pub-5238575981085443 CONTEXTO POLÍTICO.
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quarta-feira, 18 de março de 2015

Efeito Coxinhas: Teori rejeita pedido de investigação de Dilma Rousseff


A partir dessa postagem, estaremos publicando no blog uma série de comentários acerca do que estamos chamando de "efeito coxinhas", ou seja, uma análise das repercussões - no Governo e na Oposição - das manifestações do último dia 15, que reuniu dois milhões de pessoas em todo o país, pedindo, entre outras coisas, o impeachment da presidente Dilma Rousseff. Dilma Rousseff, de fato, enfrenta um problema de turbulência no início do seu segundo mandato. A economia não vai bem; a política está paralisada; o escândalo de corrupção na Petrobras se avoluma e complica-se a cada dia. Por outro lado, não há como envolver Dilma nessas falcatruas. Hoje, pela manhã, lembrei a um cidadão que se apresentou como Pedro, em comentário a um artigo nosso publicado no Blog de Jamildo Melo, que Dilma, de fato, tem as mãos limpas. Ainda na condição de ministra de Lula, já comprava brigas feias no Governo em torno dos famigerados "aditivos" que, além de representar um mecanismo de desvios de verbas públicas, atrasavam investimentos públicos fundamentais para a população. Até mesmo obras como a transposição das águas do Rio São Francisco foram atingidas por esse expediente. Esse parece ser o mesmo raciocínio da turma do STF, que não deram a mínima por um pedido de investigação da presidente protocolado pelo PPS, através do Deputado Raul Jungmann. O açodamento foi tão grande que esqueceram de assinar a petição. Mas, se assinassem, a postura de Teori não seria outra. Há uma turma ensandecida pedindo a cabeça da presidente, mas não há argumento para isso. Durante as manifestações do último dia 15, havia muitas faixas pedindo a volta dos militares, numa clara demonstração de desrespeito ao Estado Democrático de Direito. Eu não sei se chamo isso de burrice ou falta de responsabilidade, uma vez os padrões de conscientização política observados eram extremamente precários. Penso tratar-se de pessoas que não dimensionam corretamente o que isso representou para o país. O que precisamos e lutar diuturnamente para fortalecer nossas instituições democráticas, deixando um legado de consolidação democrática para os nossos filhos. Deveríamos, isso sim, ampliar as conquistas sociais obtidas nos últimos anos, permitindo a diminuição do hiato politico entre democracia política e econômica. Fotos tiradas das manifestações na Bahia, por exemplo, parece mostrar um país de 500 anos atrás, evidenciando a necessidade de ampliar as pontes entre o andar de cima e o andar de baixo. Enquanto os coxinhas brancos ( e amarelos) desfilavam tranquilamente, os negros observavam nas arquibancadas.

Efeito Coxinhas: Vaccari e Cid Gomes podem cair


Recentemente, o ex-gerente da Petrobras, Pedro Barusco, prestou um longo depoimento na Câmara dos Deputados, precisamente numa comissão criada para investigar as denúncias de desvios de recursos públicos na estatal. Instigado pelos deputados de oposição, em certo momento de sua fala, insinuou que havia repassado recursos oriundo de propinas de empreiteiras para o tesoureiro do PT, João Vaccari Neto. Um outro delator, Paulo Roberto Costa, antes, já havia descido aos detalhes do enredo, inclusive informando o nome do hotel onde o tesoureiro encontrava-se com os operadores do esquema. À época, Vaccari não negou os encontros, mas disse que eram encontros sociais. Não vejo muita razão para acreditar que Barusco esteja mentindo. Até recentemente, foram repatriados de suas contas no exterior, aproximadamente algo em torno de R$ 160 milhões de reais. Barusco fala de R$ 300 milhões como quem estivesse fazendo as continhas das despesas com o churrasco no final de semana. Pouco provável que esteja mentindo. Passaria em qualquer detector de mentiras. O PT, naturalmente, esperneou e ameaçou processar Barusco. Hoje, no entanto, diante do pandemônio em que está se transformando o caldeirão politico de Brasília, seus dirigentes já recomendam o afastamento dele do cargo, torcendo que vá para bem longe. De preferência numa cidadezinha do interior mineiro, longe dos holofotes. Cid Gomes, o Ministro da Educação, é outro que passou a ser ameaçado pela guilhotina do Planalto. Sua indicação sempre levantou muitas controvérsias, mas, nos bastidores sabe-se que atendia às conveniências políticas para tentar salvar o segundo mandato de Dilma. Um lance de pragmatismo e nada mais. Em certos aspectos, confesso que o Cid até tem nos surpreendido. Na defesa intransigente do Governo Dilma, por exemplo. Parece assumir a condição de um homem da Casa Civil ou da Articulação Política. Mas, dadas as contingências, parece que falou demais. Ao se referir aos parlamentares informou que a Câmara dos Deputados teria, pelo menos, uns 300 achacadores. A turma não gostou, ameaçou processá-lo, e o PT parece disposto a pedir sua cabeça a presidente Dilma Rousseff. Nas coxias, comenta-se que até Lula teria entrado no circuito. Seria uma forma de fazer uma concessão - mais uma - aos seus algozes. Estamos vivendo, de fato, um ambiente político muito turno. Agora talvez fique mais simples entender porque o economista Marcelo Neri foi afastado da Secretaria de Assuntos Estratégicos. Estratégico para o PT, hoje, seria salvar o pescoço. É tempo de murici, moçada.
Nota do editor: Depois de mais um depoimento tumultuado na Câmara Federal, o ex-governador do Ceará, Cid Gomes, foi demitido do cargo. Os achacadores pediram sua cabeça, sob a chantagem de abandonarem a base aliada do Governo Dilma Rousseff. Dilma entregou. Cid caiu em pé, de cabeça erguida, reafirmando sua posição sobre a dinâmica de funcionamento daquela Casa e de seus representantes. Cometeu sincericídio.

A Casa-Grande vai às ruas. O que eles querem? O de sempre.


A Casa-Grande vai às ruas. O que eles querem? O de sempre.

