O sistema de registro de
ocorrências policiais é, hoje, extremamente engessado e burocrático. A cada
evento, o cidadão é obrigado a dirigir-se a uma delegacia, exigência que, não
raro, contribui para a subnotificação que tanto prejudica o planejamento da
segurança pública. Projeto de minha autoria apresentado ao Senado recentemente,
o PLS nº 227/2012 pretende descentralizar esse processo, com um boletim de
ocorrência (BO) único.
Pela proposta, os boletins sairão da alçada exclusiva do delegado de polícia, civil ou federal, podendo ser lavrados também por policiais militares e rodoviários ou até mesmo pelo militar das Forças Armadas, quando em missão de garantia da lei e da ordem. Não há risco de desrespeito às atribuições legais das polícias judiciárias, que continuarão responsáveis por arbitrar fiança, apreender objetos e periciar a cena do crime.
A possibilidade de facultar a
outros agentes públicos esse tipo de registro permitirá o aumento da capacidade
de investigação da Polícia Civil. As equipes destinadas ao trabalho aumentarão
(delegado, escrivão, investigador e agente) sem a necessidade de novas
contratações, na medida em que serão transferidos para a área os policiais civis
hoje voltados ao atendimento do público nos balcões das delegacias.
A proposta do BO único deverá
contribuir para dar mais capilaridade ao sistema de segurança pública com um
fator positivo adicional: é uma iniciativa complementar à recente criação do
Sistema Nacional de Estatísticas de Segurança Pública e Justiça Criminal
(Sinesp) pelo Ministério da Justiça, que irá geri-lo.
O foco do Sinesp é a organização e
a padronização de dados criminais e operacionais do sistema de justiça,
atualmente produzidos pelos estados e em menor escala pela União. Nesse sentido,
apresenta-se como uma caixa de saída de tais estatísticas. Transforma os dados
atualmente existentes em informações disponíveis para uso nas atividades de
avaliação, monitoramento e planejamento. O Sinesp, no entanto, não regulamenta a
forma de entrada dos dados provenientes de ocorrências policiais. Essa é
precisamente a lacuna que será preenchida pela Lei do BO Único.
O Sinesp, tendo na base um sistema
único de registro de ocorrências propiciado pelo PLS 227, será capaz de produzir
um quadro mais abrangente do fenômeno criminal. Experiências em vários países
demonstraram que o uso adequado de informações é fundamental para o planejamento
e a implementação de medidas eficazes na área da segurança pública.
O Compstat, sistema de controle de
desempenho desenvolvido pela polícia de Nova York, na década de 1990, é um dos
melhores exemplos do sucesso obtido com a introdução de métodos de gerenciamento
por resultados no sistema de administração da segurança pública. Sem informações
confiáveis e padronizadas, não é possível avaliar e monitorar o trabalho
policial na ponta.
Na medida em que mais ocorrências
serão registradas, mais informações serão carreadas para o recém-criado sistema
de informações. O público e os meios de comunicação passarão a ter maior poder
de controle e monitoramento, o que poderá gerar novas e benéficas pressões sobre
o gestor público.
Haverá, então, base mais sólida
para refletir sobre as políticas públicas e a eficiência das medidas propostas
de combate ao crime ou em prol da segurança. Precisamos que a administração
pública opere com a cultura da avaliação com base em métodos rigorosos e
cientificamente reconhecidos.
Armando Monteiro
Neto
Senador (PTB - PE)
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