O ex-governador de Pernambuco, em seu discurso de despedida do Senado, afirmou que a política brasileira parecia "um filme de terror, onde os mocinhos morrem todos no final". Partindo de quem fala, é interessante analisar essa despedida melancólica de um político que tanto perseguiu, processou, desrespeitou os adversários em seu Estado. Há muito tempo se fala dos aleijões, das deformações e patologias do sistema político brasileiro, que aliás permitiram que uma criatura legitimamente sua vem se arvorar em "catão" da República petista. Ainda não se fez a autópsia do cadáver dessas administrações do PMDB (e suas alianças monstruosas) aqui em Pernambuco. Em algum momento, um crítico com a necessária imunidade aos humores acrimoniosos desse ex-governador colocará o dedo das feridas dessas gestões "virtuosas" e extrairá o conteúdo verdadeiro do que foram elas para o interesse público do nosso Estado.
Foi este cidadão republicano e virtuoso que inaugurou entre nós o modelo das administrações do "salesman" e da agenda gerencial do Estado. Como o gerente mais bem compenetrado do evangelho PSDbista de FHC, o ex-governador pôs em prática a fórmula da alienação do patrimônio público, publicizou as políticas sociais e desmontou os mecanismos de fiscalização da administração pública. "Vendeu" o Estado à base de uma fabulosa renúncia fiscal às empresas e perseguiu como pôde os críticos, os adversários, os que nunca concordaram com esse modelo de gestão pública-privada. E ainda se valeu da marketização agressiva dos símbolos oficiais do Estado para produzir um arremedo de "cultura cívica"; para o que deve ter sido de muita valia a propaganda do "Pernambuco da Sorte". Dá sorte a quem?
As parcerias com as fundações (sem fins lucrativos?) empresariais vieram substituir a rede pública de ensino e a justa valorização da magistério. Contratos e convênio milionários com a Fundação Roberto Marinho e a Fundação Ayrton Senna, com suas tele-salas e seus monitores, estes contratados por cooperativas de trabalho ao arrepio das legislação trabalhista. E o que dizer da contribuição dessa famoso estadista para o aperfeiçoamento do sistema partidário brasileiro? - Ele simplesmente implodiu o sistema partidário de Pernambuco, depois de sua vitória contra Miguel Arraes de Alencar, numa das disputas mais litigiosas que já tivemos. E que continuou, depois da eleição.
É muito ilustrativo ver agora o destemido e valente parlamentar - que fará sua reestreia na Câmara dos Deputados - eleito através do palanque do seu arqui-inimigo, o falecido Eduardo Campos, depois de ter tripudiado sobre o cadáver político do velho Arraes. Sinal dos tempos. O ciclo encerrou-se. Fica a assombração, a carantonha de quem foi outrora o opocisionista autêntico do antigo PMDB de Pernambuco.
Michel Zaidan Filho é historiador, filósofo, cientista político e professor da Universidade Federal de Pernambuco.
Nenhum comentário:
Postar um comentário