quarta-feira, 18 de novembro de 2020
Editorial: O compromisso com a democracia acima de tudo.
Uma grande raposa da política pernambucana ensinava que política era a arte do possível. Exímio articulador, segundo pessoas mais próximas, sacrificava até mesmo a vida pessoal para manter-se ao telefone, costurando alianças, negociando apoios, indicando nomes de sua confiança para ocupar postos na administração pública. Por essa lógica eu seria um péssimo político, por guardar princípios identitários que jamais nos permitiram tamanha flexibilidade em busca do poder ou alguma vantagem pessoal. Ainda ontem comentamos por aqui que princípios são inegociáveis, assim como a plataforma política do partido ou candidato. Chegar ao poder abdicando desses princípios ou comprometendo a linha programática da agremiação ou do candidato seria um suicídio político. Com o Partido dos Tabalhadores ocorreu um pouco isso, ao aliar-se com setores atrasados da nossa elite, impedindo a materialização de reformas importantes, como a reforma política, agrária, tributária, dos meios de comunicação. Em setores estratégicos, o partido ficou paralisado, exceto nas politicas públicas de corte inclusivo, na distribuição de renda e no atendimento de demandas repremidas de minorias de gênenro, raça e sexuais. Nos últimos quinhentos anos, o único indicador da raça negra que avançou foi o da inserção de jovens negros no ensino superior. Isso graças a política de cotas. Por isso reafirmo aqui que o PT deu uma enorme contribuição para a nossa democracia substantiva, a despeito dos inúmeros equívocos no campo político. Quando a nossa elite torpe, entreguista e asquerosa se cansou dessas concessões ao andar de baixo, retomou o poder, de onde, na realidade, para ser mais preciso, nunca saiu.
Essa preocupação vem a respeito do leque de alianças que está sendo montado no Recife em torno da candidata Marília Arraes(PT), que disputa, no segundo turno, com o candidato do PSB, João Campos, a Prefeitura da Cidade do Recife. Marília, que aliás, tem o DNA de um outro grande político pernambucano, o ex-governador Miguel Arraes. Quando dos estudos universitários, conversei com diversos políticos pernambucanos acerca da política de alianças do ex-governador. Por mais hábil que ele fosse nessas costuras aliancista - como a estratégia de cindir os redutos conservadores da elite estadual, principalmente a aristocracia açucareira, que ele passou a conhecer tão bem como presidente do IAA - jamais negociou as políticas sociais que sempre o caracterizou, inclusive celebrando acordos importantes no campo, juntando capital e trabalho. Um exemplo disto é que a FETAPE sempre foi uma aliada incondicional do Dr. Miguel Arraes. Um outro fato observado pelo atual vice-prefeito, Luciano Siqueira, é que, apesar desses apoios de setores conservadores, Arraes nunca abandonou os comunistas. De fato, justamente naqueles tempos de comunistas autênticos, Arraes sempre esteve com eles, permitindo que eles participassem dos seus governos. Apesar da inegável simpatia por sua candidatura, passei a ter dúvidas se Marília foi uma boa aluna do professor Arraes.
Ontem, inclusive, afirmávamos ser improvável que os eleitores da delegada Patrícia(Podemos) e de Mendonça Filho(DEM) estejam disposto a votarem numa candidata do PT. Insufladas por inúmeras campanhas depreciativas, essa turma passou a nutrir uma espécie de ojeriza ao PT. Mesmo que seus dirigentes acenem para uma composição - caso já definido pelo Podemos - é muito pouco provável que seus filiados e simpatizantes sigam a orientação dos seus dirigentes. Muitos criticaram a postura de Mendonça Filho neste segundo turno, mas ela é, no mínimo coerente. Ele não teria motivos para pedir aos seus eleitores que votassem no PSB, tampouco no PT, que ele até se orgulhava, durante a campanha, de ter ajudado a tirar do poder. No intervalo entre o primeiro e o segundo turno, certamente, não tempo suficiente para costuras de alianças bem amadurecidas, onde as cartas sejam devidamente apresentadas. Dizer que estará com Marília porque o PSB já deu o que tinha que dar é muito pouco. Esse momento político que estamos vivendo é crucial para o futuro da democracia no país. Embora a eleição seja municipal, convém não negligenciar as questãos da macro política que estão em jogo neste momento. Quem não tem compromisso com a democracia não pode integrar um jogo democrático. Tenho dúvidas sobre se Marília está atenta a essas questões.
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