O Conselho Nacional de
Justiça (CNJ) foi criado, no âmbito das discussões sobre a reforma do Poder
Judiciário, como uma forma de controle da prestação jurisdicional à sociedade
brasileira. A prestação jurisdicional é uma modalidade de serviço público,
subordinado à Constituição do país e deve ser exclusivamente aos reclamos dos
cidadãos e cidadãs, indiscriminadamente. A criação do CNJ veio atender à
reivindicação de mais agilidade, acessividade e justiça da maioria do povo
brasileiro. Foram também criados os Juizados Especiais para desafogar a justiça
comum da imensa quantidade de processos físicos que se amontoam nas prateleiras
dos cartórios das inúmeras varas judiciais. Os oficiais de justiça se queixam
rotineiramente de que não dispõe de tempo para entregar no domicílio dos
intimados os inúmeros mandados de citação expendidos pelos magistrados
brasileiros a propósitos da multidão dos conflitos e litígios que ocorrem
diariamente no país.
Pois, eis que diante desse
quadro dramático da prestação jurisdicional no Brasil há um cidadão, que ocupa
o cargo de Governador do Estado, que tem o privilégio de utilizar uma das varas
da justiça criminal de Pernambuco para conseguir que sejam entregues, com
celeridade, 3 mandados de citação, sobre o mesmo assunto, sendo que dois num
mesmo dia, num espaço de menos de um mês! Qual é o cidadão brasileiro que tem o
privilégio de utilizar a prestação jurisdicional, ao seu bel prazer, para
intimar um desafeto público três vezes, em tão pouco espaço de tempo, sobre um
“pedido de interpelação judicial” em relação a algum comentário ou informação
pública relacionado com a administração estadual?
Quando o atual
Presidente da Câmara, o senhor Eduardo Cunha, usou a Advocacia Geral da União,
para se defender das denúncias assacadas contra ele pela Procuradoria-Geral da
República, afirmou o Procurador que ele não podia usar as atribuições de seu
cargo para a defesa de interesses pessoais. Isto tinha um nome: patrimonialismo.
Usar as instituições públicas para fins particulares. Então, o que dizer de um
mandatário estadual – cuja formação é da área de contabilidade pública – que
se vale da prerrogativa do cargo para utilizar o serviço judiciário – tão
criticado pela sua morosidade e inoperância – para intimidar, constranger,
perseguir adversários políticos ou simplesmente críticos de sua gestão?
Mais grave é o fato de
ter sido procurado pela imprensa (TV GLOBO, DIÁRIO DE PERNAMBUCO) para se
pronunciar publicamente sobre o motivo dessa perseguição judicial, e a
autoridade não fazer nenhuma declaração. Isso depois de ter conseguido um feito
na justiça: a marcação de uma audiência na 7ª Vara criminal para o dia 11 de
novembro, às 14:00, sem acostar ao mandato a queixa-crime e dizer qual era o
motivo da interpelação judicial. Só ele, do alto de sua grandeza incontestável,
pode fazer tal coisa. Ciente dos erros cometidos na expedição do primeiro
mandato, manda senhor Paulo Henrique Saraiva Câmara, através de seus advogados,
entregar – logo depois – mais duas intimações no mesmo dia, em lugares e
horários diferentes, sobre o mesmo assunto.
Provavelmente, o
magistrado deve ter interpretado que a honra, os direitos de personalidade, a
estima social, do senhor governador é muito mais importante e cara do que a
maioria de seus concidadãos que sustentam – com aumento de impostos – a
perdulária e ineficiente administração do governador. Assim, é preciso agir com
urgência para preservar o patrimônio moral do administrador. Talvez o
magistrado tão dedicado assim, não tenha percebido que muitas suspeitas recaem
sobre os gestores e a administração pública de nosso país. Não é crime – ainda
– a sociedade exigir uma cabal e convincente explicação pelas brumosas dúvidas
e incertezas que pairam sobre os atos administrativos que envolvem o erário
público, tão em falta no Estado de Pernambuco, até para a própria atividade
judiciária, que sofreu com os cortes orçamentários de tão competente
gestor/auditor.
Michel Zaidan Filho é filósofo, historiador, cientista político, professor titular da Universidade Federal de Pernambuco e coordenador do Núcleo de Estudos Eleitorais, Partidários e da Democracia.
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