latina a partir do primeiro FSM, um maior dinamismo. Existe uma contradição entre o tempo da história e o tempo da vida dos homens. Cada pessoa quer ver os resultados das coisas, o que é compreensível,  um desejo humano. Mas a história é uma senhora que caminha devagar. É preciso ter paciência. O resultado dessa articulação de vozes não aparece em um ou nem mesmo em dez anos. Estão despertando  energias que pareciam estar dormindo ou até mortas.
Essa articulação  é lenta, mas imprescindível para o futuro dos movimentos sociais. Na  solidão, estamos mortos. A esquerda está tentando um caminho novo,  novas experiências políticas. Essas novidades aparecem em todos os  setores, não só nas eleições. É interessante ver que (Hugo) Chávez, demonizadíssimo  por toda a grande mídia, ganha nove eleições limpas. Estamos falando de um tirano muito especial que ganhou nove eleições – todas mais transparentes que as dos EUA. No Uruguai, a esquerda ganhou, mostrando que o trabalho rende frutos, não é só água jogada no  mar. Foi um trabalho iniciado em 1971, casa por casa.
O FSM e os pequenos
Com o passar do tempo, valorizo cada vez mais as pequenas escalas,  as pequenas dimensões e desconfio cada vez mais da espetacularização das grandes notícias. Eu digo isso para revelar a grandeza  escondida nas coisas pequenas e denunciar a mesquinharia das  coisas grandes. O Fórum Social Mundial tem essa característica do espetáculo, mas é diferente, porque é nascido da insólita e jamais vista tentativa de juntar todas essas pequenas forças desconhecidas  que existiam espalhadas. Ele tem sido um grande passo adiante na direção correta de juntar os dispersos, re-vincular os desvinculados,  de salvar-nos da solidão. Nesse sentido, acho que o mundo tem avançado  muito, de uma maneira silenciosa, não estrepitosa, mas certa. E que não corresponde exigir resultados imediatos, pois são processos muito longos, complexos, que caminham devagar e crescem desde o  pé, como pedia o cantor uruguaio e meu amigo muito querido Alfredo
Zitarosa, porque senão as coisas não duram.
O Fórum abriu um grande espaço de encontro e essa é sua importância, ter conseguido  que os dedos ganhassem consciência de que fora da mão não servem para nada. A ida para a Índia parece ter sido uma experiência positiva, pois abriu toda uma metade do mundo que estava meio em sombra, não aparecia muito, e permitiu a expressão de forças que estavam latentes. Mas não sei o que acontecerá. Em geral, não sou  um bom profeta. Sobretudo no que mais me interessa na vida, que é o futebol (risos).
500 Anos de Solidão
A América Latina é uma região do planeta dentro da qual existem energias de mudança muito lindas e também energias do sistema colonial que vêm se perpetuando já há mais de cinco séculos e que são  muito poderosas. Eles têm um poder econômico e cultural imenso e boa parte do poder político. São essas as forças que estão nos treinando desde sempre para a certeza de nossa impotência. Para a certeza de  que a realidade é intocável, de que o que é, é porque foi e continuará sendo. De que amanhã é outro nome de hoje. Isso é um fatalismo herdado e tem muito tempo de vida: cinco séculos. Não é fácil lutar contra isso. Vamos inventar a vida, vamos imaginar o futuro. Vamos cometer a loucura de acreditar que essa terra pode ser outra. De que essa região nossa não está condenada pelos deuses nem pelos diabos à pena perpétua de solidão e desgraça. Mas isso não é fácil.
Elogio ou acusação
Como sempre, há essa tensão criativa entre as forças da inércia dos sistemas tradicionais e as forças novas que surgem. O problema é que às vezes as forças novas adotam os valores das que combatem sem perceber. Por exemplo, toda uma escala de valores que acredita no sucesso como uma fonte de valor. Então, essas forças de mudança começam uma corrida louca para parecer com seu inimigo, para fazer a coisa de tal maneira que seu inimigo lhe aplauda. Às vezes me dizem: “você é muito bom”. Mas eu procuro ver quem é que está falando, porque, dependendo, pode ser uma acusação gravíssima.
O pecado contra a esperança
A vitória da esquerda nas eleições uruguaias foi, para nós, um acontecimento incrível. Parece milagre. A esquerda obteve a metade mais um dos votos contra um monopólio compartilhado de dois partidos  tradicionais que exerciam o poder desde a fundação dos tempos, desde Adão e Eva ou antes. Parece milagre, mas não é. É o resultado de um trabalho paciente, feito dia após dia, porta por porta, consciência após
consciência. A vitória da Frente Ampla foi crescendo desde o pé. E foi celebrada numa noite inesquecível. Aquele domingo foi absolutamente inesquecível. Eu nunca tinha visto, sentido, vivido tanta alegria no meu país. Foi uma ressurreição da alegria, que parecia morta, mas estava apenas dormindo. Lá pelas quatro da manhã, o povo nas ruas, aquela explosão incessante das melhores coisas, um amigo me comentou: “Quero que essa noite não acabe nunca”.
