pub-5238575981085443 CONTEXTO POLÍTICO.
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quarta-feira, 12 de outubro de 2016

"Não há nada nos cadernos pretos que possa indicar a adesão de Hiedegger ao nazismo".


Professor italiano estudioso dos cadernos pretos do filósofo, Francesco Alfieri defende que eles foram "instrumentalizados" a fim de provocar confusão entre a comunidade científica. Acadêmico vem a São Paulo no dia 25 de outubro para palestra no Espaço CULT
O professor italiano Francesco Alfieri, que ministra palestra no Espaço CULT no dia 25/10  (Reprodução)
O professor italiano Francesco Alfieri, que ministra palestra no Espaço CULT no dia 25/10 (Reprodução)
Amanda Massuela
Desde novembro de 2014 debruçado sobre os cadernos pretos de Martin Heidegger (1889-1976), o professor italiano Francesco Alfieri afirma estar “mais do que convencido” de que não há ligação entre o filósofo alemão e a ideologia nazista. A conclusão vem depois de quase dois anos de estudo sistemático dos cadernos, feito em parceria com o professor Friedrich von Herrmann, último discípulo vivo de Heidegger.
Para Alfieri, as acusações de antissemitismo feitas contra o filósofo são resultado de uma “estratégia engenhosamente posta em ato para gerar confusão”, fruto de insinuações feitas sem rigor científico e amplamente disseminadas pela imprensa. As constatações foram reunidas no livro A verdade sobre os cadernos pretos de Heidegger, publicado em janeiro na Itália e atualmente em fase de tradução no Brasil.
“O livro contém parte da correspondência entre Heidegger e Von Herrmann, além de algumas cartas trocadas com Hans-Georg Gadamer. São documentos que auxiliam a compreender como a instrumentalização de Heidegger não é de hoje, mas acompanha a vida do filósofo desde sempre”, adianta o professor, que no dia 25 de outubro vem a São Paulo para apresentar os resultados dos estudos.
O conteúdo das cadernetas de capa preta em que o filósofo costumava anotar seus pensamentos começou a ser publicado em 2014, com edição do filósofo Peter Trawny. Em diversas ocasiões, Trawny  defendeu, em entrevistas e artigos, o caráter antissemita de alguns escritos: “Heidegger não só adotou essas ideias antissemitas, mas as processou filosoficamente, falhando em imunizar seu pensamento dessas tendências”, disse em entrevista ao jornal inglês The Guardian.
Em entrevista por e-mail ao site da CULT, o professor Francesco Alfieri defende exatamente o oposto e afirma que as “hipóteses fantasiosas” do editor alemão, com o apoio da mídia, podem ter influenciado a opinião pública.
CULT – Você já afirmou que, logo na sua primeira leitura dos cadernos pretos de Heidegger, entendeu que eles eram “perigosos”. Por quê?
Francesco Alfieri – É verdade, e hoje confirmo o que disse em 2014. São “perigosos” porque se prestam a ser instrumentalizados por quem não conhece o itinerário especulativo de Heidegger. Por sua estrutura fragmentária, os esboços de pensamento registrados nos cadernos pretos iludem o leitor “ingênuo”, dando-lhe a impressão de que o conteúdo desses esboços é compreendido facilmente. Mas não é bem assim…
Depois de ter estudado os cadernos, você estaria convencido de que o nazismo de Heidegger é antes um mito construído, e não uma realidade?
Estou mais do que convencido de que as acusações de antissemitismo feitas contra Heidegger são o resultado de uma estratégia engenhosamente posta em ato para gerar confusão e para insinuar que finalmente foram encontradas provas tangíveis do compromisso do filósofo com o nacional-socialismo de Hitler.
Então, qual a razão para Heidegger ter mantido esses cadernos em segredo?
Heidegger nunca quis mantê-los em segredo. Essa é uma notícia fantasiosa vendida por Peter Trawny, editor alemão da obra. Heidegger queria que os cadernos fossem publicados quando se tivesse chegado à edição completa de suas obras. Não se trata, portanto, de anotações secretas, porque já se sabia da sua existência, uma vez que o próprio Heidegger remetia a elas em alguns comentários feitos nos seus trabalhos publicados pela editora Vittorio Klostermann.
 Qual a chave de leitura para entender que o nazismo de Heidegger é um mito?
Não há nenhuma chave de leitura a esse respeito porque não há simplesmente nada nos cadernos que possa dar base para afirmar uma adesão de Heidegger ao nazismo. Aliás, o termo “mito” foi empregado pelo editor alemão dos cadernos pretos, mas a fim de promover as suas próprias e fantasiosas hipóteses, que são desmentidas categoricamente por boa parte da comunidade científica.
A interpretação de Trawny pode ter condicionado a recepção dos cadernos pretos entre os intelectuais?
Sustento que as hipóteses fantasiosas do editor alemão, com o apoio da mídia, tenha influenciado a opinião pública. No entanto, há um abismo entre a opinião pública e o trabalho dos intelectuais. Muitos intelectuais preferiram ficar fora desse caos midiático.
Trawny afirma enfaticamente que, sim, há passagens antissemitas nos cadernos.Ele também afirma que, assim como muitos europeus nos anos 1920 e 1930, “Heidegger era em algum grau antissemita”, ainda que isso não tenha afetado a sua obra. Como vê essa afirmação?
O editor alemão não deu até hoje “nenhuma prova” do antissemitismo histórico-ontológico de Heidegger. Repito: “nenhuma prova”. Ele apenas insinuou que isso está presente em Heidegger, selecionando algumas passagens das anotações do filósofo com o fim de gerar uma grande confusão (confusão, aliás, alimentada com a ajuda da mídia), na qual tomou parte quem desejava a “todo custo” crer que isso era verdadeiro, sem, no entanto, dar-se ao trabalho de verificar pessoalmente se essas hipóteses eram defensáveis. Creio que o editor alemão tenha dado prova de descuido e do seu pouco rigor científico, coisas que têm ficado claras para muitos leitores atentos.
Você já afirmou que não se pode ler Heidegger ou qualquer outro autor com veemência, ressentimento ou com muita paixão, porque isso produz leituras deturpadas. Então de que maneira o leitor pode tomar a distância aconselhável para que possa fazer uma leitura apropriada dos cadernos, tendo em vista seu conteúdo tão polêmico?
Eles precisam ser estudados dentro de um contexto muito mais amplo e complexo, precisamente à luz das grandes obras de Heidegger. Não é adequado deter-se apenas nesses cadernos de anotação e isolá-los do conjunto do trabalho heideggeriano. Quem faz isso demonstra não respeitar o pensamento ontológico-histórico do filósofo. Convém entender até a raiz o conteúdo dos cadernos pretos por meio de um linguajar que se revela como acessível apenas a quem aceita entrar no conjunto da obra de Heidegger.
Parece que Hannah Arendt e tantos outros falaram do caráter difícil e perigoso de Heidegger. Concorda com as afirmações?
Hannah Arendt e outros sempre falaram da complexidade de Heidegger pelo fato de o seus escritos não serem facilmente acessíveis, em função de seu vocabulário e da criação de uma nova terminologia que impedia o acesso de “muitos” ao seu pensamento. É preciso, portanto, conhecer a fundo os combates existenciais de Heidegger com base, por exemplo, na sua correspondência. Isso permite descobrir que, se hoje há algo de “perigoso”, ele está do lado da ditadura da opinião pública, marcada pela pretensão de “comunicar sem conteúdos”, bem como do lado de alguns estudiosos que fazem suas publicações sem rigor científico. A verdadeira pesquisa, rigorosa, não está nas mãos de quem segue a lógica do consenso e do ouvir dizer: essas são estradas frequentemente percorridas por quem se serve da filosofia para atingir escopos utilitaristas.
A leitura dos cadernos pretos mudou alguma coisa na percepção da obra de Heidegger?
Creio que ela fez amadurecer uma nova consciência nos estudiosos: a “necessidade” de retornar às obras do autor e, sobretudo, a urgência de perceber que sem uma minuciosa hermenêutica, baseada em uma investigação filológica, não é plenamente compreensível o movimento de seu pensamento. Sem esse duro trabalho não se chega a lugar algum.
 Como o seu livro, escrito com o professor Von Hermann, foi recebido na Europa?
Estamos muito contentes com o fato de os especialistas, entre eles o Prof. François Fédier [filósofo francês e discípulo de Heidegger] e muitos expoentes da corrente fenomenológica mesmo fora da Europa – por exemplo, o Prof. In-Suk Cha, da Coreia do Sul – tenham encontrado em nosso livro as chaves hermenêutico-interpretativas para poder chegar a um estudo sistemático dos cadernos pretos. Recentemente recebemos com satisfação a notícia de que as edições Gallimard, com o apoio direto do próprio editor Antoine Gallimard, publicarão a tradução francesa de nosso livro, feita pelo professor Pascal David. Aliás, a tradução já está pronta.
Seu livro será traduzido e publicado no Brasil? Quando?
É muito sólida a minha intenção de que este livro seja publicado pela editora Perspectiva, porque desejo que ele seja um sinal de diálogo com a comunidade judaica, à qual fizemos questão de homenagear com a escolha da data de publicação do original italiano, em 26 de janeiro, Dia da Memória. Insisto que quem instrumentalizou os cadernos pretos de Heidegger violou indiretamente a dor da comunidade judaica. A distorção da História, produzida com a instrumentalização dos cadernos pretos, foi por nós denunciada a justo título. Donde o nosso intento de render homenagem à comunidade judaica: é a sua própria recordação de toda a dor sofrida nos campos de extermínio que não pode e não deve ser instrumentalizada.
Colaboração e tradução Juvenal Savian Filho
A verdade sobre os cadernos pretos de Heidegger, com Francesco Alfieri
Onde: 
Espaço CULT, rua Aspicuelta, 99, Alto de Pinheiros – SP
Quando: 
25/10, às 19h30
Quanto: grátis
(Publicado originalmente no site da revista Cult)

