pub-5238575981085443 CONTEXTO POLÍTICO. : Tempero demais na cozinha, artigo de José Carlos Xavier
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terça-feira, 11 de junho de 2013

Tempero demais na cozinha, artigo de José Carlos Xavier

Estava escrevendo o presente artigo quando li labor semelhante da lavra do culto e dileto amigo Pedro Dutra, inserto no “Jornal O Globo”, sob o título “A Nova Cozinha Brasileira”. Confesso que de pronto me predispus a abortar a minha escrita, ante a excelência dos trabalhos do ilustre advogado. Entretanto, me aprofundando na leitura, percebi que o conteúdo da minha inspiração era diverso e abrangia outros aspectos sobre o tema em estudo. O erudito causídico, em abreviada síntese histórica, de forma singular, citando San Tiago Dantas, obtempera como fora introduzida entre nós a Consolidação das Leis do Trabalho, calcada que fora na “Carta del Lavoro” italiana, ao passo que a minha fala volta sua ótica para a importância da regulamentação da matéria em comento, embora, admite-se, enalteça o inquestionável avanço isonômico da Emenda Constitucional 72, que instituiu livro de ponto, 44 horas semanais de trabalho doméstico, intervalo para almoço e descanso, contrato padronizado de trabalho, que a tanto equivale a acordo coletivo, hora extra, fundo de garantia, multa fundiária de 40% em razão de dispensa sem justa causa, como também seguro desemprego.
Registre-se que embora tardio o novo regramento, muita vez, no afã salutar de legislar da melhor forma possível, se criam normas que, na prática, podem inviabilizar, seja para os empregados, seja para o empregador, a aplicação da legislação em testilha, tendo em vista as características do trabalho doméstico, de molde a impedir que “o tiro saia pela culatra”.
É bem de ver que muitas famílias vivem do rendimento do trabalho doméstico, daí por que se deve buscar o melhor entendimento nessa relação trabalhista, a fim de se evitar dispensas açodadas (estima-se que, na primeira hora, possam ocorrer cerca de aproximadamente 1 milhão de demissões de empregados domésticos). Na primeira hora ouviu-se dizer: vou trocar minha empregada doméstica por 3 diaristas diferentes, assim consigo burlar a lei.
Ledo engano!
Ora, há de ser considerada a questão da confiança recíproca entre os envolvidos, o conhecimento dos costumes de ambas as partes, circunstâncias essas que advêm com o tempo, razão pela qual não podem ser, de uma hora para outra, sob esse pífio argumento, jogadas pela janela. Ademais, o empregado doméstico possui características diferentes do trabalhador comum, no sentido de que, não raro, dorme no seu trabalho, não tem gastos e tampouco estresse com transporte que o conduz ao seu serviço (greves, manifestações, atraso do transporte coletivo etc), alimenta-se, por vezes, gratuitamente da mesma maneira, ou seja, sem desgaste físico ou mental, assiste televisão, escuta rádio, enquanto exerce seu mister etc.
Não é descabido dizer que o serviço doméstico é um trabalho sui generis e, como tal, deve ser tratado, a ponto de que com o passar o tempo, o trabalhador doméstico é tratado como se fosse da família do empregador.
Assim, o bom senso indica que a Casa de Leis, no caso o Congresso Nacional, sugira medidas que possam viabilizar o trabalho doméstico e não emperrá-lo. Nesse passo, seria de bom alvitre a criação de banco de horas, regime especial para cuidadores de idosos, recém-nascidos e infantes. De outro lado, seria recomendável que a Justiça laboral, ao interpretar a lei, admitisse que em processos que tais, patrões e empregados, possam firmar acordos individuais, que se traduzem em verdadeira vontade das partes. A uma para que o empregado, não perca o seu emprego; a duas, para que o patrão, muitas vezes um operário de parco recurso, não fique sem o empregado, em razão da ausência de alguém que cuide da prole daquele.
Ponto finalizando, ressalte-se a necessidade que se encontre um consenso no que tange ao percentual sobre a multa do Fundo de Garantia, bem como o “quantum” da contribuição do empregador ao Instituto Nacional de Seguro Social, vulgarmente chamado INSS (Brasil país das siglas), que hoje é de 12%, encontrando-se patamar adequado para tal contribuição, porquanto as famílias não se consubstanciam em pessoa física ou jurídica com fins lucrativos. Poder-se-ia pensar, através de uma sugestão mais ousada, destinada para arraia miúda, que precisa do empregado doméstico por imperiosa necessidade, a possibilidade de descontos desses encargos no imposto sobre a renda. Se assim não for, forçoso convir que se corre o risco de colocar muito dendê no tempero da cozinha, cuja a consequência funesta, como é cediço, para alguns, será inevitável.
JOSÉ CARLOS G. XAVIER DE AQUINO É DESEMBARGADOR DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO

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