pub-5238575981085443 CONTEXTO POLÍTICO.
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sexta-feira, 18 de novembro de 2016

Crônicas do cotidiano: Gilberto Freyre e o Português do Porto do Recife.




José Luiz Gomes da Silva


Confesso que, não raro, fico confuso sobre alguns dados biográficos do sociólogo Gilberto Freyre. Aliás, Gilberto é um ser híbrido em muitos aspectos. Híbrido e certamente complexo, o que suscita algumas interpretações igualmente confusas sobre sua vida e, principalmente sobre a sua obra. Ainda ontem discutíamos por aqui uma polêmica entre ele e o médico Josué de Castro, envolvendo questões relativas à alimentação. Quando as nuvens políticas se fecharam aqui na província, em razão do Estado Novo, ele se exilou em Portugal, um país que tinha todos os motivos para acolhê-lo bem, em razão de suas excelentes relações políticas e acadêmicas com aquele país, inclusive com com intelectuais ligados ao salazarismo. Apesar desse ambiente político favorável, o que se diz é que ele teria enfrentado muitas dificuldades, tendo que ministrar aulas para sobreviver. Foi nesse período que ele teria dado os retoques finais em sua obra clássica Casa Grande&Senzala. Como sempre brinco, apesar de doce, Casa Grande & Senzala foi produzida num momento delicado do seu autor. 

Um outro dado curioso que alguns biógrafos relutam em assumir abertamente é o que informa que o sociólogo de Apipucos é filho da fina flor da aristocracia açucareira do Estado, ou, como diria Tobias Barreto, da açucarocracia pernambucana. Ontem li um texto onde a primeira referência da autora é sobre este assunto, confirmando este fato. Seu pai, Alfredo Freyre, era juiz e professor catedrático de economia política da Faculdade de Direito do Recife. Sua família era descendente dos colonizadores portugueses, o que talvez possa informar muita coisa acerca de suas teses sobre o conceito de colonialismo assimilativo, em contraposição ao do tipo segregacionista inglês. O que também reforça essa sua relação com a aristocracia açucareira do Estado, desde suas origens, é o fato de ele passar suas férias em um engenho da família, em São Severino dos Ramos. Sobre suas ligações políticas com esta classe senhorial, creio, dispensa-se os comentários.

O repórter Geneton Moraes Neto certa vez comentou que Gilberto Freyre costumava receber os jornalistas nos jardins da Fundação Joaquim Nabuco. Ali, num bate papo informal, respondia, uma a uma, as perguntas a ele dirigidas, sempre muito cortes, sempre muito solícito. Por vezes, as perguntas envolviam diversos temas, mas, qual não era a surpresa dos jornalistas quando chegavam às redações. Ao fazerem a checagem do material, estavam diante de um artigo muito bem redigido, com argumentos consistentes e uma linguagem bem articulada. Freyre era um homem de uma inteligência ímpar. Comenta-se que até hoje em sua residência existem algumas cartas a ele dirigidas onde se escreve Gilberto Freyre com "i". Quando Dona Madalena Freyre reclamava que ele não abria as correspondência, ele repetia: não é para mim. É para um tal de Gilberto Freyre com "i". Quem gosta muito dessa história é o jornalista Paulo Henrique Amorim. Ainda escrevo uma crônica sobre o assunto, mas antecipo que ela envolve um alto executivo das organizações globo. 

