Uma das políticas mais redistributivas criadas pela
Constituição de 1988 foi a seguridade social. Ela é um mecanismo de compensação
social do Estado republicano para beneficiar aqueles que não têm renda ou de
baixa renda. O instituto da Seguridade Social é um tripé constituído pela saúde
pública (SUS), Assistência Social (LOAS) e a Previdência Pública (INSS). Nem
sempre o Estado cuidou de providenciar as fontes permanentes de financiamento
da Seguridade Social. Por isso foram criadas taxas e contribuições (com
finalidade para-fiscal) cujo objetivo era arrecadar fundos ora para saúde
(CPMF), ora para a assistência social (pis, cofins, loterias etc.) No caso
específico da Previdência Social, existe uma ciência econômica chamada
“atuária”, que faz o cálculo de quanto é preciso cobrar dos servidores e
trabalhadores, num certo prazo de tempo de vida útil (para a produção), de
forma a assegurar uma aposentadoria digna para os futuros aposentados. Há,
portanto, um contrato atuarial que rege o sistema público e privado da
Previdência Social. Não é favor do Estado ou de governo que os trabalhadores e
servidores públicos (municipais, estaduais e federais) se aposentem, depois de
30, 35 ou 40 anos de serviços prestados. É um direito líquido e certo de cada
um/a requerer sua aposentadoria, uma vez cumprido o prazo legal para se
aposentar.
A Previdência Social implica um pacto Inter- geracional
entre nós, os que nos antecederam e os
que vierem depois de nós. Os nossos antecessores pagaram/contribuíram à Previdência para garantir o nosso direito
previdenciário de hoje. E nós, estamos fazendo a mesma coisa com a geração futura.
É assim que a coisa funciona.
Tem havido muita falácia, mentira e propaganda enganosa
nessa “estória” de que a Previdência social é deficitária. Isso não é verdade.
Mesmo considerando as aposentadorias especiais (como a do trabalhador rural,
das donas de casa ou dos idosos), todos
os relatórios de caixa da Previdência mostram à saciedade que a superávit, não
déficit. Ocorre que há graves problemas de gestão dos fundos públicos e
privados da Seguridade Social. Parte da receita foi desvinculada para servir de
pagamento a outras despesas que não têm nada a ver com a Previdência Social,
como por exemplo, o pagamento dos juros da dívida soberana da União – que hoje
é trilionária e serve, sobretudo para engordar os cofres dos portadores
desses papéis. Se o governo quisesse
aumentar a receita, bastaria autuar os grandes sonegadores e fraudadores da Previdência
Social, ao invés de editar “refins” generosos com os fraudadores, como a JBS, a
GLOBO, a Mitsubishi, Bradesco etc. O governo não faz a sua parte e resolve
transferir o ônus das contas públicas para os trabalhadores, servidores
públicos e aposentados. A propósito, as alíquotas – que já são confisco
salariais – do imposto de renda e do INSS subirão respectivamente para 35% e
14%, numa estrutura tributária reconhecidamente regressiva. Mostram os estudos
que o caso do Brasil é o de uma pirâmide social invertida: só quem paga imposto
no Brasil é trabalhador, servidor público e, agora, até os aposentados. Os
ricos, muito ricos não precisam pagar impostos. Fazem o que se chama
“planejamento tributário” e “elisão fiscal”.
A população brasileira, segundo os censos do IBGE, está
envelhecendo e vivendo mais. Isso é ruim ou bom? Para um governo nazista,
preocupado em criar uma espécie de “biopolítica” no nosso país, isso é muito ruim. É preciso
encontrar urgentemente um meio de eliminar esse imenso contingente de
improdutivos, doentes, perdulários que são os clientes da seguridade social.
Estas propostas de mudança da Previdência Social rumam na direção de uma faxina
geracional da população brasileira, sob a alegação da insustentabilidade do
Previdência Social. Ora, viver muito e bem, depois de ter servido ao país e à
sociedade, é um direito legítimo de cada um de nós. Não é ser um fardo inútil e
dispendioso a ser carregado pelos contribuintes.
Mas o objetivo central desse plano diabólico é privatizar a
previdência pública, através do estímulo (obrigatório) da migração dos
contribuintes previdenciários para “fundos de pensão” privados, que trabalham
como empresas de capitalização, operando em bolsas de valores. Segundo esses
Planos de capitalização, não há mais benefícios fixos, e sim contribuições
fixas. A rentabilidade dos benefícios depende da valorização das aplicações no
mercado financeiro. Imagine o que pode
acontecer com as aposentadorias das pessoas, se depender das
especulações financeiras nos mercados de capitais. Quem não se lembra da CAPEMI? Da VASP?
Se esses atuais pregoeiros das “mudanças”, não passem de
meros “moedeiros falsos”, e falassem francamente para a população, diriam: nós vamos
transformar a sua aposentadoria num mero plano de capitalização, sem benefício
definido e sujeito às oscilações do mercado financeiro! E pronto! Mas não tem coragem de confessar o crime de
lesa-sociedade que estão prestes a cometer, em nome da sustentabilidade
financeira da Previdência Social!
Michel Zaidan Filho é filósofo, historiador, cientista político, professor titular da Universidade Federal de Pernambuco e Coordenador do Núcleo de Estudos Eleitorais, Partidários e da Democracia - NEEPD-UFPE
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