Acompanhamos atentamente a palestra do professor Antonio
Paulo de Resende, ontem, dia 29, no auditório Benício Dias, do Museu do Homem
do Nordeste. Foi uma palestra bastante concorrida. Primeiro, pela legião de
ex-alunos e admiradores de Paulo e, depois, pelos posicionamentos políticos e a sólida formação
acadêmica do palestrante. Imagino que Paulo não deve ter feito outra coisa na
vida além de ensinar. Tenho amigos que já concluíram o doutorado e lembram-se
dele como professor secundarista.
Não
foram poucos os momentos em que, no CFCH-UFPE, nos deparamos com aquela figura
franzina que, no início de uma bem-sucedida carreira acadêmica, adorava falar
sobre o Movimento Operário, com certa predileção pelos anarquistas. O Movimento
Operário foi um dos primeiros temas de concentração de Paulo. Não por acaso,
estava em nossa banca de examinadores quando discutíamos a formação do Partido
dos Trabalhadores. Nunca tivemos a oportunidade de participar de nenhuma
disciplina ministrada por Paulo, mas ficamos muito felizes e recordando de
nossa atuação em sala de aula, quando ele enfatizou a questão do afeto na sua relação metodológica com o
alunado.
De
fato, há alguns professores – como bem lembrou Paulo – que apagam as luzes,
deixam os alunos isolados e abusam de tecnologias que sequer permitem uma troca
de olhares entre educando e educador. No momento em que, em sua prática, o
professor permite os “olhares”, quantas questões podem aflorar, quantas
cidadanias podem ser exercidas, quantos “peixes” podem ser vendidos. Com esses
aparatos metodológicos que não permitem a interatividade, não raros fazemos
descobertas tardias, como aqueles alunos - como numa expressão de Louis
Althusser, que já se encontram "interpelados e asujeitados” – implorando para
serem ouvidos.
Ou,
mais até mais grave, aqueles alunos que já são vítimas das sócio-patologias
modernas – como bem lembrou o professor – que vivenciam a angústia do
isolamento, mesmo convivendo com multidões. Por falar em companhia, Paulo
estava muito bem acompanhado. Além de uma platéia atenta à sua fala, estavam do
seu lado alguns pensadores emblemáticos, como Lacan, Marx, Foucault,
Baudrillard, Bourdieu, Derridá, um pouco de Barthes, além de uma gama de pensadores
que se debruçaram sobre a sociedade de consumo, bastante criticada pelo
palestrante.
No
contexto de uma sociedade de consumo, como lembrou Paulo durante sua fala, não
é de se estranhar que a condição de cidadania do indivíduo limita-se às suas
posses ou acessos. Bem típico dessa mentalidade da chamada nova classe “C”,
forjada num imaginário já antecipado pelo antropólogo Roberto DaMatta, ou seja,
o grande frisson é a freqüência ao
Shopping Center, a compra de um carro como ostentação e “diferenciação” e a
contratação de uma empregada doméstica, uma atividade em extinção.
Apesar
de lembrar o livreto de Jean Baudrillard, um desafeto de Foucault – que nos
recomenda esquecê-lo - Paulo flerta com Foucault em diversos momentos de sua
fala. A “construção e a desconstrução do discurso é um dos seus “motes”. “Não
há ordem sem transgressão nem transgressão sem ordem”, “A cultura é uma
construção de significados. Cultura é atribuir significados”, “A História é uma
invenção, uma construção”; “A História não tem sentido”, “A grande utopia da História
é a democracia”.
Neste
momento, ele se revela foucaultiano de carteirinha. No momento em que ele
discute as relações de poder como algo que independe das relações sociais de
produção. Indivíduo bom é o indivíduo dócil e útil. A observação de Foucault é
dirigida aos liberais e socialistas, soterrando, igualmente, a utopia
anarquista. Historicamente, não tivemos nenhuma experiência do chamado
socialismo real de corte democrático, embora, advogue-se em seu favor avanços no concerne à justiça
social. As conquistas dos movimentos feministas,
ambientalistas e dos trabalhadores são pontuais e serão sempre pontuais, jamais
atingindo o âmago dessas relações opressoras. O capitalismo, então, é um primor
de violência simbólica, uma das mais danosas. A liberdade também produz muita desigualdade.
Diante
das observações de Paulo, vale apena recordar
outro francês, Claude Lefort, que afirmara que uma democracia que não se
amplia tende a morrer de inanição. Quais são, afinal, os limites de ampliação
desses espaços de democratização da democracia? O Museu do Homem do Nordeste se
sentiu honrado com a sua presença, Paulo. Próximos encontros deverão ser
agendados, sempre em nossa Casa. Esteja certo de que não será no carro ou num
bar chique da cidade. Um grande abraço!!!
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