Charge! Jornalistas Livres

Editorial: Políticas públicas em tempos de #PECdoFimdoMundo






No dia de ontem me debrucei sobre os avanços das políticas de igualdade racial ocorridas durante os governos da coalizão petista. Tivemos avanços dos mais significativos, seja do ponto de vista dos direitos, do espaço de poder ocupados pelos representantes dessas etnias no governo - com status de ministérios - seja em dados concretos, como, por exemplo, o aumento do percentual de negros que tiveram acesso ao ensino superior. Nos poucos meses do Governo Temer, todas essas conquistas vieram por água abaixo e, neste ritmo, vamos voltar a um estágio que antecedeu a promulgação da constituição cidadã de 1988 ou a um cenário ainda mais grotesco, como nos tempos dos grilhões. Mas, no momento, não queremos nos aprofundar nessa questão, uma vez que se trata de um debate institucional ora em curso numa instituição de pesquisa ligada ao MEC.  

No dia de hoje, gostaria de comentar sobre a aprovação da PEC 241, em primeira votação, na Câmara dos Deputados, por 366 votos a 111, depois dos banquetes de canapés oferecidos aos deputados federais pela Presidência da República, onde a contenção de despesas parece que não foi bem o forte, posto que se calcula um gasto superior aos cem mil reais. Na cruzada movida pelo Planalto para aprovar a PEC 241, até ministros foram temporariamente exonerados, como foi o caso dos pernambucanos Bruno Araújo(PSDB), das Cidades, Fernando Bezerra Coelho Filho(PSB), das Minas e Energia. Depois do que houve com a licenciosidade do Pré-Sal para a exploração por empresas estrangeiras - que atingiu em cheio a soberania nacional - agora vem a aprovação da PEC 241, que, na prática, congela investimentos em saúde e educação pelos próximos 20 anos, além de retroagir na política de aumentos do salário mínimo que vinha sendo adotada pelos governos da coalizão petista. 

O sociólogo Paulo Sérgio Pinheiro tem toda a razão ao afirmar que, somente através de um golpe, seria possível a adoção dessas medidas. Elas jamais poderiam ser negociadas por algum partido ou coalizão de partidos, através do voto livre dos eleitores, em clima de normalidade democrática. Aponta-se, aqui, então, uma das vertentes mais óbvias das urdiduras que afastaram a presidente Dilma Rousseff do poder:criar as condições políticas para promover a mais violenta erosão de direitos da classe trabalhadora. Com a aprovação da PEC 241, o SUS, que atende aquela população desassistida dos planos de saúde, ficará irremediavelmente comprometido. Na educação, então, o PNE também deverá ser profundamente afetado, inclusive no que concerne ao piso nacional dos professores. Aliás, de acordo com um determinado ministro, talvez seja o caso de cortar as "regalias" da categoria. 

Nesse clima de profunda instabilidade política e clima de terra arrasada é pouco previsível dizer o que irá restar ao longo e ao cabo deste governo. As liberdades públicas, os direitos estão sendo corroídos e o patrimônio nacional completamente dilapidado. Os comentários são de que essas medidas poderão entrar em vigor apenas em 2018, quando o presidente Michel Temer deveria deixar o poder. Eis aqui um exercício de previsão dos mais complexos antever, do ponto de vista do poder, o que poderá ocorrer até o ano de 2018 quando, em tese, teríamos eleições diretas para a Presidência da República. A começar pelo fato de que nós não acreditamos nessa possibilidade, salvo numa condição em que eles possam ter certeza sobre o resultado do jogo. 

O mais provável hoje é que haja um golpe dentro do golpe e as coisas se arranjem entre eles, entre a nucleação de poder do PMDB e o PSDB. No nosso entendimento, as forças do campo progressistas deverão amargar um longo e tenebroso inverno longe do poder. O PT está esfacelado e o PSTU ainda não possui a capilaridade política para estabelecer um contraponto a este núcleo de poder. Isso se eles ainda desejarem manter as aparências de normalidade democrática, com a existência de eleições diretas. Ainda citando o sociólogo Sérgio Pinheiro, a maldade dessas medidas não seriam possíveis de ser aplicada sob a égide de um regime de normalidade democrática. O momento político vivido é bastante delicado. Os parlamentares que aprovaram essas medidas estão brincando com coisa muito séria, como o fato de condenar alguns brasileiros à morte, como disse o Temporão. Salvo pelos sites da imprensa independente, não li absolutamente nada da "grande" imprensa condenando essas medidas extremas. Estamos no pior dos mundos. Numa única semana, como disse o editor da Opera Mundi, perdemos o Pré-Sal, o STF "relativizou" o princípio da presunção de inocência, concedeu poderes especiais a um certo juiz do Paraná e tivemos a aprovação da #PECdoFimdoMundo, em primeira votação na Câmara dos Deputados. 



A charge que ilustra este editorial é do cartunista Renato Aroeira.  


terça-feira, 11 de outubro de 2016

Manifesto de apoio à candidatura de João Paulo a prefeito do Recife ( Leia, pense e assine)



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Assistimos a uma onda de conservadorismo invadir o país, expressa na resultado eleitoral do primeiro turno. O golpe parlamentar, com forte apoio da mídia, que rasgou a Constituição e afastou uma presidenta democraticamente eleita produziu um ambiente em que políticos comprometidos com os interesses dos ricos e poderosos saíram-se vitoriosos na maioria das capitais e das grandes e médias cidades.
Por razões distintas, três capitais brasileiras transformaram-se em campos de batalha onde as forças democráticas, de esquerda e populares enfrentam os setores de centro-direita, parceiros do golpe. As eleições do Recife, Rio de Janeiro e de Belém poderão ou não eleger governos democráticos para seus habitantes e para o país como um todo.
As vitórias de João Paulo no Recife, Marcelo Freixo no Rio de Janeiro, e Edmilson Rodrigues, em Belém, interessam a todos os militantes da causa democrática e representarão a resistência democrática em nosso país.
No caso especial do Recife, acreditamos que João Paulo, que já governou a cidade por dois mandatos seguidos, saberá levar adiante um projeto em defesa da liberdade, das conquistas sociais e dos mais pobres; irá recuperar a eficiência da gestão municipal e sua integração com as demandas da sociedade. Experiência não lhe falta. João Paulo saiu da Prefeitura, em 2008, com 88% de aprovação e ainda hoje as pessoas recordam dos avanços que a cidade assistiu em sua gestão: a inversão do trânsito em Boa Viagem, o saneamento dos bairros da Mangueira e da Mustardinha, a abertura de vias, a paralela da Caxangá, a Via Mangue, a contratação de 2.650 professores, o investimento na formação dos educadores, a multiplicação das equipes de agentes da família, o Carnaval Multicultural do Recife, entre tantas outras ações e obras.
Hoje, no entanto, alguns ganhos obtidos na gestão se perderam.  Nos últimos anos, o Recife andou para trás. Um bom exemplo é a volta das palafitas. Foram retiradas quase duas mil famílias dessas habitações indignas e transferidas para conjuntos habitacionais. Na saúde, o abandono atual facilitou o aparecimento de doenças que estavam erradicadas ou eram desconhecidas. 
Sabemos que João Paulo encontra-se numa disputa eleitoral em um contexto político desigual. Além de enfrentar um governo nacional ilegítimo, vê-se diante de duas outras poderosas máquinas – as dos governos municipal e estadual. Mas há uma vigorosa resposta das ruas, um sentimento de mudança que cresce dia a dia, e estamos agora em defesa desse projeto, independente de nossas concepções do mundo e filiações partidárias. 
O que nos une é a defesa da democracia e a esperança por um Recife mais justo e solidário e a certeza de que, eleito João Paulo será um importante interlocutor das forças democráticas na conquista de um país mais justo e igual.


Charge! Com a genialidade do Renato Aroeira

domingo, 9 de outubro de 2016

Socialismo ou barbárie outra vez?

