O XADREZ POLÍTICO DAS ELEIÇÕES
MUNICIPAIS DE 2012 NO RECIFE. Cinquenta tons de amarelo. A iminente derrota do
Partido dos Trabalhadores em sua principal vitrine regional.
José Luiz Gomes escreve:
Pelo menos dois episódios são
emblemáticos para entendermos os desacertos da candidatura do Partido dos
Trabalhadores no Recife. No dia de ontem, através de uma entrevista concedida
ao Jornal do Commércio, o atual
prefeito João da Costa (PT), que se sentiu provocado, quebrou o silêncio,
defendeu sua gestão dos ataques do “fogo amigo” e teceu alguns comentários
sobre a personalidade de João Paulo, insinuando que ele não atua bem como ator
coadjuvante. Se eleito como vice de Humberto, logo estaria querendo mandar na
gestão, criando arestas com o companheiro. Coxias e camarins não fazem bem a
João, que gosta de atuar na boca do palco, numa fala que reabre as feridas dos
reais motivos do rompimento entre ambos.
O
sociólogo Gilberto Freyre, costumeiramente, utilizava uma expressão conhecida,
o tempo tríbio. As observações de João da Costa confirmam a tese da ressaca da gestão petista, que esteve à
frente do Palácio Antonio Farias nos últimos 12 anos. Mais do nunca vale a
observação de Eliot, ou seja, o tempo presente e o tempo passado estão ambos,
talvez, no tempo futuro. Um futuro que, salvo algum fato novo ou mal
gerenciado, se prenuncia pouco alvissareiro para o PT.
Cansado
dessas refregas, o eleitorado passa um recado claro ao partido, ou seja, o de
que não pretende acompanhar, como meros expectadores, as brigas constantes de
integrantes da legenda e suas inevitáveis conseqüências para a condução da
máquina pública, com prejuízo direto do contribuinte, que paga seus impostos e
quer soluções concretas para os graves problemas que a cidade do Recife
enfrenta.
As
derrotas infringidas pelo grupo de Humberto Costa na Casa de José Mariano ao
prefeito João da Costa – em plena mobilização das prévias – dão bem a dimensão
da ausência de uma postura republicana ou de um compromisso de espírito público
da legenda. Como observa João da Costa, uma possível vitória de Humberto Costa
levaria, inevitavelmente, às arengas entre ambos, Humberto e João Paulo, tão
logo se encerrassem as eleições. João da Costa antecipou o final da novela
petista no Recife. Com ela, aliado a outros fatores que discutiremos mais
adiante, o PT encerra seu ciclo na gestão da capital pernambucana, seguramente,
a mais reluzente vitrine do partido na região, uma praça onde a legenda
tentava, a todo custo, evitar uma derrota.
Hoje,
no nosso entendimento, nem a vinda de Lula, prometida para setembro, teria
condições de reverter esse quadro. Lula encontrará o PT recifense sangrando em
praça pública, amargando o risco iminente de uma derrota – no ritmo de
crescimento do candidato Geraldo Julio – ainda no primeiro turno, numa
estratégia traçada pelos palacianos. O
núcleo duro de campanha do senador Humberto Costa resolveu ignorar as
declarações de João da Costa, mas fizeram questão de informar que ele poderia
estar fazendo o jogo do candidato Geraldo Julio, num script previamente
ensaiado pelo PSB. Ignorando ou não, o fato é que as declarações do prefeito
tocam no ponto nevrálgico do PT, atingindo-o em cheio, num momento em que tudo
parece dar errado, antecipando cenários preocupantes.
Até
recentemente, Geraldo Julio engatinhava nas pesquisas. Logo conseguiria
reverter essa situação, aparecendo muito bem nas últimas sondagens de intenção
de voto, fato confirmado por mais de um instituto. Já se encontra tecnicamente
empatado com Humberto Costa, com 29% pelo último IBOPE, sempre em curva
ascendente. Há, inclusive, a expectativa de que um desses institutos já
sinalize para a superação do candidato
petista pelo socialista, o que apenas confirmariam uma tendência que vem se verificando
desde que o candidato foi lançado pelo PSB, provocando um frisson entre Eduardo
Campos e Lula.
