19 de março de 2015 | 11:16 Autor: Fernando Brito
Meu bom companheiro Fernando Molica, colunista de O Dia, publicou ontem, em seu blog, um excelente artigo sobre o vídeo que havíamos mostrado aqui, feito pelos jornalistas da revista Trip na manifestação da Avenida Paulista de domingo.
Rerproduzo o artigo ao final, mas peço licença a Molica para trazer
logo para o início a ficha do aparentemente inofensivo “Carlinhos
Metralha” louvado pelos manifestante e digno até de uma esdrúxula
continência por parte de um policial militar.
Carlos Alberto Augusto, vulgo ‘Carteira Preta’ e ‘Carlinhos
Metralha’, o ex-delegado do Dops que discursou na manifestação, levou
para a Avenida Paulista um cartaz em que dizia querer ser ouvido pela
Comissão da Verdade. Pena que só diz isso agora, quando os trabalhos da
comissão foram encerrados. O relatório diz que ele foi convocado a
depor, mas não foi localizado. Na hora de prestar contas à história, ele
tratou de não aparecer. Segue trecho do relatório sobre ele:
Carlos Alberto Augusto (1944-) Delegado de polícia. Serviu no
Departamento de Ordem Política e Social de São Paulo (DOPS/SP), sendo
conhecido como “Carteira Preta” e “Carlinhos Metralha”. Integrou a
equipe do delegado Sérgio Paranhos Fleury. Teve participação em casos de
detenção ilegal, tortura e execução. Convocado para prestar depoimento à CNV, não foi localizado.
Vítimas relacionadas: Carlos Marighella (1969); Eduardo Collen Leite
(1970); Antônio Pinheiro Salles e Devanir José de Carvalho (1971);
Soledad Barrett Viedma, Pauline Reichstul, Jarbas Pereira Marques, José
Manoel da Silva, Eudaldo Gomes, Evaldo Luiz Ferreira de Souza e Edgard
de Aquino Duarte (1973).
A Pauline Reichstul, apontada no relatório como uma das vítimas
do ‘Carlinhos Metralha’, era irmã de Henri Philippe Reichstul,
presidente da Petrobras no governo Fernando Henrique Cardoso.
Retomo: Carlinhos Metralha era um dos agentes do DOPS que
“administrava” as delações do famigerado Cabo Anselmo. Pauline e outros
cinco jovens foram executados não na “Paulista”, mas em Paulista,
Pernambuco, no que ficou conhecido como “A Chacina da Chácara São
Bento”.
Pauline recebeu uma coronhada na cabeça. Os outros cinco, executados a tiros.
26 tiros, relata o jornalista pernambucano Luiz Felipe Campos,
que escreveu um livro sobre o episódio: “14 na cabeça e muitos à
queima-roupa. Ao cenário brutal, foram adicionadas armas ao redor dos
corpos para sugerir um confronto entre guerrilheiros e militares que
nunca houve. As fotos, difundindo a versão oficial de que um “congresso
de terroristas” havia sido desbaratado, foi estampada nos jornais três
dias depois”.
Já mortos, metralhados.
“Com muito prazer”, talvez, como disse no vídeo o “herói da Paulista”.
O ato, os golpistas e o torturador
Fernando Molica
O vídeo
sobre a manifestação paulistana que foi preparado por equipe da revista
‘Trip’ é assustador demais. Não dá para achar razoável ou tolerável que
organizadores de ato que diz defender a democracia aceitem a presença
de entusiastas de um golpe militar e até liberem o microfone para um
ex-torturador, o delegado aposentado Carlos Alberto Augusto. Admitir a
participação desses sujeitos seria o mesmo que aceitar a presença de
nazistas numa passeata contra a política externa de Israel. Uma coisa é
uma coisa, outra coisa é outra coisa.
