pub-5238575981085443 CONTEXTO POLÍTICO. : Editorial: O arquiteto do golpe.
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domingo, 24 de novembro de 2024

Editorial: O arquiteto do golpe.



Ali pelos idos da década de 60, quando o economista Celso Furtado presidia a SUDENE - Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste - o sociólogo Gilberto Freyre integrava o conselho deliberativo da autarquia recém-criada pelo presidente Juscelino Kubitschek. Segundo Celso Furtado, Gilberto era extremamente disciplinado, chegava na hora certa às reuniões, e, raramente se ausentava das sessões, fato que ocorria apenas quando havia outros compromissos inadiáveis. Por outro lado, sabe-se que haviam divergências entre ambos, minimizadas pelo paraibano, que sempre as atribuía à formação de Gilberto, que não era economista de formação. 

Um observador mais atento, entretanto, iria concluir que, na realidade, nessas indisposições do sociólogo com as políticas públicas regionais propostas pela autarquia - que contrariavam os interesses das oligarquias locais - estavam presentes, na verdade, os dois projetos de sociedade em curso no país, que iria resultar, poucos anos depois, no engendramento do Golpe Civil-Militar de 1964. Naquele momento, o golpe militar já estava sendo urdido, preparado. Gilberto se constituiria, alguns anos mais tarde, numa espécie de mentor intelectual dos militares, que o consultava sobre diversos assuntos. Ainda hoje há livros seus sendo reeditados por estamentos militares.  

Sugere-se que ele gostaria de ter contribuído para além do que os militares desejavam. Uma matéria do jornal O Globo, mostra, por exemplo, que eram regulares seus diálogos com um dos principais artífices do regime militar - dizem até que o arquiteto do golpe de 1964 - o general Golbery do Couto e Silva. Uma pesquisa na biblioteca do bruxo mostrou que era Gilberto quem mais enviava livros para o então Ministro Chefe da Casa Civil no Governo Ernesto Geisel. Preparado intelectualmente, hábil no traquejo político e estrategista de primeiro time da geopolítica, Golbery sobreviveu no cargo por um longo período, sendo apontado, inclusive,  como um dos principais nomes na descompressão do regime. 

Habilidade política que faltava a Gilberto, que desejava ser governador de Pernambuco e nunca mereceu a confiança dos militares para nomeá-lo. A conhecida vaidade do sociólogo é um do pontos também elencados quando se discute as reticências dos militares com o sociólogo, a quem fora oferecido o Ministério da Educação e a Embaixada Brasileira em Paris. Ambos os cargos recusados pelo sociólogo. Esta introdução é apenas para mostrar como há uma diferença abissal, sob certos aspectos, como diria Franz Kafka em seu Diário Íntimo e Secreto, entre aquelas tessituras que culminaram com o golpe civil militar de 1964 e o atual, movidos por guardas da esquina,  que certamente desejavam dar vasão aos seus instintos selvagens de perversidade contra os desafetos ou opositores e  assegurar seus privilégios.  Observem o quanto o governo anterior favoreceu os militares, principalmente aquele grupo que gravitava em torno da figura do ex-presidente, escolhidos a dedo, consoante suas afinidades com o projeto em curso. 

Revogaram até a legislação, que não permitia a acumulação salarial, elevando os rendimentos de alguns deles lá para cima. acima do teto dos ministros do STF, que é utilizado como parâmetro. É o que Anne Applebaum conceitua como Autocracia S\A, no livro O Crepúsculo da Democracia.  É curiosa a sacada desta jornalista e escritora, que conseguiu perceber as similaridades entre essas ditaturas que se instalaram pelo mundo afora, vinculadas à extrema-direita. Em 1964, com toda desgraça inerente aos projetos autoritários - que, em quaisquer circunstâncias, representam um retrocesso civilizatório - não se poderia dizer que não houvesse um projeto em curso para o país. Tivemos até um milagre econômico, que durou pouco tempo, uma vez que o santo era de barro. 

Um fato aparentemente contraditório é que os militares tinham a convicção sobre a necessidade de uma reforma agrária no país. |Isso ficou claro durante os debates da CPI do MST. Gilberto chegou a escrever um prospecto tratando deste assunto, a pedido de Marco Maciel, bastante solicitado aqui pelo blog, em princípio, pelo seu ineditismo. É lamentável que o sono político das forças do campo democrático, civilizado, republicano e progressista tenha permitido este estágio de avanço da extrema-direita no país. Eles já dominam as ruas, as redes sociais e estão bem representados no parlamento. A cada nova eleição eles avançam, com suas pautas bombásticas, estimulando aloprados, que já chegaram a planejar até mesmo o assassinado de autoridades, conforme conclusões da Polícia Federal.  

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