PUBLICADO EM 17/03/2015 ÀS 14:45 POR  EM NOTÍCIAS

Manifestantes-durante-ato-em-favor-de-Dilma-Rousseff-e-da-Petrobras-no-Rio-de-Janeiro-foto-Fernando-Frazao-Agencia-Brasil_0008-850x565
Por José Luiz Gomes
(Cientista Político)
Independentemente das controvérsias sobre o número real de participantes dos protestos contra o Governo Dilma, no dia de ontem, na Av. Paulista – principal reduto dos tucanos – o fato é que, para o bem ou para o mal, não se pode negligenciar o recado das urnas. Os protestos ocorreram praticamente em todo o país, principalmente nas grandes capitais, com um número expressivo de participantes. Aqui, pelas redes sociais, observo que alguns internautas estão tentando desqualificar as manifestações a partir de alguns fatos curiosos – como uma pauta difusa; carregada de preconceitos; algumas reivindicações bem particulares; outras ilegais, posto que fere a Constituição Federal- como o pedido de intervenção militar -; aparições mais ousadas, como aquela mulher que ficou nua ou a outra que mostrou os seios. Até o educador pernambucano, Paulo Freire, entrou nessa história. Um cartaz pedia seu impeachment do currículo de ensino básico, além da prisão de um certo Karl Marx de Garanhuns, uma cidade maravilhosa do Agreste pernambucano.
De fato, ocorreram algumas situações hilárias e folclóricas. Mas, como já advertíamos em postagens anteriores, o Planalto precisa ficar bastante atento às manifestações de ruas, seja contra ou a favor. Mesmo com todo o apoio da mídia golpista, não se pode desprezar uma manifestação desse porte. A cobertura da Rede Globo de Televisão ao evento foi de um esmero “impecável”, como já se imaginava que fosse. O canal aberto fez chamadas sistemáticas logo cedinho e o canal fechado, Globo News, dedicou horas de cobertura ao evento, transmitindo-o quase que simultaneamente. Quase que a totalidade do tempo do Programa Fantástico foi dedicado ao tema.
À noite, tratei de observar o termômetro das ruas e a estimativa de um milhão de pessoas na Av. Paulista já havia se consolidado no imaginário coletivo. Para o militante petista e apoiadores de Dilma essa desqualificação pode até servir para massagear o seu ego. Para o Governo Dilma, a encrenca é bem mais acentuada, exigindo-se uma ampla negociação política para “tocar” ou salvar o seu mandato, além dos cuidados com a retaguarda de comunicação, como sugere Miguel do Rosário, no seu Tijolaço. O Governo, no seu entendimento, apanha feio e oferece a outra face, além de estar cometendo erros sucessivos de avaliação.
O desgaste é inegável. Como afirmou o cientista político Michel Zaidan Filho, tudo que de ruim poderia acontecer está ocorrendo neste início de mandato. Dilma está acuada pela oposição e isolada dentro de sua própria base de apoio, diante de um verdadeiro travamento político. Sua articulação política é tão frágil que a presidente anda às turras com o PMDB e setores do PT. Outro dia, em depoimento à CPI da Petrobras, Eduardo Cunha arrancou aplausos de petistas. Consultado, seu padrinho político, o Lula, fez algumas recomendações, mas penso que ela as ignorou. Há quem informe que a personalidade de Dilma Rousseff passou a constituir-se num problema grave na atual conjuntura política. Além de não avançarmos na regulação econômica da mídia, o Governo Federal injeta milhões de recursos em mídias que o massacra diuturnamente, a exemplo do que ocorreu no dia de ontem, onde a emissora do plim plim, paralelo às imagens dos manifestantes, tecia análises política as mais tendenciosas possíveis sobre o seu Governo. Isso sem que a população tivesse acesso ao contraditório através dos canais oficiais do Governo na blogosfera ou nas redes sociais.
Voltando à arena da articulação política, ela nunca foi muito feliz por aqui. Além de não gostar desse meio de campo, da micropolítica, também não foi feliz na escolha dos seus assessores. A “trinca” que hoje responde pela área não tem se saído melhor do que os seus anteriores. O resumo da ópera não é dos melhores. Um Governo que perdeu a guerra de comunicação; desarticulado politicamente; com uma economia que não vai bem das pernas; com gente do partido envolto num escândalo de dimensões gigantescas. Pouco provável que o ex-gerente da estatal, Pedro Barusco, estivesse mentido ao afirmar que repassou algo em torno de R$ 300 milhões ao tesoureiro do partido, João Vaccari Neto. Dilma tem as mãos limpas. Nunca compactuou com esses malfeitos. Juridicamente, não há razão nenhum para um pedido de impeachment. Estamos aqui, então, diante de um grande impasse. Como resolver, então, essa crise política? Só esperamos que, comprovada alguma irregularidade, depois de cumpridas todas as tramitações jurídicas necessárias, Vaccari não se transforme num novo Delúbio.
E aí temos que entrar no grande pleito dos manifestantes do dia 15: eles querem a cabeça da presidente Dilma Rousseff. Essa história de corrupção é apenas o pano de fundo que, pelo nível de alguns manifestantes, passa a ser cueca mesmo. Está aqui um fenômeno muito bem-sucedido de fomentação de ódio. Ódio contra um partido. Ódio contra uma presidenta da República. Ódio que se dissemina como um câncer em estado de metástase. Nem mesmo o acirramento de ânimos da campanha de 2014 externaram a dimensão do problema, mas o ovo da serpente já estava aquecido. Para setores poderosos, Aécio Neves, o candidato do PSDB, ter perdido aquelas eleições deve ter provocado uma grande frustração em segmentos da elite e da classe média. Essa classe média, definitivamente, como afirmou o chargista Renato Aroeira, não gosta de Dilma. Desde então, eles não permitem que Dilma governe. A presidente já fez várias concessões a esses grupos, mas, nem assim, eles parecem estar satisfeitos. Não aceitam as regras do jogo democrático. Desejam derrubá-la. Querem sua degola e estão ensandecidos, assim como piranhas na carne fresca e urubus na carniça.
Embora não se aplique, no caso, um pedido de impeachment, muito menos uma intervenção militar, se faz necessário que o Planalto encontre uma saída política para enfrentá-los. Talvez precisássemos aqui de um grande negociador, alguém com bom trânsito, um bombeiro para apagar esse incêndio. Não temos. Outra alternativa, como sugeriu Renato Aroeira, seria uma saída pela esquerda como último recurso. Mas, mesmo aqui, Dilma deve uma boa explicação para ter mexido em direitos trabalhistas, ter adotado um receituário neoliberal de ajuste fiscal; ter convidado um assessor do adversário para assumir a pasta da Fazenda. Já dizia um estudioso do assunto que um dos grandes problemas deste país são as conciliações. Tudo parece ser resolvido com uns tapinhas nas costas ou são eternamente protelado. A rigor, se o Planalto tivesse dado ouvido às reivindicações das “Jornadas de Junho”, possivelmente, no mínimo, já teríamos um arcabouço institucional melhor preparado para enfrentar esses solavancos.
Quando a rapaziada vai às ruas, o Governo se arvora em afirmar que adotará as medidas para atender ao pleito dos manifestantes. Foi assim em Junho de 2013. Está sendo assim em 2015. Nenhuma mudança significativa na agenda de políticas públicas. Pelo contrário, até cortes foram anunciados no MEC, até então um ministério estratégico para o PT. Nenhuma avanço na reforma política que pudesse permitir ao presidente ser menos refém das chantagens do Legislativo; nenhum avanço na regulação econômica da mídia – que combatesse os oligopólios – promotores de um massacre diário da presidente. Assim não dá, doutora. Estamos aqui pra emprestar-lhe total e irrestrito apoio e solidariedade, mas é necessário que se tenha a dimensão correta do problema.
Naturalmente, não se pode comparar essas duas manifestações. Há uma distância enorme entre ambas. As Jornadas de Junho foram de caráter cívico, legalistas, rigorosamente preocupadas com o rumos do país, propondo uma nova agenda de governança. Essas últimas podem ser traduzidas muito mais como arroubos de uma classe média e de uma elite insatisfeitas com as concessões ao andar de baixo. Perdeu-se ali, durante as Jornadas de Junho, uma grande oportunidade de se passar este país a limpo; de construir pontes entre os diversos segmentos sociais; de atender aos pleitos dos movimentos sociais; de montar um arcabouço de engenharia política capaz de resistir a essas intempéries. Esses urubus voando de costa, em nome de uma ressaca eleitoral, estão tentando parar o governo, atentar contra o Estado Democrático de Direito. Muito grave isso.
(Publicado ontem, dia 17, no blog de Jamildo, do Jornal do Commércio)