A ditadura já começou, por Luis Felipe Miguel

O novo regime busca hoje manter ao máximo a aparência de legalidade, mas a tendência é que caminhe para formas cada vez mais escancaradas de violência
Assim como sofremos um golpe de novo tipo, estamos vivendo o início de uma ditadura de novo tipo. Não será o regime de um ditador pessoal, até porque nenhum dos possíveis candidatos ao posto tem força suficiente para alcançá-lo. Não será uma ditadura das forças armadas, ainda que sua participação na repressão tenda a crescer. Provavelmente, muitos dos rituais do Estado de direito e da democracia eleitoral serão mantidos, mas cada vez mais esvaziados de sentido.
A ditadura se expressa no alinhamento dos três poderes em torno de um projeto claro de retração de direitos individuais e sociais, a ser implantado sem que se busque sequer a anuência formal da maioria da população, por meio das eleições. Entre muitos outros sinais de que ela já começou, é possível citar:
- A decisão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, no dia 22 de setembro, concedendo ao juiz Sérgio Moro poderes de exceção. Na prática, as garantias constitucionais ficam suspensas para qualquer um que seja alvo do juiz curitibano.
- A decisão do Supremo Tribunal Federal, do último dia 5 de outubro, de permitir o encarceramento de réus sem que os recursos tenham sido esgotados. Vendida como medida para impedir a impunidade dos poderosos, amplia o poder discricionário de um Judiciário que é notoriamente enviesado em suas decisões. Apenas como ilustração, a Defensoria Pública do Rio de Janeiro afirmou em nota que mais de 40% de seus recursos ao STJ têm efeito positivo. É, portanto, um contingente muito expressivo de pessoas que começariam a cumprir penas depois consideradas injustas.
- Outra decisão do STF no mesmo dia permitindo que a polícia invada domicílios sem mandado judicial.
- O aumento generalizado da truculência policial, algo que vem desde o final do governo Dilma, estimulado pelo clima político de avanço da reação - e também pela legislação que o próprio governo Dilma aprovou.
- O rolo compressor das mudanças na lei e na Constituição, com o uso inaceitável do instrumento da medida provisória (como no caso do ensino médio) ou a ausência de qualquer debate, seja com a sociedade, seja dentro do próprio Congresso. A entrega do pré-sal e a PEC de estrangulamento do investimento público servem de exemplo: a "base governista" nem tentou fingir que não estava apenas cumprindo o ritual da aprovação parlamentar, sem qualquer engajamento em discussões com a oposição.
- O avanço da censura e a imposição da narrativa única pelos oligopólios da mídia empresarial, parceiros de primeira hora da ditadura em implantação. Isso se dá em várias frentes. Há o estrangulamento econômico dos meios de comunicação independentes. Há a intimidação das vozes críticas, da qual o exemplo maior são as inúmeras decisões judiciais que penalizam qualquer um que ouse falar sobre o ministro Gilmar Mendes. E há o cerceamento à liberdade de expressão nos espaços em que ela possa ocorrer, como faz o projeto Escola Sem Partido. A comissão especial criada para discuti-lo na Câmara dos Deputados é formada quase que exclusivamente por fundamentalistas cristãos e outros direitistas extremados. Uma ação no Supremo, contra a lei que foi aprovada em Alagoas, mas que barraria iniciativas similares no Brasil todo, está parada nas mãos do ministro Luís Roberto Barroso.
- A volta da tortura a prisioneiros, com motivação política. O encarceramento por tempo indefinido, com o objetivo expresso de "quebrar a resistência" de suspeitos (pois nem réus são) e levá-los à delação, tornou-se rotina no Brasil e é uma forma de abuso de poder, de constrangimento ilegal e, enfim, de tortura. (E antes de que alguém lembre que a tortura a presos comuns nunca se extinguiu no Brasil, cabe ponderar que a extensão da prática em nada melhora a situação dos presos comuns; ao contrário, pode piorá-la.)
- A volta da perseguição política, com inquéritos farsescos contra alvos selecionados, com o objetivo de apenas encontrar justificativas para punições definidas de antemão. O cerco a Lula é o exemplo mais claro.
- A criminalização do PT e da esquerda em geral, alimentada pelos meios de comunicação empresariais e pelos poderes de Estado, com destaque agora para a campanha do governo Temer sobre "tirar o Brasil do vermelho". A agressividade crescente dos militantes da direita, produzida de forma deliberada, tenta emparedar as posições à esquerda, progressistas e democráticas, ao mesmo tempo em que a cassação de registros partidários torna-se uma possibilidade mais palpável.
O novo regime busca hoje manter ao máximo a aparência de legalidade, mas a tendência é que caminhe para formas cada vez mais escancaradas de violência. Há uma razão simples para isso. Seu projeto é a confluência de quatro eixos: (1) entrega do patrimônio nacional; (2) ampliação da taxa de exploração do trabalho; (3) retrocesso nos direitos de grupos subalternos, com a reafirmação das hierarquias tradicionais (penso nas mulheres, na população negra, em lésbicas, gays e travestis); e (4) permanência das práticas de corrupção e de saque do Estado em favor da elite política reinante. Os eixos revelam o espectro de interesses diversos que se reuniram para a deflagração do golpe.
Trata-se de um projeto extraordinariamente lesivo para a grande maioria do povo brasileiro. Graças à baixíssima educação política da maior parte da população e à campanha incessante da mídia, para muita gente a ficha não caiu. Mas os efeitos da redução dos salários, do aumento do desemprego, do subfinanciamento do Estado e do desmonte dos serviços públicos logo se farão sentir de forma plena. Para conter a inevitável reação popular, será necessária uma escalada repressiva e restrições cada vez maiores aos direitos.
Diante deste cenário, de uma luta desigual e prolongada, o campo democrático brasileiro parte atrasado e sem clareza. As eleições municipais funcionaram e ainda funcionam como uma bela armadilha para colocar as forças de esquerda, progressistas e democráticas brigando entre si, enquanto os novos donos do poder nadam de braçada. É triste perceber a falta de visão e de grandeza que faz com que lideranças e militantes do PT e do PSOL prefiram puxar o tapete uns dos outros em vez de unir forças contra o inimigo comum; é triste ver um candidato de esquerda anunciando que a campanha no segundo turno será "municipalizada" e não tocará em questões nacionais; é triste ver como a energia que devia ser canalizada para a construção da resistência é desperdiçada no conflito interno.
Há muito o que criticar na trajetória das organizações de esquerda e suas lideranças - sobretudo do PT, que foi o principal partido durante décadas e exerceu o poder. Que o PT errou, todos sabemos. Mas a discussão, necessária, sobre seus erros e seus limites não pode impedir a unidade de ação contra o golpe e sua agenda. A expressão "Frente Ampla" está na boca de todo mundo, mas para muitos ela parece designar "somente eu e meus amigos". Não. É uma frente, isto é, reúne uma diversidade de grupos. E é ampla: nela devem estar aqueles com quem eu divirjo sobre muitas coisas, desde que possamos agir juntos em relação a algo que concordamos que, no momento, é o prioritário.
E o prioritário é restabelecer a vigência das regras democráticas e impedir o recuo social. Se as lideranças da esquerda brasileira não entendem isso, não entendem nada.

(Publicado originalmente no Jornal GGN)

Charge!Aroeira via Facebook

sexta-feira, 7 de outubro de 2016

Editorial: PT: Como morre um partido político?



O livro Os Partidos Políticos, do sociólogo e cientista político Maurice Duverger, é um livro que parece não sofrer os efeitos do tempo. Escrito em 1951, continua um livro atualíssimo sobre o tema, sobretudo em razão de apresentar uma teoria sobre os partidos políticos, que mereceu poucos reparos ao longo desses anos. Quando trata da origem dos partidos políticos, por exemplo, Duverger vai nos apresentar uma distinção bem clara sobre os partidos de quadros, nascidos nos parlamentos, e os partidos de massa, que tem sua origem fora do parlamento, nas organizações sindicais e movimentos sociais. Os partidos de massa surgiram exatamente para representar uma demanda social, que jamais foi atendida pelos partidos de quadros. Assim, esses partidos, em função da origem e identidade com determinados segmentos eleitorais, vão apresentar características bem diferenciadas. Os partidos de quadros podem acabar, simplesmente, pela vontade dos seus caciques, dos seus donos, de acordo com as conveniências de ocasião. Já em relação aos partidos de massa, a situação é bem mais complexa, envolvendo inúmeros fatores, inclusive um divórcio com a sua base histórica de sustentação.

O senador Aécio Neves(PSDB), depois dos resultados das eleições municipais do último domingo, dia 02, soltou uma frase cheia de regozijo pelo desfecho da malograda campanha petista, que perdeu 60% das prefeituras conquistadas nas eleições de 2012: O PT foi dizimado. Certamente, alguma coisa precisa ser feita em relação ao Partido dos Trabalhadores, cotidianamente atacado por uma mídia ensandecida, com o propósito inequívoco, como mesmo disse o senador, de dizimar a legenda ou promover o seu "assassinato simbólico" no imaginário do cidadão comum. Como afirmamos num artigo sobre as eleições municipais do Recife, o eleitorado anti-petista, consolidado durante esse período, foi um dos principais trunfos das forças conservadoras nessas eleições municipais. E, pelo andar da carruagem política de Fernando Haddad, em São Paulo, que perdeu muitos votos na periferia, o que começou como uma onda da elite e dos coxinhas de classe média, começa a atingir os estratos sociais mais fragilizados economicamente.  

Se perguntamos a algum profissional de comunicação ou da área de marketing político, ele, certamente, chegará à conclusão de que, de fato, algo no Partido dos Trabalhadores está irremediavelmente dizimado. Parece-nos não haver dúvida quanto à constatação de que, do ponto de vista da comunicação, alguma coisa precisa ser feita. Suas principais lideranças no plano nacional já falam em fazer uma reformulação geral da legenda, quem sabe até mesmo mudando o seu nome.Numa campanha de comunicação muito bem-sucedida das forças conservadoras, a sigla PT, o número 13, a estrela foram "criminalizados". Claro que quando se trata de sua linha programática a conversa é bem outra. 