Aos 17 anos, Gilberto Freyre saiu aqui da província para estudar nos Estados Unidos, precisamente nas Universidades de Baylor- Columbia, onde tornou-se amigo do professor Franz Boas, que exerceria forte influência sobre ele, inclusive no seu projeto posterior de criação do Museu do Homem do Nordeste. Gilberto ganhou uma bolsa de estudos concedida por entidades ligadas a Igreja Batista à qual sua família pertencia. Aqui, na juventude, era um disciplinado pregador, um missionário, o que nos informava o ex-bispo anglicano Robinson Cavalcanti. Já nos Estados Unidos, Gilberto abandona completamente suas convicções religiosas, o que contingenciou Robinson Cavalcanti a escrever um artigo nos jornais locais fazendo um apelo: Volta ao púlpito, pregador

Exílio é sempre algo muito ruim. O sociólogo Josué de Castro morreu deprimido, em Paris, tentando voltar para casa, para matar saudade da paisagem e da gente dos bairros alagados do Recife, habitat de seus estudos sobre a fome. Outro dia, publicamos por aqui um belo texto escrito por Paulo Freire, em homenagem à família que o acolheu no Chile. O poema - sim, um poema - invoca as belas paisagens do Recife, com aquele nomes de ruas que mais se parecem um convite ao encantamento, à paixão. Mas, um dado curioso que li recentemente fala de um momento difícil na vida do autor de Casa Grande & Senzala. Creio que a década de 40 tenha sido uma das mais difíceis para Gilberto Freyre, embora no seu finalzinho, em 49, já como Deputado Constituinte, ele tenha conseguido a aprovação do projeto de lei que criou o então Instituto Joaquim Nabuco de Pesquisas Sociais, hoje Fundação Joaquim Nabuco. 

Gilberto sofreu uma brutal perseguição do Estado Novo, embora tivesse uma boa relação com Getúlio Vargas. O problema era o seu "carrasco no Estado", como se referia a Agamenon Magalhães, Getúlio Vargas. Foi preso durante duas vezes, escapou de uma tentativa de assassinato na Pracinha do Diário de Pernambuco e ficou praticamente interditado aqui no Estado. Dessa época há relatos sobre reais dificuldades financeiras do mestre de Apipucos. Para sobreviver, segundo este autor, ele precisava corrigir o Português dos documentos do Porto do Recife, uma atividade que o desagradava profundamente. Apesar de suas dificuldades iniciais - foi alfabetizado antes em Inglês - Freyre, como ele mesmo gabava-se, "dançava" muito bem em língua portuguesa. 


https://pt.wikipedia.org/wiki/Gilberto_Freyre

Gilberto de Mello Freyre KBE (Recife, 15 de março de 1900 — Recife, 18 de julho de 1987) foi um polímata brasileiro. Como escritor, dedicou-se à ensaística da ...
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1 dia atrás - Crônicas do cotidiano: Gilberto Freyre e Josué de Castro num encontro na Ilha de Deus Quando se discute a questão da alimentação, sobretudo se tomarmos ...



quinta-feira, 17 de novembro de 2016

Crônicas do cotidiano: Gilberto Freyre e Josué de Castro num encontro na Ilha de Deus






José Luiz Gomes da Silva


Quando se discute a questão da alimentação, sobretudo se tomarmos como referência a região do Nordeste brasileiro, há divergências substantivas entre o médico Josué de Castro e o sociólogo Gilberto Freyre. O tema é bastante polêmico e, parte a parte, em dados momentos de suas conclusões, um estudioso dessa polêmica ficaria, no mínimo dividido, caso não se deixasse levar pelas suas simpatias por este ou aquele autor. Quem nos dá a honra de ler nossas crônicas aqui pelo blog, sabe que somos, naturalmente, suspeitos para deixarmos de assumir uma posição. No campo do estudo sobre alimentação, Gilberto Freyre apresenta-se como mais um precursor, antecipando-se a outros estudos encaminhados, inclusive, por profissionais de outras formações como nutricionistas e médicos. 