terça-feira, 17 de março de 2015

Tijolinho Real: Quem, afinal, é este Karl Marx de Garanhuns.



 


Garanhuns é uma cidade muito gostosa do Agreste Pernambucano. De clima agradabilíssimo, num passado recente era o principal reduto da burguesa recifense nas suas férias de inverno. Sobretudo por questões de logística, esse posto hoje é ocupado por uma outra cidade do Agreste - bem mais próxima do Recife - Gravatá. Tenho ótimas lembranças do local, principalmente do Hotel Fazenda Alvorada, para mim, com raízes fincadas no campo, um verdadeiro paraíso na terra. Tenho grandes amigos daquela cidade - alguns deles virtuais - outros de carne e osso mesmo, a exemplo de Rafael Souto Maior - com quem fiz o mestrado na UFPE - Marlon César Pessoa Neves, com quem trabalhei junto no Governo do Estado - e o maior deles, o professor Michel Zaidan Filho, um amigo de todas as horas e lugares. Michel é natural de Garanhuns. 

Aconteceram algumas situações graves e outras engraçadas nessa manifestação do último dia 15 de março. As graves já comentamos em outras postagens. Entre as hilárias, um cidadão que ostentava um cartaz pedindo a prisão de um certo Karl Marx de Garanhuns. Confesso que fiquei curioso para conhecer esse tal Karl Marx. Na cidade, entre esses nossos amigos virtuais, que prefiro não citar o nome, existe um cidadão radical, que possui um jornalzinho de circulação restrita à cidade. Se veste como guerrilheiro e usa uma boina com as cores da bandeira de Cuba. É, certamente, o suspeito mais provável. Peço encarecidamente, aos amigos da cidade, que nos ajudem a descobrir a verdadeira identidade deste cidadão. 

Nota do editor: Agora caiu a ficha. Um pouco tarde, é verdade. O tal Karl Marx a que o cidadão faz alusão é o ex-presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, que nasceu na cidade. Na realidade, Lula nasceu no então distrito de Caetés, hoje transformado em cidade. Mesmo assim, a comparação é equivocada, uma vez que Lula nunca foi comunista. Penso que, sequer, possui alguma familiaridade com a obra do filósofo alemão.  

Tijolinho Real: Cassaram Paulo Freire... de novo!


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Na década de 60, um pernambucano do país de Casa Amarela, ligado ao SESC, começava uma trajetória no campo da educação que o tornaria famoso no mundo todo. Como diretor do Departamento de Extensão da Universidade do Recife e através da experiência com o Movimento de Cultura Popular - criado na época em que o Dr. Arraes era prefeito do Recife - desenvolveu um método de alfabetização de adulto revolucionário. Posto em prática, experimentalmente, na cidade de Angicos, no Rio Grande do Norte, em 45 dias, foram alfabetizados 300 camponeses, o que levou o Governo do então presidente João Goulart a pensar em ampliar a experiência para todo o país, com um projeto de alfabetizar 2 milhões de pessoas.

Infelizmente, com a deposição de Jango, o projeto foi abortado e Paulo Freire foi exilado no Chile, onde continuou aperfeiçoando e aplicando o seu método no Governo socialista de Salvador Allende. Nunca mais parou de refletir e produzir sobre o tema educação. Paulo possui inúmeros livros publicados. É hoje o pensador brasileiro mais lido e aplicado na Europa e nos Estados Unidos. A Biblioteca de Stanford, segundo Marcelo Rubens Paiva, dedica um andar apenas para os seus livros. Ainda no segundo Governo Arraes, visitou a Usina Catende, onde centenas de camponeses também foram alfabetizados com o seu método. Paulo ministrou a aula inaugural e tivemos a oportunidade de questioná-lo sobre algo que nunca havia entendido muito bem. Ele não gostava do livro de Educação de Adultos, concebido por duas companheiras do MCP, que, no nosso entendimento, atendia a todas as etapas do seu método. Isso nos facultou uma farta ( e fértil) troca de impressões com Carlos Alberto Torres, um dos maiores especialistas no assunto.  

O último cargo público que ocupou foi o de Secretário de Educação de São Paulo, no Governo de Luiza Erundina, até então filiada ao PT. Nas manifestações do dia de ontem, 15, numa demonstração do caráter reacionário da mesma, havia um cartaz que pedia pela sua exclusão do currículo de ensino da educação básica. Pelas redes sociais, o professor Fernando Magalhães, teve o cuidado de reproduzir um discurso de Jango sobre as reformas de base e o quanto a elite brasileira se opunha a essas reformas. 1964 e 2015 estão mais próximo do que se imagina.

segunda-feira, 16 de março de 2015

A Casa-Grande saiu às ruas. O que eles desejam? O de sempre.

 


 José Luiz Gomes escreve:

Independentemente das controvérsias sobre o número real de participantes dos protestos contra o Governo Dilma, no dia de ontem, na Av. Paulista - principal reduto dos tucanos - o fato é que, para o bem ou para o mal, não se pode negligenciar o recado das urnas. Os protestos ocorreram praticamente em todo o país, principalmente nas grandes capitais, com um número expressivo de participantes. Aqui, pelas redes sociais, observo que alguns internautas estão tentando desqualificar as manifestações a partir de alguns fatos curiosos - como uma pauta difusa; carregada de preconceitos; algumas reivindicações bem particulares; outras ilegais, posto que fere a Constituição Federal- como o pedido de intervenção militar -; aparições mais ousadas, como aquela mulher que ficou nua ou a outra que mostrou os seios. Até o educador pernambucano, Paulo Freire, entrou nessa história. Um cartaz pedia seu impeachment do currículo de ensino básico, além da prisão de um certo Karl Marx de Garanhuns, uma cidade maravilhosa do Agreste pernambucano.

