Com referências que vão de ‘Clube da Luta’ a canções de Gilberto Gil, ‘Dialeticomix’ quer aproximar o público mais jovem do filósofo
Paulo Henrique Pompermaier
“A dialética é incrível porque abarca o oposto dela, explica o oposto, contempla o oposto. É um raciocínio absurdamente necessário nos dias de hoje”. Dessa forma Gláucia Angélica Campregher, professora de economia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), explica a importância que atribui ao pensamento dialético nos dias de hoje. Foi essa relevância que a levou a criar, junto com o desenhista Carlos Ferreira, o livro Dialeticomix, que transforma o pensamento dialético de Hegel em história em quadrinhos.
A escolha da HQ como formato para traduzir o conceito filosófico, deu-se porque Campregher quer alcançar um público que, segundo ela, talvez não tenha interesse no assunto de outro modo: jovens, principalmente os que não são da área de Ciências Sociais. “As pessoas não têm o hábito de conversar. O que eu fiz foi falar com a gurizada, ouvir as músicas que eles escutam, ver os filmes, ler os livros, HQs, frequentar os mesmo lugares”, comenta.
Foi a partir dessa vivência que Angélica moldou a HQ. Os personagens principais são dois universitários que, ao longo da narrativa vivenciam romances, discussões familiares, brigas por discordâncias ideológicas, fugas da polícia em manifestações de rua. Ao longo da trama, o pensamento dialético vai sendo tecido e explicado, por exemplo, durante uma discussão entre os protagonistas, que têm ideias opostas, mas vão penetrando no pensando um do outro e se identificando por meio de ideias a princípio opostas. Referências a filmes como Clube da Luta, Jango e músicas de Gilberto Gil e Lulu Santos ajudam a dar uma cara mais pop à história.
Uma das principais dificuldades de Campregher foi colocar tamanha densidade filosófica em situações ilustradas. “Eu não queria fazer um texto ilustrado, então cada cena teve que ser pensada com o ilustrador. Mas foi interessante explorar o diálogo, típico da HQ, e que nasceu com a dialética”, diz. A importância dos diálogos é também um dos motivos da escolha de personagens jovens como protagonistas. “Quando você fica velho, fica menos disponível, menos disposto a dialogar.”
Para a professora, a incapacidade de “pensar dialeticamente” é um dos motivos da polarização política “burra” vivenciada no Brasil hoje. “Nós precisamos criar sínteses positivas que nos coloquem como participantes do processo, em vez de ficar do lado de uma ideia ou de outra.” O projeto atualmente está em fase de financiamento coletivo no Catarse. Campregher considera que uma das coisas “mais bonitas e interessantes” do pensamento dialético é perceber que “os opostos não são diferentes, eles estão um no outro. Quanto mais contrário você se por a alguma ideia, mais idêntico a ela você é”.
(Publicado originalmente no site da revista Cult)
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