pub-5238575981085443 CONTEXTO POLÍTICO.
Powered By Blogger

segunda-feira, 7 de novembro de 2016

Novembro azul: Sesi/PE realiza 2 mil exames gratuitos de prevenção ao câncer de próstata



O Serviço Social da Indústria de Pernambuco (Sesi/PE) reforça a campanha Novembro Azul, de prevenção ao câncer de próstata. A entidade oferece, a partir desta terça-feira (8), 2 mil exames gratuitos para diagnosticar a doença entre a população da Região Metropolitana do Recife. Até 17 de novembro, a Unidade Móvel da instituição estará na quadra do Quartel do Derby, das 8h às 13h, realizando os exames de ultrassonografia e PSA, exame de sangue que complementa o diagnóstico do câncer de próstata.
Podem realizar os exames homens a partir de 40 anos, que estiverem em jejum e levarem CPF e carteira de identidade. Pessoas com menos de 40 anos poderão realizar o exame, desde que possua encaminhamento médico. Os interessados devem comparecer ao local, a partir das 8h, para pegar uma das 150 fichas distribuídas diariamente para o atendimento. Mais informações pelo telefone (81) 3412.8330, pelo e-mail relacionamento@pe.sesi.org.br ou pelo WhatsApp (81) 9.8829.3330. Esses atendimentos no Derby são uma parceria entre o Sesi/PE e a Polícia Militar de Pernambuco.
Com esses exames de próstata, o Sesi/PE encerra seu programa de prevenção aos cânceres de mama e próstata, que ao longo deste ano beneficiará 32 mil pessoas com exames gratuitos, sendo 16 mil de cada. “Esse programa faz parte do compromisso social do Sesi em promover a qualidade de vida da população, especialmente do trabalhador da indústria. Por isso, temos atuado firmemente em facilitar o acesso de homens e mulheres aos exames necessários para obter um diagnóstico precoce do câncer de próstata e mama, que aumenta as chances de cura em 90% e reduz as sequelas do tratamento”, afirma o superintendente da entidade, Nilo Simões.
Ação educativa - Outra ação do Sesi/PE no Novembro Azul, é a realização de palestras educativas nas empresas para sensibilizar a população masculina sobre o câncer de próstata, que poderá fazer 61 mil novos casos este ano, de acordo com o Instituto Nacional do Câncer (Inca).
Serviço:
2 mil exames gratuitos para prevenir o câncer de próstata
Quando: 8 a 17/11 (exceto o feriado do dia 15/11), das 8h às 13h
Onde: Quadra do Quartel do Derby
Como: 150 exames diários, precisa pegar ficha a partir das 8h
Mais informações: (81) 3412.8330, relacionamento@pe.sesi.org.br ou (81) 9.8829.3330 (zap).
cid:image002.jpg@01D238D9.5EFC08C0

domingo, 6 de novembro de 2016

Charge!Laerte!

Resultado de imagem para charges/laerte

Artigo: A política energética "genocida" imposta aos países da América Central.




No ano de 2007, estivemos no Estado do Maranhão, com o objetivo de manter alguns contatos com as federações congregadoras das comunidades quilombolas daquele Estado. Num desses momentos, visitamos as comunidades quilombolas da cidade de Alcântara, assim como as famosas "agrovilas" construídas pelo Governo Federal, para abrigar as comunidades remanescentes de quilombos que foram retiradas de suas terras de origem, para a construção da famosa base de lançamento de foguetes da Aeronáutica. Conhecemos as lideranças do MABE - Movimento dos Atingidos pela Base de Alcântara - com as quais mantemos contato até hoje. 

Mas, o mais importante mesmo foram as entrevistas gravadas com líderes quilombolas da região, que nos forneceram informações importantíssimas sobre o longo processo de negociações com a Aeronáutica, assim como suas impressões acerca dos problemas enfrentados por aquelas comunidades em função da diáspora de suas terras originais. Por aquela época ainda eram exigidos os tais laudos antropológicos - abolidos nos governos da coalizão petista - para a concessão do título de posse de terra de quilombos. Era visível o descontentamento nas agrovilas. Alguns líderes nos relataram, por exemplo, que, não raro, era preciso percorrer quilômetros de extensão para se ter acesso ao pescado, o que provocava o seu estrago antes mesmo de se chegar ao destino. Para se ter acesso aos recolhimento dos cocos da palmeira babaçu, apenas em horas marcadas e com a autorização do pessoal da Aeronáutica. (...)

(Conteúdo exclusivo, liberado apenas para os assinantes do blog)

Editorial: As condições "ideais" para o desmonte dos direitos dos trabalhadores.


Resultado de imagem para desempregados no brasil

Já fazia algum tempo que não mantínhamos qualquer tipo de contato com o professor Ricardo Antunes, decano da prestigiada Universidade de Campinas, em São Paulo. No campo acadêmico, Ricardo foi, durante anos, considerado o maior especialista brasileiro nas relações de trabalho. Para mim, ele ainda não perdeu esse status. Nossos contatos foram mais estreitos, quando, na década de 90, éramos um abnegado estudioso do Partido dos Trabalhadores, e, quando tratávamos da composição social dos grupos que formaram aquela agremiação dos "trabalhadores", ele insistia em se contrapor, informando que estratos de intelectuais de classe média estiveram presentes na famosa reunião do Colégio Sion, em 10 de fevereiro de 1980, assim como membros de uma espécie de "elite" sindical, formada por integrantes do Novo Sindicalismo.

Agora o professor Ricardo Antunes nos brinda com um excelente artigo, publicado na edição de outubro do jornal Le Monde Diplomatique, onde discute as condições políticas, econômicas e sociais "ideais" para o desmonte dos direitos e garantias constitucionais (leia-se CLT) dos trabalhadores nas relações de trabalho: Governo de Exceção, parlamento submisso, judiciário de conluio e uma baita crise econômica, geradora de desemprego. (...)

(Conteúdo exclusivo, liberado apenas para os assinantes do blog) 

sábado, 5 de novembro de 2016

Artigo: PSB: um candidato presidencial para chamar de seu. Mesmo que este homem seja Alckmin.


Resultado de imagem para geraldo alckmin

Resultado de imagem para ana arraes

Em política, é fundamentalmente importante observar os movimentos do adversário. Aqui na província, apenas observando os movimentos, ninguém pode negar os projetos majoritários de atores políticos como o senador Armando Monteiro(PTB), o ministro Bruno Araújo(PSDB) e o também senador Fernando Bezerra Coelho(PSB). No plano nacional, em certa medida, já existe uma aliança entre socialistas e o PSDB, a julgar pelos movimentos das pombinhas e tucanos nessas eleições municipais de 2016. Geraldo Alckmin montou uma espécie de "cinturão presidencial paulista", contando, inclusive com o PSB, que segurou as pontas em cidades como Guarulhos e Campinas, ambas com mais de um milhão de eleitores. Os movimentos de Alckmin, aliás, foram muito além dos seus domínios paulistas, com a presença até mesmo aqui na província. 

A impressão que temos é que esse esboço de uma possível candidatura própria dos socialistas, tese levantada pelo prefeito eleito Geraldo Júlio e endossada pelo Deputado Federal Danilo Cabral, até onde se sabe, trata-se, tão somente, de afirma-se no contexto de uma possível aliança com os tucanos. Não há nome socialista com o capital político e eleitoral de um Geraldo Alckmin nas hostes socialistas (...)

(Conteúdo exclusivo, liberado apenas para os assinantes do blog)

P.S.:Do Realpolitik: Somados os eleitores dessas duas cidades, de fato, chegamos a uma média de um milhão e trezentos mil eleitores. Isoladamente, elas não chegam  a um milhão de eleitores, conforme informamos no post. Erramos. Mesmo assim, trata-se de um contingente eleitoral nada desprezível numa corrida presidencial.  

sexta-feira, 4 de novembro de 2016

Editorial: A criminalização dos movimentos sociais


Há pouco tempo recebemos uma nota do Movimento dos Trabalhadores sem Terra, MST, denunciado a invasão da Escola Florestan Fernandes, localizada em Mogi das Cruzes, interior de São Paulo. A invasão foi realizada pela Polícia Civil do Estado de São Paulo, em parceria com a Polícia Civil do Paraná, com o propósito de cumprir um mandado de prisão contra uma senhora que, supostamente, se encontrava na escola. Até aqui, nenhuma novidade. Os mandados de prisão expedidos pela justiça nem sempre são cumpridos de forma consensual entre as partes, não raro, exigindo o emprego de alguma força. O problema, nesta caso em particular, é o "simbologismo" da invasão de uma escola, que pertence ao MST, de forma truculenta, com emprego excessivo de força, cujo mandado foi apresentado apenas pelo celular de um dos policiais, caracterizando-se como uma medida arbitrária, típicas de Estado de Exceção, como bem disse o ator Wagner Moura ao comentar o assunto. (...)

(Conteúdo exclusivo, liberado apenas para os assinantes do blog)

Em nota, o MST critica a "criminalização" dos movimentos sociais.