De fato, ocorreram algumas situações hilárias e folclóricas. Mas, como já advertíamos em postagens anteriores, o Planalto precisa ficar bastante atento às manifestações de ruas, seja contra ou a favor. Mesmo com todo o apoio da mídia golpista, não se pode desprezar uma manifestação desse porte. A cobertura da Rede Globo de Televisão ao evento foi de um esmero "impecável", como já se imaginava que fosse. O canal aberto fez chamadas sistemáticas logo cedinho e o canal fechado, Globo News, dedicou horas de cobertura ao evento, transmitindo-o quase que simultaneamente. Quase que a totalidade do tempo do Programa Fantástico foi dedicado ao tema.

À noite, tratei de observar o termômetro das ruas e a estimativa de um milhão de  pessoas na Av. Paulista já havia se consolidado no imaginário coletivo. Para o militante petista e apoiadores de Dilma essa desqualificação pode até servir para massagear o seu ego. Para o Governo Dilma, a encrenca é bem mais acentuada, exigindo-se uma ampla negociação política para "tocar" ou salvar o seu mandato, além dos cuidados com a retaguarda de comunicação, como sugere Miguel do Rosário, no seu Tijolaço. O Governo, no seu entendimento, apanha feio e oferece a outra face, além de estar cometendo erros sucessivos de avaliação. 

O desgaste é inegável. Como afirmou o cientista político Michel  Zaidan Filho, tudo que de ruim poderia acontecer está ocorrendo neste início de mandato. Dilma está acuada pela oposição e isolada dentro de sua própria base de apoio, diante de um verdadeiro travamento político. Sua articulação política é tão frágil que a presidente anda às turras com o PMDB e setores do PT. Outro dia, em depoimento à CPI da Petrobras, Eduardo Cunha arrancou aplausos de petistas. Consultado, seu padrinho político, o Lula, fez algumas recomendações, mas penso que ela as ignorou. Há quem informe que a personalidade de Dilma Rousseff passou a constituir-se num problema grave na atual conjuntura política. Além de não avançarmos na regulação econômica da mídia, o Governo Federal injeta milhões de recursos em mídias que o massacra diuturnamente, a exemplo do que ocorreu no dia de ontem, onde a emissora do plim plim, paralelo às imagens dos manifestantes, tecia análises política as mais tendenciosas possíveis sobre o seu Governo. Isso sem que a população tivesse acesso ao contraditório através dos canais oficiais do Governo na blogosfera ou nas redes sociais.

Voltando à arena da articulação política, ela nunca foi muito feliz por aqui. Além de não gostar desse meio de campo, da micropolítica, também não foi feliz na escolha dos seus assessores. A "trinca" que hoje responde pela área não tem se saído melhor do que os seus anteriores. O resumo da ópera não é dos melhores. Um Governo que perdeu a guerra de comunicação; desarticulado politicamente; com uma economia que não vai bem das pernas; com gente do partido envolto num escândalo de dimensões gigantescas. Pouco provável que o ex-gerente da estatal, Pedro Barusco, estivesse mentido ao afirmar que repassou algo em torno de R$ 300 milhões ao tesoureiro do partido, João Vaccari Neto. Dilma tem as mãos limpas. Nunca compactuou com esses malfeitos. Juridicamente, não há razão nenhum para um pedido de impeachment. Estamos aqui, então, diante de um grande impasse. Como resolver, então, essa crise política? Só esperamos que, comprovada alguma irregularidade, depois de cumpridas todas as tramitações jurídicas, Vaccari não se transforme num novo Delúbio. 

E aí temos que entrar no grande pleito dos manifestantes do dia 15: eles querem a cabeça da presidente Dilma Rousseff. Essa história de corrupção é apenas o pano de fundo que, pelo nível de alguns manifestantes, passa a ser cueca mesmo. Está aqui um fenômeno muito bem-sucedido de fomentação de ódio. Ódio contra um partido. Ódio contra uma presidenta da República. Ódio que se dissemina como um câncer em estado de metástase. Nem mesmo o acirramento de ânimos da campanha de 2014 externaram a dimensão do problema, mas o ovo da serpente já estava aquecido. Para setores poderosos, Aécio Neves, o candidato do PSDB, ter perdido aquelas eleições deve ter provocado uma grande frustração em segmentos da elite e da classe média. Essa classe média, definitivamente, como afirmou o chargista Renato Aroeira, não gosta de Dilma. Desde então, eles não permitem que Dilma governe. A presidente já fez várias concessões a esses grupos, mas, nem assim, eles parecem estar satisfeitos. Não aceitam as regras do jogo democrático. Desejam derrubá-la. Querem sua degola e estão ensandecidos, assim como piranhas na carne fresca e urubus na carniça. 

Embora não se aplique, no caso, um pedido de impeachment, muito menos uma intervenção militar, se faz necessário que o Planalto encontre uma saída política para enfrentá-los. Talvez precisássemos aqui de um grande negociador, alguém com bom trânsito, um bombeiro para apagar esse incêndio. Não temos. Outra alternativa, como sugeriu Renato Aroeira, seria uma saída pela esquerda como último recurso. Mas, mesmo aqui, Dilma deve uma boa explicação para ter mexido em direitos trabalhistas, ter adotado um receituário neoliberal de ajuste fiscal; ter convidado um assessor do adversário para assumir a pasta da Fazenda. Já dizia um estudioso do assunto que um dos grandes problemas deste país são as conciliações. Tudo parece ser resolvido com uns tapinhas nas costas ou são eternamente protelado. A rigor, se o Planalto tivesse dado ouvido às reivindicações das "Jornadas de Junho", possivelmente, no mínimo, já teríamos um arcabouço institucional melhor preparado para enfrentar esses solavancos. 

Quando a rapaziada vai às ruas, o Governo se arvora em afirmar que adotará as medidas para atender ao pleito dos manifestantes. Foi assim em Junho de 2013. Está sendo assim em 2015. Nenhuma mudança significativa na agenda de políticas públicas. Pelo contrário, até cortes foram anunciados no MEC, até então um ministério estratégico para o PT. Nenhuma avanço na reforma política que pudesse permitir ao presidente ser menos refém das chantagens do Legislativo; nenhum avanço na regulação econômica da mídia - que combatesse os oligopólios - promotores de um massacre diário da presidente. Assim não dá, doutora. Estamos aqui pra emprestar-lhe total e irrestrito apoio e solidariedade, mas é necessário que se tenha a dimensão correta do problema. 