E essa frase, que é lindíssima, não se refere só à noite da celebração, mas também a tudo que aquela noite estava encarnando, simbolizando. O que ele queria dizer verdadeiramente, mesmo sem saber, era: “Eu quero que essa alegria, essa esperança, não seja jamais traída”. Porque tinha razão o meu mestre Carlo Quijano quando, há muitos anos, comecei a fazer jornalismo ainda quase criança com ele, no semanário Marte. Ele me dizia: “Qualquer um que lhe olhe nos olhos já vê claramente sua vocação de pecado. Você é um pecador de nascença e eu não tenho nada contra. Peque sim. Mas tem um pecado que não tem redenção, que não merece perdão. É o pecado contra a esperança”. Essa é a imensa responsabilidade da esquerda em meu país. Não trair nunca essa boa energia de vida que foi vitoriosa nas eleições.
Uruguai hipotecado
O governo da Frente Ampla, que está nascendo agora, é o resultado do desenvolvimento de um movimento popular que jamais falou que iria ganhar o governo para fazer o socialismo. Seria irreal prometer isso. O que se prometeu foram coisas mais moderadas, modestas, que são as mais ou menos realizáveis, que eu espero que sejam realizáveis em um país quebrado, desesperançado como é o Uruguai. A primeira  prioridade é lutar contra a pobreza. A segunda, resgatar os filhos perdidos de um país que perdeu a população jovem, condenada ao exílio econômico, expulsa pelo sistema de poder. E a terceira, vinculada com as outras duas, é buscar um desenvolvimento econômico que não contradiga a soberania nacional sobre os recursos básicos e que permita a criação de fontes de emprego. O problema do Uruguai é que o país foi convertido pela estrutura dominante em um banco. O banco quebrou e assim estamos. A esquerda recebe um país hipotecado, com  compromissos de dívida externa terríveis, pesadíssimos. Esse é o drama latino-americano em geral, é uma soberania condicionada. Você é independente até um certo ponto. Porque depois, quem decide são os credores. É o resultado de viver em um estado de dívida perpétua, pagando para se endividar mais e mais.
Lula
Não pretendo explicar para o brasileiro como são as coisas aqui. Não sou de vender gelo a esquimós. Estou aqui aprendendo, perguntando. No caso do governo Lula, há uma distância entre as expectativas e a realidade. É um problema da esquerda no mundo, a perda de identidade. Ela passa a não se diferenciar do que combate. Em nome do realismo, se sacrificam alguns princípios fundamentais do movimento  socialista, ou como queira chamá-lo, já que teve muitos nomes. Lembro de ver, quando era jovem, um filme dos irmãos Marx. Groucho estava conduzindo um trem e não havia mais lenha. Então, ele começou a destruir os vagões com um machado, para alimentar a caldeira. Ele conseguiu chegar até a estação, mas apenas com a locomotiva. Chegou um trem sem trem. Esse é o perigo que corre a esquerda. Não é inevitável, mas é um perigo.
Projeção internacional do Brasil
O que eu resgataria do governo de Lula é a projeção internacional, essa vontade de fazer uma frente unida dos países que vivem situações semelhantes, que têm problemas semelhantes e um destino comum a conquistar. Que têm essa urgência imediata da restauração da dignidade ferida na negociação financeira, comercial e cultural. Sem essa união, não tem possibilidade. Nenhum país tem. O Brasil pode achar que tem, pela sua dimensão imensa. Mas a situação é a mesma. Por maior que o Brasil seja, não tem a possibilidade de se salvar na solidão. Já está na hora do sul do mundo recuperar aquela energia perdida dos velhos tempos, há 40, 50 anos, quando se faziam aquelas conferências do Terceiro Mundo, que era um mundo independente dos dois blocos, capitalista e comunista. Era a emergência de uma terceira possibilidade e chegou a ter muita força, mas depois se perdeu na névoa do tempo. E também os organismos que existiam
para defender o preço dos produtos básicos, que morreram todos, exceto a OPEP. Já é hora de acabar com a impunidade dos poderosos nos grandes mercados, financeiros e comerciais, e no panorama cultural mundial  também. Eles são os donos de nossos sonhos, de nossas opiniões, das informações que recebemos ou não, de acordo com a vontade de quem manda. Já é hora de recuperar isso tudo.
União é a chave
Para poder fazer frente a essa negação da esperança, é preciso concretizar uma política conjunta do Uruguai com o Brasil e a Argentina. Aí está a chave de tudo. Cito esses dois porque, no caso do Uruguai, são os vizinhos mais diretos, mas deveria envolver toda a área do cone sul. Fazer uma política conjunta do Mercosul ampliado, como for possível. A idéia de que você pode se salvar sozinho não tem mais nenhuma relação com a realidade dos dias de hoje. Sozinhos, estamos fritos. A solidão nos condena ao fracasso.
Os EUA e o medo
