Pode parecer um mero problema ligado à vida
acadêmica nacional, mas infelizmente é muito mais que isto. Trata-se da
expressão perfeita de um sintoma de obscurantismo que parece, aos
poucos, tomar conta de setores importantes da sociedade brasileira.
Há alguns anos, alguns dos mais destacados professores de filosofia da
PUC de São Paulo, associados a várias universidades francesas, ibéricas e
latino-americanas, juntamente com o Consulado Geral da França em São Paulo,
criaram a cátedra Michel Foucault. Seu objetivo era fornecer a
estrutura institucional para o estudo e pesquisa de um dos filósofos
mais importantes do século 20, com grande influência no desenvolvimento
do pensamento brasileiro. Graças a tal iniciativa, o Brasil recebeu, por
exemplo, um precioso acervo das gravações de suas aulas no Collège de
France.
No entanto, há
algumas semanas um dos conselhos dirigentes da PUC-SP vetou a criação da
referida cátedra. Motivo: o pensamento de Foucault não coadunaria com
os valores defendidos por uma instituição católica de ensino. Por ironia
do destino, e isto diz muito sobre o Brasil atual, a mesma PUC-SP foi,
nos anos setenta e oitenta, uma das instituições responsáveis pela
introdução do pensamento de Foucault e outros filósofos franceses entre
nós.
Alguns podem ver nisto certa coerência, como seria coerente, seguindo este mesmo raciocínio, impedir os alunos da PUC terem aula sobre Nietzsche (já que este anunciou a morte de Deus), Freud (que chamou a religião de "o futuro de uma ilusão"), Voltaire (o anticlerical por excelência) ou quiçá mesmo sobre Spinoza (visto pela teologia oficial como a expressão cabal da heresia panteísta).
Mas, se assim for, por que chamar de "universidade" o que, cada vez mais, se aproxima de um seminário católico ou de uma maquinaria de proselitismo religioso? "Universidade" significa espaço livre de saber, no interior do qual podemos oferecer um formação na qual visões em conflito são apresentadas. Por isto, o conteúdo de ensino de uma universidade deve estar livre dos limites impostos pelos interesses de igreja, mercado, Estado ou de qualquer outro poder político.
Se a PUC quer seguir tal caminho obscurantista, então ela deve assumir as consequências de sua escolha e abrir mão de sua creditação como universidade. Pois tal creditação é fornecida pelo Estado brasileiro a partir do respeito a valores elementares de abertura e pluralidade. Várias outras universidades católicas no mundo achariam aterrador uma atitude como a recusa de uma cátedra de filosofia por motivos teológicos. Se esta for a regra daqui para a frente, o Estado brasileiro deve defender o conceito de universidade fruto do Esclarecimento.
Alguns podem ver nisto certa coerência, como seria coerente, seguindo este mesmo raciocínio, impedir os alunos da PUC terem aula sobre Nietzsche (já que este anunciou a morte de Deus), Freud (que chamou a religião de "o futuro de uma ilusão"), Voltaire (o anticlerical por excelência) ou quiçá mesmo sobre Spinoza (visto pela teologia oficial como a expressão cabal da heresia panteísta).
Mas, se assim for, por que chamar de "universidade" o que, cada vez mais, se aproxima de um seminário católico ou de uma maquinaria de proselitismo religioso? "Universidade" significa espaço livre de saber, no interior do qual podemos oferecer um formação na qual visões em conflito são apresentadas. Por isto, o conteúdo de ensino de uma universidade deve estar livre dos limites impostos pelos interesses de igreja, mercado, Estado ou de qualquer outro poder político.
Se a PUC quer seguir tal caminho obscurantista, então ela deve assumir as consequências de sua escolha e abrir mão de sua creditação como universidade. Pois tal creditação é fornecida pelo Estado brasileiro a partir do respeito a valores elementares de abertura e pluralidade. Várias outras universidades católicas no mundo achariam aterrador uma atitude como a recusa de uma cátedra de filosofia por motivos teológicos. Se esta for a regra daqui para a frente, o Estado brasileiro deve defender o conceito de universidade fruto do Esclarecimento.
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