É uma enorme
falácia apontar a existência de déficit nas
contas da Previdência dos trabalhadores urbanos no Brasil. Ela é
superavitária. Ocorre que através de medida provisória, foi aprovado um
contingenciamento de cerca de 30% dessa receita (DRU), transferidos para o
orçamento geral da União, que são usados para pagamento da dívida pública e
outras obrigações financeiras do governo. Há também um enorme inúmero de
inadimplentes que, no caso de grandes empresas, entes públicos, clubes de futebol,
bancos e outras instituições, chega a casa dos 400. Bilhões. Assim como, as
isenções e imunidades fiscais que desoneram muitas atividades e agentes
econômicos de pagarem à Previdência. Naturalmente, tudo isso pesa muito no
caixa da Aposentadoria, na hora de financiar os benefícios dos aposentados e
dos que estão em abono de permanência.
Mas a
principal razão que explica os intermitentes projetos de reforma da Previdência
Pública em nosso país tem a ver com o mercado financeiro, os as empresas
privadas de previdência complementar, criadas pelo governo federal para os
funcionários públicos através de emenda constitucional. O que significa isso? –
Significa mudar o modelo de contribuição variável e benefícios fixos, para o
modelo de contribuição fixa e rendimentos variáveis. Porque, limitando os
rendimentos da aposentadoria, o segurado será obrigado a contratar um plano
privado de aposentadoria, onde seus rendimentos serão variáveis, em razão da
aplicação no mercado financeiro de sua contribuição previdenciária privada. Ou
seja, com tal modelo a governo federal, estadual e municipal se desoneram do
financiamento integral dos proventos previdenciários e entregam aos humores das
bolsas de valores a rentabilidade da contribuição dos pensionistas. Imagine que
negócio da China: lucram o governo, as empresas de capitalização e os segurados
passam a depender do sobe-e-desce do valor das aplicações de suas contribuições
no mercado financeiro. Quantos fundos de capitalização já não quebraram,
deixando seus segurados a ver navios...
Existe
também o argumento injusto e desumano de atribuir à longevidade do povo
brasileiro a quebra do sistema previdenciário. Este é pior motivo para
privatizar a previdência social no Brasil. Aqui, começa-se a trabalhar muito
cedo e sem carteira assinada. Há também um enorme contingente de trabalhadores
autônomos, informais, precários que nem sempre contribuem para a previdência.
No entanto, graças ao progresso da medicina, da informação, da melhora das
condições sociais de vida, os brasileiros estão vivendo mais e demorando a
morrer. É um privilégio e um direito líquido e certo envelhecer com dignidade,
respeito, conforto e amparo financeiro e social. Não se pode condenar as
pessoas (que contribuíram ao longo da vida para a Previdência pública) porque
vivem demais ou durante muito tempo. É
um direito social, humano e geriátrico que lhe assiste. Cortar, diminuir,
congelar esses direitos previdenciários dos idosos é uma desumanidade que não
tem limite. Que a sociedade financie esse direito a envelhecer, através de uma
política progressiva de impostos ou contribuição. Mormente, daqueles que ganham
muito (inclusive com a especulação financeira) para financiar os que ganham
menos, ou não ganham nada. Mais ainda, no fim da vida laboral. Ao contrário
disso, é condenar à morte lenta milhões
e milhões de trabalhadores idosos que deram seu suor, lágrimas e sangue para
construir a riqueza deste país.
Michel Zaidan Filho é filósofo, historiador, cientista político, professor titular da Universidade Federal de Pernambuco e coordenador do Núcleo de Estudos Eleitorais, Partidários e da Democracia
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