A propósito das outras eleições, que aconteceram dois dias depois das nossas, em um outro país, um pouco maior que o Uruguai, e que ocupa um pouco mais de espaço na mídia universal, elas consagraram o presidente do planeta, senhor George W. Bush. Na eleição do Uruguai, que não teve nenhuma repercussão neste mundo que confunde a grandeza com o tamanho grande dos países e das pessoas, foi uma vitória contra o medo. Na campanha política, a direita tentou aterrorizar a população dizendo que a Frente Ampla era uma conjunção de forças dirigida por tupamaros, seqüestradores, estupradores, ladrões e assassinos. Eu vi pela televisão o discurso final do vice-presidente do partido Colorado, que é o partido do governo atual. Ele lançou uma terrível advertência: se a esquerda ganhar, todos os uruguaios seriam obrigados a se vestir iguaizinhos, como os chineses na época do Mao.
Sobre o plebiscito das águas, também uma campanha  de terror, anunciando o pior. Águas envenenadas, sujeira, cheiro fétido, o fim dos esgotos, um panorama terrível, apocalíptico. E o pessoal não deu bola, a população votou contra o medo. Acho que nas eleições dos EUA o medo ganhou. Uns dias antes das eleições, as pesquisas apontavam uma preocupante paridade entre Bush e Kerry. E aí, apareceu, não sei como, deve ser a divina providência, esse personagem que parece tirado  do carnaval uruguaio, com aquela barba longa, que responde pelo nome de Bin Laden. Ele aparece para assustar o mundo anunciando que vai comer todos os nenês crus, que vai fazer todos os desastres. Dois apocalipses, três apocalipses, quinze mil torres de Nova York. Magnificamente, Bush subiu quatro pontos em um dia só nas pesquisas de opinião graças à ajuda proporcionada por esse que me parece um chefe de boy-scout (escoteiro). O lema do boy-scout é always ready, ou sempre alerta. Ele está sempre pronto. Acode cada vez que o sistema do medo necessita do grande assustador, esse alto funcionário da ditadura universal do medo.
O medo é importantíssimo não só porque pode eleger um presidente, como aconteceu aí com essa extorsão contínua, essa histeria do terrorismo que avança, das forças do mal, o Diabo que está aí perto, cheirando a enxofre, com chifre e rabo. Mas também para o poder militar. Que seria desta estrutura militar que hoje manda no mundo, dos 2,5 bilhões de dólares que são a cada dia destinados à indústria da morte, às despesas militares, sem o medo? Se não houvesse pessoas ou máquinas, como fabricar os demônios para justificar a existência da estrutura militar? E a mesma coisa em relação à mídia. O medo vende muito bem.
Tecelão
Meu último livro se chama Bocas do Tempo e são textos curtos, num estilo levemente parecido com o do Livro dos Abraços. São 333 histórias, mas isso não foi deliberado, foi o número que encontrei quando fiz o índice. É um número bom, dá sorte. Mas uma quantidade imensa de histórias ficou fora, porque quem escreve, tece. A palavra texto vem do latim textum, que significa tecido. Ou seja, quem escreve está tecendo, é um trabalho têxtil. Você trabalha com fios e cores, que são as palavras, as frases, os relatos. Eles vão se encontrando e há alguns fios que são lindíssimos, mas que não coincidem, não combinam. Então, com dor na alma, ficam de fora.
Foram oito anos de trabalho para esse livro, umas histórias simples, mas que de simples não tem nada. Quanto maior é a sensação que o leitor percebe de transparência, mais complicado é o trabalho que essa aparente simplicidade contém. Para mim, escrever é uma força enorme. E me dá uma alegria imensa também. No fim, quando consigo sentir que essas palavras são bastante parecidas com o desejo de dizer, fico com a certeza de que a condição para não ser mudo é não ser surdo. Ou seja, só é capaz de dizer quem é capaz de escutar. Sou um caçador de vozes e histórias. É a realidade que me conta as coisas que acho que vale a pena que sejam contagiadas.
Abraçado aos vencidos
Não sou um homem que tem ídolos, não idolatro ninguém. O mais próximo que tenho de um ídolo é um jogador de futebol, um cara que me acompanha quando escrevo, já que tenho um pôster dele no meu  escritório. Era um inimigo, pois jogou no Peñarol e sou torcedor do Nacional. Fui conquistado por ele, pelo que fazia e por sua personalidade.
Seu nome era Obdulio Varela e foi o herói de um episódio que os brasileiros chamam, com certo exagero, de “nosso Hiroshima”, a final da Copa de 50, quando o Uruguai ganhou, contra todas as possibilidades, do Brasil. Após a partida, os jogadores foram festejar essa impossibilidade. Mas ele fugiu do hotel e foi beber em um boteco do Rio.
Ele me disse que o que havia nas arquibancadas era uma besta, um monstro de 200 mil cabeças. “Eu os odiava”, contou. Depois, tomou uma, duas, três cervejas e via as pessoas, uma a uma, tristes, chorando. E pensou: “Como eu fiz isso com essa gente tão boa?”. E todos atribuíam a vitória a ele, “foi o Obdulio”, diziam. Por isso o admiro, ele não se acusou, não comemorou e passou a noite inteira abraçado aos vencidos.

