pub-5238575981085443 CONTEXTO POLÍTICO
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quarta-feira, 22 de agosto de 2012


 
COLÉGIO DE APLICAÇÃO DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO – a excelência e as mazelas do IDEB.

 

José Luiz Gomes escreve

 

                                   O IDEB foi criado em 2007 com uma preocupação específica dos gestores da educação brasileira. O objetivo inicial seria o de identificar aquelas escolas – tanto da rede pública quanto da rede particular – que estivessem em condições insatisfatórias, ou seja, não atendessem minimamente as exigências do MEC no que concerne à aprendizagem e permanência do alunado. Logo, como tantos outros indicadores concebidos pelo MEC, o IDEB se tornaria um ranking onde a sociedade poderia, em tese, aferir o desempenho dessa ou daquela escola, uma informação importante na hora de os pais decidirem matricular seus filhos num estabelecimento de ensino.

                                   Uma informação bastante difundida sobre esse último IDEB é que algumas escolas estariam “preparando” seus alunos para o teste. Confesso ainda não ter entendido como isso é apresentado como algo positivo, mas as melhores escolas do ranking apontaram esse procedimento como uma variável de competitividade no contexto das escolas submetidas ao exame. Na época do famigerado “Provão”, também tomamos conhecimento de que algumas faculdades estariam promovendo alguns “cursinhos” intensivos com o objetivo de obter um melhor desempenho naquele teste.

                                   Mesmo diante de seus modestos propósitos iniciais, o fato é que o IDEB se transformou num dos mais importantes indicadores sociais, uma referência para nos colocarmos entre as nações mais desenvolvidas. Sempre que seus resultados são anunciados, algumas questões cruciais são postas para o país, como, por exemplo, a saúde de nossa economia – que carece de pessoas qualificadas para tocá-la -; nossos ainda persistentes indicadores de desigualdades de oportunidades educacionais; a competitividade do país no contexto das economias emergentes do BRICS etc. Expressões como as utilizadas pelo senador Cristovam Buarque de que passamos por um momento de “apagão intelectual” com os resultados apresentados pelo último IDEB, dimensionam o problema. O professor pernambucano voltou a falar na sua “idéia fixa” de um esforço nacional pela melhoria de nossa qualidade de ensino.

                                   Como parâmetro, o Brasil orienta-se com objetivo de atingir a média das economias desenvolvidas, ou seja, a média 6,0, da comunidade OCDE, até o ano de 2021. No outro ano, nós até obtivemos alguns números favoráveis, amplamente comemorados. No IDEB divulgado agora, no entanto, a renitente dificuldade de o país atender às demandas mais urgentes do ensino fundamental parece-nos que voltaram à tona. Ou seja, nossos avanços tem sido num ritmo bastante lento. Há problemas crônicos que jamais foram devidamente enfrentados ao longo das últimas décadas, apesar da adoção de políticas públicas de corte mais eficaz, republicano e inclusivas adotadas a partir do Governo Lula, dispostas a atacar o mal pela raiz, como sempre se preconizou, centradas no gargalo da educação básica.

                                   Embora seja prudente tomar cuidados com os recursos investidos no setor – a questão da qualidade do ensino exige o controle de outras variáveis tão ou até mesmo, seguramente, mais importantes – entidades de classe estabelecem 10% do PIB em investimentos em educação como uma meta ideal a ser atingida, embora algumas autoridades do Governo já tenham afirmado que isso quebraria o país. Trava-se uma batalha no poder Legislativo no tocante a esse percentual.

                                   Uma melhor educação, portanto, nunca foi um insumo tão importante para o desenvolvimento do país. Os sócios do Brasil no BRICS investem pesado nessa área, a exemplo da China. Alguns deles, caso da Rússia, historicamente e em razão da experiência socialista, ainda ostentam bons indicadores nessa área. O Brasil, portanto, está atrasado em seu dever de casa. Forjado numa cultura hierarquizada, o Estado brasileiro sempre ofereceu uma educação diferenciada aos seus alunos, com prejuízo dos mais empobrecidos. Os críticos dos programas de cotas para ingresso no ensino superior apontam, com certa razão, que as desigualdades educacionais deveriam ser enfrentadas em sua origem, ou seja, no sistema de ensino fundamental, facultando aos alunos de origem mais humilde o acesso a uma educação de qualidade, criando as condições ideais de competitividade de acesso ao ensino superior.

