pub-5238575981085443 CONTEXTO POLÍTICO: Crônica: Viator ou, simplesmente, Guimarães Rosa.
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quinta-feira, 30 de agosto de 2018

Crônica: Viator ou, simplesmente, Guimarães Rosa.


 
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José Luiz Gomes


A Livraria José Olympio Editora, há alguns anos atrás,  instituiu um concurso literário para homenagear o escritor maranhense Humberto de Campos. O escritor Graciliano Ramos, amigo de José Olympio, integrava o júri desse concurso. Como seria natural, todos os anos, a editora recebia milhares de folhas escritas, de todo o país, com candidatos a escritores procurando um lugar ao sol ou a uma sombra no campo literário. Um desses concursos, realizado no ano de 1938, foi vencido pelo escritor pernambucano Luiz Jardim, que acaba de ganhar um estudo de sua obra, escrito pelo escritor e editor Sidney Rocha, publicado numa das edições da revista Hexágono. Graciliano pegou para ler um calhamaço de mais de quinhentas páginas de contos, assinado por um tal de Viator. O autor de Caetés, num desses momentos de sinceridade, admite que, nessas ocasiões, torcia para que, logo de início, o trabalho fosse rejeitado, em razão da má qualidade das primeiras páginas, evitando o transtorno de ir até o final da obra.

Para a sua surpresa, no entanto, não foi bem isso o que ocorreu com o tal livro assinado com o pseudônimo de Viator, fato que instigou o alagonao a ler todos os contos ali existentes. O livro escrito por Viator não ganhou o concurso, mas mereceu, digamos assim, uma menção honrosa, levando Graciliano a aconselhar a José Olympio a publicá-lo, quem sabe, suprimindo alguns contos que distoavam um pouco da qualidade do texto do livro como um todo. Infelizmente, à época, ninguém conseguiu localizar o tal Viator. Apesar de Viator ter perdido o prêmio para Luiz Jardim, Graciliano reconhecia a qualidade do seu texto. José Olympio chegou a sugerir a Graciliano que escrevesse um artigo, uma espécie de anúncio, mas todas as buscas se mostraram inúteis. Em fins de 1944, escreve Graciliano, Idelfonso Falcão, aqui de passagem, apresentou-lhes a João Guimarães Rosa, secretário da embaixada, recém chegado da Europa.  
- O senhor figurou num júri que julgou um livro meu em 1938.
-Como era o pseudônimo.
-Viator.
-Ah! O senhor era o médico mineiro que andei procurando.
-Idelfonso Falcão ignorava que Rosa fosse médico, mineiro e literato. Fiz camaradagem rápida com o secretário da embaixada.
-Sabe que votei contra o seu livro.
-Sei. Respondeu-me sem nenhum ressentimento.  
O Livro? Sagarana, que depois foi publicado pela Editora Universal, em 1946. A recepção do livro Sagarana pela crítica foi muito boa, embora, evidentemente, não tenha alcançado o mesmo êxito de Grande Sertão:Veredas. Num rompante de deslumbramento com a obra de Guimarães Rosa, em carta ao escritor Fernando Sabino, a poetisa Clarice Lispector assim se expressa: "Aflita de tanto gostar. Nunca vi coisa assim. Adeus, literatura nordestina de cangaço, zélins, gracilianos e bagaceiras: o homem é um mostro para escrever sobre jagunços do interior de Minas e com uma linguagem que nem Gil Vicente, nem ninguém."


P.S.: A leitura da crônica, publicada em Linhas Tortas, não sugere que o escritor Graciliano Ramos tenha votado contra o livro Sagarana, de João Guimarães Rosa. Muito ao contrário. Estabeleceu-se uma contenda e um empate técnico entre o livro de Guimarães Rosa e o livro de Luiz Jardim, não citado. Um voto de minerva é que decidiu a disputa em favor do escritor pernambucano. Convencido da qualidade do texto do escritor mineiro, Graciliano intercedeu junto a José Olympio para publicá-lo, mesmo não tendo vencido o certame literário.

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