As "velhas" teses da legenda continuam com uma atualidade impressionante, sobretudo nesses momentos de entrega da exploração do Pré-sal à empresas estrangeiras, que é um golpe de misericórdia na soberania nacional. Enquanto do ponto de vista da coalizão petista, os recursos obtidos com a exploração do Pré-sal seriam destinados à educação e à saúde, neste governo deve alimentar os tubarões das grandes corporações financeiras internacionais. Mas isso precisa ser comunicado e o problema aqui são as barreiras criadas para essa comunicação. Como bem disse o Lula, num discurso da "virada" - que acabou não ocorrendo - em prol do candidato Fernando Haddad - o partido montou uma quadrilha para tirar 36 milhões de brasileiros da extrema pobreza. Não satisfeito ainda, o governo Temer aprovou a famigerada PEC, que contingencia recursos para essas áreas pelos próximos 20 anos.

Ou seja, do ponto de vista da democracia substantiva, o partido, ao adotar uma série de políticas públicas que oportunizaram o brasileiro a ter uma vida digna, estudarem, diminuindo as desigualdades, deu sua contribuição à consolidação de nossa democracia. Por outro lado, no que concerne à engenharia da democracia procedimental, deixou de fazer reformas importantes como a reforma política e a que propunha a democratização da mídia, acabando com a hegemonia dos grandes oligopólios familiares. Isso facilitou, em muito, como se sabe o trabalho dos seus inimigos políticos. Na realidade, os problemas que o partido enfrentou na gestão da coisa pública foram utilizados - e muito bem utilizados - pelas forças conservadoras para a retomada do poder e adoção de sua agenda pública. Que, aliás, não é tão sua assim, mas resultado de um conjunto de interesses de grandes corporações financeiras e dos Estados Unidos. 

Como bem disse o editor do Le Monde Diplomatique, Cáccia Bava, as forças do campo progressista perderam a batalha de comunicação para as forças do campo conservador.Não somos - tampouco pretendemos ser - algum analista de mídia, mas uma simples curiosidade nas redes sociais e na imprensa escrita do dia nos remetem à dimensão que a situação atingiu aqui no país. Observem a repercussão da notícia sobre o novo indiciamento, pela Polícia Federal, do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, estampado nas manchetes acima, assim que a notícia foi divulgada. Quanto ao novo indiciamento pela Polícia Federal, seus advogados estão questionando bastante o fato de órgãos ligados ao PIG tomarem conhecimento dos fatos -e o alardearem - muito antes dos advogados de defesa dos réus, uma "tramitação", digamos assim, curiosíssima.

Aqui no Recife, precisamente na Av. Conde da Boa Vista, havia uma senhora, numa de suas calçadas, que costumava comercializar a estrela do Partido dos Trabalhadores. Nunca mais vi aquela senhora. Não sei como se comportaram os demais candidatos em todo o Brasil, mas aqui no Recife João Paulo conduziu sua campanha carregado da simbologia petista, de camisa vermelha, estrela no peito e com Lula em seu palanque na reta final. Agora no segundo turno, embora aberto às negociações, enfrenta sérias dificuldades diante dos demais postulantes, de feições claramente anti-petista. Nomes como Priscila Krause(DEM) e Daniel Coelho(PSDB) não iriam compor com ele em nenhuma hipótese, mesmo em sabendo tratar-se de postulantes com severas críticas à gestão do senhor Geraldo Júlio(PSB). Causa estranheza, no entanto, a suposta posição de neutralidade do senhor Edilson Silva, do PSOL. João Paulo conduziu sua campanha com muita dignidade. É um vencedor independentemente do resultado do pleito. Sobretudo neste momento delicado para as forças progressistas, ninguém entendeu muito bem foi a posição do senhor Edilson Silva.

Bons tempos aqueles em que a militância petista se reunia para defender suas teses, em encontros e congressos memoráveis da legenda. Hoje é posto o dilema da própria existência da legenda, que talvez precise de ser refundada, em razão de alguns equívocos cometidos, mas sobretudo em razão de uma campanha sem precedentes de "linchamento de imagem" promovido pela mídia golpista, com objetivos bem claro.No dia de hoje, além do indiciamento de Lula ter alcançado destaque, como disse, em tradicionais veículos do PIG, também ocupou um espaço privilegiado no Trend Trip do microblog twitter. Cumprindo a tradição, aqui na província, um dos principais jornais locais dão destaque a esta notícia, conforme capa reproduzida acima. 

P.S.: Do Realpolitik: Há quem afirme que o PT acabou quando resolveu adotar uma política de conciliação de classe com as forças conservadoras da sociedade brasileira com o objetivo de viabilizar-se para chegar ao poder no plano nacional, com Luiz Inácio Lula da Silva. Logo essa política de conciliação de classe demonstraria sua fragilidade, pela absoluta incapacidade de nossa elite em permitir a construção de uma nação que incorpore o andar de baixo da pirâmide social na condição de cidadãos. Na realidade, como disse um filósofo, nós não vivemos num país, apenas ocupamos o mesmo espaço físico. Foi um momento delicado acompanhar, por exemplo, a degradação do segundo governo da ex-presidente Dilma Rousseff, se descaracterizando em concessões e concessões a essa força, segurando-se num fio de cabelo para preservar o seu mandato. Nem assim foi possível. Já que estamos falando tanto em "impossibilidades", com a debacle do PT, surge como força política de esquerda o PSOL, mas o partido, como informa o cientista político Michel Zaidan, ainda não possui a capilaridade política suficiente para formatar um conjunto de alianças políticas que o torne viável num pleito presidencial. Há de se perguntar, igualmente, se tal composição de alianças não o deixaria um partido comprometido programaticamente.  Há de se perguntar, igualmente, se tal composição de alianças não o deixaria um partido comprometido programaticamente, o que é um dado bastante relevante quando se trata de partidos de massa. Na realidade, o declínio dos partidos políticos é generalizado, indo muito além do PT. Aqui no Brasil, contribui para o esfacelamento do PT elementos relacionados às estratégias montadas para afastá-lo do poder, assim como inviabilizar suas principais lideranças, notadamente Luiz Inácio Lula da Silva, quem sabe com a sua prisão, naquilo que está sendo chamado pelos cronistas políticos de segunda fase do golpe institucional ora em curso. Mas, como disse, a morte dos partidos políticos é um fenômeno que ocorre em todos os países que adotam a democracia representativa. Como observo no primeiro parágrafo, "naqueles tempos", os partidos, como os de massa, até surgiam para representar os interesses e as demandas de determinados segmentos sociais. Os próprios núcleos sociais que participaram da formação do PT é um excelente exemplo disso, como o Novo Sindicalismo, setores progressistas da Igreja Católica, grupos que combateram a Ditadura Militar e procuravam inserirem-se na lula institucional etc. O problema é que hoje, o sistema político ruiu e passou a representar os interesses de grandes corporações, sobretudo as financeiras, deixando a representação popular absolutamente órfã. Em termos de partidos políticos, desde que o livro de Duverger foi lançado, em 1951, tivemos um retrocesso descomunal. 


Nova obra de Michel Zaidan reúne artigos sobre marxismo

 
livro “Ensaios sobre Teoria” é uma publicação do Núcleo de Estudos Eleitorais, Partidários e da Democracia (NEEPD) da Universidade Federal de Pernambuco. O conteúdo é uma espécie de prestação de contas de quem, como Zaidan, trabalhou durante muitos anos em universidades brasileiras, lecionando disciplinas de Teoria da História e Teoria Política.

Chico Porto - JC Agência



Por isso mesmo, a obra traz uma coletânea de ensaios, artigos, resenhas e notas tratando de alguns dos principais pensadores da modernidade (Hegel, Marx, Engels, Bobbio, Benjamin, Habermas e outros). São textos escritos em ocasiões diversas e com finalidades muito diferentes, mas eles ganham unidade na proposta editorial do livro.
Apresentam, em geral, o marxismo numa perspectiva crítica. Buscam compreendê-lo no interior da própria história das idéias socialistas e num diálogo permanente com outros autores marxistas brasileiros, como Octávio Brandão, Leandro Konder, Carlos Nelson Coutinho, José Paulo Netto e Marco Aurélio Nogueira.
Entre a variedade de temas abordados encontram-se o marxismo heterodoxo de Walter Benjamin e sua recepção no ambiente universitário brasileiro; o pensamento de Gilberto Freyre e Octávio Brandão, “um Lênin que poderia ter acertado”.
Michel Zaidan Filho é Professor do Departamento de História da Universidade federal de Pernambuco e coordenador do NEEPD. È autor de importantes obras sobre a formação e primeiros anos do comunismo no Brasil, entre elas estão Nas origens de um marxismo nacional, O PCB e a Internacional Comunista e Os comunistas em céu aberto.