Naturalmente, não se pode comparar essas duas manifestações. Há uma distância enorme entre ambas. As Jornadas de Junho foram de caráter cívico, legalistas, rigorosamente preocupadas com o rumos do país, propondo uma nova agenda de governança. Essas últimas podem ser traduzidas muito mais como arroubos de uma classe média e de uma elite insatisfeitas com as concessões ao andar de baixo. Perdeu-se ali, durante as Jornadas de Junho, uma grande oportunidade de se passar este país a limpo; de construir pontes entre os diversos segmentos sociais; de atender aos pleitos dos movimentos sociais; de montar um arcabouço de engenharia política capaz de resistir a essas intempéries. Esses urubus voando de costa, em nome de uma ressaca eleitoral, estão tentando parar o governo, atentar contra o Estado Democrático de Direito. Muito grave isso.   

domingo, 15 de março de 2015

Tijolinho Real: O Planalto deve ficar atento às mobilizações de rua. Contra ou a favor.




Em pouco mais de 48 horas, duas manifestações nacionais. O Planalto precisa ficar atento aos humores das ruas. Depois de passar pelas aulas da professora Danielle de Perin Rocha Pitta, passei a observar os acontecimentos com outros olhos, menos polarizados. Historicamente, no Brasil, é muito comum analisar as coisas na base do contra e a favor. Com isso, perde-se muito nos "intervalos", algo que a nossa inteligência mediana não consegue captar. Os fatos sociais são bem mais complexos, como diriam os partidários de algumas correntes de pensamento, a exemplo do imaginário social. É exatamente nos intervalos que se concentram as melhores lições dessas duas manifestações. Uma delas já ocorreu no dia 13 e contou com milhares de manifestantes em todo o Brasil, numa demonstração de força da base aliada do Governo Dilma. Foi convocada pelos mesmos segmentos sociais que garantiram mais um mandato para a presidente Dilma Rousseff. Além de parabenizar a capacidade de mobilização dos apoiadores da presidente Dilma Rousseff, até aqui, nada a acrescentar, não fosse o conjunto de reivindicações dos movimentos sociais ao Governo. 

O MST pediu agilidade nas reformas agrária e política. Centrais sindicais como a CUT, questionaram as medidas de ajuste fiscal que estão penalizando os direitos da classe trabalhadora, como as mudanças de regras das pensões e no seguro desemprego, algo que a presidente Dilma jurou que não mexeria durante a campanha."Nem que a vaca tussa", lembram? numa expressão possivelmente recomendada por João Santana, o marqueteiro oficial do Planalto, que hoje parece ter perdido a capacidade de enfrentar o massacre que a presidente vem sofrendo por parte da mídia. Não quero aqui fazer coro com os oposicionistas - que dizem que Dilma vendeu ilusões durante a campanha - mas, de fato, todos os indicadores econômicos e as medidas tomadas até agora indicam que a saúde de nossa economia estava bastante fragilizada. Em todo caso, nós não elegemos Dilma Rousseff para ela convidar assessores de Aécio Neves para condução da política econômica, tampouco adotar um receituário neoliberal de ajuste das contas públicas, comprometendo os direitos dos trabalhadores e os investimentos estratégicos em educação, por exemplo. 

As mobilizações programadas para hoje, dia 15, possui um caráter golpista, anti-democrático. Os coxinhas saem às ruas não contra a corrupção - embora seja este o mote - mas contra, sobretudo, aos avanços sociais conquistados pelo país nos últimos anos, que favoreceram o andar de baixo da pirâmide social. Não sou muito partidário da teoria da conspiração, mas parece-nos não haver dúvida sobre as intenções nefastas deste movimento, a julgar pelo apoio de setores da grande mídia, do farto financiamento, da coação exercida para as pessoas saírem às ruas e, sobretudo, algumas considerações geopolíticas jogos, motivadas pelas posições assumidas, hoje, pelo país, no contexto das relações internacionais.

Dilma, portanto, precisa ficar atenta a dois aspectos. Ao apoio crítico de sua base de sustentação histórica e, sobretudo, a engrenagem poderosa que está sendo urdida contra o seu Governo, envolvendo, praticamente, todos os ingredientes que convergem para um golpe de Estado. Há como abortar essa operação em curso, caso sejam controladas algumas dessas "peças" fundamentais para moer essa máquina conspiratória. Essa engrenagem não é à prova de oxidação. Há uma autora chilena que teve o cuidado de levantar todas as "condições" fundamentais para a materialização de um golpe de Estado. Em 1964 todas as condições estavam amadurecidas. 

Hoje, o que nos parece estar "amadurecida" é uma pregação sistemática contra o Governo, com alguns políticos da oposição exigindo o impeachment da presidente. Uma onda de ódio contra o PT.Isso, naturalmente, atinge uma grande repercussão na mídia golpista, mas não chega às ruas. Os protestos estão programadas para as áreas litorâneas em todo o Brasil, numa nítida identificação de classe por trás do movimento. Seria bem mais interessante que esses burguesinhos continuassem tomando os seus chopps na orla e permitissem que os mais empobrecidos continuassem tendo acesso às suas azinhas de galinhas para os churrascos de final de semana na lage.  O problema é que essa gente é muito egoísta.

sábado, 14 de março de 2015

Antonio David: Crítica e autocrítica sobre o PT na política brasileira.