(Publicado originalmente na Revista Fórum)


domingo, 12 de abril de 2015

Elvino Bohn Gass: Quem são, afinal, os verdadeiros ratos da política brasileira?


publicado em 11 de abril de 2015 às 11:56
ratosFoto: Luís Macedo/Agência Câmara
Ratos
Elvino Bohn Gass, via assessoria de imprensa da Liderança do PT na Câmara dos Deputados
Antes de Lula e Dilma, o Brasil era um país que não investia em infraestrutura. Deu no que deu: enormes complexos metropolitanos onde se amontoavam pessoas desempregadas, vivendo em casebres insalubres e submetidas ao fétido odor dos esgotos a céu aberto. A responsabilidade por isso é da política. Melhor dizendo, da ausência histórica de políticas que só passaram a enfrentar, de fato, esses males há uns poucos anos.
E não adianta espernear porque os números provam e o mundo já reconheceu: foi só depois de Lula e de Dilma que as populações periféricas passaram a ser alvo de políticas públicas de recuperação da dignidade desses milhões de excluídos. Antes, esses homens e essas mulheres não só conviviam com os ratos, como do ponto de vista governamental, eram tratados como tal.
Ratos… Esta semana, alguns oposicionistas aos governos do PT soltaram alguns deles antes do depoimento de um membro da direção petista na Câmara dos Deputados. Foi uma tentativa torpe e extremamente agressiva de associar a imagem suja dos bichinhos aos membros do partido.
Então, mais do que repudiar a exposição dos animais ao risco de serem pisoteados (como foram), valho-me da mal sucedida analogia oposicionista para perguntar: quem são, afinal, os ratos da política brasileira? Os que garantem níveis de emprego nunca antes alcançados, ou os que aprovam um projeto como o da terceirização que rói conquistas que estão sendo consolidadas há 70 anos? Os que garantem casa própria para milhões de brasileiros que nunca a tiveram, ou os que quando governaram roeram o Banco Nacional de Habitação jogando-o em transações escabrosas e não construíram uma moradia sequer?
Os que permitiram que o filho da faxineira chegasse à universidade, ou os que carcomeram o futuro dos jovens proibindo a abertura de novos cursos técnicos? Os que retiraram 30 milhões de pessoas da miséria, ou os que devoraram as nossas reservas quebrando o país três vezes?
Não, senhores oposicionistas, os ratos da política não somos nós, são vocês! Vocês que impedem a reforma política porque sempre foram sustentados pelo poder econômico. Vocês que entregaram o patrimônio público a preço de banana para os seus amigos ricaços. Os roedores históricos do dinheiro e dos valores desse país são vocês, que sustentaram a ditadura, que torturaram e mataram pessoas, que trocaram de partidos mil vezes, que impediram que a corrupção fosse investigada, que mantiveram preconceitos raciais, de classe e de gênero.
Vocês, que devastaram as nossas riquezas naturais, que poluíram as nossas águas e que aniquilaram nossas populações indígenas e quilombolas. Vocês, que sempre andaram por túneis subterrâneos da política, que se comportaram furtivamente como se não fossem responsáveis pela gigantesca diferença social deste país. Vocês, que politicamente, sempre agiram como ratos.
É por isso que quando nos deparamos com cenas como a dos ratos soltos na Câmara, ou quando assistimos os senhores marchando sem constrangimento ao lado de quem pede a volta dos coturnos covardes, nós não nos surpreendemos. Porque sabemos com quem estamos lidando. Estamos lidando é com as suas longas caudas, Longas como a dos ratos. E o pavor, a gente também sabe, é porque Dilma armou a ratoeira.
Elvino Bohn Gass é deputado Federal (PT-RS)  e Secretário Nacional Agrário do PT
(Publicado originalmente no site Viomundo)