O livro pode ser adquirido diretamente no Núcleo de Estudos Eleitorais, Partidários e da Democracia (Neepd) da UFPE - endereço Avenida Prof. Moraes Rego, 1235 - Cidade Universitária, Recife - PE - CEP: 50670-901 ou do e-mail neepd@ufpe.br

quinta-feira, 6 de outubro de 2016

Michel Zaidan Filho: Em nome de Jesus

                                      

Fui submetido a uma bateria de questões, por um amigo-editor, sobre o resultado das últimas eleições municipais no Brasil. Essas eleições ocorreram num ambiente de profunda insegurança jurídica, de impunidade (em relação aos políticos “ficha suja”), de um monopólio “partidário” dos meios de comunicação, do desgaste político do PT e da esquerda, do crescimento do voto evangélico e, porque não dizer, de um Estado de Exceção, capitaneado pelo  Polícia Federal e o ativismo da Magistratura. 

Como apurou a mídia, as candidaturas mais bem aquinhoadas financeiramente venceram ou foram para o segundo turno das eleições. Os grandes partidos, sobretudo da centro-direita, aumentaram suas bancadas. Os candidatos da igreja reformada chegaram ao segundo turno. De forma que, pelo andar da carruagem, teremos legislaturas e executivos municipais mais á direita, mais conservadores. Diria um pescador (não de almas ou de águas turvas), o mar não está para peixe. Retrocedemos à época em que a nossa política de sobrevivência é a defesa dos mínimos sociais, numa frente de massas, diante das ameaças desse governo temerário, composta de aposentados, trabalhadores, estudantes, funcionários públicos, donas de casa,  pessoas sem-teto, sem emprego, sem escola etc.

Não fosse a ida de Marcelo Freixo (PSOL) para o segundo turno, no Rio de janeiro, contra o bispo da igreja universal, e a ida de João Paulo, no Recife, contra o representante local da oligarquia política que tanto nos infelicita aqui, dir-se-ia que a catástrofe política teria se abatido de uma vez sobre o país, com  ou sem a benção do nosso senhor Jesus Cristo. Já o reflexo disso sobre as eleições presidenciais e estaduais, daqui a dois anos, não prenunciam boas novas. A depender do curso da economia (e da crise internacional), base fisiológica de sustentação do atual mandatário presidencial, e da conspiração dos partidos que o colocaram na cadeira da Presidente Dilma pode-se ter ainda muitas surpresas desagradáveis nesse ínterim eleitoral. Fala-se em eleição indireta, em 2017, já com pretensos candidatos.

Afirmei que o ciclo político de centro-esquerda tinha se esgotado no Brasil, e que não tinha aparecido alternativas fortes, consistentes, que pudessem se apresentar à exaustão do ciclo político. O nome de Lula não pode ser essa única alternativa. Sobretudo, em face das manobras e escaramuças do juiz Sérgio  Morro, destinado como está a criminalizar o PT e suas lideranças políticas. O PSOL ainda não tem a musculatura suficiente para oferecer um nome e granjear alianças necessárias para tornar viável uma candidatura presidencial. Tem um longo caminho a percorrer. Não acredito também na viabilidade eleitoral de qualquer um dos  caciques do PSDB, apesar da vitória do empresário e marqueteiro João Dória, eterno adulador dos tucanos.

Assim, se a crise  econômica perdurar,  a  solerte invasão religiosa continuar, se uma certa classe media reproduzir o noticiário venenosa da mídia golpista desse país e a ditadura do Judiciário  se manter, fora de toda e qualquer controle constitucional, a porta estará aberta a todos os aventureiros, messias, salvadores da pátria de todas as igrejas existentes. Nem sempre a crise política e econômica, num ambiente de perda de confiança nas instituições republicanas, é uma janela de oportunidade para candidaturas progressistas e mais avançadas. Pode ser o atalho perigoso para o discurso da frustração política, dos “outsiders”, dos que se proclamam não-políticos, mas portadores da eficiência, da competência gerencial, da honestidade a toda prova etc.


Se  fosse religioso e frequentasse algum templo, rezaria muito  para que este tipo de messias não aparecesse tão cedo. E que o apocalipse da democracia fosse evitado.

Michel Zaidan Filho é filósofo, historiador, cientista político, professor titular da Universidade Federal de Pernambuco e coordenador do Núcleo de Estudos Eleitorais, Partidários e da Democracia - NEEPD-UFPE

terça-feira, 4 de outubro de 2016

O xadrez político das eleições de 2016, no Recife: Divorciado da classe média, a alternativa petista é concentrar esforços na periferia.


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José Luiz Gomes



A julgar pelo que ocorreu com as forças do campo progressista nestas eleições municipais, notadamente o PT, João Paulo ter conseguido levar as eleições do Recife para um segundo turno já pode ser contabilizado como uma grande vitória. Hoje, quando lançamos os olhares para o cenário político de Brasília, a unidade de análise se concentra quase que exclusivamente sobre o que poderá ocorrer entre "eles", posto que estamos bem próximo àquele cenário imposto pela Ditadura Militar de 1964, ou seja o de uma oposição consentida, sem chances efetivas de ocupar determinados níveis de poder. Estava ali apenas para salvar as aparências, bem ao estilo daquela atipicidade brasileira, que até os militares desejavam preservar. Neste contexto, aguardamos o lance de uma briga de foice entre o PMDB e o PSDB, travada nos estertores, sem participação popular. 

João Paulo não fez feio nessas eleições. Jogou limpo, defendeu o seu legado administrativo durante os dois mandatos que ocupou no Palácio Antonio Farias, trouxe Lula para participar da campanha e disse como poderia cuidar ainda melhor do recifense. Passou o recado das forças progressistas para milhões de eleitores, mesmo diante das adversidades; o menor espaço nas mídias e até diante de hostilidades, como aquela da qual foi vitima durante um almoço com correligionários em um shopping center da capital. Como ele mesmo afirmou, a luta foi muito desigual. Geraldo tinha a máquina, centenas de candidatos a vereador, um tempo de televisão bem superior ao seu e um eleitorado anti-petista consolidado, forjado na intensa campanha midiática com o propósito de promover o "assassinato simbólico" de uma legenda. Uma ajuda e tanto com que as forças conservadores contaram nessas eleições municipais. 

Já nas eleições de 2012, segundo soube, um ex-governador teria dado alguns murros na mesa, irritado pelo fato de que aquelas eleições estavam indo para um segundo turno, provocada pela performance do então candidato Daniel Coelho. Sobrou para o marqueteiro da campanha socialista à época, Diego Brandy. Vivo fosse, sua reação poderia ser a mesma nessas últimas eleições. Embora não tenha nenhum problema em admitir meus equívocos - e me expor também - é difícil apontar erros e acertos por aqui e de como eles poderiam ter sido decisivos no resultado dessas eleições, que ainda não estão definidos. Creio ter publicado, num dos artigos, algumas observações a esse respeito, a partir de algumas hipóteses levantadas pelo cientista político Roberto Numeriano. Incrível como os nossos analistas políticos andam ausentes desse debate, por vezes, construindo frases enigmáticas e apenas isso.

Agora, então, é que eles não vão arriscar nenhum prognóstico. Os candidatos Priscila Krause(DEM) e Daniel Coelho(PSDB) se mostraram reticentes em manifestar apoio ao nome o prefeito Geraldo Júlio(PSB) agora no segundo turno das eleições. Entende-se. Foram ferrenhos críticos da gestão de Geraldo Júlio, muito antes mesmo das eleições. As lideranças desses partidos, no entanto, já se anteciparam em anunciar que deverão apoiar o nome de Geraldo neste segundo turno, apesar das arestas com o governador Paulo Câmara, que rompeu com ambos. Mas, como diria o ex-governador Paulo Guerra, em política não existem nunca nem jamais, o que nos parece que está em jogo é a situação de alguns caciques dessas legendas na composição da chapa ao senado em 2018. 

O ministro da educação, Mendonça Filho(DEM), disputaria uma das vagas, assim como o ministro das Cidades, Bruno Araújo(PSDB), também teria interesse na outra vaga. No caso de Bruno, seria necessário, antes, combinar isso com o ex-prefeito de Jaboatão dos Guararapes, Elias Gomes, mas este sai com o seu prestígio arranhado depois das refregas sofridas no Cabo e no seu reduto eleitoral, Jaboatão, com a derrota de Heraldo Selva. Como se vê, a luta continua muito desigual. Na gestão do executivo municipal e estadual, os "socialistas" teriam muito maior poder de barganha.   

A última inserção de TV que vi da campanha do candidato Geraldo Júlio, ele aparecia nos morros do Recife, subindo escadarias e muros de arrimo com os moradores, conversando com populares e, depois, reunindo-se, na Prefeitura, com os seus secretários, para a cobrança de ações com o objetivo de resolver problemas enfrentados por aquela população. Bem ao estilo, creio, daquela observação que fizemos no sentido de que ganharia essas eleições aquele candidato que demonstrasse que poderia cuidar melhor do recifense. Nos últimos dias de campanha, também observamos uma intensa movimentação do candidato João Paulo junto aos bairros de periferia. No sábado último, ele ainda convidaria os eleitores para uma caminhada no bairro do Ibura. 

