Questionado, em debate na
PUC de São Paulo, sobre a recepção estrangeira do “Impeachment” da Presidente
Dilma Rousseff, respondi que os jornais e governos de vários países tinham
recebido com muita cautela ou desconfiança o movimento que culminou com o
afastamento da Presidente da República. Publicações prestigiosas como EL PAIS, LE
MONDE DIPLOMATIQUE, FINANCIAL TIMES e outros não só discutiram o aspecto legal daquela
operação, como manifestaram muitas dúvidas sobre as motivações, os objetivos e
a idoneidade de seus agentes. O principal questionamento tinha a ver com a insegurança jurídica que então se instalaria no país com o casuísmo
e a duvidosa legalidade de determinadas medidas tomadas pelo Parlamento
brasileiro, com a finalidade de executar
a agenda privatizante e
flexibilizadora dos direitos
sociais que então passou a prevalecer no Congresso Nacional. Isso porque a
sorte dos contratos e compromissos firmados pelas empresas estrangeiras
depende, naturalmente, do respeito às regras pré- existentes àquelas negociações. É preciso acrescentar
que a atuação “militante”, por um lado, e” hesitante”, por outro de nosso
Judiciário também ajudou muito nessa desconfiança generalizada. Que dizer, por
exemplo, de dois ministros das Relações Exteriores investigados pelo Supremo
Tribunal Federal, e que o triunvirato dos “homens fortes” deste governo estarem
sob suspeita, sem falar no próprio ocupante da cadeira presidencial?
Mas isso não é o mais importante para os brasileiros. Ditaduras piores
sobreviveram ao desprezo da comunidade política internacional. Quero tratar
aqui de um problema mais sério: a falta de segurança jurídica, em nosso país,
para o exercício de contraditório. Seja no âmbito local ou no nacional. Ou seja, o direito de fiscalizar e opor
reparos à indicação e a própria gestão das autoridades escolhidas, sabe-se lá
por que meios e com que interesses. Não se pode mais criticar o perfil
administrativo e o histórico político de terminados gestores, sem o risco de
uma interpelação judicial. Quando se trata de acusações e reportagens
veiculadas pelos grandes meios de comunicação, o tratamento é um. Quando se
trata de cidadãos e cidadãs, individualmente, o tratamento é outro. Pelo visto, o clima de impunidade e
ilegalidade que se abriu com o “golpe parlamentar” alimentou a disposição
autoritária, intransigente de certos políticos em relação aos críticos. Ora é
um direito de qualquer um discordar das medidas tomadas em relação à educação,
à saúde, à previdência, ao direito do trabalho, quando acha que essas medidas
atingem direitos, expectativas de direitos ou conquistas sociais e trabalhistas
há muito consolidada. Mais ainda, quando se dão ao talante de gestores – mal
preparados para suas pastas que atuam, muitas vezes, como meros prepostos de
empresários, grupos econômicos ou lobbies. Como cidadão, educador ou
contribuinte e eleitor, cada um(a) tem o direito de discordar, sem sofrer constrangimento
legal ou assédio de oficiais de justiça, na porta de suas casas. Medidas que
assumem o caráter de intimidação política diante do descalabro administrativo
que tomou conta do país.
Não resistir, não discordar de tal descalabro é que seria imoral e
criminoso. A omissão, o silêncio é uma forma de conivência com o assalto à
cidadania, tal como vem se dando no Brasil. Não se pode esperar pelas conveniências políticas de parte da
base aliada desse governo, para evitar a catástrofe. É preciso protestar, ir às
ruas, denunciar em alto e bom som o
crime de lesa-Republica, lesa-cidadania que está sendo perpetrado nesses dias.
Outro aspecto em ponto menor é o que vem se dando na esfera local e
estadual, com a ação persecutória, intolerante que vem sendo exercida no Estado de Pernambuco. O que pode haver de comum entre” o imaginário da
revolução de 17” e um governo bizarro, incompetente, desastrado que prefere
responder às críticas à sua gestão com medidas jurídicas e policiais? – Só se
for como estímulo a mais um revolução em nosso Estado, contra tal estado de
coisas que se observa. Enquanto isso, a oligarquia vai preparando a sua
sobrevivência e perpetuação através de filhos e filhotes, de olho nas eleições
proporcionais do próximo ano.
Michel Zaidan Filho é filósofo, historiador, cientista político, professor titular da Universidade Federal de Pernambuco e coordenador do Núcleo de Estudos Eleitorais, Partidários e da Democracia - NEEPD-UFPE
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