"Mais uma vez o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) é vítima da criminalização por parte do aparato repressor do Estado Paranaense. A ação violenta batizada de “Castra” aconteceu na nessa sexta-feira (04/11/2016), no Paraná, em Quedas do Iguaçu; Francisco Beltrão e Laranjeiras do Sul; também em São Paulo e Mato Grosso do Sul.
O objetivo da operação é prender e criminalizar as lideranças dos Acampamentos Dom Tomás Balduíno e Herdeiros da Luta pela Terra, militantes assentados da região central do Paraná. Até o momento foram presos seis lideranças e estão a caça de outros trabalhadores, sob diversas acusações, inclusive organização criminosa.
Desde maio de 2014 aproximadamente 3 mil famílias acampadas, ocupam áreas griladas pela empresa Araupel. Essas áreas foram griladas e por isso declaradas pela Justiça Federal terras públicas, pertencentes à União que devem ser destinadas para a Reforma Agrária.
A empresa Araupel que se constitui em um poderoso império econômico e político, utilizando da grilagem de terras públicas, do uso constante da violência contra trabalhadores rurais e posseiros, muitas vezes atua em conluio com o aparato policial civil e militar, e tendo inclusive financiado campanhas políticas de autoridades públicas, tal como o chefe da Casa Civil do Governo Beto Richa, Valdir Rossoni.
Lembramos que essa ação faz parte da continuidade do processo histórico de perseguição e violência que o MST vem sofrendo em vários Estados e no Paraná. No dia 07 de abril de 2016, nas terras griladas pela Araupel, as famílias organizadas no Acampamento Dom Tomas Balduíno foram vítimas de uma emboscada realizada pela Policia Militar e por seguranças contratados pela Araupel. No ataque, onde foram disparados mais de 120 tiros, ocorreu a execução de Vilmar Bordim e Leomar Orback, e inúmeros feridos a bala. Nesse mesmo latifúndio em 1997 pistoleiros da Araupel assassinaram em outra embosca dois trabalhadores Sem Terra. Ambos os casos permanecem impunes.
Denunciamos a escalada da repressão contra a luta pela terra, onde predominam os interesses do agronegócio associado a violência do Estado de Exceção.
Lembramos que sempre atuamos de forma organizada e pacifica para que a Reforma Agrária avance. Reivindicamos que a terra cumpra a sua função social e que seja destinada para o assentamento das 10 mil famílias acampadas no Paraná.
Seguimos lutando pelos nossos direitos e nos somamos aos que lutam por educação, saúde, moradia, e mais direitos e mais democracia."

Le Monde: Desafios da reorganização da esquerda brasileira


Com um resultado eleitoral perto do catastrófico, esquerda brasileira precisa se reinventar a partir de três tarefas: balanço crítico, renovação programática e promessa para o futuro
por Juliano Medeiros

O resultado das eleições municipais deste ano ensejou, nos últimos dias, diversas análises sobre os rumos da esquerda. De todos os lados, analistas buscam compreender as razões que levaram à acachapante vitória eleitoral dos partidos associados ao golpe que conduziu Michel Temer à Presidência da República. A ideia de que o terreno perdido nos últimos meses exigirá uma necessária reconfiguração das forças progressistas parece encontrar eco em muitas vozes. No entanto, a “reorganização da esquerda” pode ter distintos significados a depender de como se interpreta a derrota que o impeachment e as eleições municipais deste ano representaram.
Parece consenso que é chegada a hora de um profundo ajuste de contas na esquerda brasileira. O fim do ciclo do PT – que se anunciava desde junho de 2013 e se concretizou tragicamente com o impeachment de Dilma Rousseff – abriu um período de definições estratégicas para as forças populares. Um claro processo de reconfiguração da esquerda está em curso, dentro e fora das organizações tradicionais como partidos, sindicatos e entidades estudantis. No âmbito das organizações partidárias esse movimento é mais nítido. No PT, o movimento “Muda PT” representa para seus integrantes a derradeira batalha para salvar o simbolismo e a representatividade que o partido ainda detém entre parcela cada vez menor dos trabalhadores. Na Rede Sustentabilidade, as divisões internas chegaram a um limite insuportável, opondo lideranças de esquerda ao indecifrável projeto de Marina Silva. No PSOL, o crescimento do partido, que ocupou parte do espaço deixado pelo PT nas eleições municipais deste ano, exige definições sobre seu papel no novo ciclo que se abre para a esquerda brasileira. E até o pequeno e monolítico PSTU sofreu os efeitos da pressão em favor da reorganização: uma dissidência de centenas militantes deixou a legenda, rejeitando a tática do “fora todos” levada a cabo pelo partido durante o impeachment.
Mas esse processo de reconfiguração da esquerda não se resume aos partidos. Aliás, é possível afirmar que é precisamente fora da vida partidária que essa reconfiguração se processa de forma mais dinâmica. O esgotamento do ciclo do PT – que nada mais é que o esgotamento de uma tática que envolveu centenas de organizações políticas e sociais em favor do chamado “pacto de classes” – já se nota no âmbito dos movimentos sociais há algum tempo. O surgimento de novas lutas, sobretudo nas grandes cidades, novos ativismos e formas de intervenção política, expressam também um novo momento para a esquerda social. Movimentos como o Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST), Movimento Passe Livre (MPL), as ocupações de escolas em todo o país, o fortalecimento do movimento de mulheres contra o machismo e a violência, os novos movimentos de contracultura e o ativismo digital de coletivos como o Mídia Ninja, marcam o início de um novo ciclo na política brasileira. Isso não significa, é claro, que as formas “tradicionais” de organização política, como sindicatos, organizações de bairro ou entidades estudantis estão superadas. Significa apenas que esses instrumentos terão de ceder espaço a novas formas de ação política surgidas das transformações que o Brasil e o mundo vivenciaram nos últimos vinte anos, reinventando suas práticas e formas de organização para recuperar a legitimidade perdida.

O impeachment como fim de um ciclo
Afirmamos que o impeachment de Dilma marca o fim de um ciclo. Mas poderíamos ir além. Na verdade, o golpe que levou Michel Temer à presidência representa ao mesmo tempo o fim de dois ciclos. O primeiro é um ciclo mais geral da política brasileira, que começa com a Constituição de 1988. O golpe representa a ruptura do pacto que permitiu, ao longo de quase trinta anos, algum nível de estabilidade política e a garantia mínima da progressiva ampliação das políticas sociais. Mesmo no auge do neoliberalismo dos governos de Fernando Henrique Cardoso (1995-2002) direitos foram ampliados, apesar do retrocesso representado pela reforma do Estado promovida naquele período. Apesar de favorável às forças do conservadorismo, esse pacto permitiu o fortalecimento político e social do campo democrático-popular durante os anos 1990, a livre organização dos movimentos sociais e a vitória eleitoral da esquerda em 2002, mesmo que sob circunstâncias que se mostrariam fatais anos depois. Ao congelar os investimentos públicos por 20 anos, destruir o já insuficiente sistema que regulava a exploração do petróleo e retomar um agressivo ajuste no sistema de previdência, Temer implode o pacto que garantiu a estabilidade ao regime político brasileiro nas últimas duas décadas e encerra o clico instituído pela Constituição de 1988, abrindo um período de luta aberta pelos rumos do Estado.
Por outro lado, na esquerda também se encerra um ciclo. A hegemonia do PT e do bloco histórico que o sustentou desde os anos 1980 chegou definitivamente ao fim. O historiador Lincoln Secco, em livro sobre a história do PT,1 afirma que o partido viveu três momentos em sua história. O primeiro foi marcado por um partido radical que liderava a oposição social à ditadura militar. O segundo momento é aquele em que o PT se consolida como oposição parlamentar ao neoliberalismo, quando o partido se institucionaliza e passa a viver a experiência de governar importantes municípios. O terceiro momento, que se inicia com a vitória de Lula em 2002, é aquele caracterizado pela ascensão do PT à condição de “partido de governo”. Nessa terceira e última etapa do processo de aggiornamento2 do partido à dinâmica do sistema político brasileiro, o PT incorpora plenamente a estratégia do pacto de classes, isto é, de uma aliança reformista assentada no crescimento econômico com distribuição de “dividendos” para todas as classes. Com o processo de impeachment e a implosão do pacto que o PT mantinha com diferentes frações da burguesia brasileira, o partido e seu campo de aliados tende a perder definitivamente a hegemonia sobre a esquerda brasileira. É o fim desse outro ciclo que exige definições urgentes sobre os rumos da reorganização das forças populares.