Gilberto acerta ao apontar situações como o regime escravocrata, a monocultura da cana-de-açúcar, os grandes latifúndios, assim como a introdução da farinha de mandioca, pouco nutritiva, como base da alimentação nordestina, em substituição da farinha de trigo dos colonizadores, como fatores que poderiam contribuir para uma alimentação carente de alguns nutrientes importantes. Nossa alimentação "mestiça - como resultado da relação entre as três raças - de fato, excluía vegetais, legumes, ovos, leite e algumas fontes proteicas necessárias a uma boa alimentação. Ao apontar os senhores de engenhos e os escravos da região como os mais bem alimentados, entretanto, ele comete o equívoco de confundir comer muito com comer bem, sobretudo em relação aos escravos, conforme alfineta Josué de Castro. Errou feio ao sugerir também que a região canavieira era uma das mais bem nutridas do país, mito completamente rechaçados pelos estudos de José de Castro.

O curioso é que esta polêmica entre ambos é longa, tendo réplicas e tréplicas abusadas de ambos aos autores. Teria sido iniciada com os primeiros trabalhos de Josué de Castro, acerca da alimentação de grupos de operários do Recife, estudos de livre-docência do sociólogo da fome. Depois se estenderia pela demarcação de "campo" - como Gilberto advertindo Josué a não se imiscuir a assuntos relacionados à sociologia ou antropologia, assim Josué devolvendo, que um sociólogo não estaria habilitado a utilizar determinados conceitos, como o de albuminóides e proteínas, onde Freyre, de acordo com Josué, demonstrava absoluta ignorância do termo e que, portanto, não poderia ser levado a sério. O fato concreto é que, enquanto Freyre aponta as causas "naturais" das possíveis carências alimentares, Josué de Castro deduz que ela pode ser o resultado de engrenagens sociais perversas, alimentadas - permita-me o trocadilho - pelas relações estabelecidas entre os homens. Josué de Castro, como bem observara Manuel Correia de Andrade, empresta ao fenômeno da fome um status político. 

Mas, todo esse introito vem a respeito dos nossos mocambos dos bairros alagados do Recife. Aqui, ambos parecem estabelecer uma "trégua" embora não tenha lido nada do sociólogo Gilberto Freyre sobre a alimentação dos habitantes das palafitas do Recife, enquanto Josué de Castro tomou esse tema até como incursão literária, ao escrever um poema para o homem-caranguejo. Outro dia, escrevemos por aqui um artigo sobre o direito à cidade. Ali, lembrávamos das divergências sobre os mocambos do Recife, envolvendo o sociólogo Gilberto Freyre e o interventor Agamenon Magalhães. Ao defender as palafitas do Recife da sanha higienista de Agamenon Magalhães, Gilberto enfatizava as soluções ecologicamente corretas utilizadas por aquela população empobrecida - em sua maioria oriunda das usinas da zona da mata do Estado - assim como a proximidade com a sua fonte principal de alimentação, os crustáceos. 

Possivelmente em razão da influência de Gilberto Freyre, outro intelectual que iria demonstrar uma profunda simpatia pelos mocambos do Recife foi o escritor paraibano, José Lins do Rego. Em seu processo de recifinização, lá estavam os mocambos, além do Pátio do Carmo, da Av. Encruzilhada, da Rua da Aurora e, possivelmente, dos quebra nos becos dos bairros de boemia e prostituição do Recife Antigo. Sobre a relação de Josué de Castro com esses bairros alagados no Recife, creio ser desnecessário acrescentar alguma coisa. De acordo com relatos de amigos, sempre que voltava ao Recife, atolava os pés na lama para conversar com os homens e mulheres caranguejos. Um homem que conheceu o mundo, ministrou aulas na Sorbonne, morou em Paris, morreu de saudade dos Afogados, do píer do Pina, dos ribeirinhos da Ilha de Deus.





Na Web,  em termos de acessos, perdemos apenas para o próprio site do médico Josué de Castro. Desta vez, ganhamos da Wikipedia. Obrigado aos leitores.



www.josuedecastro.com.br/

A vida e a obra do intelectual brasileiro que pioneiramente mapeou o drama da fome no Brasil e no mundo. Josué de Castro diagnosticou a relação direta entre ...