Outro
fator desconcertante na campanha do senador Humberto Costa é a sua estratégia
de campanha que, parece-nos, está batendo cabeça. Enquanto aparece um Lula, no
guia, tentando desconstruir essa idéia de “choque de gestão”, do técnico
competente, mas que, segundo ele, não tem coração, as inserções do partido
tentam passar a imagem de que o senador Humberto Costa também é um homem
público competente. Afinal, foi convidado por Lula para assumir o Ministério da
Saúde e pelo próprio Eduardo Campos para assumir a Secretaria das Cidades. O
eleitor não é bobo e sabe que o que pesou para esses convites não foi a
competência técnica de Humberto, mas os arranjos políticos inerentes em cada um
desses momentos.
No
caso da composição da equipe de Eduardo, salvo essas excepcionalidades dos
arranjos políticos inevitáveis, a competência técnica, a meritocracia também
pesaram na escolha de seus auxiliares. Eduardo montou uma equipe – tocada por
Geraldo Julio – geradora de políticas públicas importantes na área de saúde,
educação, segurança pública. O Estado de Pernambuco tornou-se uma das máquinas
públicas mais bem administradas do país, elevando Eduardo à condição de um dos
principais concorrentes ao Planalto, criando uma área de atrito com o PT.
Aliás,
num confronto direto entre os dois candidatos sobre competências técnicas,
Geraldo Julio leva vantagem. Se não quisermos entrar nessas minúcias, numa
sociedade do espetáculo, políticas públicas como o “Pacto pela Vida”, com
direito à premiação da ONU, acompanhado de uma bem-sucedida estratégia de
marketing, superaram, de longe, os feitos de Humberto em sua passagem pelo
Ministério da Saúde e pela Secretaria das Cidades.
São
inúmeros os fatores que determinam a vitória ou a derrota desse ou daquele
candidato numa eleição. No pleito para a Prefeitura da Cidade do Recife, a
candidatura do senador Humberto Costa, pelo PT, enfrenta uma série de percalços
que podem ser determinantes no resultado dessas eleições, culminando com a
derrota do partido numa das praças mais importantes para a agremiação.
A
sangria do PT no Recife é um processo lento e doloroso. Vai às urnas numa
“união” arranjada, com o atual gestor “amuado” e um candidato imposto pela Executiva
Nacional, travado entre militantes e rejeitado por parcelas do eleitorado.
Trocando os pés pelas mãos, para lembrarmos uma observação do ex-ministro da Justiça
e ex-presidente da Fundação Joaquim Nabuco, Fernando Lyra, que afirmou que o
ex-prefeito, João Paulo, deveria estar na cabeça de chapa.
Evidente
que o PT possui o legado dos 12 anos de mandato na gestão da cidade, com uma
experiência, inclusive, de muita sensibilidade junto aos setores historicamente
fragilizados da sociedade recifense. Hoje, esse apelo emocional, no entanto,
muito utilizado por Lula ao falar no “coração” de Humberto Costa, já não consegue
mobilizar o eleitorado como antes. Pesa contra o partido a “saturação” natural
de tantos anos no poder, não apresentando soluções para alguns “gargalos” da
cidade. A educação municipal, por exemplo, no último IDEB, foi cabalmente
reprovada, sem chances de ir para a final.
Geraldo
Julio não é necessariamente, um técnico sem coração, como parece querer
insinuar Lula. Erra os marqueteiros de Humberto, igualmente, ao querer
estabelecer um confronto de gestão entre ambos, caindo numa armadilha criada
pelo marqueteiro do PSB, Raimundo Luedy, que já trabalhou para os petistas. Geraldo
Júlio foi uma espécie de regente de uma orquestra de uma gestão pública,
conforme já afirmamos, das mais bem-sucedidas do Brasil, responsável por
inovações importantes na condução da máquina o que, habilita, inclusive, o
pleito presidencial do governador Eduardo Campos.
Tentar
“desconstruir” isso, igualmente, num momento, em que se observa um eleitorado
pragmaticamente orientado pelas decisões que deverão ser tomadas no tocante à
gestão dos problemas da cidade, do seu dia-a-dia, da sua mobilidade, é também
um grave equívoco. Jogar nos dois campos, como vem se fazendo, é um equívoco
ainda maior.
O
técnico e o modelo de gestão estão consolidados na cabeça do eleitor como algo
positivo no candidato Geraldo Julio. Se você faz uma gestão ruim da cidade,
sofrem todos, os mais abastados e os menos favorecidos. O modelo de gestão
popular do PT – sobretudo uma herança do ex-prefeito João Paulo – também sofreu
um profundo desgaste nos últimos anos, levando a muitos questionamentos,
sobretudo se consideramos que, em tese, João da Costa deu prosseguimento a tal
modelo de gestão, como ele afirma, embora os partidários do ex-prefeito João
Paulo advoguem exatamente o contrário.