Três tarefas urgentes para a reorganização da esquerda no Brasil
Nossa situação política é inédita. Diferente de outros momentos da história, quando a esquerda foi coagida fisicamente pelas forças do conservadorismo e da reação, o que vemos hoje é um processo de “demonização” das organizações de esquerda que alcançou níveis inéditos desde a redemocratização. Combinando o desgaste promovido pela crise econômica e seus efeitos sobre os mais pobres com as denúncias de corrupção envolvendo altos dirigentes do governo e do PT, a mídia monopolista construiu com relativo sucesso uma associação quase automática entre “esquerda” e “corrupção/ineficiência”. Os partidos que compuseram o governo, como PT e PCdoB, sentiram mais fortemente os efeitos dessa narrativa no recente processo eleitoral. Mas ela não poupou nem aqueles partidos que jamais mantiveram qualquer envolvimento com atos de corrupção e nunca compuseram o governo Dilma, como o PSOL. A luta que se trava em torno das responsabilidades sobre a recessão econômica e a corrupção atingiu em cheio a esquerda.
Quais seriam, então, as tarefas para contornar essa situação? Evidentemente, não há um “manual de reorganização da esquerda brasileira”. Mas há alguns elementos indispensáveis para enfrentar esse gigantesco desafio, que podemos sintetizar no tripé balanço / renovação programática / promessa. Vejamos como se apresentam cada uma dessas tarefas:
a) Balanço:A mais urgente das tarefas para a reorganização da esquerda brasileira refere-se ao balanço da experiência dos governos petistas. Por mais de uma década, a esquerda brasileira se dividiu entre aqueles que apoiavam ou não o projeto liderado por Lula e Dilma. Por vezes, essa divisão tomava formas absurdas, onde uns se tornavam incapazes de ver os flagrantes limites dos governos de conciliação, enquanto outros fechavam os olhos para os inegáveis avanços que foram promovidos na expansão de alguns direitos sociais. Com o fim do ciclo do PT à frente do governo federal, torna-se possível desenvolver um balanço crítico e honesto dos avanços e limites que os governos petistas produziram. Exemplos não faltarão. Se por um lado é evidente que o crescimento econômico de quase uma década proporcionou uma melhoria nas condições de vida de parte expressiva da população mais pobre, com acesso a crédito, aumento real do salário mínimo e mais políticas sociais, por outro, não se pode esconder que a natureza do projeto de conciliação de classes não permitiu avanços mais profundos, manteve o país vulnerável à dinâmica do capital financeiro, fortaleceu o agronegócio predatório e deixou intocado o controle da informação nas mãos da mídia monopolista. Além disso, o mito conservador da “governabilidade” se impôs de tal forma sobre as iniciativas de participação direta da população sobre a política, favorecendo o fisiologismo e as alianças pragmáticas, que muitos terão dificuldades em admitir que o governo foi enredado em acordos que jamais deveria ter firmado. Por isso um balanço crítico e desapaixonado é indispensável para extrair as lições dos limites da conciliação de classes. Sem isso será impossível pensar um novo projeto político independente e comprometido com os interesses populares.
b) Renovação programática:O bloco histórico surgido com o PT na luta contra a ditadura militar representou uma grande novidade na cena política brasileira. Aquela esquerda, renovada pelos novos atores políticos que entraram em cena no final dos anos 1970, construiu um programa ao mesmo tempo radical e inovador para enfrentar os séculos de atraso e exploração que marcavam nossa formação social. Ele estava muito à frente do reformismo que caracterizava, já naquela época, os partidos comunistas no Brasil. O chamado “Programa Democrático-Popular”, aprovado no 5º Encontro Nacional do PT, em 1987, reunia um conjunto de tarefas anti-monopolistas, anti-imperialistas e anti-latifundiárias que conferiam à estratégia do partido um caráter profundamente anti-capitalista e radicalmente democrático. Esse programa, rompendo com a tradição que fora hegemônica na esquerda até então, apresentava uma nova interpretação do estágio de desenvolvimento do capitalismo no Brasil e preconizava uma tática de fortalecimento das organizações de base do campo popular, rechaçando a conciliação de classes em favor da independência política dos trabalhadores e trabalhadoras. O abandono desse programa por parte do PT e sua relativa desatualização deixaram a esquerda brasileira, no século XXI, com um enorme “déficit programático”. Ao mesmo tempo em que foram incorporadas novas demandas à agenda política da esquerda nos últimos anos, especialmente no campo dos direitos civis, pouco se avançou na correta interpretação das mudanças que o Brasil viveu durante as últimas três décadas. A consolidação do processo de urbanização do capital e suas contradições trouxeram novas formas de dominação política e econômica que ainda precisam ser incorporadas à análise da esquerda. Essa renovação programática – econômica, política, social, cultural, ideológica – é uma condição indispensável para “reconectar” a esquerda ao Brasil real.
c) Promessa: Os efeitos da derrocada do PT terão efeitos de longo prazo. Uma geração inteira de militantes, desiludida com as inaceitáveis concessões feitas pelo partido ao longo de quase catorze anos, já não acredita que outro instrumento partidário possa responder à tarefa histórica de liderar a reorganização da esquerda brasileira. Isso é natural. A decepção é profunda, tanto quanto a indignação pelos erros cometidos – em especial em relação à corrupção e à retirada de direitos dos mais pobres, marca do último ano de governo Dilma. Por isso, além de realizar um balanço crítico da experiência petista no governo federal e promover uma profunda atualização programática, a esquerda deverá lançar mão de uma promessa: a de que é possível construir um caminho diferente no futuro. Numa de suas principais obras,3 Hannah Arendt afirma que é a promessa que valida o perdão; isto é, apenas o compromisso de que algo novo está sendo construído no lugar do velho é que permite expiar os pecados do passado. Mesmo aqueles que nada tiveram a ver com os erros cometidos terão de consignar seu compromisso com a promessa de que nada será como antes. O perdão, que exime a esquerda das consequências dos erros cometidos, só pode ser validado pela promessa do novo. E esse novo que é reclamado pela nova geração de lutadores e lutadoras que está nas ruas não pode ser nada menos que uma esquerda horizontal, pluralista, radicalmente democrática e profundamente comprometida com os interesses dos explorados e oprimidos. Uma esquerda anticapitalista, socialista e classista, mas também feminista, negra, jovem, disposta a combater qualquer tipo de opressão. Perdão e promessa: eis o binômio do qual a reorganização da esquerda não pode fugir.

Os atores da reorganização
Consideramos que as tarefas que mencionamos – balanço / renovação programática / afirmação do novo – não poderão ser bem-sucedidas sem atores dispostos a encará-las como indispensáveis à reorganização da esquerda brasileira. Para isso será necessário um amplo processo de diálogo entre aqueles dispostos a enfrentar o momento de defensiva estratégica que os setores populares vivem e dar um novo sentido à luta em favor de um amplo instrumento político que unifique os que lutam contra a opressão e a exploração.
Mesmo que os efeitos da ofensiva conservadora tenham sido devastadores, há diversos atores discutindo os rumos da reorganização da esquerda brasileira. No PT e na Rede Sustentabilidade há setores dispostos a debater a construção de uma nova síntese política “pós-PT”. Outras organizações políticas não partidárias também iniciam essa discussão. No âmbito dos movimentos sociais, novos atores já se apresentam como expressão concreta de um novo ciclo político que rechaça como limitadas as promessas do lulismo.4 Há ainda uma grande quantidade de intelectuais críticos que reivindicam uma profunda reflexão sobre os rumos do campo popular e democrático no Brasil, em favor de uma “nova esquerda” que se apresente como tal já a partir das eleições presidenciais de 2018. No meio desse turbilhão está o PSOL.
O PSOL é hoje o polo mais dinâmico da reorganização da esquerda brasileira e o partido mais bem localizado politicamente para enfrentar esse desafio. Isso se deve a algumas razões específicas que garantem a ele uma posição privilegiada nesse processo. O primeiro e mais evidente é o fato do partido ter mantido, ao longo de seus onze anos de vida institucional, uma profunda crítica à estratégia de conciliação de classes levada a cabo pelo PT. Por essa razão o PSOL é visto como um partido coerente, capaz de arcar com as pesadas consequências de ser oposição de esquerda aos governos petistas para conservar suas posições. Além disso, a tática que o partido assumiu durante o impeachment, quando sua militância e suas figuras públicas se engajaram plenamente na luta contra o golpe, permitiu ao PSOL conectar-se com o mais importante movimento de massas ocorrido no país desde junho de 2013. Para os milhares de lutadores e lutadoras que tomaram as ruas contra o golpe, o PSOL foi visto como um partido capaz de deixar as diferenças de lado para unir forças em favor de um objetivo maior: a defesa da democracia. Por fim, vivendo toda a sua existência fora da dinâmica do Estado, o partido compreende melhor os novos atores sociais que emergiram na última década. Esses lutadores e lutadoras têm uma forte empatia com o partido e muitos concorreram pelo PSOL nas eleições deste ano. Portanto, se o partido tiver a sabedoria política necessária para se colocar à altura do momento histórico, ele pode se tornar a expressão “natural” de uma nova síntese política para essa nova esquerda que está se formando no Brasil. Mas para isso, será necessário responder às inadiáveis tarefas que mencionamos neste ensaio.

Juliano Medeiros
Presidente da Fundação Lauro Campos e membro da Executiva Nacional do PSOL.