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20 min atrás - Crônicas do cotidiano: Gilberto Freyre e Josué de Castro num encontro na Ilha de Deus

Josué de Castro – Wikipédia, a enciclopédia livre

https://pt.wikipedia.org/wiki/Josué_de_Castro

Josué Apolônio de Castro (Recife, 5 de setembro de 1908 - Paris, 24 de setembro de 1973), mais conhecido como Josué de Castro, foi um influente médico, ...

  

Volume final da triologia biográfica de Kafka desconstrói mitos sobre o autor


Autor mostra as circunstâncias pessoais, políticas e culturais que moldaram o jovem Kafka a se tornar um dos autores que moldaram a literatura moderna
Retrato de Kafka por Renato Guttuso (Reprodução)
Retrato de Kafka por Renato Guttuso (Reprodução)
Redação
Franz Kafka não era um escritor neurótico, recluso ou marcado unicamente pelo relacionamento difícil que mantinha com o pai, um comerciante chamado Hermann. As conclusões estão no volume final da trilogia biográfica do autor, Kafka: The yearly years(Princeton University Press), originalmente publicado em 2013 e recentemente traduzido para o inglês.
A obra, que completa o trabalho de duas décadas empreendido pelo autor alemão Reiner Stach, cobre os primeiros vinte e sete anos da vida de Kafka, nascido em Praga no ano de 1883 em uma família de judeus de classe média. Já no prefácio, a tradutora Shelley Frisch avisa: “Os leitores desta obra verão os mitos sobre Kafka explodir”.
Entre eles, segundo Frisch, está a ideia de que o autor de A Metaformose e O Processo teria sido um homem alienado da vida cotidiana, algo que seu trabalho como funcionário de uma companhia de seguros de saúde não permitiria, por exemplo.
Em outras passagens, Stach mostra que uma das primeiras experiências sentimentais de Kafka foi a solidão – uma vez que os pais passavam doze horas por dia trabalhando na loja da família –, e não a humilhação a que Hermann o submetia constantemente.
A investigação foi feita com base em cartas de família, memórias de colegas do colégio e diários do amigo e testamenteiro Max Brod. O difícil acesso a esses diários, que revelavam especialmente fatos sobre os anos de formação de Kafka, foram o principal motivo pela ordem não cronológica de publicação dos volumes.
The decisive years, de 2002, cobre o período de 1910 a 1915, quando algumas de suas principais obras são lançadas, enquanto The years of insight, de 2008, trata dos anos finais da vida de Kafka, do fim do relacionamento com Felice Bauer à sua morte, em 1924.
“Kafka é um autor realista que criou uma nova forma para dar conta de uma nova realidade, pois o mundo havia se tornado tão obscuro, tão insolúvel, que ele deveria fazer uma construção literária para dar conta literariamente daquilo. Então ele inventou um narrador que não sabe, e esse narrador somos nós”, disse Modesto Carone à CULT em 2014, em depoimento publicado no Dossiê Kafka – A literatura como experimentação política e filosófica.
Só agora, quatorze anos depois do primeiro título, serão de fato documentadas as complexas circunstâncias pessoais, políticas e culturais que moldaram o jovem Frank Kafka a se tornar um dos autores que ajudaram a moldar a literatura moderna.
k10818
Kafka: The early years

Reiner Stach
Princeton University Press
584 págs. – R$ 115,80


(Publicado originalmente no site da revista Cult)

Le Monde: Nem leão nem gazela


Todas as manhãs, a gazela acorda sabendo que tem de correr mais velozmente que o leão ou será morta. Todas as manhãs o leão acorda sabendo que deve correr mais rapidamente que a gazela ou morrerá de fome. Não importa se és um leão ou uma gazela: quando o Sol desponta, o melhor é começares a correr. Provérbio africano
por Clemente Ganz Lúcio