                                   Por outro lado, apesar das críticas, também se entende a sensibilidade social do Governo Lula em procurar, mesmo que por essas vias tortuosas, corrigir as distorções de ingresso ao ensino superior entre pobres e ricos, criando dispositivos e programas como o ProUni, um dos instrumentos inclusivos mais eficazes, permitindo aos mais empobrecidos o acesso ao ensino superior. Com o ProUni, o Governo Lula promoveu uma verdadeira revolução no ensino superior do país. Para dimensionar o alcance social desse instrumento, sempre lembro uma fala do professor Sérgio Abranches, ex-diretor do Centro de Educação da UFPE, numa palestra em faculdade onde ministrávamos aulas. Depois de encerrar sua preleção, teve a curiosidade de perguntar aos alunos, quantos ali os pais haviam feito um curso superior. Ninguém levantou a mão. Ou seja, oportunizava-se o acesso ao ensino superior a uma geração cujos pais jamais tiveram acesso.

                                   Em razão desses acertos, não raro menciono em nosso blog que, certamente, teria sido melhor manter o Fernando Haddad naquela pasta. Por teimosia de Lula, Haddad embarcou na canoa furada das eleições paulistas, com poucas chances de reverter o quadro que vem se desenhando. Permanece como um lulodependente e o seu padrinho político não irá ajudá-lo como gostaria. Por razões distintas, Marta Suplicy e Dilma Rousseff também não se engajarão na campanha, o que representa mais um revés para o candidato. Pelos últimos números do Datafolha, ele permanece “empacado”, mantendo 8% das intenções de voto. Quem lidera a pesquisa é o deputado Celso Russomanno, que dispensa apresentações.  

                                    Muita coisa precisa ser feita até 2021 para atingirmos a média das economias mais desenvolvidas. Nossa média geral, para as primeiras séries do fundamental, foi de 3,8. Para as séries finais, 3,9. Como diria Cristovam Buarque, com essa nota não dar para “passar”. Ainda não significa dizer que não tenhamos condições de atingir os índices da OCDE em 2021, mas estamos fazendo uma caminhada cheia de obstáculos, com alguns êxitos pontuais, ainda assim bastante dispersivos, o que nos coloca com as barbas de molho.

                                   Esse fosso entre algumas escolas de referência de desempenho, como o Colégio de Aplicação da UFPE e o média geral obtidas por obscuras escolas da rede pública de periferia, nos coloca num dilema bastante preocupante. Escolas e programas excepcionais são exceções à regra e não podem servir como parâmetro, salvo para meia dúzia de privilegiados que podem freqüentar aqueles estabelecimentos.

                                   Em Pernambuco, por exemplo, o Governo vem fazendo uma enorme propaganda do Programa Ganhar o Mundo, que permite o intercâmbio de estudantes do Estado com alguns países, com o objetivo de aprimorar o aprendizado de idioma. Certamente, esses alunos, a partir de programas dessa natureza, poderão, um dia, sair da conjugação do verbo To Be e dizer, em inglês, algo além do The  book is on the table. Mas, se o Governo não investir efetivamente na melhoria do ensino de língua estrangeira na Rede Pública Estadual como um todo, isso não irá fazer grandes diferenças.

                                   Na Região Nordeste, por exemplo, o Estado do Piauí apresenta alguns indicadores interessantes em algumas escolas que funcionam em condições precárias e a capital, Teresina, obteve um dos melhores desempenhos entre as capitais. Por outro lado, na média, está um pouco acima apenas de Alagoas, o Estado que apresenta um dos resultados mais sofríveis. Salvo algum engano, durante uma palestra sobre as linhas de ações da Fundação Joaquim Nabuco consoante as suas articulações com as políticas educacionais do MEC, o presidente da Instituição mencionou a disposição da FUNDAJ em colaborar com o Governo no sentido de melhorar nossos indicadores educacionais, citando nominalmente aquele Estado.

                                   Em Pernambuco, Recife permanece com um desempenho sofrível, mas cidades como Petrolina e, pasmem, Quixadá, surpreenderam-nos, obtendo uma média considerada razoável, embora, voltamos a repetir, a única coisa que essas cidades podem nos ensinar para melhoramos nossos resultados no IDEB, tão somente, é a pedagogia de sua práxis cotidiana, em termos de gestão, empenho e qualificação dos professores, estruturação do plano de ensino, metas estabelecidas, instrumentos eficazes de acompanhamento de aprendizagem etc. Fora disso, não passam rigorosamente de “ilhas”.

