pub-5238575981085443 CONTEXTO POLÍTICO: Editorial: Em defesa de Michel Zaidan ou o direito à liberdade de expressão.
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sábado, 8 de setembro de 2012

Editorial: Em defesa de Michel Zaidan ou o direito à liberdade de expressão.




Ao longo de sua bem-sucedida carreira acadêmica, o professor Michel Zaidan Filho entrou em diversas polêmicas, o que apenas evidencia seu espírito combativo e a sua capacidade de indignação. Quem teve o privilégio de ser aluno, orientando e amigo sabe perfeitamente porque ele tem sido vítima constante dos poderosos de ocasião, das carcomidas oligarquias locais e de subservientes bajuladores, mesmo que, em alguns casos, estes ostentem perfis acadêmicos, embora se comportem como lacaios de interesses mesquinhos.

                                   A lista de polemistas com quem Michel estabeleceu  algum embate é extensa e, possivelmente, ocuparia todo o espaço desse editorial, sobretudo se entrássemos nos detalhes. Enfatize-se, entretanto, que os motivos que levaram o professor Zaidan a entrar nesses embates são princípios nobres, eivados de espírito público, sempre na defesa dos valores da democracia, da liberdade de expressão, em defesa do patrimônio público, da res publica, dos movimentos sociais de trabalhadores, contra o mandonismo, o arbítrio, a oligarquização da política local, a privatização ou familiarização do interesse público.

                                   Em sua trincheira do CFCH/UFPE, o mestre montou uma torre de vigilância sempre atenta aos desmandos e abusos contra o interesse público. Num momento de debandada de acadêmicos ao apelo de corte instrumental ou meramente adesivo ao Governo FHC, o príncipe dos sociólogos, Michel se manteve em seu reduto, orientando-se pela defesa dos seus caros princípios, em sua salinha empilhada de livros e uma velha máquina Olivetti, onde até hoje escreve seus artigos, atendendo seus alunos, acompanhando os movimentos estudantis, participando de barricadas, opinando sobre a política, lendo suas teses, escrevendo seus livros. A ele não se aplica a crítica de Sartre a Maurice Merleau Ponty, a quem acusava de ser um intelectual de gabinete. Do mestre pode-se dizer que é um militante político.

                                   Num momento em que ocupou a Coordenação do Mestrado em Ciência Política, numa nomeação de Robinson Cavalcanti, além de todas essas atividades, quem ligasse para aquela Coordenação, ainda podia ter a surpresa de ter seu telefonema atendido pelo próprio Coordenador do Departamento. Nos anos em que frequentei aquele Centro só houve um momento em que cheguei antes do mestre, por ocasião da nossa defesa de dissertação de mestrado, quando chegamos às 07h00, naquele dia específico, como brincou o mestre, literalmente abrimos o Programa, movido pela ansiedade.

                                   Em sua defesa aos ataques desferidos por pessoas ligadas do Palácio do Campo das Princesas, manteve a serenidade, apontando os argumentos pelos quais conduzia seu raciocínio, tudo dentro de parâmetros civilizados, não esquecendo inclusive, governador Eduardo Campos, de honrar a memória e a integridade do seu avô, Dr. Miguel Arraes, sobretudo num ponto nevrálgico, a defesa da redemocratização do país e a sensibilidade social, um DNA herdado por vossa excelência, até prova em contrário.

                                   Como afirmou o mestre, ele tem o direito de se encontrar entre os 5% que talvez não concordem com a gestão que Vossa Excelência está imprimindo ao Estado, sobretudo nos pontos que foram invocados. Essas contingências políticas são complicadas, mas competia à sua assessoria tomar alguns cuidados quando se reportasse aos 5% que, de alguma forma, discordam de sua gestão, seja ele um respeitado acadêmico ou um cidadão comum do Alto José do Pinho que, dentro de uma república, merecem o mesmo respeito.

                                   Já dizia o poeta que toda unanimidade é burra. Já afirmei em outras ocasiões e volto a fazê-lo, muito cuidado com os “clipadores” do Campo das Princesas, esses que põe em sua mesa de trabalho os artigos e reportagens sobre o seu Governo, limitando-se a informá-los: Esses são contra, esses são a favo. Não se avança com a bajulação. Eles não agregam, a não ser uma massagem no ego dos governantes e o “entreguismo” visceral, por vezes criminoso, como forma de ganhar “ponto” junto aos poderosos, numa manifestação cabal de sua subserviência. Sobretudo quando eles resolvem escrever suas réplicas e pedir para alguns incautos assinarem. Não sei se Vossa Excelência leu o artigo, mas trata-se de um texto muito mal escrito, que, pela absoluta ausência de argumentos consistentes, descamba para as agressões pessoais, isca que o mestre, em sua tréplica, não engoliu.