Ilustração: Daniel Kondo

1 Lincoln Secco. História do PT – 1978-2010. Cotia: Ateliê Editorial, 2011.
2 Termo em italiano que signfica atualização ou adaptação.
3 Hannah Arendt. A condição humana. Rio de Janeiro: Editora Forense Universitária, 2000.
4 Para saber mais sobre o lulismo como expressão da política de pacto de classes nos governos petistas ver André Singer. Os sentidos do lulismo: reforma gradual e pacto conservador. São Paulo: Companhia das Letras, 2012.
04 de Novembro de 2016
Palavras chave: Esquerdacrise na esquerdaciclo da esquerdapartidosmovimentos sociaisnova esquerdaPTPSOL

Charge!Aroeira via Facebook

Le Monde: Direito à cidade e desigualdades regionais


Na conjuntura favorável dos governos Lula, uma nova orientação foi dada à política de desenvolvimento regional visando à redução das desigualdades não só entre as regiões, mas, também, dentro de cada região
por Jan Bitoun e Lívia Miranda

Ficaremos mais distantes de um desenvolvimento socialmente equilibrado, ambientalmente sustentável e politicamente participativo para os municípios brasileiros (Crédito: Klaus Balzano)
A leitura das desigualdades regionais se deu desde meados do século passado comparando indicadores econômicos e sociais das cinco grandes regiões do país: Sudeste, Sul, Centro Oeste, Nordeste e Norte. Consolidou-se no senso comum uma representação de um Brasil desenvolvido cujo núcleo está no Sudeste e no Sul e de um Brasil subdesenvolvido, nas demais grandes regiões. Com efeito, a concentração no Sudeste e no Sul de uma estrutura industrial diversificada em especial nas metrópoles e nas suas proximidades foi se configurando durante o processo veloz de industrialização tardia do país, acelerado dos anos 1940 a 1970.
O direito à cidade em tempos de crise
A série “O direito à cidade em tempos de crise” é uma parceria do Le Monde Diplomatique Brasilcom o INCT (Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia) Observatório das Metrópoles. A série tem como objetivo suscitar a reflexão e monitorar os avanços e conquistas na afirmação do direito à cidade no Brasil, denunciar retrocessos e apontar tendências para o futuro das cidades brasileiras.
A cidade transformou-se, em pleno século XXI, no palco principal das lutas políticas e sociais. A reprodução da vida, individual e coletiva, biológica e social, depende cada vez mais da qualidade do meio urbano construído que se expressa na forma social que chamamos de cidade, mas que também se expressa na sociedade urbana global.
Ao mesmo tempo, a atual crise do capitalismo tornou a cidade uma nova fronteira de escoamento do capital sobre acumulado e financeirizado. Estes dois movimentos tornaram a cidade palco e objeto das lutas contemporâneas de classes, opondo a razão da reprodução da vida à razão da reprodução do capital. Esta contradição global está também cada vez mais presente no Brasil.
Com efeito, ingressamos na sociedade urbana com legado de cidades historicamente precárias, nas quais estão presente dois projetos antagônicos em disputa. De um lado, o representado pelos ideais, princípios e mecanismos da reforma urbana que obteve alguns avanços na afirmação do direito à cidade, no período 2003-2013. De outro lado, o projeto representado pela ideologia neoliberal que, em nome do empreendedorismo urbano, tem incentivado a adoção de políticas urbanas habilitadoras das forças mercantilizadoras do solo urbano, da moradia, privatização dos serviços coletivos, entre outros.
Mas qual desses projeto irá predominar diante do atual quadro de crise político-econômica de longa duração no país? Se caso a saída para a crise for conservadora e ultra liberal, isso representará um provável retrocesso das conquistas do direito à cidade no Brasil. E é esse um dos principais campos em disputa.
No início do século XXI, essa representação começa a se desfazer: o Centro Oeste transformou-se no celeiro da agropecuária de exportação; o Norte e suas populações, culturalmente diversas, é percebido pela ciência e pela mídia com um novo olhar graças à centralidade que têm hoje no mundo a biodiversidade e a sustentabilidade (Becker, 1999). As populações do Nordeste, especialmente as famílias em condição de pobreza ou de baixa renda, experimentaram nos últimos governos inovações importantes: universalização da energia elétrica, oportunidades educacionais, melhor proteção social, pequeno aumento da renda que permitiu ampliar o consumo, atraindo empresas de distribuição de bens e serviços. Um novo quadro foi se esboçando atestado por um novo padrão dos fluxos migratórios, reduzindo-se a migração para o Sudeste, e, frente à atual seca severa e prolongada, pela ausência dos saques e fluxos de retirantes que eram comuns em episódios anteriores. O gostinho da mudança foi vivenciado por segmentos numerosos na região: empregadas domésticas cuja profissão foi regulamentada, mulheres enfrentando o machismo, afro-brasileiros cujos ancestrais foram objetos do tráfego negreiro no Atlântico Sul, trabalhadores que em sua grande maioria ganham o salário mínimo que seguiu, durante alguns anos, uma trajetória de aumento diferenciado.
A crise atual é mais um espasmo de alta intensidade no cenário instável comandado, desde os anos 1990 pela acumulação financeira, cujo ritmo, nas palavras de Cláudio Egler, “está determinado pela capacidade de conquistar fundos privados, seja no mercado doméstico, seja no mundial, viabilizada, em grande parte, pelas políticas cambiais e monetárias do Estado-nação, que passa a cooperar e/ou a competir com outros Estados-nações pela captura desses fundos privados” (Ipea, 2002, p.85-86).
As instabilidades decorrentes das práticas especulativas dos setores rentistas movimentando seus ativos financeiros em escala global, as políticas de desenvolvimento regional, que visam fortalecer a coesão territorial e reduzir as desigualdades entre as regiões de um país, sofrem descontinuidades. Em conjunturas favoráveis, quando os Estados-nações conseguem capturar esses fundos, ganham importância. Quando as capacidades financeiras dos Estados-nações se reduzem, a ênfase passa a ser dada às poucas regiões e cidades competitivas com capital e infraestruturas já consolidados e bem articulados em cenários continental e global.
No Brasil, após a interrupção das políticas de desenvolvimento regional nos anos 1980 e a desativação das superintendências regionais, houve uma lenta retomada já na segunda metade dos anos 1990, definindo eixos de desenvolvimento inseridos no Plano Brasil em ação do governo de Fernando Henrique Cardoso, com ênfase dada em cada grande região a segmentos e áreas que receberam recursos para completar ou acelerar sua integração competitiva no ambiente continental e global. Muitos dos investimentos do PAC nos governos posteriores deram continuidade a essa orientação. Mas, na conjuntura favorável dos governos Lula, uma nova orientação foi dada à política de desenvolvimento regional visando à redução das desigualdades não só entre as regiões, mas, também, dentro de cada região; concebeu-se o Plano Nacional de Desenvolvimento Regional (PNDR), que objetivava carrear recursos e projetos para as áreas economicamente menos dinâmicas e com grande incidência de pobreza. A tensão gerada entre essas duas orientações de políticas de desenvolvimento em cada região demandava uma nova leitura das desigualdades regionais em escalas mais finas que aquela consagrada das cinco grandes regiões.
Tânia Bacelar de Araújo, explica no texto Nordeste, Nordestes: Que Nordestes? (2000) que se buscou “avançar na percepção das diferenciações existentes dentro da própria região Nordeste, destacando-se os novos subespaços dinâmicos, as diferentes trajetórias estaduais e metropolitanas, e os focos de resistência a mudanças”. Essa nova leitura, ressaltando a heterogeneidade e a complexidade das dinâmicas em curso nas regiões do país guiou a proposta da política urbano-regional policêntrica elaborada, sob a coordenação do professor Clélio Campolina Diniz, pelo Centro de Estudos e Gestão Estratégica, para subsidiar a concepção da dimensão territorial do desenvolvimento nacional no Plano Plurianual PPA 2008-2011 e no planejamento governamental de longo prazo (CGEE, 2007). Nessa proposta, ressaltava-se, ao lado da já reconhecida importância dos espaços metropolitanos, a relevância das cidades médias e das suas inserções regionais, próximas ou mais distantes a depender das dinâmicas territoriais que vivenciavam.
Como bem ressaltou Fernandes (2008), pensar o urbano na sua dimensão regional significa compreender a cidade como um fator de distribuição de infraestruturas, serviços públicos, qualidade de vida e oportunidades para a população no território. Nessa perspectiva, o direito à cidade não pode estar restrito ao acesso a políticas bens e serviços, deve estar articulado a uma visão mais ampla: a do direito a uma cidadania plena que se materializa quando todas as pessoas, vivendo em zonas urbanas ou rurais, tiverem acesso a uma vida com qualidade, acesso à moradia digna, à terra urbanizada e ao saneamento ambiental, ao transporte público e à mobilidade, à alimentação, à cultura e ao lazer, à participação.
Considerando a grande diversidade de municípios brasileiros, é preciso reconhecer a inseparabilidade do urbano e do rural, não somente nos traços da economia urbana, mas também no cotidiano da cidade. Favareto e Wanderley (2013, p.441) alertam que o processo de urbanização brasileiro alcançará efeitos diferenciados, mais inclusivo ou excludente, em função das opções estratégicas escolhidas para o desenvolvimento rural:
“[...] assumirá significados distintos, se em sua incidência sobre o mundo rural reforçar um ou outro desses projetos: a imposição, em nome da modernização da agricultura, dos padrões dominantes de trabalho, produção e consumo, que reitera a grande propriedade como o modelo ideal de empresa rural ou, inversamente, a implantação de uma modernização rural, pela qual os habitantes do campo tenham assegurado o acesso aos bens e serviços socialmente necessários e possam participar como protagonistas da gestão desse mesmo acesso”.
Nos médios e pequenos municípios a vida está imbricada de ruralidades. Em função disso, a garantia do acesso às condições de produção; o fortalecimento do cooperativismo, da agricultura familiar, do uso de tecnologias agroecológicas, da autonomia econômica, social e política das mulheres também são essenciais para que as pessoas que vivem da terra tenham efetivamente seus direitos de cidadania reconhecidos e o acesso equânime igualitário às políticas públicas. Nessa direção, o Plano Diretor, na esfera municipal, poderia ser o instrumento integrador das políticas territoriais, tanto urbanas quanto rurais, como define o Estatuto da Cidade (Lei Federal 10.257/01), no seu Art. 40, § 2°: “O plano diretor deverá englobar o território do município como um todo”, no entanto tal determinação esbarra na sobreposição de competências federativas (principalmente sobre a gestão do território rural) e na generalizada fragmentação das esferas de planejamento das políticas públicas no território.
No que concerne à dinâmica política dos movimentos sociais essa fragmentação é evidente. A agenda da reforma urbana foi construída nas metrópoles e dificilmente se transferirá para as médias e pequenas cidades. A agenda da reforma agrária, construída no campo, dificilmente transfere-se para as cidades. Tal fragmentação dificulta a construção de uma agenda comum de caráter territorial que privilegie a qualidade das infraestruturas para a promoção do desenvolvimento econômico e do bem-estar urbano ou rural: a conquista da segurança hídrica e a difusão de tecnologias adequadas de saneamento e conservação das águas; a conquista da segurança no acesso à terra seja para trabalhar, seja para morar; a conquista da inserção em cadeias produtivas curtas e longas seja para gerar riquezas, seja para se alimentar de modo mais saudável, respeitando e valorizando a diversidade cultural. Para isso, o acesso ao crédito e às tecnologias adequadas para empreender precisam ser mais difundidos e baseados sobre a confiança nos saberes que os produtores acumularam nas suas vivências com os seus lugares de vida. Para isso, precisa romper com a arrogância tecnoburocrática que caracteriza muitos aparelhos do Estado brasileiro (Bresser-Pereira, 1972).
Ainda na esfera das dinâmicas políticas dos movimentos sociais e urbanos é preciso ampliar as capacidades para identificar potencialidades e bloqueios que permitam a inclusão ou alheamento de políticas públicas no território: saúde, educação, habitabilidade, combate à pobreza extrema e iniciativas de fortalecimento cultural. Como define o IICA (2013): “Há capacidades fundamentais (aquelas que envolvem as privações básicas, como acesso à educação e a condições mínimas de vida e de saúde), capacidades instrumentais (as que incluem habilidades para a produção, a gestão e o desenvolvimento de atividades ou dimensões específicas da vida econômica, política e social) e capacidades institucionais (aquelas que repercutem sobre grupos sociais ou segmentos inteiros da população das áreas onde se concentra a pobreza)”.
O modelo de desenvolvimento econômico que se pretende, na base da PEC 241, parece fundado na alta remuneração dos setores rentistas, na continuidade do consumo de uma minoria abastada e na arrogância tecnoburocrática, reforçado pela expressão do ódio e da ignorância de segmentos sociais em relação àqueles que mal ergueram a cabeça no período recente, ignora a diversidade e voltará a concentrar investimentos em parcelas do território nacional, onde já estão concentrados.
Na cidade a previsão é de acirramento dos embates que ocorrem em escalas locais entre a concepção de planos estratégicos de City Marketing, envolvendo a realização de grandes eventos e de grandes projetos urbanos, tais como os Waterfront, de um lado, e, do outro, as tentativas de recuperação dos investimentos públicos por meio de instrumentos de gestão urbana e de introduçãode um modelo de desenvolvimento urbano mais inclusivo para a maior parte da população (habitação, mobilidade e saneamento).
No campo, o desmonte do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) certamente compromete fortemente o desenvolvimento de políticas territoriais (Territórios da Cidadania) cujo objetivo principal era fortalecer a agricultura familiar e colocar em prática os direitos à terra dos assentados, indígenas, quilombolas, de modo a valorizar a diversidade cultural do país e a difusão de uma “alimentação adequada e saudável que valorize a sociobiodiversidade e as culturas alimentares”de cuja existência esses segmentos sociais são portadores (Maluf, 2015).
A capacidade de inovação instituída, o investimento e a população mais qualificada também está concentrada, principalmente, nos níveis mais elevados da rede urbana, as metrópoles, e nos demais pontos vantajosos do território por terem recursos minerais, florestais e produções do agronegócio, para a maximização do lucro e do crescimento. Essa tendência ao desequilíbrio da rede urbana e ao acirramento das desigualdades regionais é tanto maior quanto menos desenvolvida for a região e a cidade que a polariza justo porque a menor renda média e pouca importância atribuída às competências inovativas da população reforçam a concentração ainda maior dos investimentos e serviços nos poucos núcleos superiores da rede urbana (Fernandes In: Bitoun; Miranda, 2008)
As transformações econômicas recentes vão impactar fortemente o formato de desenvolvimento agropecuário, industrial e de serviços. Evidencia-se nessa perspectiva a necessidade de valorização das cidades intermediárias localizadas principalmente no interior do país. Nelas os poucos equipamentos existentes, imprescindíveis ao desenvolvimento econômico e social, estarão ainda mais sobrecarregados com o evidente distanciamento de uma plataforma de expansão das políticas sociais de proteção e redistributivas. Dessa forma ficaremos mais distantes de um desenvolvimento socialmente equilibrado, ambientalmente sustentável e politicamente participativo para os municípios brasileiros.
Em um país de dimensões continentais e de exuberante diversidade territorial, é preciso ampliar e fortalecer uma agenda ampla pelo direito à cidade, capaz de reconhecer resistências e contraposições em que se inserem os pequenos e médios municípios. As principais iniciativas de políticas territoriais, de caráter limitado mesmo se às vezes bastantes inovador, resultam da ação dos entes infranacionais, estados e municípios, destacando-se os últimos por estarem mais diretamente influenciados pela qualidade da sociedade civil. Houve então um número significativo de experiências inovadoras em municípios brasileiros, sem que isso compensasse o caráter instável e descoordenado de políticas territoriais nacionais de desenvolvimento regional em múltiplas escalas.