Dois séculos de disputa

É por meio do trabalho que as sociedades produzem o bem-estar e a qualidade de vida. Desde a Revolução Industrial, no século XIX, a economia capitalista transforma o trabalho em mercadoria (mão de obra) a ser comprada livremente para ser empregada na produção. Desde então, os trabalhadores lutam para se libertar das amarras que os aprisionam nos limites da sociedade de mercado. Regular as relações sociais de produção por meio das leis e dos acordos coletivos visa colocar limites à livre exploração dos trabalhadores.
Nesses quase dois séculos, a engrenagem de produção capitalista aumentou a geração de riqueza, viabilizou a acumulação de capital e promoveu a desigualdade e, muitas vezes, a pobreza. A sociedade de mercado gestou a questão social e a economia de mercado, a luta de classes.
Os trabalhadores desenvolvem, em cada tempo histórico, diversas formas de lutas para disputar as regras que regem a produção e a distribuição da riqueza e da renda. Duas grandes guerras fizeram emergir na Europa, no pós-1945, a consolidação do Estado moderno, a democracia e os pactos sociais que combinaram a acumulação de capital com estratégias distributivas, de tal modo que a era de ouro do capitalismo conformou, em trinta anos, um sistema tributário progressivo, com políticas sociais de promoção e proteção social e laboral. A disputa distributiva e regulatória ganhou centralidade na sociedade, com legislação protetora e organização social, especialmente o sindicalismo, capaz de representar interesses. As negociações coletivas adquiriram importância como mecanismo regulador das relações de trabalho, e os sindicatos conseguiram o direito de representação coletiva e de organização no local de trabalho.
Os empresários constroem, desde sempre, uma resistência à expansão da regulação. Nos anos 1970, já eram visíveis os sinais de que fariam tudo para dar o troco ao modelo regulatório que emergiu no pós-guerra. Conformaram uma nova força econômica, política e social, denominada neoliberalismo e comandada pelas grandes corporações transnacionais e, especialmente, pelo sistema financeiro e rentista. Ronald Reagan e Margaret Thatcher foram baluartes desse movimento, que se tornou hegemônico em quase todo o mundo. Os neoliberais prometem entregar crescimento econômico, vendem felicidade, exacerbam o individualismo e a meritocracia. Não entregam o crescimento. Ao contrário, provocaram a monumental crise de 2008, promovem o aumento vertiginoso da desigualdade, exacerbam o individualismo, o qual adoece uma sociedade conectada, que vive a solidão, a depressão e o acirramento dos conflitos sociais.
Afirmam, com convicção divina, que é necessário competir, reduzir o custo do trabalho, diminuir o tamanho do Estado, aliviar a carga tributária, reduzir impostos, liberar o acesso aos mercados, limitar o direito de representação coletiva e o papel das instituições. Coagir, reprimir e cooptar são verbos que os neoliberais precisam conjugar, instrumentos necessários para o convencimento, renovados todas as manhãs quando acordam. Adoram uma sociedade de leões e gazelas, com a certeza de que são leões e de que não morrerão de fome.

