pub-5238575981085443 CONTEXTO POLÍTICO. : Crônicas do cotidiano: Pierre Bourdieu, um sociólogo francês em Paulista.
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terça-feira, 10 de maio de 2016

Crônicas do cotidiano: Pierre Bourdieu, um sociólogo francês em Paulista.




José Luiz Gomes


Paulista, cidade aqui da região metropolitana do Recife, nos últimos anos, tornou-se uma obsessão para mim. Nosso objetivo, a partir de um trabalho em execução, seria o de entender como, de fato, funcionou  a dinâmica de "dominação" e "exploração" da classe operária daquele município durante a hegemonia da família Lundgren na cidade. Trata-se um tipo de dominação que ia muito além da linha de produção, algo exaustivamente estudado por teóricos como Karl Marx. Para entendê-la, portanto, seria muito interessante a leitura de outros estudiosos do assunto, como Michel Foucault, Pierre Bourdieu, Louis Althusser e, possivelmente Karl Kaustski. 

Surpreendeu a mim o número de bons trabalhos acadêmicos já produzidos sobre o assunto. Creio que, ao destacar a tese de doutoramento de José Sérgio Leite Lopes, A Tecelagem do Conflito de Classe na Cidade das Chaminés, não cometeríamos alguma injustiça com os demais. O livro é muito bem recomendado através do prefácio do sociólogo Francisco de Oliveira, um dos examinadores. Para Francisco de Oliveira, mesmo respeitando o rito acadêmico, há uma espécie de "engajamento" do autor, onde se é possível vislumbrar, mesmo que anpassant, uma poiésis operária - em meio à aisthesis - naquele trabalho, destacando o grau de aviltamento dos operários e operárias nas relações sociais de produção e nas relações sociais mais gerais.  

No período pós-guerra, que nos perdoem os historiadores se estivermos cometendo algum equívoco, a família Lundgren consolida o seu poder total no município. O complexo de controle social envolvia, além da linha de produção nas três companhias de tecido, a vila operária, a produção de alimentos, além das atividades recreativas e religiosas. A vila operária chegou a possuir 6 mil casas arrendadas aos trabalhadores da CTP, sigla da Companhia de Tecidos Paulista. Entender esse intricado processo de dominação - para muito além das fábricas - é uma missão das mais instigantes. A acessibilidade aos equipamentos culturais, por assim dizer, também era uma prerrogativa que precisava contar com o aval da família Lundgren. Os cinemas e o clube social eram dos Lundgrens. Afinal, o que não era dos Lundgrens em Paulista? Esfera pública, então, tratava-se de uma grande utopia. 

Para completar o serviço, ainda mantinham uma milícia armada para fazer valer sua vontade sobre os operários-moradores. Talvez seja por isso que nos causa asco quando vejo movimentos no sentido de resgatar o "legado" dos Lundgrens naquela cidade. Como afirmou o professor Durval Muniz, numa de suas palestras na Fundação Joaquim Nabuco, há alguns fatos históricos que não é para serem resgatados mesmo. Aliás, brincava ainda Durval, quem resgata é o SAMU e o Corpo de Bombeiros. Parafraseando o sociólogo Gilberto Freyre, no livro Nordeste, numa referência aos senhores de engenho da época, os Lundgrens eram os donos de tudo: da terra, da fábrica, das matas, dos rios, das máquinas, das casas, do porto, do aeroporto e das melhores mulheres.

Muitos bons autores são observados pelo José Sérgio Leite Lopes, no sentido de orientar a sua pesquisa. Autores identificados com essa questão do poder, da exploração, das desigualdades sociais e econômicas. Michel Foucault traz contribuições importantíssimas sobre as relações de poder e resistência exercida entre os Lundgren e os operários. O conceito de "instituição total" também se aplica bem àquele objeto de estudo. Quando chegavam na cidade para ingressarem na CTP, geralmente fugindo de outros processos de exploração no campo, os operários eram mantidos em alojamentos que mais se assemelhavam a campos de concentração. 

Pierre Bourdieu, então, como o "sociólogo das desigualdades", através do seu conceito de capital simbólico - que amplia o conceito de capital econômico de Marx - introduz reflexões mais do que importantes para entender aquelas relações. Senti a falta de outro francês, amigo José Sérgio Leite Lopes, o Louis Althusser, quem sabe para entender melhor a interpelação dos operários. Outro dia, atendendo ao convite de uma professora da rede pública municipal, tivemos uma conversa com os alu@s que estão lendo nossas crônicas sobre o município e gostariam de entender melhor como foi sua cidade há alguns anos atrás.   




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