Somos todxs Zaidan!
Ensaio
22 de outubro de 2015
Por Diogo
Valença, Gutemberg Miranda, Mateus
Toledo e Mauricio Gonçalves,
ex-estudantes da UFPE.
(Publicado originalmente no blog Síntese)
A onda de
regressividade democrática em Pernambuco (mesmo que nos quadros de uma
democracia liberal-formal, diga-se) alcança agora uma das mais
importantes figuras do Estado, intelectual e politicamente, cuja trajetória em
defesa dos interesses dos segmentos populares e do autêntico espírito
republicano e antiprivatista é contado em décadas: o professor Michel Zaidan
Filho. Não bastassem o monitoramento, infiltração e ataques aos Direitos
Humanos daqueles que protestam em Pernambuco – vide os episódios das diversas
lutas sociais, das jornadas de junho de 2013, mobilizações contra a Copa da
FIFA e remoções de São Lourenço da Mata ao Movimento Ocupe Estelita, entre
tantos outros –, agora é o eminente professor quem está sendo chamado a dar
explicações por suas declarações. Zaidan vem recebendo várias intimações –
mandados de citação – através de visitas de oficiais de justiça convocando-o a
depor por supostos crimes (calúnia, difamação, etc.) contra o atual governador
Paulo Câmara [1], apadrinhado do falecido Eduardo Campos – aquele que o status quo local busca em doses
cavalares transformar em mito.
Contudo,
o ataque, a intimidação e o constrangimento a Zaidan ganham inteligibilidade se
levamos em conta que é ele quem vem desvendando e desvelando os nexos íntimos,
a lógica interna de funcionamento da força política estadual hoje hegemônica,
que, diga-se de passagem, já enfrenta investigações, com provas e mais
indícios, de não ser assim tão asséptica como quer parecer [2]. A ofensiva
autoritária do governo do Estado evidencia o recuo dos Direitos Civis, que há
pouco ganhou mais um episódio com a perseguição ao presidente do Sindicato dos Policiais Civis em Pernambuco,
Áureo Cisneiros, através de representação criminal [3]. Ou seja, criticar
politicamente o governador seja onde for (blogs, carro de som, redes sociais,
etc.), não por pura invenção, mas a partir de documentos (de órgãos estatais de
fiscalização ou jornalísticos), é tido como ataque pessoal e motivo para
processo judicial e representação criminal. Onde isso vai parar?
O
professor Michel Zaidan é importante não apenas pelo papel que vem cumprindo.
Nem somente pelas opiniões que exara contra a lógica privatista e
patrimonialista da atual gestão do governo estadual, numa verdadeira atuação
como intelectual público. Sua
relevância se torna ainda maior num cenário de silêncio e omissão da esmagadora
maioria de seus pares. E o que dizer então de seu papel, quando muitos docentes
subscrevem a repressão policial a estudantes ocupados na Reitoria [4] – em nome
da defesa da ideologia da meritocracia e da competitividade mercadológica da
UFPE! – em reivindicação pela implementação de um estatuto universitário
elaborado pela comunidade da UFPE, e que foi promessa de campanha do reitor
eleito [5]?
Independentemente
do acordo ou não com seus pensamentos (e nós nem sempre defendemos as mesmas
posições), recebemos dele algumas lições que transcendem o atual momento e as
opções políticas particulares, e que buscamos carregar como ensinamentos
duradouros: (a) a generosidade e o compromisso intelectual (quantas vezes
obtivemos indicações bibliográficas e dicas para que seguíssemos em pesquisas e
vieses que não eram os mesmos que os dele?); (b) o desprendimento e a
disponibilidade pessoal, sempre pronto a colaborar com o desenvolvimento de um
grupo de estudos, com uma formação sindical, com uma palestra/conversa com um
movimento popular, com uma reflexão partidária etc., o que só demonstra sua
estatura (atividades que não proporcionam retorno institucional, credibilidade
acadêmica, nem tampouco “engordam” o Currículo Lattes); (c) defesa em atos, e
não apenas em palavras, da res publica (utilizando e sofrendo com os
propositalmente sucateados e precários serviços coletivos de transporte e saúde
públicos, entre outros).
Mais
do que lições acadêmicas e teóricas, Zaidan nos deixou um método, uma prática, uma
postura, um exemplo. Será possível ir além da miséria do presente sem esses elementos? Estamos convictos que não.
Por isso não podemos deixar que a tecnocracia patrimonialista – legado de uma
espécie de neocoronelismo eduardiano – e a “democracia das empreiteiras” (entre
elas a Odebrecht e a Moura Dubeaux) e do grande capital em Pernambuco façam o
que estão fazendo. Os ataques a Zaidan – mas também aos manifestantes das
jornadas de junho, ao Ocupe Estelita, a Áureo Cisneiros, etc. – são ataques a
todos os que continuam na resistência e que teimam em defender os valores de
uma res publica radicalmente democrática
em todos os níveis, contra os desmandos e arbitrariedades do governador, de
seus correligionários políticos e de seus representantes no aparelho estatal.
São ataques aos que defendem os valores públicos mais avançados de nosso tempo.
Valores que aprendemos teórica e também praticamente
com o professor. Por isso, hoje devemos exclamar sem receio: “Somos todxs Zaidan!”.
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