O candidato à prefeitura do Recife Roberto Numeriano (PCB) criticou o modelo de cobertura política das eleições em Pernambuco. Falando mais como cientista político e jornalista, Numeriano aponta um grave empobrecimento do debate político em torno de ideias e propostas, reclamando também de não ter espaço igualitário nos veículos de comunicação e afirmando que aposta nas redes sociais para escapar disso - no entanto, o candidato ainda não criou uma página virtual para a sua campanha.
"A tradição política pernambucana, sobretudo recifense, era a do debate de políticas públicas a partir de eixos, não necessariamente ideológicos, que fundamentavam a intervenção dos candidatos. O que temos hoje é um vale tudo pelo poder, traduzido sobretudo em arranjos políticos que sequer se explicam taticamente. O caso exemplar é a aliança Eduardo Campos e Jarbas."
"Os lances desse vale tudo de fofocas pautou a cobertura dos principais jornais e rádios do Recife, desde a pré-campanha. A cobertura cria e consolida um círculo vicioso, com cartas marcadas. Claro, a legislação eleitoral determina que as entrevistas tenham o mesmo tempo, no rádio e noutros veículos. Mas o que vemos é alguns radialistas e editores de jornais convidando seguidamente os candidatos da "voz do dono", ou seja, a voz do dono da emissora. E tome doses cavalares de Geraldo Júlio, numa dada emissora ou jornal, ou de Humberto Costa. E fico admirado dos esforços de ambos para se mostrarem diferentes com suas propostas de governo tão antigas quanto as pedras do cais recifense. Essa imprensa provoca uma falsa polarização política que é seriamente grave para a cidadania recifense", criticou o candidato da Frente de Esquerda.
Como exemplo da cobertura que ele afirma não ser jornalisticamente isenta, Numeriano aponta a não publicação de nenhuma matéria da Frente nos jornais locais: "Elaboramos um agendão com os trabalhos da candidatura e vez por outra difundimos para os jornais, rádios e emissoras de TV algumas matérias, sempre solenemente ignoradas. Nenhuma foi publicada, até agora, pelos jornais."
"Ao mesmo tempo, vemos o desfile desse museu de grandes novidades que são as propostas do PSB, PT, DEM e PSDB, enchendo as páginas das editorias políticas. Houve até uma disputa em torno da autoria de uma dada proposta de governo entre dois partidos, como se houvesse direito autoral para propostas desse tipo. Fotos e textos falando de visitas aos bairros, sempre com a procissão de gente paga e candidato apertando a mão e dando tapinhas nas costas do eleitorado."
"Sinceramente, falando como professor de jornalismo e dirigente político, essa cobertura impressa precisa sair dessa mesmice e cobertura aética e discutir as propostas dos candidatos a partir de mesas redondas com participação de entidades, lideranças, jornalistas etc, questionando as propostas, desmascarando demagogias, mostrando as contradições de projetos", disse Numeriano, que ensinou Ética do Jornalismo na Unicap e Jornalismo Político na Maurício de Nassau.
Ele também criticou o formato dos debates televisivos, engessados e controlados muito mais pelo marketing dos candidatos, do que inspirados por ideias: "É preciso debater a cidade sem amarras de tempo. A TV dá tempo para futilidades, mas para debater e planejar a cidade pela cidadania ativa, cadê o tempo?", disse.
"Felizmente, temos neste ano as redes sociais para fazer campanha. Se não fosse esse espaço, não seríamos visíveis. Espaços nos blogs, como o de Jamildo, que publica inclusive artigos que escrevemos para fundamentar as nossas propostas, são a única alternativa que temos (à exceção de um ou outro programa de rádio de algumas emissoras com excelentes e éticos profissionais, para não ser injusto), para nos tornar visíveis".
"Esse blog propicia espaço e respeita o contraditório político, essencial para o debate rico em ideias. Alguém dirá, "mas são mídias diferentes". Não estou tratando disso, não precisa descobrir a roda. Estou defendendo que o princípio deve ser o mesmo na cobertura político-eleitoral, seja qual for a mídia. Só assim a disputa se tornará igualitária no campo onde deve ser, que é o das ideias. Por enquanto, a cobertura das eleições, sob esse viés, tem sido balizada pelo poder dos palácios e de seus imperadores que parecem ditar as pautas das editorias políticas".
Artigo publicado originalmente no Blog de Jamildo, Jornal do Commércio.
Nota do editor: O editor do blog se sente muito a vontade em falar sobre esse assunto, pois, com a autorização de Numeriano, publicamos aqui um dos seus artigos veiculados nas redes sociais.
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