Gazelas, comecem a correr
Há trinta anos, a lógica neoliberal busca desregular o mercado de trabalho para reduzir o custo do trabalho, flexibilizar as regras que promovem e protegem os empregos e os direitos laborais, diminuir o poder de proteção coletiva dos sindicatos e aumentar o poder de coerção das empresas sobre os trabalhadores. As crises e o desemprego criam um ambiente favorável para o alcance desses objetivos. Tem sido assim na Europa. Agora, passa novamente a ser assim no Brasil.
É preciso lembrar que, nos anos 1990, dezenas de iniciativas legislativas desregularam direitos trabalhistas, criaram formas precárias de contrato de trabalho, de flexibilização da jornada de trabalho sem pagamento (banco de horas) etc. A terceirização foi uma grande sacada e passou a ser uma maneira estrutural de reduzir custos, transferir riscos e fragilizar a ação sindical. Precarização, informalidade, arrocho salarial, desemprego, desigualdade e pobreza são expressões desse movimento, que agora retorna.
As lutas sociais no Brasil acompanharam a disputa regulatória que os trabalhadores fizeram mundo afora. Avançou-se na produção social e política de uma legislação de proteção laboral e sindical reunida na CLT (Consolidação das Leis do Trabalho), bem como na estruturação de um sistema de relações de trabalho que, por meio da negociação coletiva, representa o interesse coletivo dos trabalhadores e avança na formatação dos direitos laborais. Em 1988, a ditadura civil-militar foi superada com um conjunto de novas regras que se consolidaram na Constituição. Ambas, Constituição e CLT, têm sido permanentemente alteradas.
Os sindicatos sempre apostaram nas negociações e na prevalência do acordado, sempre que é superior ao legislado. É assim que, há décadas, a negociação coletiva promove, de maneira incremental, avanços nos direitos laborais.
Agora, mais uma vez, os empresários propõem reformas na legislação para que o negociado prevaleça sobre o legislado e se faça a modernização da legislação trabalhista. Para eles, modernizar é sinônimo de flexibilidade para reduzir, desmontar e desmobilizar o padrão civilizatório duramente construído. Negociar, para eles, é aumentar a capacidade de submeter e enquadrar, para que o acordado possa reduzir aquilo que a legislação define como piso.
Não somos nem leões nem gazelas. A inteligência (pensamento e memória) e a história (conhecimento de si e do outro) permitem desenhar projetos de futuro e de sociedade nos quais a igualdade, a liberdade, a justiça, a cooperação e a solidariedade deem outro sentido para as manhãs.
Por isso, o movimento sindical luta para: modernizar a legislação trabalhista, a fim de incluir aqueles que ainda estão desprotegidos e criar novas regras para as ocupações que surgem; fortalecer as negociações coletivas; coibir a fragmentação sindical; ter organizações sindicais representativas desde o chão da empresa; garantir uma institucionalidade que promova a solução ágil dos conflitos; ampliar o direito de greve e de organização; que todos os trabalhadores estejam protegidos pelas leis laborais e previdenciárias, pois um terço ainda está sem nenhuma proteção.
O movimento sindical acredita que, na democracia, as escolhas se fazem pelo debate público, capaz de afirmar o sentido geral e o bem comum de cada dimensão da vida em sociedade, pela ampla participação, pela capacidade coletiva de corrigir erros e de aprender.

Clemente Ganz Lúcio
é Sociólogo, diretor técnico do DIEESE (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos), Membro do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social (CDES) e do Conselho de Administração do Centro de Gestão e Estudos Estratégicos (CGEE).


03 de Outubro de 2016
Palavras chave: direitostrabalhistasgolpedesempregopobrezaTemerflexibilizaçãotrabalho

terça-feira, 15 de novembro de 2016

Antonio Campos "se mexe". Cobra que não anda não engole sapo.

Resultado de imagem para antonio campos

Como um bom rebento de Macaparana, o ex-governador Joaquim Francisco é o autor de algumas "filosofias" políticas que deixaram sua marca registrada no cenário político pernambucana. Quando estava em "banho-maria", sem uma definição do seu rumo político, se questionado pelos repórteres, costumava afirmar que estava observando a água do mar bater nas pedras para ver o formato das espumas. Por outro lado, muito antes dos pleitos, costumava manter um ritmo de quem estava em campanha, pois, segundo ele, cobra que não anda não engole sapo. Sou instigado a lembrar dessas tiradas do ex-governador quando vejo as intensas movimentações do escritor Antonio Campos, sobretudo depois dos episódios envolvendo as últimas eleições municipais de Olinda.

Confesso que alguns desses "movimentos" podem confundir os adversários. Mas, por outro lado, pode ser este mesmo o seu objetivo, posto que gato escaldado tem medo de água fria. Antonio Campos não emite nenhum sinal que pretende comprar a briga com os seus possíveis desafetos dentro do PSB por "fora", mas nas instâncias internas da agremiação. Aproxima-se dos históricos, defende o "legado" de outrora da legenda, principalmente aquele legado forjado numa época em que o avô, Miguel Arraes, ainda era vivo. Isso não o impede, entretanto, de continuar construindo pontes com outras legendas, inclusive com o PSDB da terrinha, como a família Lyra, em Caruaru, e o ministro das Cidades, Bruno Araújo, que o apoiou no segundo turno em Olinda. 