Há quem diga que um dos erros de João Paulo teria sido a tentativa de reaproximação do eleitorado de classe média, que o apoiou nas duas vezes em que ele foi eleito para dirigir os destinos do Recife. De fato, por razões bem conhecidas, essa parcela do eleitorado se mostrou bastante reticente a esse reatamento. Parece-nos aqui que estamos tratando de um divórcio litigioso. O esforço concentrado, portanto, deve ser mesmo nos bairros de periferia, onde o eleitorado é mais sensível ao PT. A tese da polarização dos "golpistas e não-golpistas", a julgar como procedente a avaliação da candidata derrotada nas eleições de Olinda, Luciana Santos, de que perdeu as eleições por defender a presidente Dilma Rousseff, parece que também fica enfraquecida, sobretudo em função desse clima de aparente normalidade em que estamos vivendo, artificialmente criado e matreiramente alimentado. 

domingo, 2 de outubro de 2016

Tijolinho: Lula e Temer em tempo de votação


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O senhor presidente Michel Temer passou a tomar muito cuidado com as suas aparições públicas. A rigor, esse cuidado seria natural a qualquer político, até mesmo entre aqueles que gozavam de grande popularidade, como o ex-governador Miguel Arraes de Alencar, que calculava muito bem suas aparições públicas. O grande problema relacionado ao presidente Michel Temer é que, em razão da função que ocupa, essas aparições são frequentes e inevitáveis. E, todas as vezes em que ele precisa sair da redoma do Jaburu, as hostilidades são inevitáveis. No caso dele, não existe este ou aquele momento mais favoráveis. Todos os momentos são desfavoráveis.  

A saída tem sido encurtar essas aparições, criar barreiras de proteção, aumentar o som do ambiente para que os apupos não sejam captados pelas redes de TV. No dia de hoje, por exemplo, havia uma programação de que ele chegasse no local de votação por volta das 11:00 horas. Ele resolveu antecipar este horário, até mesmo para antes das 8:00 horas, com o objetivo de evitar possíveis hostilidades. O índice de desaprovação do governo Temer é altíssimo. Apenas 13% da população brasileira aprova o seu governo. E olha que isso foi bem antes dele anunciar algumas medidas do seu pacote de maldades. Votei num grupo escolar de minha cidade e tive a curiosidade de observar alguns cartazes expostos pelos alunos: todos contestavam as recentes medidas previstas para a reforma do ensino médio. 

O inverso disso é o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que votou por volta das 11:30 horas, na região de São Bernardo, reduto tradicional do PT. Uma festa de recepção, com direito a fotos, abraços e afagos do público, numa grande demonstração de popularidade. Ao contrário de Temer, Lula deve sentir tesão em ir às ruas, encontrar-se com o seu povo. Há uma semana atrás, num esforço derradeiro para alavancar o nome de Fernando Haddad na disputa da capital paulista, ele realizou o mesmo feito. Pelas pesquisas de boca de urna, tudo indica que ele deve colher os resultados satisfatórios: É quase certo um segundo turno em São Paulo, entre Fernando Haddad(PT) e João Dória(PSDB). Haddad pode atingir um índice superior a 20% do eleitorado. 

Tijolinho: Datafolha confirma Haddad no segundo turno em São Paulo.




O Partido dos Trabalhadores enfrenta dificuldades em todo o país. Setores conservadores desenvolvem ações conjunta no sentido de promoverem uma espécie de linchamento moral do partido. Isso não teria como não ter reflexos nessas eleições municipais e o PT, certamente, acusará esse golpe. Numa estimativa até otimista, acredita-se que o partido deverá perder a metade das prefeituras conquistadas nas últimas eleições. A prisão preventiva do ex-ministro Antonio Palloci ocorreu praticamente às vésperas das eleições, num claro indício da manobra denunciada como "Boca de Urna". A batalha das batalhas, como sempre será São Paulo, a maior capital do país, reduto tradicionalíssimo dos tucanos. 

Mesmo com o possível fraco desempenho da legenda em outras praças do país, infligir uma derrota ao candidato tucano em São Paulo, João Dória, lavaria a alma da legenda. Não é uma tarefa fácil, mas também não é impossível. A vitória de Haddad nas eleições de 2012 já representou uma grande conquista para o PT no ninho mais emplumado dos tucanos. Este ano tem alguns ingredientes novos, como o afastamento da presidente Dilma Rousseff da presidência da República, num processo jurídico nebuloso, que alguns juristas tentam "justificar" através de expedientes ainda pouco convincentes, como assinalou, em artigo publicado aqui no blog, o cientista político Michel Zaidan Filho. 

A última pesquisa do Instituto Datafolha confirma um segundo turno em São Paulo. João Dória(PSDB) aparece com 44% das intenções de voto, Russomanno(PRB) com 16%, Haddad(PT) com 16% e Marta Suplicy(PMDB) com 14%. Não há qualquer dúvida de que teremos um segundo turno. Entre outras coisas, será mais uma oportunidade para acompanharmos a degenerescência ideológica da senhora Marta Suplicy, que deverá compor com os golpistas sem a menor cerimônia. Para ela, definitivamente, não há mais caminho de volta. Na reta final da campanha, o ex-presidente Lula acompanhou Haddad em tradicionais redutos eleitorais responsáveis pelas históricas "viradas" do partido nas eleições municipais da capital. Nas últimas horas, parece que o eleitorado reagiu bem a uma frase utilizada pelo ex-presidente durante as incursões pelos bairros periféricos: Sim. Eu montei uma quadrilha para tirar 36 milhões de brasileiros da extrema pobreza.

P.S.: Do Realpolitik: Se, por um lado, a pesquisa do Datafolha indicava um crescimento do candidato do PSDB, João Dória Junior, por outro lado, esta mesma pesquisa previa a possibilidade concreta de um segundo turno entre o candidato tucano e o petista Fernando Haddad(PT), o que acabou não ocorrendo. Em alguns casos, Haddad, aparecia com 20% das intenções de voto. Aqui também contou um pouco da torcida do editor do blog.

Charge! Renato Aroeira via Facebook

sábado, 1 de outubro de 2016

Tijolinho: Olinda: 20 anos de gestão comunista?



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O eleitorado é sempre soberano e a sua vontade deve ser respeitada num regime democrático. Embora os exemplos no plano federal não sejam dos melhores - "impeachment" da presidente Dilma - os verdadeiros democratas devem se empenhar por eleições livres e limpas, guindando ao poder atores políticos que respeitem essas regras e se conduzam de forma correta na gestão dos negócios públicos. O PCdoB está há 16 anos na gestão da cidade histórica de Olinda. O desgaste seria natural e, para a saúde de um dos pilares da democracia - o rodízio do poder - seria salutar que houvesse uma "oxigenação" na gestão da cidade. Tudo leva a crer, no entanto, que isso não passa de raciocínios de sábados à noite, de algum cientista político utópico. O quadro que se apresenta no cenário de 02 de outubro é o de que a candidata Luciana Santos(PCdoB), estará num possível segundo turno daquelas eleições municipais, contrariando alguns diagnósticos iniciais.

Conheço a candidata Luciana Santos desde a época da militância estudantil, na UFPE. Trata-se de uma candidata carismática, com um excelente nível de organicidade ou capilaridade política no município, o suficiente para "descolá-la" da figura do ex-prefeito Renildo Calheiro, cuja popularidade não é das melhores. Matreira, a candidata também deu uma forcinha a essa descolamento de imagem, não permitindo que ele empurrasse o andor. Poderia levá-la ao precipício. A grande disputa em Olinda, amanhã, é, na realidade, sobre quem vai para o segundo turno com a candidata do PCdoB. Há três nomes cotados pra este embate: Antonio Campos(PSB), Izabel Urquiza(PSDB) e, assim como um "azarão", o professor Lupércio, do Solidariedade. O professor é bom de urna. Pode ter fôlego para chegar a um segundo turno. Tereza Leitão, infelizmente, não conseguiu lidar com o "travamento" petista, mas, do ponto de vista republicano, seria um bom nome.

Como candidato, o senhor Antonio Campos continua sendo um literato. No caso dele, essa transição de um "campo" parece outro para que não será uma tarefa assim tão simples. Acrescente-se o fato de ele ter sido abandonado pela família Campos, que não teria sido consultada sobre os seus projetos políticos. Os Campos se abstiveram de participar de atos de campanha na cidade, sob o "argumento" de o Palácio apoiar mais de um nome na cidade. O que nos parece que está em jogo, na realidade, é um problema mal resolvido de sucessão familiar. Embora seja difícil precisar o potencial apoio dos Campos ao seu projeto político, o "não apoio", por outro lado, pode ser metido por uma fala de uma popular, no dia de ontem, aqui na praia de Casa Caiada: nem a família o apoiou. Sabe-se o que significa isso no "imaginário popular". Em todo caso, a despeito das dificuldades iniciais, ele é hoje o nome com maiores chances de ir a um segundo turno com a comunista Luciana Santos. 

P.S.:Do Realpolitik: Aqui em Olinda, todas as pesquisas sobre a intenção de voto dos olindenses indicavam que a candidata comunista, Luciana Santos, apesar do desgaste da gestão de Renildo Calheiro, iria para o segundo turno com um dos postulantes, com maior probabilidade de ser Antonio Campos(PSB) ou Izabel Urquiza. A probabilidade do professor Lupércio ir ao segundo turno era menor, mas nós aqui do blog alertamos para o fato de o candidato, bom de urna, surpreender. De fato isso ocorreu e o professor Lupércio está no segundo turno das eleições em Olinda.  