Jan Bitoun e Lívia Miranda
Jan Bitoun é professor de Geografia da Universidade Federal de Pernambuco e integrante da rede de pesquisa INCT Observatório das Metrópoles e da Rede de Pesquisas sobre Cidades Médias – ReCiMe.
Lívia Miranda, doutora em Desenvolvimento Urbano e pesquisadora do INCT Observatório das Metrópoles, é professora-adjunta na Universidade Federal de Campina Grande.


Referências bibliográficas
ARAUJO, T. B. Nordeste, Nordestes: que Nordeste? In: Ensaios sobre o desenvolvimento brasileiro: heranças e urgências. Rio de Janeiro: Revan: Observatório das Metrópoles, 2000.
Becker, B. K. Brasil - Tordesilhas, ano 2000. Revista Território, Rio de Janeiro, ano IV. n° 7, p. 7-23. jul./dez, 1999
Bresser-Pereira L. C.. Tecnoburocracia e Contestação. Petrópolis: Editora Vozes, 1972.
Bresser-Pereira, L. C. http://www.conversaafiada.com.br/brasil/bresser-pereira-perdemos-a-ideia-de-nacao
Bitoun, J.; Miranda, L. Desenvolvimento e cidades no Brasil: Contribuição para o Debate sobre as Políticas Territoriais. Recife: Observatório das Metrópoles, FASE, 2008.
CGEE. Regionalização para o Plano Plurianual PPA – Final Proposta para um Brasil Policêntrico. Brasília, 2007.
IPEA. Caracterização e tendências da rede urbana do Brasil: configurações atuais e tendências da rede urbana / IPEA, IBGE, UNICAMP. Brasília: IPEA, 2001. pp.85-86.
IICA, 2013. Práticas de desenvolvimento no Nordeste do Brasil: experiências dos projetos apoiados pelo FIDA. Brasília: IICA, 2013.
MALUF, R. Prefácio In GRISA, C.; SCHNEIDER, S. (Orgs.) Políticas públicas de desenvolvimento rural no Brasil. Porto Alegre: Editora da UFRGS, 2015.
THERY Herve; MELLO, N. A. Disparidades e dinâmicas territoriais no Brasil. Revista do Departamento de Geografia – USP, Volume Especial 30 Anos (2012), p. 68-91
WANDERLEY, M. N. B.; FAVARETO, A. A singularidade do rural brasileiro: implicações para as tipologias territoriais e a elaboração de políticas públicas. In MIRANDA, C., SILVA, H. (Orgs.). Concepções da ruralidade contemporânea: as singularidades brasileiras. Brasília: IICA, 2013. (Série Desenvolvimento Rural Sustentável; v.21), p. 413-472.
03 de Novembro de 2016
Palavras chave: Série especialDireito à cidadedesigualdadedesigualdades regionais