                                    O Colégio de Aplicação do Centro de Educação da Universidade Federal de Pernambuco tornou-se um centro de referência de ensino, aparecendo nas primeiras colocações em sucessivos IDEBs. Trata-se, como chamamos no título desse artigo, um exemplo emblemático para analisarmos os possíveis êxitos e, muito mais que isso, as mazelas do IDEB. O colégio obteve uma média de 8,1 no último levantamento, conseguindo o primeiro lugar geral nas últimas séries do ensino fundamental. Segundo tomei conhecimento, eles planejavam obter a nota 8,4. Em todo caso, pontualmente, trata-se de um desempenho excepcional, comemorado por pais, professores e gestores daquele estabelecimento de ensino.

                                   O Centro de Educação da UFPE, ao qual está vinculado aquele colégio, também goza de uma reputação elevada em termos de reflexões e produção acadêmica na área de educação. Durante as últimas décadas, exerceu forte influência sobre as políticas de educação implementadas pela Prefeitura da Cidade do Recife, tendo saído daquele Centro vários gestores municipais, alguns ex-professores e colegas que prefiro não mencionar. Se, por um lado, isso significa o reconhecimento do nível de reflexão daquela entidade sobre o assunto, por outro, é de se lamentar que os bons indicadores na área do ensino fundamental não estejam se refletindo na Rede Pública da Cidade do Recife, que alcançou um dos piores resultados do Brasil.

                                   Um dos gestores daquele Centro foi o professor Ives de Mapeau, de saudosa memória, uma pessoa simples, sensível, que, algumas décadas atrás, quem sabe pelo hábito trazido da França, já usava a bicicleta como um meio de transporte, numa postura ecologicamente correta. Uma de suas declarações causou espanto nos meios acadêmicos ao afirmar que o Colégio de Aplicação não teria competência para trabalhar com alunos empobrecidos. À época, isso repercutiu muito mal, porque o Centro era(?) hegemonizado pelo pensamento de esquerda e a franqueza do professor pareceu algo conservador, elitista.

                                   Por outro lado, se estávamos num Centro de excelência em educação, como admitir essa incapacidade de conceber um programa de educação que fosse competente o suficiente para enfrentar as desigualdades inerentes aos alunos mais empobrecidos? O professor foi muito mal interpretado e vítima do patrulhamento ideológico – limitado ao discurso – dos departamentos mais identificados com o pensamento de esquerda na educação, notadamente o de Fundamentos Sócio-Filosóficos da Educação. O curioso naquele Centro é que o Departamento de Gestão Educacional, perdoe-nos por não lembrar-nos do nome correto - quem sabe pelo viés instrumental – sempre manteve uma postura mais conservadora.

                                   Na realidade, retirado esse pano de fundo ideologizado, logo se compreende as afirmações do professor Ives de Mapeau, com quem tive a oportunidade de conviver e conhecer sua seriedade. Há verdades e mitos que precisam ser refletidos, sem a coloração ideológica que costuma anestesiar o pensamento. Primeiro, há de se reconhecer todo o bom desempenho do Colégio de Aplicação da Universidade Federal de Pernambuco, elogiando-se todos os seus servidores e alunos. A nota obtida no IDEB é fruto da meritocracia. Possivelmente há um programa de ensino e um planejamento muito bem estruturado; uma gestão atenta, que acompanha todo processo – ou seja, tira a bunda da cadeira -; os professores são bem qualificados e contratados consoante os critérios adotados pelo mesmo processo de ingresso na Universidade.

                                   Embora não haja nenhuma indicação de que professores com melhor remuneração sejam melhores professores, não resta dúvida de que eles possuem uma vida mais sossegada, tendo acesso à dispositivos culturais que melhoram sua atuação em sala de aula. A clientela atendida pelo Colégio é muito bem-selecionada, através de um teste aplicado com regularidade, todos os anos. Isso permite àquele estabelecimento trabalhar com uma público oriundo dos estratos sociais remediado ou melhor favorecido da sociedade recifense e adjacentes. As enquetes sociais aplicadas devem indicar isso.

                                   Afora esses procedimentos pedagógicos que podem ser repicados em escala em toda a rede pública, caso haja recursos, vontade política e mobilização da sociedade, num contexto mais geral, pouco contribuirá para socializar a melhoria da qualidade do ensino no país. Quando muito, no final, serve apenas para aprofundar o fosso que separa a sociedade brasileira, construindo-se muros, num país que precisa urgentemente de pontes para se encontrar enquanto nação... até 2021. Chegaremos lá?  

 


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