                                   Aprendi a admirar o seu avô, Dr. Miguel Arraes, desde criança. Meu pai foi um ex-operário da Companhia de Tecidos Paulista, da família Lundgren, de Paulista, e nos ensinou a admirar aquele político que se orientava pela defesa dos mais humildes. Quando, no Governo Jarbas, ele foi virulentamente atacado por tecer algumas críticas ao Governo, tomamos a liberdade de escrever para os jornais, defendendo seu direito de se opor. Nossas posições sobre o seu Governo são conhecidas. Não raro Vossa Excelência aparece em nosso blog. Quando preciso, reconheço os acertos, quando necessário, apontamos equívocos como forma, inclusive, de contribuir com sua gestão.

                                   Em palestra recente na Fundação Joaquim Nabuco, o professor Antonio Paulo de Resende comentou sobre os limites da democracia, argumentando que se tratava de uma utopia histórica. De fato, nenhuma modelo de organização social conseguiu conviver harmoniosamente e de forma plena com a democracia, utilizando em maior ou menor escala os tradicionais mecanismos de controle social, exaustivamente discutidos pelo filósofo Michel Foucault. Michel, inclusive, afirmava que algumas conquistas nesse terreno - obtidas através da luta dos movimentos sociais - seriam pontuais e meramente pontuais, jamais atingindo o âmago das relações de poder. Em certa medida, era um pessimista não quanto aos valores, mas sobre a materialização da democracia.

                                   Mas, a utopia nos faz sonhar e não são poucos os estudiosos que se orientam em defesa da democracia e de sua ampliação, embora, como afirmava o filósofo político italiano Norberto Bobbio, comentando sobre o desmonte da experiência socialista, o grade dilema da humanidade é que ainda não se resolveu a equação entre liberdade e igualdade. Conquistas como a liberdade de expressão entra no campo dos avanços pontuais, como advogava Foucault. Democratizar a democracia, portanto, é nossa utopia, digamos assim. Deve ser muito triste deixar de acreditar numa utopia. Isso pode ser comparado ao recente acidente vascular que acometeu o escritor pernambucano Raimundo Carrero, que afirmou ser o seu maior temor perder a faculdade de “imaginar”.

                                   O sociólogo francês, Claude Lefort, defendia a tese de que deveríamos nos empenhar por sua ampliação, uma vez que uma democracia que não se ampliava tendia a morrer de inanição. O problema são seus limites e “incertezas” inerentes, como advogava o cientista político polonês, Adam Przeworski. Quais são os reais limite, afinal? Historicamente, ela, a democracia, vem sendo testada cotidianamente. A experiência do socialismo realmente existente, conforme defendia Bobbio, é uma prova insofismável das dificuldades de conciliação entre liberdade e igualdade. Países como Cuba, por exemplo, a despeito dos avanços sociais – talvez o único país do mundo a erradicar a desnutrição infantil, dado atestado pela UNICEF- suprime as liberdades individuais, não permitindo que seus cidadãos expressem, livremente, suas opiniões, praticando uma espécie de "crime de consciência", imaginem vocês. O cidadão é preso, perseguido, torturado por pensar diferente, numa evidente demonstração de intolerância.

                                   As economias liberais, por sua vez, apesar de alardearem a liberdade de expressão, até mesmo do ponto de vista jurídico, na prática, adotam alguns dispositivos sutis de censura, quando não investe, deliberadamente, sobre o controle dos meios de comunicação, como se tentou no país, através dos marcos regulatórios da imprensa. Felizmente, a presidente Dilma Rousseff, logo que assumiu o Governo, adotou uma postura de corte democrático, em defesa do interesse público, não permitindo que essas investidas se tornassem exitosas. Em todo caso, não são poucos os que, no Governo, ainda tentam desencavar esses expedientes.

                                   O linguista Noam Chomski tem sido um grande crítico da indústria de comunicação dos Estados Unidos, apontando seu poder de manipulação, definindo pautas consoantes interesses corporativos e de grupos econômicos e políticos. Seus debates com os grandes empresários do setor se tornaram antológicos e, não raro, os reproduzimos em nosso blog. Numa palestra na Fundação Joaquim Nabuco, um economista da USP, após fazer sua explanação, comentou ter sido censurado pela grande imprensa paulista por emitir opiniões contrárias aos interesses do establishment governista da época. Convidado a conceder uma entrevista, emitiu suas opiniões sobre o Plano Real, que nunca foram publicadas.

