Quando o “muro do Berlim” ruiu, talvez apressadamente
demais, houve uma onda de euforia neoliberal que pretendeu retificar a história
contemporânea, extirpando dela as páginas dedicadas à experiência socialista.
Numa leitura canhestra – influenciada por Alexandre Kojeve- da filosofia da
História de Hegel, apareceu um profeta nissei
chamado Francis Fukuyama que prognosticou o fim da História, com isso
querendo dizer que a democracia liberal
e a economia de mercado eram o ponto final da evolução política e social da
humanidade. Como disse então Eric Hobsbawn, aquela era uma profecia de vida
muita curta, logo depois veio a guerra do Golfo e a roda da História continuou
a girar.
Agora, apareceu no Brasil um estadista de Belo Jardim cuja
primeira medida é o fim da História, outra vez. O que tem certos políticos
para acertar logo a História, quando
detém um pouco de poder nas mãos? – Numa leitura freudiana, o gesto poderia ser
interpretado como o assassinato simbólico dos professores de História do atual
ministro. Lembre-se que ele manteve uma polêmica azeda com seus mestres, na
época da Escola Parque do Recife,
chamando-os de “subversivos”. É como se vingasse deles, agora, retirando a
disciplina do currículo do ensino médio. Mas essa seria uma interpretação rasa,
superficial.
A retirada da obrigatoriedade do ensino de História, no
ensino médio, faz parte de um plano arquitetado pelo lobby dos empresários do
ensino, interessados no aligeiramento do perfil do alunado. Para esses
“educadores pragmáticos” a História não tem a menor serventia para a formação
de uma força-de-trabalho barata e dócil, destinada a um mercado de locação de
serviços desregulamentado. Como, aliás, a Filosofia, a Sociologia e as Artes.
Para que tanta coisa (a formação humanística), quando se trata de produzir
“massa de manobra” para a exploração desse capitalismo (rentista) selvagem? –
Deixa para os filhos da burguesia, da alta classe média, dos herdeiros dos
grandes impérios industriais, que precisam sim de uma formação integral,
ampliada, de perfil crítico, inventivo. E que podem pagar – caro – por isso. É
o reforço da divisão social entre quem manda e quem obedece. Quem tem e quem não
tem capital social, capital simbólico, capital intelectual.
A história já foi prisioneira de inúmeras práticas discursivas.
A mais conhecida é a história genealógica, de Nietzsche e Foucault. A história,
como mera racionalização de uma vontade de poder ou de potencia. Mas ela não só
serve para isso. A história é vida e não um cadáver embalsamado para
contemplação de eruditos. A história é o domínio dos possíveis, da
virtualidade, daquilo que ainda não é, mas pode vir a ser. É essa a concepção
de História que precisamos. Não a história antiquária, ou a da erudição balofa
e vazia. Não a história como racionalização da epopeia do vencedor. A história
que está viva é a história das nossas utopias, dos nossos sonhos, dos projetos
de alteridade social. Essa história nenhum avicultor poderá matar ou suprimir.
Pode reescrever ao sabor de suas conveniências políticas. Mas ela sempre
viverá, como ideia reguladora, a guiar o ideal de
justiça, de beleza, de verdade dos homens e mulheres de boa vontade.
Michel Zaidan Filho é filósofo, historiador, cientista político, professor titular da Universidade Federal de Pernambuco e coordenador do Núcleo de Estudos Eleitorais, Partidários e da Democracia - NEEPD-UFPE. Texto produzido em co-autoria com Moisés Peixoto, mestre em História e docente da Rede de Ensino de Roraima.
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