No plano nacional, além de atores políticos estratégicos da legenda, como é o caso de Márcio França, vice de Geraldo Alckmin, em São Paulo, entabula conversas com ovelhas desgarradas, como é o caso dos ilustres representantes da família Ferreira Gomes, do Ceará, como Cid e Ciro. Ciro, inclusive, alimenta o projeto de uma candidatura presidencial nas eleições de 2018. Aqui, nada sugere que ele mudaria suas posições em torno  último pleito, quando acusou alguns membros da agremiação de não se empenharem o suficiente para a sua derrota. Na realidade, não apenas não ajudaram, mas atrapalharam. O mesmo se aplica aos processos movidos pelo ex-candidato contra próceres socialistas locais, que, de acordo com a imprensa, teria sido aconselhado a desistir. 

Crônicas do cotidiano: O Moleque Ricardo em Paulista.





José Luiz Gomes da Silva


Em todos os estudos que li sobre a obra do escritor paraibano José Lins do Rego, O Moleque Ricardo sempre ocupou um papel relevante. Mesmo entre aqueles estudos onde, a princípio, o livro não seria elencado como objeto. Eis aqui mais uma evidência de sua importância na obra de José Lins do Rego. O Moleque Ricardo integra aqueles livros do chamado ciclo da cana-de-açúcar do escritor. Embora os livros dessa fase sejam apresentados como os mais importantes do escritor, sobretudo entre os críticos literários, parece existir um consenso de que ainda não seriam os escritos de sua maturidade como escritor, justamente em razão do seu caráter acentuadamente memorialista. Livros de fases seguintes, que não alcançaram o mesmo êxito dos livros escritos sobre o ciclo econômico da produção da cana-de-açúcar na região, do ponto de vista da crítica literária, ocupariam um status mais elevado, em razão de o escritor estar mais "solto" das amarras memorialistas do apogeu dos engenhos no Nordeste brasileiro. 

Na realidade, José Lins do Rego era uma espécie de "homo literatus" de Gilberto Freyre, na perspectiva de consolidação de seu regionalismo. Ambos se conheceram logo após a formatura de José Lins do Rego em Direito, aqui na Faculdade de Direito do Recife, e se tornariam amigos íntimos. Embora já, de certa forma, iniciado no jornalismo e na literatura, José Lins confessa uma mudança radical em sua vida depois de conhecer o sociólogo Gilberto Freyre. Há, nas entrelinhas dessa confissão, claros indícios dos rumos literários que ele tomaria a partir de então. Menino de Engenho é de 1932 e Casa Grande & Senzala de 1933. Enquanto Gilberto Freyre se dedicou ao ensaísmo histórico, José Lins enveredou pela tarefa de "romancear" o ciclo da cana-de-açúcar na região, claro, sob os auspícios do mestre de Apipucos. Um fiel escudeiro. Gilberto Freyre ficou bastante abatido com a sua morte, ainda jovem, com pouco mais de 55 anos de idade. Uma carta de despedida que ele escreveu a este respeito é de partir os corações mais sensíveis. 

Nos dois trabalhos acadêmicos que li recentemente envolvendo a obra do escritor - um deles escrito por Gladson de Oliveira Santos, "José Lins e a modernização da economia açucareira"; o outro de Carla de Fátima Cordeiro, "Pelos olhos de um menino. Os personagens negros na obra de José Lins do Rego" - embora em abordagens distintas, lá estava O Moleque Ricardo. Ricardo era íntimo de Carlinhos nas peripécias da bagaceira. Certamente, teria mais habilidades para essas estripulias, assim como ocorria com todos os moleques da senzala, que faziam tudo melhor do que os filhos da Casa Grande dos engenhos. Ricardo era um moleque especial. Diferente dos outros meninos da bagaceira, sabia ler, graças aos esforços de sua mãe. 