quinta-feira, 3 de novembro de 2016

Falta diversidade nas feiras literárias brasileiras, diz criador da FLUPP


Écio Salles, criador da Festa Literária das Periferias, critica falta de “insistência” em garantir a representatividade em eventos literários no país
A FLUPP acontece entre 8 e 13 de novembro, na Cidade de Deus (Foto: Divulgação)
A FLUPP acontece entre 8 e 13 de novembro, na Cidade de Deus (Foto: Divulgação)
Paulo Henrique Pompermaier
Desde 2012, quando foi criada no Rio de Janeiro, a Festa Literária das Periferias (FLUPP) já passou pelo Morro dos Prazeres, pela Babilônia, Mangueira e por Vigário Geral. Neste ano, em sua quinta edição, chega à Cidade de Deus a partir da próxima terça (8). “A gente percebia uma demanda por algum festival literário com envergadura na cidade que pensasse essa diversidade de territórios, que não excluísse a favela. E percebia também que tinha uma juventude que, a despeito dos dados sobre leitura no país, não só liam como gostavam de escrever. E a gente queria criar um canal para gerar oportunidades para esses jovens”, conta um dos criadores da FLUPP, Écio Salles.
Na programação deste ano há nomes como a dramaturga transgênero Jo Clifford, o rapper Mano Brown, a escritora negra Conceição Evaristo e o ensaísta alemão Hans-Ulrich Treichel. Para Salles, a diversidade – que na FLUPP aparece como uma “preocupação central” da curadoria – não é priorizada na maior parte dos grandes eventos literários do país. “As pessoas prestam muita atenção nas coisas feitas só por negros, mas ninguém se importa se um festival brasileiro, com artistas brasileiros, tem apenas brancos. Acham isso normal, acham que raça não existe”, critica.
Criada para ser um espaço de formação de novos autores e leitores nas periferias das grandes cidades, a FLUPP revelou nomes como Jessé Andarilho, publicado pela Objetiva em 2014, e Julio Pecly, que no ano passado lançou Cidade de Deus Z, pela Leya. Dez livros foram publicados desde o início das oficinas de formação, em 2012, e mais de cem nomes foram revelados. Em entrevista ao site da CULT, Écio Salles fala sobre a edição deste ano da feira e critica a falta de diversidade dos grandes eventos literários do país.
CULT – Falta representatividade e diversidades nos grandes eventos literários do Brasil?
Écio Salles – Eu acho que sim. Foi publicado nos jornais no ano passado a polêmica em torno da edição da FLIP sem autores negros e sem nenhum negro na curadoria. É claro, a gente conhece o Paulo Werneck, sabemos que não houve motivações racistas, mas por outro lado não há uma insistência em garantir a representatividade de diversidade brasileira nos grandes festivais, algo que para nós, na FLUPP, está sempre presente. Temos autores independentes de cor, raça, sexo, credo, mas sabemos que é muito importante existir também uma representatividade identitária, primeiro porque o país tem que se expressar em cor. Quando o Jailson de Souza, diretor do Observatório de Favelas, viu o público em uma edição da “FLUPP Pensa”, comentou comigo: “Puxa vida, isso aqui é o Brasil”. Porque tinha ali uma representatividade muito significativa, de pessoas de diferentes territórios cariocas, do Rio, muita gente da Baixada Fluminense participando, por exemplo, e gente de todas as cores e orientações sexuais, cada uma com as suas propostas e um diálogo que para nós é muito importante. Sabemos que o Brasil se formou de maneira que não favorece a preocupação com a inclusão e a diversidade, mas para nós é importante que isso exista, até para mostrar que, apesar de tudo, existem grandes autores negros, eles não são todos brancos. Se eles não estão presentes [nos grandes eventos literários] não é por falta, inexistência de bons escritores negros. Na nossa curadoria, sempre nos preocupamos em ter um equilíbrio entre autores homens e mulheres, de todo espectro de raça ou cor que existe e que, na verdade, resume o que é o Brasil. Nunca perdemos isso de vista, diferente dos grandes festivais, que não têm essa como uma preocupação central.
Uma festa literária como FLUPP mantém essa importância então, de garantir a diversidade?
Um dos aspectos que percebemos na forma como se organiza o Brasil, é que às vezes os considerados brancos não percebem os seus privilégios. E um dos privilégios que eles têm é justamente esse. As pessoas prestam muita atenção nas coisas feitas só por negros, mas ninguém se importa se um festival brasileiro, com artistas brasileiros, tem apenas brancos. Acham isso normal, acham que raça não existe. A gente procura, no nosso festival, incentivar essa diversidade e enfatizar esse aspecto, porque é importante dar visibilidade a escritores negros ou de periferia que têm um trabalho maravilhoso sendo realizado, até para que eles possam, também, se apresentar em outros festivais.
A FLUPP foi criada em 2012. Desde então, há uma projeção maior desses autores que participam do evento, e que estão fora dos eixos consolidados?
Historicamente a literatura brasileira tem algumas omissões muito importantes nesse campo. Por exemplo, o Lima Barreto foi marginalizado durante muitos anos e hoje parece inclusive que vai ser homenageado pela própria FLIP, o que é de uma importância histórica. O Lima foi o primeiro autor homenageado pela FLUPP. A gente dá muita atenção ao fato de termos homenageado o Lima Barreto, mas o festival era recém-nascido, então nosso impacto era pequeno na época. Mesmo assim foi importante. Uma autora como Maria Firmina dos Reis [considerada a primeira mulher a ser publicada no Brasil], por exemplo, que escreveu um romance incrível, é pouquíssimo citada por acadêmicos ou na própria história da literatura. Porém, uma geração mais recente, como Conceição Evaristo, para falar de uma escritora negra, e o Ferréz, pra falar de um escritor da periferia de São Paulo, têm ocupado um lugar cada vez mais destacado, então sem dúvida nenhuma que isso está melhorando. A gente só não pode achar que o fato de estar melhorando signifique que está resolvido, que os problemas acabaram. Ainda falta um longo caminho a ser trilhado, mas já avançou muito. A polêmica em torno da FLIP ano passado foi importante, mostrou que, pelo menos, não há mais silêncio sobre essas questões. As redes sociais colaboraram muito nesse sentido para que, pelo menos, possa haver alguma reflexão em torno dessas ausências, quando elas acontecem.
FLUPP 2016Quando: 8/11 a 13/11
Onde: Praça da Cidade de Deus (Praça Padre Júlio Groten) – R. Edgar Werneck, 1565 – Jacarépaguá
Quanto: Grátis
(Publicado originalmente no site da Revista Cult)

quarta-feira, 2 de novembro de 2016

Le Monde: Planos de saúde populares, desmonte do SUS e a arapuca Qualicorp


Se a nossa constituição traz a saúde como um direito de todos e dever do Estado, devendo este fornecer condições para o seu total acesso, por que existe o mercado de planos de saúde?
por Leandro Farias
Um acontecimento marcante na história de nosso país, a 8ª Conferência Nacional de Saúde, completa trinta anos. Realizado em Brasília em março de 1986, o evento reuniu políticos, gestores, profissionais e usuários do sistema de saúde e discutiu melhorias para o setor e mudanças no seu panorama. O relatório final, produzido pelos participantes, serviu de embasamento para que os parlamentares que compuseram o Processo Constituinte Brasileiro de 1987 elaborassem o capítulo da Constituição de 1988 que abrange o direito à saúde, que vai dos artigos 196 ao 200. A partir disso, convido os leitores a fazer a seguinte reflexão: Se a nossa constituição traz a saúde como um direito de todos e dever do Estado, devendo este fornecer condições para o seu total acesso, por que existe o mercado de planos de saúde?
Em 1998, o Estado legitima essa prática através da Lei n. 9.656 e cria uma agência para regular e fiscalizar o setor, por meio da Lei n. 9.961 de 2000.A mesma lei que cria a agência prevê em seus artigos 6 e 7 que a diretoria do órgão será composta por indicação política. Segundo dados do TSE, nas eleições de 2014, os planos de saúde doaram em torno de R$ 52 milhões, contribuindo para 131 candidaturas, desde deputado estadual até presidente da República. Empresa líder no segmento de planos de saúde, com cerca de 5 milhões de usuários em sua carteira de clientes, a Qualicorp doou R$ 6 milhões. Qual seria a contrapartida de tantas doações?