                                   Num segundo momento, o mesmo jornal, ligou para o departamento procurando outro pesquisador para se pronunciar sobre o assunto. Ao encerrar sua fala na sala Calouste Gulbenkian, um dos participantes retrucou suas observações, afirmando que, naquele momento, ele não havia sido censurado, estando livre para emitir suas opiniões. O economista então respondeu que ali, sim, ele podia falar. Afinal, logo após a palestra aqueles ouvinte iriam tomar seus carros com ar-condicionado e se dirigirem aos seus apartamentos e - ele não falou, mas eu acrescento - deixariam seus apartamentos, num sábado, para participarem de um protesto que ficou batizado de Movimento pela Mobilidade das Hilux, que ocorreu recentemente no bairro de Parnamirim, contra a ciclovia da Estrada do Arraial, sem o menor desprendimento de alteridade. Houve até um locutor que informava que aqueles privilegiados não usavam transporte coletivo ou precisavam de ciclovias, algo muito mais próximo dos moradores dos morros adjacentes.

                                   Quando do seu primeiro mandato, o governador Eduardo Campos convidou o professor Michel Zaidan para debater um possível programa de Governo, numa reunião ocorrida em Olinda, se houver algum engano nessa informação, peço perdão. Lembro-me de uma entrevista, logo em seguida, onde o mestre comentou sobre os graves problemas hídricos do Estado. Em conversa com outro cientista político do nosso grupo, ele nos confidenciou que Eduardo teria afirmado que Michel Zaidan e uma economista de renome no Estado, cada um dentro de suas áreas específicas, poderia dizer o que quisessem sobre o Governo, sem correr o risco de serem censurados ou processados. Não é o que parece quem vem ocorrendo, pelo menos em relação ao cientista político Michel Zaidan.

                                   Michel Zaidan não chegou a integrar o Governo – penso que nem pretendia – apeado, segundo dizem, por pessoas que não sabem conviver com opiniões contrárias à sua e, certamente, incomodadas com a sua altivez, independência e sinceridade. Quem acompanha o nosso Blog do Jolugue sabe que o editor, não raro, aponta dois equívocos no Governo de Eduardo Campos: o primeiro diz respeito ao descaso com questões relativas ao meio-ambiente, sobretudo em seu primeiro mandato, algo que vem tentando se corrigir. O outro, de natureza, política, é que observamos que o Governo, entremeado pelo pragmatismo fisiológico da tradição política brasileira – deixou de dar ênfase à meritocracia, de corte republicano, tão enfatizada em seus primeiros anos de Governo.

                                   Quem não se lembra de um antológico diálogo proposto aqui no Blog do Jolugue, entre Eduardo Campos e conhecido oligarca do Estado do Maranhão? Entre seus novos amigos, há aqueles que o aconselham a afasta-se do PT e antecipou que, em algum momento, ele teria que emendar o bigode com este oligarca, que ainda possui algumas capitanias hereditárias na República. República que avança em certos aspectos, mas permanece recheada dessas práticas fisiológicas, patrimonialista, numa espécie de neo-patrimonialismo mitigado entre inovação e continuísmo, eficiência e práticas reificadas, permitindo-se que interesses de grupelhos se sobressaiam sobre o interesse público. Mais arguto do que o discípulo, o mestre apontou alguns equívocos na condução das políticas públicas do Estado na área de saúde e de educação.

                                   O Governo do Estado, que enfatiza tanto o aspecto profissional da gestão, precisa tomar mais cuidado com a imagem do seu Governo, respondendo as críticas dentro de parâmetros civilizados, urbanos, respeitosos, republicanos, jamais se permitindo levar para o campo pessoal as observações sobre a gestão da máquina. Michel Zaidan é uma das pessoas pelas quais o editor do Blog do Jolugue possui uma profunda admiração. Cuidados com réplicas que usam a bílis e não argumentos consistentes apenas contribuem para confirmar os argumentos que estão sendo postos.

                                   O mestre é alguém que merece nosso respeito, governador. Ao contrário do que afirma o ghost writer do Palácio do Campo das Princesas, é alguém respeitado no circuito acadêmico. Não vai aqui nenhuma demonstração de “arrogância acadêmica”, mas nós não observamos quantos artigos foram escritos pelo ghost writer, quais foram seus temas de estudos, de quantas bancas de defesa de mestrado ou doutorado ele participou, quantos alunos ele orientou ao longo de sua vida acadêmica, quantos artigos científicos publicou em revistas especializadas ou algo parecido. Confesso que, nesses anos todos, nunca esbarrei com ele pelo CFCH, sequer, acompanhando uma palestra sobre o movimento operário, um dos temas em que mestre especializou-se. Certamente, ele teria muito que aprender com Michel Zaidan. Noutros tempos, eu convidaria para saborear um “Tropical” na Cantina do Daniel, em nossa companhia.

                                   Volto a repetir, não entenda isso como uma sobreposição de saberes, até porque tanto ele como eu temos profundo respeito pelos humildes analfabetos, alguns deles, sequer, tiveram facultado o direito a uma educação pública de qualidade, uma obrigação do Estado. Argumentos, na realidade, se responde com argumentos, não com agressão ou censura. Não há como responder, governador?

José Luiz Gomes da Silva, Cientista Político, Editor do Blog.

(Crédito da foto: Diário de Pernambuco).

                                    

 

 

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