Tijolinho Real: Dilma não vetará a PL 4330








Um dos assuntos mais comentados aqui pelas redes sociais ainda é a PL 4330 ou o Projeto de Lei que regulamenta a terceirização do trabalho. Depois de muita discussão, o  texto-base foi  aprovado na Câmara dos Deputados, em sessão tumultuada. Expressivos contingentes sociais torcem para que a presidente Dilma Rousseff vete o projeto. Dentre os partidos políticos, algumas decepções, como o voto fechado do PDT - quem diria - a favor do projeto de lei. O PT votou contra; uma ou outra defecção no PMDB; o PSDB, como já era previsto, votou fechado pela aprovação da PL 4330. No PCdoB, um partido que em toda a sua história nunca votou contra os trabalhadores, desta vez contou com uma honrosa exceção, representada pelo deputado neo-comunista pernambucano Carlos Eduardo Cadoca. Aqui torna-se difícil realizar uma clivagem ideológica. Nem Cadoca nunca foi comunista, e faz algum tempo que a turma do PCdoB deixou de sê-lo. Os trabalhistas do PDT também votaram pela aprovação do projeto. O senador Cristovam Buarque​, adjetivou de vergonhosa a posição do PDT. De fato, uma atitude que depõe contra a trajetória da agremiação à qual esteve vinculado atores políticos da estirpe de um Darcy Ribeiro e Leonel Brizola. Ressalve-se que toda a família Brizola, com a qual mantemos contato nas redes sociais, se manifestou contra a decisão do partido.

Na realidade, a aprovação da PL 4330 representa um grande retrocesso no que concerne às conquistas históricas da classe trabalhadora. Menores salários, mais acidentes, menos concursos públicos, enfim, uma crescente precarização das condições de trabalho. Estudos do DIEESE indicam que a redução salarial entre os terceirizados fica em torno de 29%. É um conjunto de medidas que só interessam ao capital. As entidades ligadas aos trabalhadores estão mobilizadas em todo o país no sentido de pressionar por sua reversão, hoje nas mãos da presidente Dilma Rousseff, que tem a prerrogativa de vetar o projeto.  Com raros lampejos de lucidez - caso da indicação de Renato Janine para a educação - o fato é que a presidente encontra-se num momento político delicado. Até seu Ministro do Trabalho já fez rasgados elogios ao projeto. É muito pouco provável que Dilma vete o projeto. Infelizmente. Essa tal governabilidade tolhe significativamente a margem de manobra dos governantes. A economia está nas mãos do PSDB e a política nas mãos do PMDB. Estamos em maus lençóis. 

sábado, 11 de abril de 2015

Os professores entraram em greve... E agora, senhor governador Paulo Câmara?