Ministro da Saúde Ricardo Barros durante VII Fórum Nacional do Ensino Médico (Crédito: Erasmo Salomão/MS)
O governo Temer nomeou para comandar a pasta da saúde o engenheiro civil e deputado federal Ricardo Barros (PP-PR), que vem demonstrando total desconhecimento em relação ao Sistema Único de Saúde (SUS), e já deixou claro a partir de suas “gafes” para quem irá trabalhar em sua nova função: o mercado de planos de saúde. O atual ministro e seu partido tiveram suas campanhas financiadas por empresários e operadoras de saúde e, no dia 4 de agosto de 2016, por meio da Portaria n. 1.482, instituiu um grupo de trabalho para discutir e elaborar projeto de criação de planos de saúde populares. Tal medida, que visa aumentar o lucro dos empresários de um setor que apresenta um faturamento anual na casa dos R$ 100 bilhões, funcionará como uma verdadeira “armadilha” para seus usuários, uma vez que será oferecida uma cobertura menor por meio da alteração da lei que regula os planos (Lei n. 9.656, de 3 de junho de 1998), com o objetivo de modificar ou anular a exigência de cobertura mínima. Ressaltamos que, mesmo diante dessa cobertura obrigatória, a população tem seus direitos e garantias violados diariamente, o que gera preocupação diante de uma cobertura ainda mais reduzida. Outro ponto importante é que, diante de uma crise orçamentária, o Estado deixará de arrecadar ainda mais por conta da renúncia fiscal com o aumento do número de detentores de planos de saúde. Segundo dados de 2013 sobre gasto tributário efetivo, o país deixou de arrecadar mais de R$ 25 bilhões com renúncia fiscal oriunda de gastos com saúde.
No mercado de planos de saúde existem as modalidades pessoa física e jurídica. A modalidade por pessoa jurídica classificada como coletivo por adesão merece uma atenção especial, pois um de seus traços é a livre negociação entre as partes sem regulação da ANS. Quando uma pessoa física procura os planos coletivos por adesão, atraída pelo preço abaixo do mercado e ampla oferta de redes hospitalares credenciadas, ela necessariamente precisa ser incorporada a uma associação ou entidade de classe, de acordo com as resoluções normativas n. 195 e 196 da ANS. Contudo, por vezes, ela é incorporada pelos corretores da empresa Qualicorp, maior beneficiária de tais resoluções, a uma determinada associação que se enquadre no perfil do cliente sem qualquer vínculo entre eles. Vale ressaltar que no ano em que tais resoluções foram geradas pela ANS, o empresário Maurício Ceschin, advindo da Qualicorp, assumiu cargo na diretoria da agência reguladora, e ao final de seu mandato retornou para a presidência da empresa. Atualmente, o empresário é presidente da empresa Gama Saúde, que assim como a Administradora Aliança, é pertencente ao grupo Qualicorp. Em 2014, o diretor-presidente e fundador da Aliança, Elon Gomes de Almeida Barros, foi o maior doador individual da campanha para deputado federal do ministro Ricardo Barros, disponibilizando a quantia de R$ 100 mil.
É evidente que grande parte das associações cadastradas não possui qualquer compromisso em defender seus associados, mas têm interesse sim no valor de repasse referente ao convênio firmado entre as associações e a administradora de benefícios Qualicorp, os chamados royalties. Segundo dados da própria Qualicorp, no primeiro trimestre de 2016 foi repassado a essas associações o valor de R$ 42,3 milhões por conta dessas “parcerias”. Não à toa, a modalidade coletivo por adesão, mesmo representando apenas 36% da carteira de clientes da Qualicorp, é responsável por mais de 90% do faturamento da empresa, desbancando a modalidade empresarial, que representa os outros 64% da carteira de clientes. A empresa obteve lucro de R$ 198,3 milhões só no primeiro trimestre de 2016, apresentando um avanço de 343,6% em relação ao mesmo período de 2015; quando comparado ao trimestre anterior, o avanço apresentado foi de 222,7%. Note-se que a Qualicorp segue na contramão da crise econômica que aflige o país. Como pode, diante de um cenário de recessão econômica, uma empresa anunciar aumento nos lucros? Isso é justificável em razão da falta de regulamentação por parte da agência que regula esse mercado, a ANS, que permite reajustes abusivos aos clientes que estão enquadrados na modalidade coletivo por adesão, com índices muito acima da inflação. Em alguns casos, o aumento do plano por adesão chega a 40%, lembrando que a inflação, pelo IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo), fechou o ano passado em 10,67%. Ou seja, tal modalidade apresentou reajuste quase três vezes maior que a inflação. Visando coibir tais abusos praticados pelo setor privado, tramita no Congresso o Projeto de Lei do Senado (PLS) 152/2016, de autoria do senador Paulo Paim (PT-RS), que determina que o índice máximo de reajuste dos planos de saúde em todas as modalidades seja o índice nacional de preços ao consumidor (INPC). Contudo, a proposta não tem previsão de votação.
Essa complexa prática funciona como uma verdadeira “arapuca” e vira um “prato cheio” para os corretores que, antes de informar detalhadamente sobre esses procedimentos, estão preocupados acima de tudo em vender o plano de saúde. A falta de transparência e de informação nesse procedimento nebuloso acarreta em uma enorme demanda de clientes lesados, pois os mesmos são levados a erro pelos corretores. A dinâmica do negócio se faz com a venda do plano por parte do corretor ao cliente atraído pelo preço abaixo do mercado e ampla rede credenciada; o corretor, preocupado somente em vender, não informa os deméritos do serviço vendido; o cliente contrata o serviço por vezes sem saber que foi incorporado a uma associação; o cliente não é informado que o contrato pode sofrer até três aumentos progressivos, um por mudança de faixa etária, outro anualmente por variação de custos na data do aniversário do contrato e outro na data da celebração da parceria entre a administradora de benefício (Qualicorp) e a determinada associação. Resultado: o cliente contrata por um preço X abaixo do mercado e no ano seguinte estará pagando um valor acima do mercado, o que configura prática totalmente condenável pelo Código de Defesa do Consumidor em quase integralidade de seus capítulos, pela Política Nacional de Relações de Consumo, nos direitos básicos do consumidor, das práticas comerciais, da proteção contratual etc. A modalidade de plano que mais pratica o aumento abusivo é a de coletivo por adesão. Repetindo: não à toa, tal modalidade corresponde a 90% do faturamento da empresa Qualicorp, líder do segmento. A partir de tais fatos, poderíamos questionar se as ditas associações funcionariam como “laranjas” nesse esquema criminoso orquestrado pela Qualicorp?
As estatísticas do setor são claras, por conta dessa brecha na regulação, atualmente apenas 20% dos planos de saúde oferecidos no mercado são da modalidade pessoa física, pois o reajuste anual é tabelado e anunciado pela ANS, que estipula um teto percentual de maneira a conter os reajustes abusivos das mensalidades dos clientes por parte das operadoras de plano de saúde, pois essa modalidade, diferente dos planos coletivos, é regulamentada pela agência. Vale frisar que nos últimos dez anos, o percentual de reajuste tabelado pela agência apresentou valores acima da inflação. No plano coletivo empresarial contratado por uma empresa, é recorrente que anualmente as operadoras convoquem uma reunião para negociar reajustes. Diferente das associações, no caso dos planos coletivos, a empresa tem interesse em negociar um valor compatível ao mercado, pois, afinal, a empresa paga parte dos planos para seus funcionários.
Outra questão preocupante é o fenômeno da “verticalização”, no qual empresas de plano de saúde constroem e adquirem unidades de atendimento próprias. À primeira vista, pode parecer uma excelente notícia para o cliente, pois significaria aumento do número da rede de atendimento. Porém o que está em jogo aqui é o lucro, pois através de unidades próprias, as empresas cortam custos, por meio de mão de obra mal remunerada e escassa, e na centralização da realização de procedimentos onerosos. Em relação a este último faço um alerta. Um cliente que, atendido em uma unidade de saúde e com diagnóstico, teve atestada a necessidade de realizar um procedimento de urgência oneroso corre o sério risco de aguardar por uma transferência da unidade em que recebeu o diagnóstico para uma unidade própria do plano de saúde, visando contenção de gastos, mesmo que a primeira unidade tenha capacidade técnica para a realização do procedimento. Durante a espera pela transferência, as pessoas correm o risco de agravamento de seus quadros. Tudo em razão da “sanha por lucro” das operadoras.
Apesar de haver legislação e uma agência reguladora para o setor, diversas irregularidades são praticadas pelas operadoras: descumprimento do prazo máximo para marcação de consultas; precarização em relação à disponibilidade de profissionais na rede credenciada; presença de cláusulas abusivas nos contratos, que excluem ou limitam a cobertura de uma série de procedimentos, além de aumentos abusivos e acima da inflação; não autorização e glosa de procedimentos médicos e laboratoriais; descredenciamento unilateral de médicos, clínicas e hospitais; processos de auditoria que visam inibir médicos e pacientes; cruzamento de propriedade, em que algumas das empresas e instituições privadas de planos de saúde são detentores de toda cadeia econômica que os cercam, incluindo hospitais, redes de laboratórios de análises clínicas e de imagem e rede de médicos credenciados. Segundo o Procon, os planos de saúde permaneceram, na última década, no topo do ranking de reclamações dos consumidores. Entre as reclamações que chegam à justiça, 88% dão ganho de causa para o consumidor, comprovando o descumprimento das operadoras com suas obrigações contratuais.
O usuário que se sentir lesado tem a opção de entrar em contato com a ANS e abrir uma Notificação de Intermediação Preliminar (NIP). A empresa é notificada para que se resolva o problema no prazo entre cinco a dez dias. Porém, após a resposta da empresa o usuário deve, em um prazo de dez dias, reforçar a reclamação. Se passado o prazo e o usuário não entrar em contato com a agência, por diversas razões, como esquecimento ou até por desconhecimento da norma, absurdamente a demanda é declarada como resolvida. E assim tal medida põe em dúvida o percentual de demandas solucionadas publicado pela agência, que em dados atualizados ultrapassaram os 95%. Lembrando que em relação a infrações cometidas por parte dos planos de saúde, convertidas em multas, a dívida das operadoras com o Estado passa de R$ 1,5 bilhão. Vale frisar que determinados valores de multas estão defasados, pois a legislação que trata dessa questão é a Resolução Normativa n. 124/2006. Ou seja, dez anos se passaram e determinados valores estão congelados, necessitando de reajustes. A penalidade conhecida como ressarcimento ao SUS, presente no artigo 32 da Lei n. 9.656, é uma prova da falta de comprometimento por parte das operadoras diante de seus usuários, que ao obterem negativa de cobertura são atendidos pelo SUS: tal dívida ultrapassa os R$ 500 milhões.
As reclamações por parte dos usuários dos planos apresentaram um crescimento considerável, e segundo dados da ANS, apenas em 2014, o órgão que regula e fiscaliza o setor recebeu mais de 90 mil reclamações por parte dos usuários. Como resposta às reclamações, a agência inicia processos investigativos e quando confirmada a existência de infração são geradas multas às operadoras. Entretanto, as operadoras infratoras recorrem sucessivamente da punição visando à prescrição da mesma, ou até a anistia da dívida ou a sua renegociação através do chamado Termo de Compromisso de Ajuste de Conduta (TCAC), possibilitando a redução do valor, como dispostos nas Resoluções Normativas n. 372 e 388, que trazem alguns “benefícios” a essas operadoras como o desconto de até 80% sobre o valor da multa. Com o objetivo de sustar esse mecanismo, odeputado federal Ivan Valente (Psol-SP) apresentou o Projeto de Decreto Legislativo (PDC) 322/2016, que se encontra em tramitação.
A proposta de criação de planos populares apresentada por Barros vai na contramão do modelo elaborado pelo movimento da reforma sanitária, que originou o SUS, pois a ideia de saúde como bem de consumo ao adentrar pela sociedade, se sobrepondo a proposta de saúde como um direito fundamental, promoverá o processo de segmentação de um sistema que fora criado para ser universal, integral, equânime, público e de qualidade. Tal medida, atrelada à Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 241/2016 que por um prazo de vinte anos visa reduzir consideravelmente o investimento em saúde pública, podendo gerar uma perda em torno de R$ 700 bilhões a partir de um estudo publicado pelo Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (Ipea), e à PEC 143/2015 que permite a desvinculação das receitas da União, estados e municípios e que segundo entidades ligadas ao setor saúde geraria uma perda de recursos para o custeio do SUS estimada em R$ 80 bilhões, funciona como um verdadeiro golpe à saúde pública. Lembrando que gastos com políticas sociais como o SUS não oneram nem 5% do PIB, enquanto em países desenvolvidos com sistema universal de saúde é aplicado em torno de 10% do PIB. Em 2013, o investimento per capita do setor público em saúde foi de US$ 523, enquanto em países que também possuem um sistema público universal, como Reino Unido e França, foram investidos U$$ 2.766 e US$ 3.360, e o investimento per capita médio nas Américas foi de US$ 1.816. Mesmo diante dessa discrepância, em 2015, o atual ministro e seu antecessor, o deputado federal Marcelo Castro (PMDB-PI), enquanto deputados votaram à favor da PEC 358/2013, que gerou a Emenda Constitucional (EC) 86 e assim alterou a forma do cálculo que define a quantidade de recursos a serem destinados para o orçamento da saúde pública. Tal medida instituiu o chamado Orçamento Impositivo, diminuindo o financiamento da saúde, por parte da União, gerando uma perda estimada em R$ 10 bilhões para 2016. Porém, no dia 22 de setembro de 2016, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, ajuizou no Supremo Tribunal Federal (STF) a ação de inconstitucionalidade n. 5.595, contra dispositivos da EC 86, sob a alegação de que “tais mudanças são intensamente prejudiciais ao financiamento do SUS, por implicarem redução drástica no orçamento para ações e serviços públicos em saúde, o qual já é historicamente insuficiente”.

