Há alguns meses atrás - em meio à pandemia autoritária que atingia o continente americano - com base num artigo do jurista Rubens Casara, originalmente publicado na revista Cult - publicamos aqui pelo blog uma série de artigos tratando das ditaduras de um novo tipo instauradas no continente, inclusive abordando, em profundidade, o caso brasileiro. O artigo de Casara estava baseado num livro recente, do filósofo francês Michel Onfrey. Neste livro, Onfrey realizava uma excepcional apropriação das teses de George Oswell, no livro 1984, onde o autor inglês, num exercício premonitório, lança as bases sobre as características que norteariam os regimes ditatoriais no futuro.
Diferentes, talvez mais sutis, baseadas em outros métodos, mas não menos danosas seriam essas ditaduras de um novo tipo. O que ocorreu é que, durante os anos, as tecnologias que desenvolveram os dispositivos de controle social foram sensivelmente aprimoradas, de alguma forma facilitando a vida dos estados ditatoriais e seus asseclas de turno. As teses defendidas por George Oswell foram brilhantemente dissecadas por Onfrey e comentadas por Casara e por este editor aqui no blog. Essas teses foram cotejadas com a realidade observada no país e publicadas, com exemplos esclarecedores. Agora, diante da pandemia do coronavírus, vários projeções tem sido feitas acerca de como ficará o mundo depois dessa pandemia.
Os Estados que estão realizando o percurso da escalada autoritária - que traz no seu bojo um componente ultraliberal na condução da política econômica - mudariam sua conduta no que concerne ao atendimento das demandas dos desamparados pela crise de saúde pública? Como ficaria, por exemplo, o mundo do trabalho? O antropólogo David Graeber teria razão ao se referir aos "trabalhos de merda", numa referência aos home office, que estão mudando substantivamente as relações de trabalho? Neste contexto, quem, de fato, seriam os "trabalhadores essenciais"? Aqueles que reuniram condições de ficar em casa ou aqueles que tiveram que se expor ao vírus, por trabalharem em serviços essenciais, como os profissionais de saúde, os entregadores de mercadoria através de empresas de aplicativos? O ensino online poderia substituir definitivamente o ensino presencial, mesmo diante do grande déficit de pessoas sem acesso à internet e considerando-se o fato de não ser possível fazer download de merenda, uma vez que, no Brasil, até uma programa de férias - ou quarentena - torna-se extremamente complicada, uma vez que contingentes significativos de estudantes comem nas escolas?
Já ando recebendo em casa e-mails pedindo minha opinião sobre o assunto, numa perspectiva até certo ponto tendenciosa. Algo em torno de 50 milhões de brasileiros estão cadastrados naquilo que os especialistas denominam de "uberizacão". São trabalhadores informais, que atuam através das empresas por aplicativos - como Uber Ifood - sensivelmente desprotegidos. Agora, diante da crise do coronavírus - que nos obrigou a ficar em casa - esses profissionais passaram a ter uma importância capital. Serão tratados da mesma forma depois da crise do coronavírus? Ou o capital - que passou por uma refrega neste período - faria algum aceno para este tipo de trabalho?
A partir de agora, em série, esse debate terá um espaço aqui no blog Contexto Político e no seu canal no YouTube, criado recentemente, com o objetivo de ampliar essas discussões para um público maior. Participem com suas ideias, seus comentários, inscrevam-se no canal, deixem suas impressões e críticas. É uma forma de aprimorarmos nosso trabalho, principalmente nessa fase de reaprendizagem e reinvenção. Um grande abraço do editor.
Nenhum comentário:
Postar um comentário