É razoável imaginar que organizadores da manifestação tomassem a
iniciativa de expulsar do ato um grupo de petistas que fosse até lá para
condenar a roubalheira na Petrobras e, ao mesmo tempo, defender Dilma
Rousseff. Não seria absurdo que eles fossem convidados a se retirar de
uma passeata que protesta contra o governo. A eventual presença deles
poderia até ser vista como provocação.
O problema é que, pelo que vi e li sobre as manifestações de domingo,
não houve qualquer tentativa de expulsão dos pregadores do golpe (o
vídeo até mostra mulheres que se revoltaram com a histeria militarista,
mas, pelo visto, não passou de um protesto isolado).
É simples, ato que inclui defensores da ditadura, torturadores (havia
pelo menos um) e pessoas que não admitem a pluralidade (caso dos que
revelam intolerância com comunistas e integrantes de outras correntes de
esquerda) não pode ser chamado de democrático. Mais: quem defende a
ditadura não tem o direito de dizer que é contra a corrupção. Afinal, na
ditadura, casos de corrupção eram censurados ou não geravam qualquer
consequência – como as mordomias no escalão federal reveladas pelo
‘Estadão’ e a negociata, publicada pela ‘Folha’, que envolveu o grupo
Delfin e o Banco Nacional da Habitação (terrenos no valor de Cr$ 10
bilhões quitaram uma dívida de Cr$ 60 bi junto ao BNH). Quem defende a
ditadura defende o direito de quem quer roubar sem ser punido.
Vale também ressaltar o absurdo que foi utilizar a belíssima ‘Canção
do Expedicionário’ como trilha sonora da manifestação, isto representou
uma ofensa aos pracinhas que foram combater ditaduras na Europa. Um
combate que, aqui, acabou provocando a queda de um ditador. A ‘Canção’
(“Por mais terras que eu percorra/ Não permita Deus que eu morra/Sem que
volte para lá”) é linda, deve ser o único canto de guerra que não fala
em destruição, em morte, mas da vitória e da saudade da pátria amada:
Venho das praias sedosas,
Das montanhas alterosas,
Dos pampas, do seringal,
Das margens crespas dos rios,
Dos verdes mares bravios
Da minha terra natal.
Das montanhas alterosas,
Dos pampas, do seringal,
Das margens crespas dos rios,
Dos verdes mares bravios
Da minha terra natal.
Por último, vale registrar: o Carlos Alberto Augusto, vulgo ‘Carteira
Preta’ e ‘Carlinhos Metralha’, o ex-delegado do Dops que discursou na
manifestação, levou para a Avenida Paulista um cartaz em que dizia
querer ser ouvido pela Comissão da Verdade. Pena que só diz isso agora,
quando os trabalhos da comissão foram encerrados. O relatório diz que
ele foi convocado a depor, mas não foi localizado. Na hora de prestar
contas à história, ele tratou de não aparecer. Segue trecho do relatório
sobre ele:
Carlos Alberto Augusto (1944-) Delegado de polícia. Serviu no
Departamento de Ordem Política e Social de São Paulo (DOPS/SP), sendo
conhecido como “Carteira Preta” e “Carlinhos Metralha”. Integrou a
equipe do delegado Sérgio Paranhos Fleury. Teve participação em casos de
detenção ilegal, tortura e execução. Convocado para prestar depoimento à CNV, não foi localizado.
Vítimas relacionadas: Carlos Marighella (1969); Eduardo Collen Leite
(1970); Antônio Pinheiro Salles e Devanir José de Carvalho (1971);
Soledad Barrett Viedma, Pauline Reichstul, Jarbas Pereira Marques, José
Manoel da Silva, Eudaldo Gomes, Evaldo Luiz Ferreira de Souza e Edgard
de Aquino Duarte (1973).
A Pauline Reichstul, apontada no relatório como uma das vítimas do
‘Carlinhos Metralha’, era irmã de Henri Philippe Reichstul, presidente
da Petrobras no governo Fernando Henrique Cardoso.
Nenhum comentário:
Postar um comentário