Leandro Farias
Farmacêutico Sanitarista da Fiocruz e coordenador do Movimento Chega de Descaso.


01 de Novembro de 2016
Palavras chave: SaúdeSUSConstituiçãoPlano de saúdeQualicorpPlano de saúde popular

(Publicado originalmente no site do Jornal Le Monde Diplomatique)

Artigo: O "batismo" político do técnico Geraldo Júlio



Resultado de imagem para geraldo júlio

Há um consenso de que essas eleições municipais representaram uma espécie de "batismo" político para o prefeito Geraldo Júlio(PSB). Da equipe de "técnicos" do ex-governador Eduardo Campos, o crédito de sua primeira eleição para a Prefeitura da Cidade do Recife foi atribuída totalmente ao prestígio do ex-governador. Nessas eleições municipais de 2016, ele precisou caminhar com seus próprios pés, sem o apoio de algum ator político com mais carisma ou capilaridade política. Na esteira dessa vitória, logo setores da imprensa local passaram a projetar o seu nome para uma eventual candidatura ao Palácio do Campo das Princesas, possivelmente em 2022, uma vez que 2018 estaria reservado para o projeto de reeleição do governador Paulo Câmara. 

Hoje ele concedeu uma entrevista ao Jornal Folha de São Paulo, onde se sobressai uma preocupação em identificar-se com um perfil progressista, lembrando, inclusive a sensibilidade social de homens públicos que o inspira, como Miguel Arraes e Eduardo Campos. Aproveitou o ensejo, até mesmo, para tecer algumas críticas às recentes medidas do Governo Michel Temer, procurando imiscuir-se de suas inevitáveis consequências danosas à gestão municipal e, principalmente à população. Primeiro, é preciso dizer que, no estágio atual em que se encontra o partido socialista, seriam necessárias muitas costuras políticas internas para assegurar esse "escalonamento" de poder entre os seus membros. Depois, seria fundamental combinar, antes, como advertia o craque Garrincha, com os adversários. Até lá, muita água deverá correr no rio da política local, por vezes contrariando projetos e ambições pessoais. (...)

(Conteúdo exclusivo, liberado apenas para os assinantes do blog)

Artigo: Rumores de sabres em Caruaru e Olinda?




A entrevista concedida pelo escritor Antonio Campos à imprensa, depois da ressaca eleitoral da cidade de Olinda, de acordo com os próprios jornalistas, foi bastante esclarecedora acerca dos bastidores de sua candidatura à Prefeitura daquela cidade. Conforme antecipávamos aqui pelo blog, mesmo antes do resultado das urnas, o PSB sairia definitivamente rachado do episódio. Depois da entrevista de Antonio Campos, então, todas as dúvidas foram dissipadas a este respeito. Pelo teor da entrevista, fica evidente que um conjunto de manobras foram engendradas no sentido de asfixiar sua candidatura desde o primeiro momento. Entre essas manobras, ele faz uma acusação grave às ações da Casa Militar do Campo das Princesas que teria, segundo ele, monitorado todos os movimentos de sua campanha. A Casa Militar, no dia de hoje, soltou uma notinha negando os fatos. 

Mas, como sempre costumo juntar uma coisa aqui e outra ali para tirar alguma conclusão, vem da Princesa do Agreste, também em relação às ultimas eleições municipais, uma outra denúncia do ex-governador João Lyra informando que a Polícia Militar do Estado teria cometido alguns "excessos de zelo" num momento específico da campanha, apresentando-se, ostensivamente, em frente ao comitê jurídico da campanha de Raquel Lyra(PSDB), de acordo com João Lyra, configurando-se uma tentativa de intimidação. Não deixa de ser curioso a presença de 05 viaturas da PM-PE, numa única rua, numa cidade que apresenta um dos maiores índices de violência no Estado. (...)

(Conteúdo exclusivo, liberado apenas para os assinantes do blog) 

[Política] Antônio Campos dispara mais uma vez contra Renata Campos e re...



Vídeo originalmente publicado pelo jornal Folha de Pernambuco

Editorial: Serra e Odebrecht: A Lava Jato esbarra na Casa Grande



Resultado de imagem para josé serra

Gosto muito de ler e ouvir o sociólogo Paulo Sérgio Pinheiro, da USP. Assim como poucos, ele descreve, didaticamente, toda a engrenagem montada em torno dos objetivos desse golpe institucional ora em curso no país. Uma de suas premissas é a de que, em condições de normalidade democrática, onde os partidos teriam que negociar suas agendas com o eleitorado, jamais essas reformas poderiam ser implementadas. Essa foi uma das razões do golpe: rasgar a constituição cidadã, promulgada em 1988, destruindo todo o edifício de direitos e conquistas obtidos pela sociedade brasileira nas últimas décadas. A elite brasileira teria que se juntar a bandidos e cupinchas para implantar um regime de força, sem o qual seria impraticável essas medidas. 

Um dos outros possíveis motivos seria blindar alguns desses atores, envolvidos diretamente nessas urdiduras, das investigações da Operação Lava Jato, que estava se aproximando, perigosamente, da Casa Grande. Em delação premiada da Construtora Odebrechet, aparece, com todos as letras e pingos nos "is" a informação de que o então candidato José Serra, nas eleições de 2010, recebeu com, regularidade, uma quantia estimada em R$ 23 milhões,  como caixa-dois de campanha. Zeloso, aquele juiz do Paraná teria imposto uma espécie de sigilo a esta delação premiada. Cuidadoso, o jornal Folha de São Paulo trata sobre o assunto em "notinhas". E Serra segue em frente, como qualquer cristão, como se nada estivesse ocorrendo...(...)

(Conteúdo exclusivo, liberado apenas para os assinantes do blog)

Artigo: Antonio Campos: A incrível história dos bastidores de uma candidatura.

Resultado de imagem para antonio campos

O escritor Antonio Campos, candidato à Prefeitura da Cidade de Olinda nas últimas eleições municipais, convocou a imprensa para uma coletiva. Nessa coletiva, ele mesmo se encarregou, digamos assim, de lavar as roupas sujas que envolveram os bastidores de sua candidatura, tumultuada desde o início, pelo fato de não se ter construído um consenso sobre o assunto tanto nas hostes socialistas locais, quanto na nucleação familiar Campos/Arraes. Ele foi de uma franqueza que até nos surpreendeu, ao falar sobre a personalidade da senhora Renata Campos, assim como adjetivar, com absoluta clareza, o processo de perseguição implacável aplicado à vereadora Marília Arraes quando, um pouco antes, abriu uma dissidência no clã. 

Depois dessa coletiva, creio, sua relação com o grupo jamais será a mesma. Antonio Campos, por exemplo, informa que foi boicotado desde o início pelo Palácio do Campo das Princesas, que não moveu uma palha para evitar a pulverização de candidaturas no primeiro turno daquelas eleições. Há, aqui, independentemente de outras considerações, um problema de origem: a definição do nome que deverá herdar o espólio político do ex-governador Eduardo Campos. Como o PSB local é uma agremiação que segue as diretrizes da viúva Renata Campos, o nome ungido recai sobre o filho do ex-governador, João Campos, hoje chefe de gabinete do Governo Paulo Câmara. Uma eventual vitória de Antonio Campos, em Olinda, poderia entornar o caldo sucessório familiar. (...)

(Conteúdo exclusivo, liberado apena para os assinantes do blog)