Tijolinho: O imbróglio socialista-tucano em Jaboatão dos Guararapes.


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Segundo colégio eleitoral do Estado, território de disputas políticas renhidas, a cidade de Jaboatão dos Guararapes tornou-se o palco de uma grande dor de cabeça para socialistas e tucanos nessas eleições municipais. Tucanos de alta plumagem defendiam a tese de que o prefeito Elias Gomes(PSDB) comandasse o seu processo sucessório, não permitindo ingerência demasiada do Palácio do Campo das Princesas. Com alguns nomes de sua estrita confiança como pré-candidatos, Elias esticou o cabo de guerra com o Campo das Princesas até às últimas consequências, cedendo, já no final, ao aceitar a indicação de Heraldo Selva(PSB) como cabeça de chapa, indicando a vice. Heraldo é parente de Renata Campos, esposa do ex-governador Eduardo Campos.

Muitas coisas estavam em jogo no arranjo que tornou possível a candidatura de Heraldo Selva, inclusive um possível apoio do Palácio do Campo das Princesas ao nome de Elias Gomes para a disputa do Senado Federal nas eleições majoritárias de 2018. O acordo previa empenho do governador na eleição de Heraldo Selva, retirada de candidaturas, apoio de deputados com base eleitoral no município, "isolamento" de candidatos etc. Tudo isso estava previsto com o objetivo de alavancar o nome de Heraldo Selva na disputa. O que seguiu, na prática, foi uma sucessão de erros - alguns primários - que culminaram com o fraco desempenho do candidato socialista na disputa. A situação complicou-se a tal ponto de o ex-prefeito agendar uma reunião de "emergência" com o governador Paulo Câmara. Segundo ele, alguns acordos não teriam sido cumpridos.

O fato concreto hoje é que há uma possibilidade real do nome de Heraldo Selva(PSB) não disputar o segundo turno daquelas eleições, o que representaria uma grande derrota para o ex-prefeito Elias Gomes(PSDB). Até pesquisas falsas andaram divulgando nas redes sociais no sentido de inflar o nome do socialista no pleito. Saindo um pouco da fantasia e dos possíveis acordos não cumpridos, as verdadeiras pesquisas de intenção de voto indicam uma disputa acirrada entre os candidatos Anderson Ferreira(PR), Manuel Neco(PDT) e Cleiton Collins(PP). A partir de amanhã deveremos saber quem deve ir para o segundo turno daquelas eleições. Assim como ocorre com a cidade de Abreu e Lima, na região metropolitana do Recife, os votos dos evangélicos são decisivos na definição do pleito. Tanto Anderson quanto Collins possuem base evangélica. Neco, um pouco menos, mas, por outro lado, penetra firme numa parcela do eleitorado, digamos assim, mais "popular", que já deu vitórias históricas ao ex-prefeito Nilton Carneiro. É esperar para ver. 

P.S.:Do Realpolitik: Aqui, erros mesmo podem ser apontados na estratégia adotada pela cúpula socialista e tucana na definição do nome que iria para disputa. Havia, de acordo com o ex-prefeito Elias Gomes, uma série de medidas que precisariam ser adotadas pelo Campo das Princesas, evitando, assim, a pulverização dos votos do candidato governista, Heraldo Selva. Algumas "insatisfações" das hostes socialistas locais também foram muito mal-administradas, gerando o famoso "corpo mole" entre alguns atores políticos. Um pouco mais calmo, depois da ressaca eleitoral que o vitimou em Jaboatão dos Guararapes e Cabo de Santo Agostinho, Elias admite seus erros pessoais na condução do processo sucessório, como a demora em bater o martelo sobre o candidato que teria seu apoio no pleito deste ano. O erro desse timing teria sido determinante e de sua inteira responsabilidade. 


Michel Zaidan Filho: Ainda sobre o Estado de Exceção no Brasil




A publicação do artigo sobre o “Impeachment” da Presidenta Dilma Vania Rousseff, de autoria do professor de Filosofia do Direito, João Maurício Adeodato teve o mérito de mobilizar a “inteligenzia” jurídica do país em torno da argumentação filosófica e jurídica empregada pelo autor para justificar o ato impeditivo, com base nas teorias de Nico Luhmman e Karl Schimdt. Do primeiro, ele toma de empréstimo a teoria da “legitimação pelo procedimento”, sobretudo quando aclamado por uma maioria ativa. Do segundo, a tese muito apreciada pelos nazistas do chamado “decisionismo político”. É desse jurista conservador alemão a obra tão lida e discutida, nos dias de hoje, sobre o “Estado de Exceção”. Antes de qualquer coisa, acrescente-se que o professor pernambucano já se disse, mais de uma vez, adepto das doutrinas neo-nominalistas e relativistas da Ética, do Direito e da Política. 

Certamente, influenciado pela teoria dos “atos retóricos”, de nítida inspiração wittgensteiniana e sua filosofia sobre “os jogos de linguagem”, onde o Direito é apenas uma modalidade de um jogo de linguagem. A chamada “virada linguística” do Direito, no pensamento deste autor, não leva a uma legitimação do discurso jurídico pelas pretensões de validade do operador do direito, no processo argumentativo (provas e contraprovas), mas a uma legitimação pelo procedimento discursivo, seguir as regras do discurso. E ponto.

Feito esse introito, cabe agora perguntar: estamos ou não diante de um “Estado de Exceção” mal disfarçado de democracia no Brasil? O funcionamento formal e ritual das instituições prova que vivemos num regime democrático, ainda que de baixa intensidade? – Essa é a questão.O professor João Maurício Adeodato  apoiado nesses autores alemães  já mencionados, afirma categoricamente que sim. Afinal, o processo de impedimento da Presidenta eleita seguiu o ritual previsto pela Constituição (legitimação pelo procedimento), e os atos juridicamente discutíveis que levaram tanto a magistratura, como os políticos do Congresso Nacional a tirarem-na da cadeira presidencial, mesmo admitindo  a inexistência de crime de responsabilidade (pelas operações de crédito, ou pedidos de créditos suplementar, sem a autorização da Comissão de orçamento do Senado federal) poderiam ser explicados pela doutrina schmditiana do “decisionismo político”. 

Se isso pode ser aceito, então temos de admitir que  estaríamos, sim, num “Estado de exceção”, não mais episódico, como diz Liana Cirne, mas declarado e permanente. Onde para os inimigos, a classe trabalhadora e o povo, a lei é a lei penal, os tipos penais. Não preciso lembrar que a uma lei antiterror em vigência no Brasil, usada recorrentemente para criminalizar os movimentos de protesto social. Os atos recentes do juiz Sérgio Morro, suas pregações cívico-religiosas em Igrejas reformadas, justificando suas ações, as declarações do procurador Deltran Dallagnol,  os anúncios antecipados de prisões, conduções coercitivas e intimações pelo “Ministro” da Justiça, a atitude de passividade e cumplicidade do CNJ, das Corregedorias de Justiça e do próprio STF, sobre os abusos cometidos  contra cidadãos e cidadãs,  pela discricionariedade de certos magistrados e procuradores colocam o nosso país decididamente no marco da vigência de um Estado Exceção declarado, a serviço de interesses não republicanos, não nacionais, não de interesse público ou da maioria do povo brasileiro.

É deveras lamentável que juristas tão preparados e conceituados nos meios forenses e acadêmicos se prestem  a legitimar, com base em seus conhecimentos filosóficos, uma ditadura com o verniz de legalidade a serviço de interesses inconfessáveis que só esse breve tempo social vai revelando aos poucos (destruição do SUS, destruição da educação pública, destruição das políticas de transferência de renda, alienação do patrimônio nacional, ataque generalizado à Universidade Pública, aos direitos trabalhistas, previdenciários etc.)

Pensávamos que a época em que ditadores e generais convocavam juristas a escrever ou refazer as Constituições, ao sabor de seus interesses, já tinha passado no mundo e no Brasil. Enganamo-nos, e  aqui bem pertinho de nós.

Michel Zaidan Filho é filósofo, historiador, cientista político, professor titular da Universidade Federal de Pernambuco e coordenador do Núcleo de Estudos Eleitorais, Partidários e da Democracia - NEEPD-UFPE

Editorial: O Pacto pela Vida acabou?




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Já faz algum tempo que não tratamos do problema da violência aqui no nosso blog, menos ainda num editorial. Em certa medida porque ocorre conosco o mesmo fenômeno que vem ocorrendo com a mídia em geral, hoje bastante concentrada nas novas fases da Operação Lava Jato. Até mesmo a cobertura das próximas eleições municipais foi prejudicada por essa razão. Um outro fato inibidor é a absoluta ausência em acrescentar algo sobre o que já fora dito sobre o assunto, sobretudo quando se trata dos graves problemas do sistema penitenciário brasileiro, hoje metido num atoleiro de proporções gigantescas. Penso que não há mais nada a dizer sobre as nossas masmorras prisionais, geridas em parceria com os próprios detentos; antro de consumo de drogas e prostituição; escritórios do crime organizado; sem assegurar ao apenado as condições mínimas de cumprirem suas penas sob um regime onde os direitos humanos fossem respeitados.