Eis que, num determinado momento - não lembro qual a motivação - ele resolve deixar o engenho Santa Rosa e vir para a cidade do Recife. Se quisermos aqui uma "essência" do texto O Moleque Ricardo, ela está na narrativa discursiva sobre a vida nos engenhos de cana-de-açúcar e a vida na cidade. Há uma dissertação de mestrado que trata exatamente sobre este assunto. Essa vida urbana proporcionada pela açucarocracia nordestina aos seus rebentos, aliás, irá se constituir num tema dos mais importantes quando se considera, por exemplo, a fase de decadência dos engenhos, uma vez que "enebriados" pela vida nas grandes cidades, os herdeiros se desinteressavam em tocar os negócios dos seus antepassados. 

José Lins, por exemplo, tornou-se um homem de boemia e literatura. Terminou o curso de Direito com um "simplesmente", ou seja, a nota mínima exigida para a aprovação. Um dos piores momentos sua vida, foi quando exerceu um cargo de promotor numa cidade mineira, emprego conseguido por um parente. Em vários momentos de suas obras, fica claro a sua absoluta inapetência para a vida no eito, em substituição ao coronel José Paulino, cuja decadência ele apenas acompanha, de preferência deitado numa rede, lendo o Diário de Pernambuco. Não esconde, igualmente, sua inabilidade para as letras jurídicas. No Menino de Engenho, há relatos de sua volta ao Santa Rosa, onde uma tia sua insistia em perguntar-lhes, nas horas da refeição: Já pegou alguma causa, Carlinhos?

Aqui no Recife, Ricardo acabou por cometer alguns delitos e cumpriu pena em Fernando de Noronha. Mas, o mais interessante nessa história é que descobrimos algo curioso. Há uma possibilidade concreta - a partir do próprio texto - de Ricardo ter trabalhado na Companhia de Tecidos Paulista, aqui na cidade de Paulista, que pertencia à família Lundgren. Desta vez não se trata de ficção, mas de um relato fidedigno aos fatos. Quando voltou ao Engenho Santa Rosa - já de fogo morto e em franca decadência, em razão da chegada das usinas - Ricardo iria acompanhar os lamentos de Gilberto Freyre e José Lins do Rego pelo fim de uma ciclo, o ciclo dos engenhos, da bagaceira, das safadezas com as mulatas, das licenciosidades entre senhores e escravos. A pesquisadora Carla de Fátima lembra, por exemplo, que em nenhum momento da obra de José Lins do Rego ele usa a palavra "prostituta", mas ela entende que mulata teria o mesmo significado. Numa época em que o cajado ainda funcionava, o coronel José Paulino mantinha umas quatro. Na realidade, era disso que eles sentiam saudades.


P.S.: Do Realpolitik: Muito grato aos internautas que estão acessando a crônica escrita sobre o Moleque Ricardo, tanto aqui quanto no blog de pesquisa escolar. Amanhá teremos muitas novidades sobre o assunto. Na Web, ela se encontra apenas abaixo da Wikepedia

https://pt.wikipedia.org/wiki/O_Moleque_Ricardo

O Moleque Ricardo, publicado em 1935, é primeiro romance de José Lins do Rego narrado em 3ª pessoa. Romance regionalista, O Moleque Ricardo, ...

Crônicas do cotidiano: O Moleque Ricardo em Paulista. Em todos os ...

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5 horas atrás - Em todos os estudos que li sobre a obra do escritor paraibano José Lins do Rego, O Moleque Ricardo sempre ocupou um papel relevante. Mesmo entre aqueles ...

Crônicas do cotidiano: O Moleque Ricardo em Paulista.

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