Não faz muito tempo, escrevemos um artigo sobre as primeiras negociações entre a categoria dos professores e o Governo do Estado. Falávamos ali de um possível impasse nessas negociações, o que poderia culminar na decretação de uma greve. Não deu outra. A categoria, em assembléia, resolveu decretar greve por tempo indeterminado. Os representantes do Governo Estadual foram para as rodadas de negociações apenas para dizer que as finanças públicas não permitiriam arcar com a recomposição salarial pleiteada pelos professores. Já estavam no limite da Lei de Responsabilidade Fiscal, que estipula o teto de 46,6% dos gastos da receita com a folha de pagamento dos servidores. A Lei de Responsabilidade Fiscal, se considerarmos suas finalidades, na realidade, é algo muito positivo. Ela contingencia uma margem de manobra dos governantes para os investimentos em políticas públicas determinadas pelas demandas da população. Do contrário, a máquina pública tende a torna-se apenas um cabide de empregos e nada mais. 

Parece não haver dúvidas de que a constelação de súditos que se se formou em torno do ex-governador Eduardo Campos entende muito bem de contas públicas. Alguns deles foram escolhidos ainda no tempo de militância política estudantil, nos bancos do Curso de Ciências Econômicas da UFPE. Depois, um número expressivo deles vieram do Tribunal de Contas do Estado e transitaram pelas áreas fazendárias da administração pública estadual, a exemplo do próprio governador do Estado, o senhor Paulo Câmara. Não seria nada humilhante para o governador informar para a população que o Estado encontra-se com suas finanças combalidas. Embora isso seja negado, na prática, todos os dias percebe-se isso muito claramente. A negativa parece ser, então, uma tentativa de não macular a imagem de bom gestor do ex-governador Eduardo Campos. Não sei como este cidadão vai se "arranjar". Durante a campanha ele prometeu que dobraria o salário dos professores. 

Essa política escancarada de renúncia fiscal e fundiária é, certamente, um dos fatores que estão comprometendo as finanças públicas estaduais. É isenção para isso, para aquilo, cessão de patrimônio público - terrenos e prédios (Fábrica da Tacaruna) - e para que? Alguém já fez a continha para saber o que isso representou em termos de geração de emprego e arrecadação de tributos? No final, a conta acaba sendo paga pelo arrocho contra os servidores públicos. 

Se o senhor Paulo Câmara conhecia todo esse contingenciamento das contas públicas estaduais, por que prometeu que dobraria os salários dos professores? Como fazê-lo nas circunstâncias atuais, onde sequer uma recuperação do poder de compra do salário dos servidores pode ser concedida? O senhor Paulo Câmara precisa entender que exerce uma função pública de altíssima responsabilidade, que não pode ficar atrelado aos interesses de grupos comezinhos. O Estado, para usarmos uma expressão do sociólogo Gilberto Freyre, está "inchado" desses cargos comissionados, uma prática para satisfazer os apetites dos apoiadores de ocasião. Devo admitir que, em razão do não comprometimento do seu projeto presidencial, o ex-governador até tentou passar a tesoura nesses cargos, já no final do seu mandato. O discurso da "meritocracia" não coadunava-se com essa prática. Meritocracia, meu caro, é concurso público. Preocupado em "acomodar" os apoiadores, o Paulo parece não ter dado muito atenção a essa questão.Deveria ter dado amplitude a esse lampejo de lucidez política do seu padrinho. Eis aqui, grosso modo, as razões pelas quais o Governo alega que não reúne as condições de conceder a recomposição salarial dos professores. O pleito dos professores é justo. É justíssimo, como diria aquele personagem do Chico Anísio. Só não sei como o senhor Paulo Câmara irá se "arranjar".  

Comenta-se que a bancada da situação na ALEPE não tinha muita coisa para falar sobre esses primeiros cem dias do Governo Paulo Câmara. De fato, não há muita coisa a ser mostrada mesmo. Isso ocorre de forma generalizada por todo o Brasil. No Maranhão, por exemplo, a única coisa que o comunista Flávio Dino conseguiu mostrar foram as peças de publicidade de campanha, quando ele pôs fim ao reinado da  oligarquia Sarney. Aqui, em primeiro lugar, ele deve uma boa explicação à categoria dos professores. Em segundo lugar, em razão da responsabilidade do cargo, em algum momento, ele terá que se pronunciar sobre a herança maldita deixada em sua poltrona no Palácio do Campo das princesas. Só  espero que ninguém resolva nos processar por dizer essas verdades. 