publicado em 13 de março de 2015 às 20:26
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Crítica e autocrítica
por Antônio David, especial para o Viomundo
Nesse artigo, pretendo discutir a intervenção da esquerda na conjuntura política brasileira, mais especificamente o exercício da crítica e da autocrítica. Para tanto, tomarei como base artigo publicado recentemente no Correio da Cidadania, de autoria do jovem cientista político Henrique Costa, intitulado O PT e seu eterno retorno.
Henrique expressa um ponto de vista representativo de uma corrente de pensamento, que genericamente podemos chamar de “oposição de esquerda”. De minha parte, pretendo expor um raciocínio divergente.
Tanto eu como Henrique não somos nomes de relevo no debate público no Brasil. Peço ao leitor que ignore este fato e atenha-se, na medida do possível, ao raciocínio contido em cada artigo. Que considere os argumentos. Pois, mesmo que mal formulado e expresso por um nome desconhecido, um raciocínio contém potencialmente a chave para a solução de impasses. Se a solução para os impasses vividos pela esquerda brasileira puderem ser extraídos de um exercício de crítica e correção dos argumentos aqui levantados, o artigo terá cumprido seu papel.
Não vou me ater a questões do artigo de Henrique que me parecem discutíveis, mas que não são centrais em seu raciocínio, tal como “Uma parte significativa da classe média já foi petista”, ou a leitura que se pode fazer dos dados da pesquisa Datafolha mencionados no artigo: “Mas o Datafolha nos diz que 36% das pessoas com renda de até 2 salários mínimos e 46% das pessoas com renda entre 2 e 5 salários mínimos rejeitam a presidente. Quem está certo?”.
Para melhor expor o raciocínio, dividi o artigo em quatro partes.
1) Penso que Henrique toca naquela que talvez seja a questão mais relevante para a esquerda brasileira:
O lulismo vai sendo encoberto pelo deserto de ideias e pela queima rápida e gradual do capital político acumulado de 2003 a 2008”.
Dito de outro modo, há um acúmulo, há uma conquista, e há o risco de um desacúmulo, de uma derrota. E entre um e outro há uma relação problemática: quanto mais o tempo passa e mais pessoas são incluídas, mais difícil é manter o ritmo da inclusão. Daí a insatisfação ou inquietação dos que foram recém-incluídos (nova classe trabalhadora), algo diferente do ódio ao PT vindo dos que já eram incluídos (classe média tradicional).
Haverá divergências na esquerda sobre a natureza e o grau da conquista e do horizonte da derrota, mas, expressa dessa maneira, em termos muito genéricos, o problema parece bem colocado.
De que maneira Henrique lida com esse problema? Ou seja, como ele identifica as raízes ou causas tanto das conquistas como da possibilidade da derrota?
2) Penso que Henrique consegue localizar a causa quando faz menção a “questões de ordem política e organizacional”.
“O problema de algumas análises, mesmo as mais consistentes e sensatas, é que veem a raiz dos atuais problemas do PT como resultado de um mérito, a política para os pobres. Assim, questões de ordem política e organizacional, intrínsecas à conformação que o partido adotou durante seus mais de trinta anos e ao modelo de governabilidade que hoje se mostra esgotado, perdem relevância para, no fim, serem justificadas pelo “ódio” das classes abastadas. Servem para diminuir a responsabilidade de atores políticos que nem sempre tiveram bons modos”.
De fato, a raiz do problema reside na política e na organização. É nestes campos que a esquerda terá alguma chance de avançar. Todavia, se é na política e na organização que residem os impasses vividos pela esquerda, a pergunta que deveríamos tentar responder é: o que levou o PT a ter ou a adotar certa política e certa organização, e não outra – isto é, e não aquela que supostamente o PT deveria ter ou adotar?
Henrique não fez essa pergunta. Como ele não a faz, ele não tentou respondê-la. E não a tendo respondido, ele incorreu num erro grave: foi obrigado a enxergar o PT não pelo que o PT é, mas pelo que o PT não é. (Daí a ocorrência de termos que começam com -in: “incapacidade” e “inapitidão”). Ora, se o PT é supostamente incapaz e inapto a cumprir certas tarefas, caberia investigar quais tarefas o PT cumpre com capacidade e aptidão. Afinal, é provável que o PT não consiga cumprir certas tarefas exatamente porque está cumprindo outras tarefas.
De minha parte, eu faria as seguintes perguntas: Será que a política e a organização que o PT tem hoje não são exatamente fruto do esforço levado a cabo de fazer “política para os pobres”? Será que o PT poderia ter chegado onde chegou e ter feito o que fez sem exatamente a política e a organização que assumiu? Será que o PT poderia ter o “mérito” que Henrique parece reconhecer e, ao mesmo tempo, ter outros méritos, aqueles que Henrique reclama? Em suma, será que o PT poderia ser o PT da “política para os pobres” e, ao mesmo tempo, o PT tal como Henrique reivindica?
Tais perguntas são tão mais relevantes quando se constata que, no fundo, quem faz as “análises consistentes e sensatas” mencionadas por Henrique não faz outra coisa senão jogar luz exatamente nesse leque de questões, que constituem um verdadeiro impasse. Porém, ao invés de encará-lo e discuti-lo, Henrique esquivou-se dele.
Para mim, considerando a pobreza do atual quadro do debate público na esquerda brasileira, importa menos a resposta a essas perguntas; mais importante é o reconhecimento de que estas perguntas merecem ser feitas e respondidas.
3) Se Henrique tivesse enfrentado o impasse que tais perguntas evocam, ele teria sido obrigado a fazer uma crítica totalizante da sociedade brasileira e da esquerda brasileira como um todo. Ele possivelmente seria obrigado a enfrentar questões como: Qual é a natureza e o real tamanho da pobreza no Brasil? Qual é o perfil e quais são as divisões no interior da classe trabalhadora no Brasil? Que tipo de política de massas a sociedade brasileira permite? Quais são as blindagens do Estado brasileiro? Teríamos de recorrer a toda uma tradição de pensamento crítico, infelizmente um tanto marginalizada, como Caio Prado Jr., Florestan Fernandes, Raymundo Faoro.
Note-se: no fundo, questões mais prosaicas e ordinárias (tais como “É possível reduzir a pobreza e incluir sem ter de se subordinar à lógica da governabilidade”) pressupõem respostas para aquelas perguntas. O problema é que nem aquelas perguntas nem suas respostas costumam aparecer no debate público. Há entre nós um campo opaco em que as questões de fundo, as que realmente importam, permanecem escondidas.
Ademais, se tivesse enfrentado aquelas questões, Henrique teria sido obrigado ainda a fazer uma autocrítica, tanto pessoal como dos grupos aos quais ele foi (ou é) associado. Mas isso ele não fez. E justamente por não ter feito, o artigo soa como uma sátira: enquanto Henrique acusa o PT de evocar a “ignorância alheia” (para o PT, ignorantes são os outros) – de fato o PT faz isso –, ele próprio incorre nesse mesmo argumento, pois a mensagem de seu artigo não é outra senão: ignorante é o PT.
Aqui, ao discutir a autocrítica no artigo de Henrique, faço a minha própria autocrítica.
Cito três passagens:
