Hoje, dia primeiro, por razões conhecidas, o Parque Arruda Câmara, mais conhecido como A Bica, localizado em João Pessoa, tornou-se o grande assunto do noticiário nacional, depois do incidente que vitimou Gerson de Melo Machado, com 19 anos, conhecido como Vaqueirinho, que adentrou a jaula destinado aos felinos e foi morto pela leoa. Assim, uma crônica escrita por este editor, há alguns meses atrás, tratando dos momentos bons vividos naquele espaço, está alcançando um grande número de acessos, possivelmente em razão do algoritmo. É trágica a história de vida deste rapaz. Filho de mãe e avó com diagnóstico de esquizofrenia, o Conselho Tutelar afastou ele e três outros irmãos da tutela da família. Três deles foram adotados, o que não ocorreu com Gerson, que, a partir daí, teve uma vida errática, acabando morto na jaula dos felinos da Bica. Há registros de inúmeras entradas em unidades prisionais, quando, na realidade, o seu problema exigia outro encaminhamento.
Sua conselheira tutelar escreveu um artigo onde relata a trajetória trágica do rapaz, que contava apenas com 19 anos de idade. O artigo é comovente, mas é preciso atentarmos para as nossas falhas no que concerne aos cuidados com um rapaz com o seu perfil. Na realidade, Gerson não se jogou na cova dos leões. Ele foi atirado ali pelo abandono, pelo descaso, pela ausência de atenção e cuidados que o caso dele ensejava. Profundamente lamentável. A Polícia Civil do Estado da Paraíba, salvo melhor juízo, está tratando o caso como suicídio. Sugere-se um surto. Gerson, segundo relata a conselheira, tinha um sonho de participar de safari na África.
João Pessoa é realmente uma cidade abençoada, o que justifica sua posição privilegiada entre as principais capitais do país, seja como destino de um final de semana, de um período de férias, ou mesmo para curtir uma aposentadoria tranquila, depois de ter sobrevivido ao inferno das repartições. Só peço a vocês que não espalhem muito a notícia, uma vez que o fluxo de turistas ao local já está produzindo alguns gargalos no trânsito, exploração do comércio nas barracas de praia, especulação no preço dos imóveis, assim como ciúmes entre os gestores das capitais vizinhas, a exemplo do futuro prefeito de Natal, que afirmou, durante o discurso de posse, que a nossa querida Jampa iria se tornar no curral da capital potiguar.
Mas acho que podemos dar por aqui uma dicazinha sobre um local bastante agradável, bem cuidado, de natureza intocável e preservada, pertinho do centro e não tão distante das praias. O Parque Arruda Câmara, mais conhecido entre os pessoenses como a Bica, em razão de uma bica ali existente que, no passado, chegou a abastecer os moradores locais com água potável. João Pessoa atingiu um nível de civilidade que, independentemente de quem seja o gestor, se do partido A ou B, há algumas coisas que avançaram e a população não permite retorno, como a limpeza da cidade, o cuidado com o patrimônio histórico, a balneabilidade das praias centrais e os seus espaços de lazer. A Bica sempre foi muito bem cuidada e gerenciada.
Nossa família foi muito feliz por ali. Acordávamos num dia ensolarado ou meio chuvoso desses janeiros - uma chuvinha que não atrapalhasse, do tipo garoa, admitamos, sempre era bem-vinda - e nos dirigíamos ao local. Logo no início, na antiga entrada do parque, um Ipê roxo florido nas aguardava, dando as boas-vindas. Depois de participarmos das recreações, seguíamos por uma trilha de Mata Atlântica e águas cristalinas, para a outra margem do parque, onde comíamos um pastel de carne com refrigerante, sem remorso, e tomávamos o melhor sorvete do mundo, aquele artesanal que, segundo seu Zé, vinha lá de Pilar, a terra do escritor José Lins do Rego.
Ao longo dos anos que frequentávamos o parque, sentimos a ausência de seu Zé. O produto passara a ser comercializado pelo seu neto. Andávamos considerando alguma coisa estranha com ele. O sorvete era oferecido em vários sabores, mas ele servia aleatoriamente, talvez não identificando os sabores solicitados pelos clientes. O neto nos informou que, numa dessas saída para vender o produto ele não conseguiu voltar para casa. Foi encontrado por alguém que o reconheceu, pois havia trabalhado com ele numa empresa local. Infelizmente, era um problema de demência ou Alzheimer, que um chargista já identificou como algo pior do que a morte. Outra coisa que nos enchiam os olhos de contentamento era contemplar a beleza da planta abricó de macaco, de origem amazônica, que, durante a florada é admirável. As coisas boas da vida são até simples, Rubem Braga.