Ademais,
se são os partidários de João da Costa ou se são os partidários de João Paulo
que tem razão, o fato é que o modelo de gestão popular – traduzido, em parte,
pelo controle do orçamento público através do orçamento participativo – em
razão do percentual ínfimo de recursos que são submetidos às decisões públicas
e a efetiva concretização de obras que são decididas pela população, também
passaram a ser bastante criticados. Faltou criatividade ou inovação na gestão
pública petista.
O
que, na realidade, determina o voto do eleitor neste ou naquele candidato. Essa
pergunta nunca foi devidamente respondida, dada sua complexidade. Há uma série
de variáveis de natureza sócio-econômicas, identificação partidária, fatores
religiosos, motivações afetivas, valores, que dificultam a identificação da
determinação do voto. O cientista político polonês Adam Przeworski, em certo
momento de suas reflexões sobre o assunto, apresenta um fato curioso de um
eleitor no seguinte dilema: ele é evangélico, servidor público prestes a se
aposentar e pretende tornar-se um empreendedor, vivendo numa cidade abandonada
pelo poder público. Qual dessas identidades teria um peso maior na hora dele
depositar seu voto na urna?
A
campanha do candidato Geraldo Julio parece-nos estar sendo conduzida com o
objetivo de manter sob controle todos os mecanismos indutores do voto, ou seja,
há um apelo ao emocional e, ao mesmo, tempo uma postura pragmática no sentido
de apresentá-lo como o homem que possui capacidade para resolver os problemas
da cidade. Nem os pentecostais e neopentecostais foram esquecidos, uma vez que
essas igrejas são mais competentes na busca de votos do que propriamente as
máquinas partidárias.
No
quesito emocional, são elencadas as relações familiares e afetivas do
candidato, apresentado-o, como nos comerciais de margarina, tomando café da
manhã com a família, arrumando a pasta para ir ao trabalho, entremeado pelos
comentários da esposa de que se trata de um bom moço, bom pai, bom marido. Um
exemplo disso é a aparição em publico, como ocorreu num encontro no Marco Zero,
com toda a família, inclusive um bebê.
No
aspecto trabalho, melhor impossível. Geraldo é aquele que pega cedo no batente,
que ingressou no serviço público através dos dispositivos republicanos do
concurso público, que tem hora para começar, mas apenas finaliza seus
compromissos com os trabalhos realizados. Aquele que, no início da campanha,
dedicava-se a vinte horas de maratona e dormia apenas 04. Um bom exemplo dessa
marca é o capacete utilizado em suas peças publicitárias ou o criativo adesivo
colocados nos carros, onde aparece uma família utilizando um capacete de sua
campanha.
Agora,
pelas redes sociais, as cartadas finais de criatividade, numa concorrência “desleal”
com o adversário. Recomenda a propaganda
de Geraldo esquecer o “passado”, de buracos, de obras não concluídas, de
prédios abandonados, das enchentes, pegando o eleitorado pelo “pé”,
literalmente falando.Depois, as propostas pontuais de implantar o Ganhando o
Mundo nas escolas municipais, o “Pacto pela Vida” municipal – comandado pessoalmente
por Geraldo – umas Upinhas aqui outras acolá. Como o trânsito está
estrangulando na Estrada do Arraial, depois do binário – tivemos a oportunidade
de observar, numa das placas do candidato, a promessa de construção de 04 Upinhas
naquele bairro, com atendimento 24 horas. Com isso e o endosso do governador
Eduardo Campos, a campanha de Geraldo Julio fecha a conta e passa a régua. O
Partido dos Trabalhadores encerra seu ciclo na gestão da Veneza brasileira.
Excelente matéria, faz uma leitura perfeita dos acontecimentos com muita clareza e objetividade.
ResponderExcluirParabéns José Luiz.
Muito agradecido pelos comentários. Um grande abraço!!!
ResponderExcluirMuito bom, Zé Luiz! Realmente um editorial esclarecedor dos últimos acontecimentos políticos e de gestão que levaram o PT a estar "sangrando em praça pública". Parabéns!
ResponderExcluirSilvana Araujo
Muito agradecido, Silvana Araújo. Obrigado pela leitura e comentários.
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