sexta-feira, 10 de abril de 2015

Je suis Michel Zaidan Filho



Em Pernambuco, parece-nos que voltamos a viver uma época de obscurantismo político, com o cerceamento da liberdade dos indivíduos em externarem suas opiniões sobre a gestão da res pública. Isso é muito grave. Gravíssimo. O cidadão que entra na vida pública e pensa que estará imune às críticas, certamente não está preparado para exercer nenhuma função pública. Melhor seria se continuasse cuidando da sua vida privada, lendo, escrevendo seus livros, trocando ideias sobre autores e coisas do gênero. Não possui a vocação necessária para as contingências impostas pela vida pública. Abnegação, renúncia, transparência dos seus atos, estrito cumprimento das leis que regem a administração pública, além da impessoalidade. Não sei qual desses princípios é o mais transgredido no atual momento político vivido pelo Estado de Pernambuco, mas, certamente, o que parece mexer mais com o brio dessa oligarquia em formação é o princípio da impessoalidade. A coisa pública para eles é uma simples transferência dos interesses familiares. Um puxadinho, um quintal recheado de pitangas roxas. 

Um desses dias, um preposto do grupo entrou no nosso perfil da rede social Facebook para nos agredir. Depois de duras respostas, optei por excluí-lo. Ele hoje ocupa uma das secretarias do Governo Estadual. São arrogantes, prepotentes e algozes dos seus críticos. Pela sua ascendência com o Dr. Arraes, mantínhamos uma certa admiração pelo ex-governador Eduardo Campos. Votamos nele na primeira eleição que ele ganhou para o Governo do Estado. O professor Michel Zaidan Filho também participou das primeiras reuniões para elaboração do programa de governo, além da definição do seu secretariado. Conta um amigo em comum, que ele havia afirmado que duas pessoas, em suas áreas de atuação específicas, poderiam dizer o que quisessem sobre o seu governo, sem medo de serem processados. Michel na área de política e Tânia Bacelar na economia. Pelo andar da carruagem - e a julgar pela ameaça de interpelação judicial contra o professor - essa promessa não foi cumprida.

Como bem lembra o Michel, por acaso é crime falar da inquestionável oligarquização dos negócios do Estado; do familismo amoral; do homem cordial; do patrimonialismo; do nepotismo. Penso que na próxima segunda-feira, os escritórios de advocacia terão muito trabalho pela frente. A lista dos futuros interpelados é grande: Robert Michels, Edward C. Banfield, Sérgio Buarque de Holanda, Max Weber a té o Papa Francisco, uma vez que essa história de nepotismo tem a ver com os sobrinhos de um deles. Ninguém tem dúvida de que o clã mantém acesa a chama e lutará pela perpetuação do espólio deixado pelo falecido. A quem isso interessa, afinal? ao povo de pernambuco, certamente não é. 

Conhecemos o professor Michel Zaidan numa palestra aqui na Fundação Joaquim Nabuco. Ele se encontrava meio perdido e fizemos a gentileza de encaminhá-lo até a sala de conferências. Já tinha uma grande admiração pelo mestre, em razão de suas ideias, ou mais precisamente, da coragem e dignidade em defendê-las. Essa relação consolidou-se no Programa de Pós-Graduação em Ciência Política da UFPE , onde ele foi o professor, o co-orientador e, sobretudo,o amigo de todas as horas. Não fosse pelo seu apoio, talvez não chegássemos a bom termo. 

Quem o conhece de perto, costuma destacar alguns traços marcantes de sua personalidade: a intransigência com alguns princípios que norteiam a sua conduta; a integridade; a solidariedade; a coerência; a autenticidade, a franqueza. Num dos últimos andares do CFCH, montou uma espécie de trincheira em defesa do interesse público. Por isso mesmo é tão perseguido, destratado e odiado pelos governantes de turno e seus áulicos ou prepostos a soldo, mantidos sob as tetas da Viúva. Outro dia precisamos escrever um longo editorial em sua defesa, depois dele ser vítima de calúnias e difamações, num artigo escrito - melhor seria dizer assinado - por um prefeito "cevado" pela oligarquia desde pequenininho. Até o corpo ele tatuou com os seus ídolos. Sempre que ele for atacado, estaremos aqui para defendê-lo. E não faremos isso por nenhuma questão de afetividade, mas, sobretudo pela admiração por sua coragem e honradez na defesa do interesse público. Je suis Michel Zaidan Filho.