Nada ali funciona, o que nos remete à conclusão de que não foram mesmo concebidos para funcionar. Um grave equívoco intencional, movido em razão do preconceito sobre os atores a quem se destinam essas medidas.Terminologias como "ressocialização", neste contexto, soam como uma grande utopia. Aqui no Estado, por exemplo, a organização Human Rights Watch produziu um relatório devastador sobre o nosso sistema prisional. Outro dia,li por aqui, mesmo diante do "engajamento" de nossa imprensa local-, que o Governo do Estado havia retirado das receitas estaduais um montante de recursos orçados para a ampliação do numero de vagas nos presídios e destinados para "assuntos estratégicos". Creio que, no raciocínio dos nossos gestores, não há nada de estratégico em cuidar dignamente de milhões de apenados, entregues à própria sorte, cujas "soluções" são encontradas pelos próprios detentos, através de um código específico, onde estão previstas, inclusive, as eliminações físicas, que ocorrem com certa frequência nas unidades prisionais.

Numa entrevista recente, o mentor do Pacto pela Vida, o sociólogo José Luiz Ratton, declarou que o Pacto pela Vida havia acabado, no que teria sido contestado pelo atual gestor do município e candidato à reeleição, Geraldo Júlio(PSB). Na condição de assessor especial para assuntos de segurança pública do ex-governador Eduardo Campos, com um trabalho dedicado, creio, exclusivamente para esta área específica, difícil não atribuir ao sociólogo a paternidade do Pacto pela Vida. Como homem forte dos quadros "técnicos" do ex-governador, também é creditado a Geraldo Júlio, durante um certo período - o gerenciamento dessa política pública de segurança - o que faz dele um ator relevante nessa discussão.

Primeiro é preciso esclarecer, antes de mais nada, como temos afirmado acima, consoante as observações do próprio  Ratton, que o Pacto pela Vida é uma política publica de segurança. E, como tal, é sempre assim que ele deve ser analisado. Há quem se refira a ele como um "programa", mas o PPV deve ser sempre analisado como uma política pública de segurança, envolvendo inúmeros atores públicos, como membros da sociedade civil, do Poder Judiciário, Ministério Público, do Sistema Penitenciário, do aparelho repressor do Estado, como as polícias militar e civil, lidando com a questão da segurança pública em suas diversas dimensões. Aqui já começa a ser delineado os possíveis problemas do PPV: uma possível desarticulação desses atores, num sentido desenvolvimento de um trabalho em conjunto, com a preocupação de se atingir determinados objetivos.  

Uma coisa é preciso ser dita. O ex-governador Eduardo Campos, na condição de maior autoridade política, coordenava pessoalmente as reuniões do PPV, cobrando dos seus subordinados os resultados a serem alcançados, consoante as metas previamente traçadas. Por vezes, as cobranças iam além de um simples diálogo e acabava com alguns murrões na mesa, gerando um clima de muita tensão na equipe. Aborrecimentos a parte, existia um planejamento dessas ações, um acompanhamento de suas execução, a cobrança pelo alcance dos resultados determinados, prazos definidos, tudo que se insere no contexto de um planejamento estatal. 

Nos primeiros meses, assim que o governador assumiu, essas reuniões ocorriam, salvo algum engano, à média de uma por semana. O fato de o governador se envolver diretamente com o PPV, segundo um chefe de polícia civil à época, podia ser creditado parte do êxito do PPV. Pernambuco era um dos Estados mais violentos do Brasil no momento em que Eduardo Campos assumiu e, para o bem de sua gestão - e das promessas de campanha - era importante a reversão desses índices de violência. Depois, com o seu projeto de tornar-se presidente da República, o PPV era uma espécie de "trunfo" com o qual ele contaria em sua campanha presidencial. 

Meses depois de implantado, diante dos primeiros resultados positivos alcançados - e a quase absoluta ausência de uma política publica de segurança desenvolvido por outros entes federados - o PPV tornou-se uma "grife" de segurança pública, provocando a "romaria" de vários governadores a Pernambuco para acompanharem os seus passos, além de receber reconhecimentos até internacionais. Por aquela época, em razão de políticas públicas sistemáticas para o setor, Estados até então muito violentos como São Paulo, Rio de Janeiro e Pernambuco, começavam a apresentar uma curva descendente nos índices de violência. Planejamento das ações tornara-se uma expressão mágica. O bom senso nos informa que atores "desarticulados", muito provavelmente, não conseguiriam coordenar suas ações com chances de êxito, o que aqui pode ser apontado como mais um problema do PPV.  

A morte do governador Eduardo Campos provocou uma espécie de solução de continuidade no programa. Esse sentimento de "orfandade" nunca foi negado pelo seu sucessor Paulo Câmara - que, afirmou, mais de uma vez, que gostaria de governar com ele. Como "desarticulação" pouca é bobagem, o processo começou a contaminar o próprio núcleo duro do aparato de Estado diretamente envolvido com a questão, como é o caso das secretarias de Defesa Social, Direitos Humanos,Secretaria de Ressocialização, Polícia Civil. Não raro, os secretários à frente dessas secretarias entram em rota de colisão em razão de suas atribuições. Com relação às entidades de classe, A ADEPPE lançou nota pedindo a extinção da Secretaria de Defesa Social, no que foi acompanhada pelo SINPOL, o Sindicato dos Policiais Civis do Estado de Pernambuco. 

Agora mesmo, por ocasião da morte do empresário Paulo César, num motel em Olinda, no curso da Operação Turbulência, a verdadeira turbulência se daria em clamorosas falhas de comunicação(?) entre os diversos atores envolvidos na elucidação daquela morte, num claro indicador de que eles não estavam se entendo muito bem. Isso reforça a tese levantada pelo mentor do PPV, o sociólogo José Luiz Ratton, de que, de fato, o PPV parece mesmo que acabou e entramos naquela fase do "salve-se quem puder" ou a "culpa não foi minha". É cada um por si e o PPV que se dane futebol clube. 

A motivação do prefeito e candidato à reeleição Geraldo Júlio(PSB) em contestar o sociólogo, creio, deve-se a duas razões: a sua ligação pessoal, do seu padrinho político e do próprio PSB com o PPV; além das políticas públicas congêneres, na área de segurança, implantadas pelo município do Recife, onde ele disputa a reeleição. No município se aplica o modelo do COMPAZ, idealizado pelo vice-governador Raul Henry. É preciso dizer, a princípio, que uma coisa não pode ser cotejada com outra. O COMPAZ é interessante, sim, sobretudo quando se toma como referência ao que ocorreu com as UPPs, adotadas em Estados como o Rio de Janeiro. Ali, a Human Rights tomou a iniciativa de comparar os gastos para a montar aquelas UPPs e os gastos do Estado em políticas educativas e culturais nas zonas onde elas foram implantadas. O resultado é desolador. Investiu-se muito mais em armamentos, equipamentos, treinamentos de pessoal do que nas políticas públicas destinadas às áreas de educação e cultura. Isso explica o fracasso dessas UPPs, uma ocupação de caráter apenas militar, com denúncias de violações de direitos, como ocorreu com a prisão ilegal, tortura, assassinato e desaparecimento do corpo do pedreiro Amarildo. 

O sociólogo José Luiz Ratton é um crítico do COMPAZ. Talvez por isso a resposta do gestor Geraldo Júlio tenha sido no sentido de se perguntar a opinião da população sobre o Centro Comunitário da Paz do Alto Santa Terezinha, num bairro da periferia do Recife. O que o Ratton critica é que o COMPAZ não tem ações destinadas exclusivamente àquela população que já foi vítima ou encontram-se vulneráveis à violência. Discordo dele, na medida em que o COMPAZ desenvolve uma série de atividades que, a princípio, poderiam funcionar como vetores da violência, como atividades culturais, esportivas, educativas, recreativas. Aqui a gente poderia entrar no mérito sobre que população vulnerável é esta, à qual se refere Ratton, que não seria necessariamente atendida pelo COMPAZ. Para mim, Ratton, é meio complexo definir essa população "vulnerável". 

A leitura de Ratton sobre o fim do PPV está relacionado a não manutenção e ampliação dos mecanismos de governança do Pacto; a diminuição dos investimentos estatais em segurança pública, dentro de uma perspectiva bem ampla, envolvendo capacitação de pessoal, tecnologias no manejo dos dados da violência, ações estratégicas no combate ao crime, notadamente o crime organizado etc. De acordo com o SINPOL, melhorar as condições de trabalho do pessoal, assim como contratar novos agentes seriam medidas bem-vindas, uma vez que o déficit cresceu bastante nos últimos anos.

P.S.: do Realpolitik: Hoje, dia 06 de outubro, foi anunciada a exoneração do secretário de Defesa Social, Alessandro de Carvalho. Nas coxias comenta-se que a sua exoneração se deu em razão dos problemas enfrentados pelo Pacto pela Vida. Para substituí-lo, foi nomeado um ex-delegado aposentado da Polícia Federal. Os problemas do Pacto pela Vida, como informa o texto, não é bem uma questão apenas de nomes. Há, dentro e fora dos meios acadêmicos, muitas vaidades e ciumeiras em torno da paternidade desta ou daquela política de segurança pública, donde se deve dar o devido desconto das críticas de Ratton ao COMPAZ.