quarta-feira, 11 de fevereiro de 2015
Renato Janine Ribeiro: Impeachment é golpe?
Não é. Tanto que está previsto na Constituição.
Mas impeachment não é brincadeira. No presidencialismo, os chefes do Poder Executivo têm mandato fixo. É o contrário do parlamentarismo, onde o primeiro-ministro pode ser destituído pelo Parlamento sem maiores dramas (e mesmo assim ficam lá anos a fio, às vezes muito impopulares, manipulando datas de eleição). No presidencialismo, não se pode destituir o presidente só porque seu governo se tornou impopular ou ele realiza uma má gestão. É preciso que tenha cometido um crime, um crime específico, que não é um crime contra pessoas privadas, mas contra a res publica, contra a própria essência do Estado que ele representa e chefia.
Há gente que sabe disso mas está manipulando as palavras. Um site, outro dia, dizia que por não ter aumentado o preço da gasolina um ou dois anos atrás Dilma poderia sofrer impeachment (porque teria gerado prejuízos na Petrobras, expondo a empresa a uma perda de valor). Olha, até pode ter sido uma pena isso, mas não é crime de responsabilidade. Como FHC haver terminado o governo com o orçamento sem poder ser executado, em crise séria, não era razão para impeachment.
Dilma pode sofrer impeachment? Qualquer presidente pode – se houver razões para tanto. Basicamente, se ela tiver cometido um crime contra a res publica. Se por exemplo for provado que ordenou que fossem cometidos crimes de corrupção. Agora, não adianta ficar brincando disso sem provas. Nem sequer sabemos quais políticos serão acusados na Lava a Jato. Então, brincar com isso nem sei se chega a ser golpe. É infantilidade.
E é importante lembrar. Não podemos quebrar a ordem constitucional. Custou muito caro ao Brasil chegar à democracia. Daqui a um mês, completaremos trinta anos de regime democrático. Quebrar isso só para tirar do poder quem você não gosta, e colocar lá um candidato que perdeu as eleições, significa ódio à democracia.
Em 1964, os civis que cometeram traição à Pátria, participando do golpe, pensavam que os militares fariam o trabalho sujo, tirariam de cena os civis que tinham votos, e depois dariam o poder de bandeja à UDN. Deu no que deu. As “vivandeiras”, como o ditador Castelo Branco apropriadamente chamou as lideranças udenistas, perderam a parada. É bom – como lembra Andréa Pachá – não acreditar que gasolina apaga fogo.
Renato Janine é Filósofo e professor de Ética e Filosofia Política da USP
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