Questionado sobre a eficácia da recente resolução do comitê de Direitos
Humanos, da ONU sobre a elegibilidade do Presidente LULA, tenho respondido que
a resolução tem dois aspectos distintos, embora interligados: o
legal e a questão da legitimidade internacional. Isto porque o ministro
da Justiça, do governo de temer, alegou que a ONU não devia interferir em
assuntos internos no Brasil, em razão da soberania jurídica e política de que
goza o país no concerto das nações.
Essa é uma meia verdade. O nosso
país é membro da comunidade internacional e signatário dos acordos, tratados e
projetos de convenção da ONU. O Brasil, ao contrário de outras nações, tem
cumprido rigorosamente todas as decisões da entidade internacional, e no
governo de LULA, tornou-se –inclusive – uma “Player” mundial, arbitrando
conflitos e ajudando outros países a resolverem suas contendas externas. A verdade (inteira) é que a nossa
ordem política internacional se apoia ainda no Tratado de Westfália, que elegeu
os estados-nação como atores privilegiados da comunidade política
internacional. O que implica no respeito à sua soberania total e absoluta na
aceitação de leis e acordos. Isto significa que os tratados, acordos e projetos
de convenção, aprovados nas conferências de cúpula pelo órgão multilateral,
precisa da homologação dos parlamentos nacionais para ter eficácia jurídica. A
rigor, eles não possuem força vinculante e não são autoaplicáveis. E há países
que não os cumpre e desafiam abertamente a organização internacional: EEUUs. E
o Estado de Israel. Alegam o direito de autodefesa, inclusive quando violam
direitos humanos internacionais. Outros especialistas alegam que não há um
regime internacional de direitos humanos, o que permite que determinados
países avoquem a si o direito de
polícia do mundo para invadir, destruir e saquear as riquezas de estados
menores.
Mas existe um outro aspecto que
deve ser considerado: a questão da legitimidade e da imagem de cada país,
externamente. Embora as decisões da ONU nem sempre tenham força vinculante,
como as leis internas de cada estado nacional, faz parte do reconhecimento de cada povo ou nação – no cenário diplomático
e comercial do mundo de hoje- que ele
não seja considerado um país fora da lei ou pária, ou seja uma entidade estatal
fora do sistema jurídico internacional. Nesta condição, ele pode sofrer
embargos e sansões econômicas e comerciais dos demais membros da Organização
das Nações Unidas e de suas agências regionais. A questão da prisão e da
inelegibilidade de LULA vai além da questão jurídica externa. Ela tem a ver
essencialmente com a legitimidade de uma eleição presidencial sem a presença do
candidato mais aprovado nas pesquisas de opinião, que não teve ainda seus
direitos políticos cassados por nenhum tribunal e cuja condenação ainda não
transitou em julgado. A presunção de inocência é um preceito constitucional.
Não pode ser atropelado por uma lei ordinária menor. Faz parte do ordenamento jurídico brasileiro
e pensamento garantista dos nossos
melhores juristas (togados ou não).
Ignorar a resolução do Comitê de Direitos Humanos, da ONU, a vontade da
maioria do povo brasileiro, o direito à presunção de inocência e a elegibilidade
de qualquer candidato lança uma suspeita muito grave sobre o resultado dessas
próximas eleições presidenciais e pode custar caro ao país na esfera do direito internacional.
Michel Zaidan Filho é filósofo, historiador, cientista político, professor titular da Universidade Federal de Pernambuco e coordenador do Núcleo de Estudos Eleitorais, Partidários e da Democracia - NEEPD-UFPE.
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