“Como se diz no jargão popular, há males que vêm para o bem. No caso do PT, há males que vieram para o mal mesmo. O afastamento compulsório da antiga burocracia partidária, resultado do julgamento do mensalão, poderia ter produzido uma renovação partidária, uma profunda mirada autocrítica e a busca por soluções arejadas e democráticas, em sintonia com as aspirações políticas de um novo momento, de novos interlocutores. Mas o único resultado desse processo foi a acomodação partidária de várias correntes e a ascensão de quadros de segundo escalão talhados nas mesmas práticas e sem a metade da capacidade de análise de conjuntura e gestão de crises”.
Essa passagem soa como uma confissão. Aliás, o artigo inteiro. Pois, se o PT é o alvo de Henrique, se o PT é “incapaz” e “inapto”, se o PT cometeu erro atrás de erro, se, enfim, a culpa é do PT, é forçoso notar o pressuposto deste raciocínio: quem diz isso parte do pressuposto (nunca dito abertamente) de que, ao fim e ao cabo, o ator que realmente importa e que tem real relevância na conjuntura brasileira é o PT. É como se, ao escrever este artigo, Henrique tivesse dito: o PT não é capaz de fazer o que só o PT pode fazer. Senão, como explicar que só o PT seja criticado?
Se a “renovação partidária” (do PT) e se a “busca por soluções arejadas e democráticas” (por parte do PT) teria sido tão importante, tão central, tão decisiva, eu pergunto: que esforço Henrique fez no sentido de produzi-la?
Henrique só poderia ter tomado parte nesse esforço se ele estivesse filiado no PT, ou no campo petista, ou pelo menos se ele não estivesse no campo antipetista. Penso não ser absolutamente necessário estar no PT para participar deste esforço, nem mesmo é necessário ser petista. Se a sociedade brasileira é polarizada entre petismo e antipetismo, basta não estar no campo antipetista.
Mas tanto Henrique como eu saímos do PT exatamente no momento mencionado por ele no artigo (no bojo do escândalo do mensalão), quando tomamos parte num projeto antipetista.
Ao termos saído do PT, não só nos abstivemos de tomar parte nessa luta, como nos engajamos num projeto político que, para tentar se viabilizar, era (em alguma medida, ainda é) obrigado a fazer propaganda ostensiva da inviabilidade dessa renovação. Assim, nós contribuímos para a não renovação do PT duplamente: primeiro, por termos abdicado de tomar parte desse esforço de renovação; segundo, já fora do PT, quando nos engajamos em difundir a crença de que esse esforço era em vão.
Como Henrique lida com o peso dessa incoerência?
Primeiro, cobrando do PT autocrítica.
“A autocrítica nunca foi um forte da esquerda brasileira”.
A cobrança é justa. Convém ao PT o exercício da autocrítica. Todavia, é forçoso constatar: Henrique cobra do PT aquilo que ele próprio evita fazer, quando seu raciocínio o obriga a fazer. Nisso reside a sátira.
Segundo, criticando a atitude do PT em atribuir aos outros a pecha de ignorante.
“A ignorância alheia é sempre um antídoto suficientemente eficaz para jogar responsabilidades, análises equivocadas e atitudes questionáveis para debaixo do tapete”.
Igualmente, a crítica é justa. A insatisfação desceu. Não é apenas a classe média golpista que está insatisfeita. A nova classe trabalhadora – que galgou conquistas graças aos governos Lula e Dilma – está cada vez mais inquieta e insatisfeita. Porém, ao imputar ao PT a responsabilidade exclusiva pelos impasses da conjuntura, e ao fazê-lo nestes termos (“incapacidade”, “inaptidão”), ele, Henrique, incorre no mesmo erro que ele próprio critica: qual seja, ao invés de buscar a responsabilidade coletiva (da qual o PT é apenas uma parte), ele se vale do recurso da “ignorância alheia”. Acaso foi só o PT que fez análises equivocadas e que tomou atitudes questionáveis? Ao evitar fazer uma crítica totalizante da esquerda brasileira, aqui também foi suficiente o antídoto da ignorância alheia.
Antes de entrar no quarto e último ponto, cabe dizer que, passados quase dez anos, a almejada alternativa à esquerda do PT não se viabilizou, nem eleitoralmente, nem na sociedade. E se hoje o antipetismo é matizado na “oposição de esquerda” em relação a dez anos atrás, ele ainda é um assunto mal resolvido entre aqueles que comungam das ideias de Henrique, mesmo entre os menos antipetistas. Penso que é, ao menos em parte, o fato de aquelas perguntas serem evitadas que faz do antipetismo um assunto ainda mal resolvido para este campo.
4) Como Henrique incorre no equívoco que ele próprio apontou ao atribuir os impasses da conjuntura à ignorância do PT, ele se sente confortável para sustentar que a movimentação oposicionista em marcha (deem o nome que quiserem) é, no fundo, fruto da ignorância do PT. O desfecho não poderia ser outro:
“Assim, o partido incorpora o eufemismo do “terceiro turno” e assume de vez que cidadão serve para votar a cada dois anos, e no meio tempo reclamação é tentativa de golpe”.
Eu pergunto: por trás da insatisfação difusa e heterogênea (quem está insatisfeito não é exatamente “o cidadão”, mas uma pluralidade recortada e atravessada por divisões), acaso não há tentativa alguma de golpe? Acaso a palavra “impeachment” não está sendo pronunciada? Podemos dormir tranquilos, confiantes de que tudo não passa de um blefe?
“Não que a mídia ou uma parte relevante da classe média-alta brasileira não tenham suas predileções, preconceitos e udenismos e, a partir deles, métodos questionáveis que, em última instância, são constitutivos do nosso capitalismo periférico. Doze anos depois de chegar ao poder, a esquerda brasileira, no entanto, recorre ao mesmo expediente, confundindo manifestações que, gostemos ou não, são legítimas em uma democracia – o que não nos impede de renegá-las ou considerá-las grosseiras –, com golpismo, o que tem, como essência, a vitimização do partido no poder e, evidentemente, de seus burocratas”.
Insisto em perguntar: por trás da insatisfação, será que não existe golpismo algum?
(É evidente que a manifestação é legítima. A defesa da “legitimidade” da manifestação só faria sentido se alguém estivesse propondo impedir que a manifestação acontecesse. Não é a legitimidade que está em questão. Ao fazer a defesa da legitimidade da manifestação, Henrique derrapa, perde de vista um ponto central em prol de uma questão que nem em discussão está).
Henrique parece estar tão imbuído da convicção de que, no fundo, a culpa é do PT, ou, mais precisamente, da ignorância do PT, que até mesmo a movimentação oposicionista em curso tem um único e exclusivo responsável: o PT e sua ignorância (expressa através das palavras “incapacidade” e “inaptidão”).
Ao invés de buscar a “responsabilidade dos atores” (como se em política, vista sob a ótica da longa duração, pudesse haver pura e simplesmente “responsáveis”), penso que seria mais proveitoso se tentássemos abordar o problema apontado por Henrique, da “queima rápida e gradual do capital político acumulado de 2003 a 2008”, olhando para a totalidade da sociedade brasileira e efetuando uma crítica de fundo da esquerda brasileira como um todo. Mas isso terá um preço, que não estamos acostumados a pagar: ao lado da crítica, teremos de fazer a autocrítica.
Antônio David desenvolve pesquisa de doutorado no Departamento de Filosofia
(Publicado originalmente no site Viomundo)

Tijolinho Real: Porque Cunha foi aplaudido na CPI da Petrobrás.





As relações da presidente Dilma Rousseff com o atual presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha(PMDB) nunca foram boas. As rusgas ocorriam muito antes dele assumir aquele cargo no Legislativo. Dilma nunca gostou desse meio-de-campo político - aqui está uma das fragilidades do seu Governo - e, muito menos, com políticos da naipe de um Eduardo Cunha. O sentimento de Dilma para com ele é de náusea. O cacique do PMDB, Michel Temer, não raro, encontrou muitas dificuldades de agendar encontros onde Cunha e Dilma tinham que estar presentes. Não se pode negar que Cunha tem estilo. Joga abaixo da linha de cintura na arena política. Mantém, em torno dele, um séquito de parlamentares de fidelidade canina. Uma verdadeira bancada exclusiva. 

Gente que obedece cegamente ao seu comando, participa dos banquetes por ele oferecidos, recebem financiamento de campanhas por ele articulados. Assim como um senhor patriarcal, não deixa os vassalos desamparados. Distribui os cargos e comissões da Câmara Federal entre os "amigos" e protegidos. Até recentemente, tentou emplacar um desses na direção da TV Câmara, cargo antes destinado aos funcionários de carreira. É um esquema pesado. Pelo que ocorreu em seu depoimento na CPI instaurada na Câmara dos Deputados para apurar as irregularidade com dinheiro público na Petrobras - onde foi aplaudido até por petistas, que se derramaram em elogios ao deputado - possivelmente, o caboclo está blindado. 

A articulação do Governo errou bastante na eleição do presidente daquela Casa, mas todos sabem que o Planalto não desejava a sua eleição. O "aliado" Michel Temer fez corpo-mole para permitir que ele fosse eleito. Na surdina, torceu por isso. Sua performance repercutiu bastante nas redes sociais e confesso que fiquei atônito, tentando entender o que, de fato, estava por trás dessa desenvoltura. Ele conseguiu a proeza de convencer a audiência sobre a fragilidade dos critérios utilizados pelo Procurador-Geral da República para a construção de sua lista dos investigados na Operação Lava Jato. Tratou o caso como mera doações regulares de campanha.Na opinião dele, ou o Janot é um despreparado ou o colocou na lista apenas por ser um desafeto do Planalto. As manobras no sentido de desqualificar Janot é bastante conhecida. Faz parte do arsenal usado pelos "vestais".

Com os dois presidentes do Poder Legislativo envolvidos até a medula nas possíveis irregularidades da Operação Lava Jato, parece-nos mesmo que estamos no fim do poço. Eles vão mover moinhos para tentar prejudicar o processo de investigação. Exatamente por isso é que há um apelo popular para que eles se afastem de suas funções. Nesse clima de "salve-se quem puder", como observou o professor Michel Zaidan, até os petistas envolvidos estão esquecendo que integram a base de sustentação da presidente Dilma Rousseff. Com relação ao PMDB, nada a acrescentar. Dilma dorme a anos com o inimigo. Quanto mais ela se desgasta, mas eles ampliam as chantagens para ocuparem mais espaço no condomínio governista. Se o desastre se prenunciar iminente, eles pulam para o outro lado sem o menor constrangimento. O que, afinal, esse Cunha tem?

A charge que ilustra este post é de Renato Aroeira, publicada no jornal O Dia.

sexta-feira, 13 de março de 2015

A constrangedora leveza intelectual dos "meninos" que lideram a campanha pelo impeachment

publicado em 13 de março de 2015 às 22:16

Da Redação
Os jovens promotores dos protestos que pedem o impeachment de Dilma conquistaram seus 15 minutos de fama.
Autor do vídeo “E se Dilma fosse uma vilão da ficção?”, Kim Kataguiri, de 19 anos, é fã de bandas como Maroon 5 e Strokes
Um dos líderes da manifestação nacional que, entre outras pautas, pedirá o impeachment da presidente Dilma Rousseff no domingo (15) é um jovem de 19 anos, neto de japoneses, que defende uma economia de linhagem liberal e que largou a universidade antes de terminar o primeiro ano: “Estava sem tempo para ir e as faculdades de economia no Brasil são muito atrasadas.”
Kim Kataguiri faz parte do Movimento Brasil Livre (MBL), grupo favorável a uma política econômica liberal, com um Estado microscópico – - o que se traduz com medidas como a privatização de estatais e dos sistemas de saúde e de educação (“com a distribuição de carteiras para aqueles que não puderem pagar”). Defende ainda a “liberdade de imprensa” e o “fim do perdão de dívidas de ditaduras” (como Guiné Equatorial).
Seria apenas constrangedor descobrir que dezenas de milhares de brasileiros foram convencidos a ir às ruas por um garoto que se acredita personagem de mangá e produz vídeos supostamente bem humorados como os que aparecem acima.
Kataguiri é co-autor de um espantoso artigo publicado pela Folha de S. Paulonum tom grandiloquente que caberia muito bem em um videogame:
Captura de Tela 2015-03-13 às 21.21.16
Como é que é?
Um menino de 19 anos, que abandonou a faculdade antes de completar o primeiro ano, quer demolir o Estado brasileiro?
Kataguiri talvez seja apenas mais um inocente útil, guindado à condição de protagonista pelo desespero da mídia em encontrar novos heróis, “apartidários”, para praticar o antipetismo.
O tal MBL, ao qual ele pertence, é uma versão fuleira do movimento libertário dos Estados Unidos, financiado pelos irmãos Koch.
Se não houver uma intervenção da matriz, essa garotada vai acabar avacalhando o liberalismo, como o próprio Kataguiri faz ao admitir, na entrevista reproduzida acima, que, uma vez privatizadas a saúde e a educação, ainda assim quem não pudesse pagar receberia ajuda.
Será que ele sabe que o guru Ronald Reagan disse que “there is no free lunch in America”?
Os “meninos do golpe”, como os definiu Rodrigo Vianna, só não são uma piada completa porque as teses que eles advogam, impulsionadas pelos milhões de dólares dos irmãos Koch, já causaram muito dano por aí, especialmente nos Estados Unidos.
Os Koch, que fizeram sua fortuna de U$ 100 bilhões no ramo do petróleo, estão na lista dos maiores poluidores norte-americanos. É tentador imaginar que advogam um Estado fraco para se livrar de prestar contas à sociedade.
Na cartilha libertária deles também estão a privatização da Previdência Social, a extinção dos sindicatos e do salário mínimo e o aumento da idade de aposentadoria.
Isso é o que se chama de advogar em causa própria!
Os irmãos Koch já torraram milhões de dólares para produzir uma câmara de eco para ideias que os beneficiam economicamente, através de:
1. Estudos “neutros”, publicados por think thanks financiados por eles;
2. “Especialistas” que se colocam à disposição da mídia para dar entrevistas;
3. Jornalistas que reproduzem nos jornais, no rádio e na TV as ideias da dupla;
4. Políticos que tiveram suas campanhas financiadas pelos bilionários.
Tendo combatido o movimento pelos direitos civis nos anos 60, os Koch militam pelo que é chamado nos Estados Unidos de “neighborhood schools”, escolas da vizinhança.
Por trás desta imagem benigna se esconde o combate à integração entre negros e brancos, de bairros diferentes, na mesma escola, uma política pública implementada com transporte escolar.
À primeira vista, o jovem Kataguiri parece ser apenas um aspirante a Danilo Gentili recém-saído da adolescência.
Se ele nos presta algum serviço neste momento, é o de oferecer um alerta sobre a profundidade e a extensão do analfabetismo político de um número bastante razoável de brasileiros.
(Publicado originalmente no site Viomundo)